𝟬𝟬𝟯 ، THE ANSWER'S IN THE LIGHTS.
CAPÍTULO TRÊS :
A RESPOSTA ESTÁ NAS LUZES.
A ESTRADA ESTAVA ESCURA quando Andy retornou para casa, tendo apenas a luz da lua iluminando a estrada de terra. O som da música tocando em seus ouvidos a distraiu de qualquer barulho que viesse da floresta, mas ela ainda manteve os olhos atentos à qualquer movimentação por puro
Ela tinha plena consciência de que aquilo era a pior idéia que ela poderia ter em tempos como aqueles ── um adolescente de bicicleta voltando para casa sozinho durante a noite parecia uma história familiar. Ela poderia ter esperado pela Wheeler ao lado de Barb mas a irritação que ela sentia naquele momento pela atitude da garota a fez buscar por uma distração em seu retorno para casa.
Pelo canto do olho ela viu algo se mover na floresta, fazendo-a parar de pedalar e abaixar os fones afim de tentar ouvir algum som que viesse dali, mas não era possível escutar nada além dos galhos das árvores batendo-se uns contra os outros por causa do vento. Andrea desligou a música, olhando uma última vez para o mato e voltando a pedalar.
Sons de passos correndo atrás dela foram ouvidos e, apavorada com aquilo, a Hopper olhou para trás afim de tentar saber o que diabos estava a seguindo, mas a roda da bicicleta bateu em algo e ela foi levada ao chão, tentando usar a mão para amortecer o impacto.
Ela se sentou na estrada, piscando os olhos algumas vezes para tentar tirar o grão de areia que estava incomodando. Algo bateu contra seu peito, derrubando-a novamente contra o chão e lambeu seu rosto enquanto a morena tentava se situar do que estava acontecendo, seu coração batendo tão forte ela não conseguia ouvir outra coisa. Com a visão livre, ela encarou a figura peluda e respirou fundo, vendo que se tratava apenas de um cachorro perdido.
─── Pelo amor de Deus... ─── ela sussurrou, levando a mão ao peito e fechando os olhos por alguns segundos para se acalmar antes de analisar o animal.
Buscando por algum nome na coleira dele, ela forçou os olhos para conseguir ver que 'Chester' estava escrito no pingente em seu pescoço. A morena fitou o cachorro por um momento, tentando lembrar onde poderia ter visto antes ele mas a dor pela queda a impediu de focar naquele pensamento. Ela se levantou com cuidado, notando um pequeno arranhão no tornozelo, bem onde a bicicleta havia caído por cima. Seu pulso também doía e ela se perguntou se conseguiria voltar pedalando ── considerando a distância da casa de Harrington até o trailer, seria uma longa caminhada.
Ela limpou a areia das roupas, erguendo a bicicleta e caminhando devagar, não confiando em si mesma para subir no transporte com o corpo doendo daquele jeito. O cachorro acompanhando seus passos chamou a atenção de Andy, que parou e o fitou, gemendo baixo.
─── Meu pai vai me matar se eu te levar pra casa. ─── a garota sussurrou para ele, voltando a andar.
O cachorro não pareceu entender ou se importar já que ele continuou a seguindo por perto, fazendo-a apenas abandonar aquela batalha perdida e o levar para casa.
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O ALARME TOCOU ALTO PRÓXIMO do ouvido de Andy. A adolescente estava deitada no chão, com um bolsa de gelo ── agora derretido ── no pulso e o telefone em cima do peito, onde ficou enquanto ela esperava pela ligação de Barb. Apesar do sono profundo, Andy sentia que não havia descansado o suficiente.
Ela respirou fundo, sentando e batendo a mão no aparelho, parando o som infernal que aquilo produzia antes de se erguer com cuidado e ver o cachorro da noite anterior deitado em cima de seus travesseiros. Extremamente confortável, pensou. Suspirando baixo, ela apertou os olhos, seguindo para o banheiro afim de se limpar depois da bagunça da noite anterior. A adolescente estava tão cansada quando chegou que só teve forças para esconder o cachorro no quarto e se jogar no chão para dormir.
Indo para a cozinha, ela vestida um moletom verde-escuro, calça jeans e a jaqueta colorida embaixo do braço, jogando-a no sofá ── seu pobre senso de moda se resumia as variações desse estilo; Andrea sentia que nunca iria conseguir acompanhar a moda da época, principalmente pela falta de dinheiro, então ela apenas desistiu de uma vez.
Ela encontrou seu pai já de pé, com uma xícara de café e o regular cigarro na boca enquanto lia o jornal, provavelmente lendo sobre o desaparecimento do Byers. Ela fez o seu melhor para ir até a cafeteira sem mancar ou resmungar da dor, evitando encará-lo por conta de um arranhão na bochecha que ela descobriu apenas minutos atrás. Não era nada feio, mas era impossível não perceber se olhasse para ela.
Basta fingir que não estou aqui, ela pensou, notando que ele não havia olhado para ela desde que entrou no local. Sua sorte não durou muito.
─── Onde você tava ontem à noite? ─── o delegado questionou, abaixando o papel em mãos e vendo-a encolher levemente os ombros, sem o encarar.
─── Com a Barb e a Nancy! Eu deixei um bilhete na geladeira... ontem à noite, antes de sair... ─── dizendo da maneira mais inocente possível, ela tomou um gole da bebida quente, apontando para o papel que estava preso na geladeira antes de abrir o armário em busca do cereal, pondo um punhado na boca.
─── Vocês entraram em uma briga ou o quê? ─── ele comentou, vendo o pulso dela, que estava em uma mistura de vermelho e roxo.
─── O quê- Não! ─── ela se virou confusa com a pergunta repentina, sorrindo em nervosismo apesar da boca cheia. ─── O que é isso, um- um interrogatório? Eu deveria chamar um advogado?
─── Você chegou tarde ontem a noite e parece que um animal atacou você, Andrea, então sim, é um interrogatório. Agora, pela última vez, o que aconteceu?
─── Pai, pelo amor de Deus, o que deu em você hoje?! ─── ela resmungou, jogando as mãos para o alto. ─── Eu fui... eu- eu fui pra casa do Steve, ok? Os pais dele viajaram e ele deu uma pequena festa, só isso.
Ele ergueu a sobrancelha, como se não estivesse acreditando nela, o que era plausível, considerando o rapaz envolvido. ─── Harrington? Steve Harrington? Achei que não gostasse dele.
Andy levou o indicador à boca e pôs a língua para fora, fingindo uma expressão de vômito ao ouvir o nome do garoto, negando com um aceno. ─── Ele me dá nojo. ─── resmungou, sentando em um banco do balcão. ─── Mas eu gosto da Nancy e da Barb e elas foram, é isso. Tô liberada, xerife?
─── Ok, mas e esses arranhões?
Andrea respirou fundo, coçando a nuca com hesitação. Com a queda e tudo relacionado a ela, a garota achava mais seguro manter aquele assunto privado, pelo menos até achar o dono do animal ou decidir o que fazer com ele.
─── Isso é vergonhoso, vamos apenas fingir que não aconteceu.
Forçando um sorriso, ela pegou um punhado de cereal direto da caixa e levou à boca, parando de mastigar quando um latido vindo do corredor foi ouvido. O Hopper mais velho olhou por cima do ombro da morena, que engoliu o resto do cereal com pressa para chamar a atenção de seu pai.
─── Então! ─── ela limpou a garganta ao girar na cadeira para fitar o pai, tão nervosa que não sabia o que dizer primeiro. ─── Você- como tá- uhm, como tá indo a investigação? Alguma novidade sobre o garoto- o Will?
─── Isso foi um latido?
Para de falar, Andy!, ela pensou, mas sua boca era muito mais rápida.
─── Latido? Não , claro que não... sabe, deve ter sido algum animal na floresta, sabe... latidos, que idéia... idiota...─── ela franziu a sobrancelha, mas a expressão no rosto de Jim apenas fez ela desistir da tentativa e rir sem graça. ─── Eu encontrei um cachorro... ontem à noite, enquanto voltava pra casa... ele... ele me derrubou da bicicleta.
─── Então um animal atacou mesmo você?
Andy soltou lentamente o ar pela boca, inclinando a cabeça. ─── Não... não exatamente. Foi mais como uma batida de carro... eu acho. Não, não foi isso faz parecer que foi grave demais, foi algo como-
O delegado respirou fundo, colocando a xícara dentro da pia e se afastando. ─── Eu não ligo, apenas... devolve esse animal, tá? Eu já tenho preocupações demais procurando pelo Will, não preciso de um roedor destruindo meu sofá.
─── Uhm...
─── O quê?
─── Eu não vi nenhum nome... só o do cachorro, mas não tinha endereço nenhum, então... ─── ela deu de ombros, mordendo o lábio para conter um sorriso, se virando para o balcão novamente. ─── Uma pena...
─── Você não vai ter um cachorro. ─── disse firme, sabendo bem o que ela estava pensando. Ela falava daquilo desde que havia aprendido a falar; Hopper apostava que suas primeiras palavras não haviam sido nem 'mamãe' e nem 'papai'.
─── Eu não falei nada! ─── bufou, passando as mãos pelo rosto com um suspiro, bagunçando o cabelo. ─── Que saco...
Ele apenas a fitou, vestindo o casaco e pegando o chapéu; aquela conversa com a adolescente o deixou cansado e ainda nem eram oito da manhã. ─── Qual o nome na coleira?
─── Chester. ─── ela respondeu, vendo o homem pensar por alguns segundos, como se reconhecesse aquele nome.
─── Chester? Tem certeza?
Ela zombou. ─── Eu torci o pulso, não fiquei cega. É Chester, eu tenho certeza absoluta, delegado.
─── Parece o nome do cachorro da Joyce.
Ela inclinou a cabeça com a menção do nome. Como ele sabia daquilo? ─── ...Joyce Byers?
─── Você conhece outra?
A morena murmurou um 'uau' com a resposta dele, voltando a atenção para o café-da-manhã ao ver que ele estava prestes a sair, pensando que talvez o assunto tivesse encerrado ali ── ela não devolveria até que uma força extrema a fizesse.
─── Eu quero o cachorro fora daqui quando eu voltar. ─── ele disse enquanto prendia a arma na cintura. Vendo que ela não pronunciou nenhuma resposta, ele a fitou novamente, mais firme dessa vez. ─── Eu quero ele fora ou você fica de castigo. ─── Ameaçou, saindo e fechando a porta, deixando a garota sozinha resmungando.
─── Tanto faz, eu não queria um mesmo...
Terminando de comer, ela jogou a caixa vazia de cereal no lixo e colocou a xícara suja na pia, pegando o que parecia o resto do jantar do dia anterior e pondo em um prato qualquer, levando para o animal preso no quarto.
─── Espero que aproveite seu último dia, Chester. Eu vou te levar embora depois da aula, ok? Joyce não pode ter dois garotos perdidos.
Ela observou enquanto o animal comia, apertando levemente os lábios antes de decidir que, em hipótese alguma ele ficaria preso em seu quarto enquanto ela estivesse fora. Ela adorava animais, mas o cheiro que resultava depois era o pior de todos, principalmente vindo de um cachorro que não era ── e nem seria ── dela. Levantando-se, ela foi procurar por uma corda nas coisas de seu pai, pensando em prender o cachorro embaixo das árvores do lado de fora.
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ARRUMANDO A ALÇA DA BOLSA AO sair da sala da conselheira escolar, Andrea seguiu pelo corredor afim de ir até seu armário pegar o que precisava para a primeira aula. A conversa estava indo bem até a menção de sua mãe e meio-irmão; a adolescente não fazia idéia de como a mulher havia descoberto tanto sobre eles em tão pouco tempo ── era sua primeira vez ali depois do incidente na semana passada. Sua mãe parecia ter orgulho em não manter contato com os antigos amigos em Hawkins e Andrea duvidava que a tal notícia havia chegado ali através dela.
Se ela ficasse quieta apenas por um minuto, sua mente a levava de volta para aquela noite, como se o acidente tivesse acabado de acontecer. A gola do moletom beliscando seu pescoço, o peso do outro corpo em cima do dela, a ponta de um graveto machucando suas costas e a terra sujando sua roupa, cada detalhe ainda estava vivido sua cabeça. As gotas de água caindo em seu rosto devido à chuva de mais cedo fez com que ela olhasse para o céu em busca de uma distração para o que havia acontecido momentos atrás, enquanto o cheiro... aquele maldito cheiro de terra molhada e algo mais que ela não identificava, seguindo do líquido quente e gosmento manchando sua mão e descendo pela extensão de seu braço, sujando o moletom azul enquanto ela tentava não pensar demais nos machucados que pudesse ter em seu corpo.
Deveria ser apenas uma noite como as outras. Uma noite onde Andrea sairia com os amigos, evitando ficar em casa com a mãe e o marido que naquela altura já havia bebido demais e descontado a raiva na esposa; se ela ficasse lá, seria mais uma vítima, como sempre. Era um costume que a Hopper estava cansada de seguir, então por quê ficar presa no quarto enquanto eles gritavam no andar de baixo quando teria uma experiência similar, porém inofensiva, com seus amigos dramáticos na oficina abandonada perto do parque?
Aquela noite estava no topo da lista dos piores acontecimentos da vida da Hopper e a adolescente temia que aquilo nunca fosse mudar.
─── Andrea!
─── Uhm? ─── respondeu assustada, olhando para o lado e vendo que era Nancy quem a chamava, com um olhar preocupado.
─── Eu te chamei várias vezes e você não... tá tudo bem? Parece pálida e... você tá machucada, o que aconteceu?
A morena respirou fundo, olhando para dentro de seu armário aberto e concordando levemente, pegando os livros da próxima aula com um sorriso fraco. ─── Eu tô bem... do que- do que você falava mesmo?
─── Uhm... sobre a Barb, você viu se ela já chegou?
A morena parou o que fazia como se tivesse saindo do transe e fitou a outra, erguendo a sobrancelha enquanto tentava mudar a direção de seus pensamentos. ─── Não, eu não vi ela, Nancy. ─── murmurou, adicionando um sorriso de lado. ─── Mas acredite, estamos tão curiosas pra saber como sua noite com-
─── Andy. ─── a Wheeler interrompeu, abaixando a voz e olhando ao redor. ─── Por favor, não vamos falar sobre isso aqui.
Voltando sua atenção para os livros novamente, Andrea fechou o armário, dando de ombros. ─── Por que não? Ele não bateu as expectativas? Sabe, eu sempre achei isso previsível pra alguém que se importa tanto com a aparência como ele-
─── Você pode parar?! Eu não tenho ouvir esse tipo de coisa sobre Steve e eu, ainda mais de você! ─── a mais nova respondeu com a voz baixa mas agressiva, fitando o rosto da Hopper com um mistura de decepção e confusão.
Desde quando Andy era daquele jeito?
─── Você não sabe onde ela tá, tudo bem, eu entendi. Mas também não precisa fazer comentários assim sobre eu e ele, não é minha culpa se não gosta de sexo como uma pessoa comum! ─── Nancy arregalou os olhos no segundo em que a sentença saiu de seus lábios, imediatamente arrependida. ─── Andy-
A Hopper apertou os lábios ao desviar o olhar, limpando brevemente a garganta. ─── Bom, eu espero que tenha valido a pena fazer Barb esperar por você ontem à noite. ─── sussurrou e se afastou, a interrompendo antes que ela pudesse dar qualquer desculpa.
─── Espera, o quê? ─── indagou confusa, segurando o pulso machucado dela. ─── Como assim "esperar por mim"?
Andrea fez uma careta com a ação, suspirando cansada. ─── Ela decidiu esperar, Nancy! Enquanto você estava lá em cima, com seu namorado, ela ficou na piscina mas pelo que parece, ela seguiu meu conselho e foi embora sozinha. ─── respondeu, inclinando a cabeça. ─── Agora, se me der licença, eu tenho aula de francês...
Ela se soltou do fraco aperto da outra, pressionando o livro de línguas contra o peito, evitando pensar em Nancy, Barb ou seu passado em Columbus. A dor em seu pulso parecia piorar com os segundos e ela considerou abandonar a aula para ir até a enfermaria. Ao menos teria uma desculpa para voltar mais cedo para casa e evitar as amigas pelo resto do dia.
─── Olá, Andy! ─── sua colega de classe, Robin, cumprimentou ao encontrar a morena na porta, fazendo-a abrir um pequeno sorriso e adentrar a sala, vendo que parte dos alunos já estavam lá. Ela nem lembrava do sinal tocar. ─── Você parece horrível, o que aconteceu?
Com um riso fraco, ela balançou a cabeça. ─── Oi, Buckley.
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ANDREA NÃO TINHA FÉ EM MUITAS COISAS, principalmente envolvendo religião ── uma das nuitas coisas que a diferenciava da mãe, que era uma católica obcecada ──, mas ela acreditava fortemente ter sido amaldiçoada ao nascer ── algo parecido com a história do anticristo, como Allison dizia; apenas isso poderia explicar todas as coisas ruins que aconteciam constantemente com as pessoas ao seu redor.
Bom, era isso ou havia algum tipo de mal em comum entre Hawkins e Columbus, o que ela achava ser quase impossível.
Tudo começou com o divórcio quando ela mal tinha completado um ano de idade ── um mísero ato de piedade, Andrea achava, porquê essa era a única razão que alguém em todo o mundo pensaria em se casar com uma mulher tão narcisista e de nariz empinado como Allison. Andrea e Jim compartilhavam algo mais do que apenas o sobrenome, afinal de contas ── uma raiva indescritível pela Montgomery, apesar de que com o Hopper, ela só se manifestava em específicos momentos.
Ficou pior com o nascimento de sua meia-irmã Sara, quando tinha seis anos ── não que ela chamasse isso de maldição, afinal, Sara era uma bebê incrível e a mãe dela era super carinhosa, mas ela não deixava de se perguntar sobre as consequências desse nascimento na sua vida. Naquela altura do campeonato, Hopper ainda era um pai presente... o máximo que conseguia após se mudar para Nova York ao lado de sua esposa gentil e a filha recém-nascida que ainda era jovem demais para ser chamada de estranha pelos colegas de classe por causa de seu aparelho dentário ou pelos desenhos que ela fazia.
Aquilo era algo totalmente fora do controle de Andrea, mas ela era inteligente para manusear aquela dor e focar na escola o máximo que conseguia; era complicado dividir seu tempo tendo que acompanhar as viagens de sua mãe para a cidade vizinha constantemente, o que mais tarde resultou nela repetindo mais um ano escolar. Além do mais, Andy tinha apenas sete anos, sua vida era controlada para girar em volta de Allison, o que poderia fazer?
Os amigos eram poucos na escola e as provocações eram demais, mas tudo virou um problema do passado quando, em 1975, Allison conheceu Gabriel, uma nova paixão que tinha um belo carro, boas condições e um filho mais velho chamado Walter, que acabou se dando bem com Andrea apesar dos quatro anos de diferença.
Novas amizades, nova personalidade, novo estilo; tudo isso se tornou parte de Andy com a mudança para Columbus depois do casamento de sua mãe e o anúncio da gravidez, o que levava a mente da adolescente para a sua outra parte da família. Depois da morte de Sara, Jim só se importava em atender as ligações da filha mais velha nos feriados de fim de ano ou em seu aniversário, o que resultou na onda de rebeldia que se seguiria pelos anos seguintes; tudo sendo uma desesperada tentativa de fazer com que pelo menos sua mãe desse o mínimo de atenção que ela queria.
As ameaças vazias de mandar Andrea de volta para a casa do pai, em Hawkins, eram ditas aos gritos pela mãe e padrasto toda vez que a garota se metia em discussões ou arranjava um problema, fosse na escola, em casa ou até mesmo na rua, mas Andy nunca achou que Allison teria coragem de engolir o orgulho ferido e ligar para Jim Hopper ir buscá-la, apesar de querer muito. Pelo menos não até o acidente na floresta.
Até a morte de Walter.
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O REFEITÓRIO FOI EVITADO POR ANDREA o máximo que pôde no intervalo. Ela sabia que Nancy e Barb estariam lá e ela não sabia o que fazer depois da discussão que teve com a Wheeler mais cedo.
Respirando fundo, ela atravessou as portas duplas e seguiu seu caminho para a fila, massageando o pulso que parecia doer mais à cada minuto. Passeando os olhos pelos estudantes espalhados pelo local, ela não conseguiu encontrar nenhuma das duas garotas, voltando sua atenção para as pessoas andando à sua frente.
"Não fique no caminho dos outros" era o que Allison diria se estivesse ali.
Tendo em mãos apenas o pudim e a caixa de suco de laranja ── que ela sempre trocava pelo pudim de Nancy por achar o resto da comida nojenta ── Andy passeou entre as mesas, insegura do que faria quando encontrasse a Wheeler. As duas nunca haviam tido uma discussão como aquela antes; sendo mais clara, as três garotas nunca haviam brigado por nada que fosse sério demais, então a situação era bastante vergonhosa pelo ponto de vista de Andrea.
Deveria fazer uma piada para aliviar os ânimos, dar um pedido de desculpas formal ou apenas entregar o suco amigavelmente?
Quase desistindo da procura e saindo do espaço fechado para comer do lado de fora com Robin, Andy avistou a Wheeler sentada ao lado de Steve e o outro casal, todos parecendo rir de algo que Carol havia dito.
A morena não conseguia ver o rosto da amiga claramente, mas pela maneira que o restante da mesa se comportava, ela apenas concluiu que Nancy não iria se importar muito com a sua ausência ── ou a de Barb, que aparentemente não estava lá também.
Dando um último olhar para a caixa de suco em sua mão, ela mordeu o lábio e deu meia-volta, sentindo um bolo na garganta se formar aos poucos; a adolescente seguiu para o campo em procura de um espaço vazio para comer seu pequeno lanche sozinha antes de retornar para o restante das aulas, esquecendo até mesmo do rascunho estranho que ela havia feito durante a aula de Francês.
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COM AS AULAS TERMINANDO ALGUNS minutos mais cedo por conta do jogo de basquete que teria naquele dia ── que ela não iria por simplesmente não dar a mínima para o time mas também por estar evitando Nancy, que com certeza estaria lá assistindo Steve ──, Andrea decidiu que era hora de ir buscar Chester e deixar o animal na casa de sua verdadeira dona, Joyce.
Não era a primeira opção da garota, já que tinha a possibilidade da Byers não ser a dona do cachorro, mas entre fazer uma viagem perdida até lá e ficar de castigo de novo em menos de duas semanas, ela preferia se arriscar até a residência dos Byers.
Ela pedalou para casa ── não tendo a mesma agilidade e velocidade de antes pelo tornozelo que ainda doía ── tendo a visão do animal descansando na sombra de uma árvore ao lado do trailer quando chegou no lago.
─── Ei, garotão. ─── chamou para o acordar, rindo quando ele começou a pular. ─── É hora de voltar pra casa. ─── ela se abaixou ao lado dele, soltando a corda.
Ele latiu enquanto tentava correr mas o aperto de Andrea na corda continha o cachorro por perto. Olhando entre o animal e a bicicleta parada ao lado do trailer, ela soltou um suspiro baixo ao pensar na bagunça que seria levar o animal dali até a casa de Joyce.
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TRÊS BATIDAS NA PORTA FOI tudo que levou para Joyce abrir ansiosa; ela deu um sorriso fraco ao ver que era apenas Andrea, estranhando ao ver a garota sozinha ali.
─── Ei, querida, o que você faz aqui?
Andy sorriu, apontando para o animal que corria atrás de algo em frente da casa, onde apenas a bicicleta de Andy e o carro de Joyce ocupavam espaço ali. ─── Eu encontrei ele ontem, meu pai disse que pode ser seu, então vim checar...
─── Eu nem notei que ele tinha sumido. ─── ela sussurrou, passou a mão pelo rosto em um gesto cansado. Ela deu espaço para a adolescente entrar antes de ir pegar o cachorro pela coleira e o levar para dentro da casa, fechando a porta. ─── Você quer alguma coisa? Uma água, suco...
─── Ahn... não, na verdade eu só vim aqui trazer ele, mas obrigada. ─── ela sorriu fraco, desviando o olhar e notando, pela primeira vez, as luzes de natal espalhadas pela casa. ─── O que é tudo isso?
Joyce olhou para a adolescente, vendo ao que ela se referia. ─── Eu... ─── ela deu de ombros, indo para a cozinha atrás de um cigarro. ─── Não é grande coisa. Além do mais, você também vai achar que eu enlouqueci.
Andrea desviou sua atenção das luzes e seguiu Joyce até o outro cômodo, retirando a jaqueta e pondo na cadeira. A Hopper tinha quase certeza de que, o que quer que Joyce fosse contar, seria apenas uma paranoia inofensiva causado pelo estresse do momento. Ela não tinha a mínima idéia de como era perder um filho ── o mais perto que havia chegado da morte de alguém próximo foi quando sua irmã morreu ── e se ouvi-la falar sobre Will fosse aliviar um pouco o peso que ela sentia, que mal faria?
Além do mais, ela gostava de Joyce, queria ajudar.
─── Eu acredito em tantas coisas absurdas que acharia que eu quem enlouqueci. Você pode confiar em mim, Joyce... eu não conheço Will muito bem mas conheço você e dói saber que uma criança como ele tá lá fora, perdido e com medo, procurando pela mãe.
A mulher mais velha a ouviu, desviando o olhar e tentando conter as lágrimas com a menção do garoto. Joyce não tinha fé alguma de que Andy iria acreditar no que havia visto no dia anterior mas, decidida, ela sentou em uma das cadeiras da mesa, batendo levemente no assento de outra para que a adolescente a acompanhasse, sem saber bem por onde começar.
─── Eu... ─── Andrea balançou levemente a cabeça, a incentivando continuar. ─── Eu acho que Will tá tentando de comunicar comigo... através das lâmpadas.
─── O Will... espera, como assim? ─── falou confusa, franzindo as sobrancelhas e apontando para as luzes espalhadas pela residência. ─── Essas lâmpadas?
─── Eu não- eu não consigo explicar, mas sei que ele quer falar comigo, Andy! ─── ela levantou, não conseguindo ficar sentada por muito tempo. ─── Primeiro foi o telefone e agora as luzes e aquela coisa na parede, eu... eu sei que não faz sentido, mas tem alguma coisa acontecendo aqui e...
A morena sentiu o coração apertar pela maneira que Joyce se encontrava. A adolescente se levantou, tocando no ombro dela e a fazendo parar de andar. Notando que ela tremia, algo que escaparia de seus olhos se não estivesse tão perto, Andy se perguntou há quanto tempo a Byers não dormia ou comia.
─── Isso tudo é um pouco confuso, mas eu acredito em você, Joyce, eu só preciso que você explique pra mim. ─── disse da maneira mais calma que pôde, apesar de não ter tanta confiança nas próprias palavras; costumava ser uma boa maneira de fazer seu irmão parar com a birra. ─── Eu já sei sobre o telefone, mas o que você quis dizer com... com a "coisa na parede"? O que isso significa?
─── Eu- eu fui até o quarto do Will e... ─── ela explicou enquanto gesticulava ansiosamente.
Andrea a fitava, mas parou de absorver suas palavras depois de alguns segundos. Ela sentiu um comichão subir por suas pernas, tendo um estranho impulso de olhar por cima do ombro. O cachorro latiu, fazendo as duas se assustarem e olharem para o animal ansioso, vendo que as luzes de natal dispostas no corredor estavam se acendendo, uma por uma, liderando o caminho até a sala.
Joyce apertou levemente o braço de Andy, que a olhou com uma pergunta silenciosa no rosto. A mais velha balançou a cabeça em concordância, largando o cigarro em cima da pia e seguindo o caminho feito pelas lâmpadas, com Andrea indo atrás um pouco hesitante.
A Byers afastou uma cômoda que estava no caminho e abriu um pequeno compartimento escondido na parede, suspirando desapontada quando o viu vazio. Pegando um dos conjuntos de luzes de natal que estavam ali perto, Andrea apenas observou a mulher adentrar o pequeno local, sem saber o que fazer em seguida enquanto ficava parada perto de umas das paredes, sem entender muito bem o que estava acontecendo.
Aquilo poderia ser apenas uma pequena coincidência. Nos últimos dias, a energia da cidade vinha tendo muitas falhas ── ela mesma havia presenciado aquilo na casa de Steve no dia anterior. Não era grande coisa, mas ela ainda não tinha coragem de dizer para Joyce deixar aquilo para lá, não em um momento tão vulnerável como aquele; se era aquilo que ela precisava para enfrentar a situação, Andy não impediria.
Além do mais, algo dentro da adolescente se contorcia para ver o que iria acontecer nos segundos seguintes ── como alguém que assiste um filme de terror e tenta se preparar para o susto, sem saber quando ou como ele virá.
─── Will... você está aqui?
Durou dois segundos. Dois longos segundos.
A sala ficou em silêncio, Andrea começando a concordar quando Joyce disse estar enlouquecendo ── certamente razoável para a ocasião. Mas então as luzes brilharam de uma maneira forte antes de se apagarem que tudo que ela pôde fazer era observar em completa descrença enquanto a Byers fazia perguntas e as luzes ── Will, onde quer que estivesse ── respondia de volta. A adolescente se agachou próxima da mesa de centro, observando aquela cena quieta e atenciosa, com medo de atrapalhar o momento; ela não fazia idéia do que aquilo significava, mas era algo grande demais para ser interrompido. Andy não sabia se aquilo era mesmo Will que estava se comunicando, mas ela estava achando extraordinário toda a situação.
─── Will? ─── Ela observou enquanto Joyce, que agora chorava, continuava chamando pelo garoto, mas ao ver que ele não respondia, levantou, olhando esperançosa para a Hopper e apontando para as luzes. ─── Andy, você, você viu isso, não viu?! Ele não tá morto, Andy, meu Will não tá morto!
A morena concordou levemente com um sorriso, respirando fundo enquanto dividia seu olhar entre a mais velha e parede atrás do sofá, tentando por os pensamentos em ordem. Uma idéia veio à mente e ela sussurrou hesitante, cruzando as mãos enquanto tentava soar de maneira coerente. ─── E se... e se fizermos uma maneira dele se comunicar com você, tipo, pra valer? Como um, como um quadro ou algo assim...
A mais velha largou o pisca-pisca no chão quando entendeu o raciocínio da garota e correu em direção à porta dos fundos, voltando segundos mais tarde com um pincel e lata na mão, que Andrea descobriu ser tinta preta; Joyce a usou para escrever as letras do alfabeto embaixo de cada lâmpada que estava presa na parede.
Ao sala fedia por causa da tinta quando Joyce pôs o Z na parede, mas o objetivo delas até o momento havia sido atingido. A Byers colocou a lata em cima da mesa de centro, fitando a parede em busca de algo; um sinal, uma luz, qualquer coisa que mostrasse que tudo aquilo não era coisa da cabeça dela.
─── Certo, querido, fale comigo. ─── ela pediu, se mexendo inquieta. ─── Fala comigo, onde você está?
Uma das lâmpadas acendeu bem em cima da letra E, fazendo Joyce se mexer ansiosa enquanto Andrea esperava pelas próximas letras, ainda não conseguindo acreditar que aquilo estava mesmo acontecendo.
─── S... T... O... U... A... Q... U... I... ─── Joyce sussurrou à medida que as lâmpadas acendiam. ─── "Estou aqui". "Estou aqui"? Eu... eu não sei o que isso significa. Eu preciso que me diga o que fazer, querido. Como eu chego até você? Como eu o encontro? O que eu faço?
Andy a fitou com tristeza pelo seu desespero, tentando pensar em alguma coisa que Will pudesse fazer para ajudar a encontrá-lo mas nada vinha em mente. Em vez disso, ela deu o seu melhor para evitar que Joyce entrasse em colapso ali mesmo, segurando sua mão enquanto fitava a parede, esperando pelas próximas palavras.
─── F... U...
Andrea franziu a sobrancelha com o formigamento no braço, engolindo em seco enquanto o ar parecia se extinguir devagar. Seu pulso aos poucos acelerou e ela sentiu uma onda de adrenalina se espalhar por cada centímetros de seu corpo, fazendo sua nuca arrepiar e sua respiração ficar presa na garganta enquanto um grande alerta em sua mente gritava 'perigo'.
─── J... A.. M...
─── Fujam... ─── sussurrou.
De repente, todas as luzes que estavam ligadas começaram a piscar rapidamente, fazendo as duas se fitarem em confusão enquanto tentava entender a mensagem mandada por Will. Um som de papel rasgando na parede atrás delas fizeram Andy e Joyce se virarem, vendo que alguma coisa ── alguém ── tentava sair dali.
Garras afiadas rasgaram o papel de parede e aos poucos, algo que Andrea não conseguia nomear saía da lá, em busca das duas. Seu corpo fino fazia a adolescente pensar imediatamente em um homem ── algo semelhante a um cadáver se perguntassem a ela, por conta da cor azulada, quase branca ── mas sua cabeça sem rosto lhe dizia que, o que quer que aquilo fosse, estava longe de um ser humano.
Ela estava petrificada em seu lugar, a criatura tendo a cabeça posta em sua direção enquanto seu corpo passava aos poucos pelo buraco feito na parede, como se, de alguma forma, a reconhecesse. Andrea voltou à realidade quando sentiu um puxão em seu braço, fazendo-a se desequilibrar por um momento antes de suas pernas começarem a se movimentar e ela correr ao lado de Joyce para fora da casa e longe da criatura, sendo atingidas pela noite fria.
A adolescente passou direto pela bicicleta, correndo pela estrada sem saber direito qual destino seguir, seu único ponto de direção sendo Joyce; nem mesmo a dor em seu tornozelo ou a falta de ar fez a Hopper parar de correr. Ela notou uma luz vindo das árvores na direção contrário, mas não sabia dizer se era um carro ou uma lanterna; inconscientemente, ela olhou para trás tentando ver se a criatura ainda seguia elas.
Tropeçando nos próprios pés e caindo no chão de terra, Andrea conseguia ouvir seus batimentos ecoando em seus ouvidos enquanto uma dor aguda subia por seu pulso machucado. O medo de ser pega era tão grande que ela não ligou para a dor que se espalhava por seu corpo e quase se arrastou pelo chão, atordoada, enquanto tentava levantar. Joyce, vendo que a garota havia parado de lhe acompanhar, voltou até ela, ajudando-a a se reerguer e continuarem até acharem ser seguro.
Ela correram por mais alguns metros, virando em uma curva na estrada e quase sendo atropeladas por um carro que vinha na direção contrária ── a luz das árvores, a adolescente pensou. Andy estava preparada para o ignorar e passar por ele, mas notando que o carro era de Jonathan e não de outro qualquer, ela parou. O rapaz saiu do veículo, sem entender o quê sua mãe e a filha do delegado estavam fazendo ali, tão assustadas que mau conseguiam pronunciar algo coerente. Enquanto isso, Andrea ── que tinha o coração batendo tão rápido que respirava com dificuldade ── se agachou ao lado do carro do Byers, seus olhos fixos no caminho que percorreu em busca da criatura.
A dor, o frio, nada mais importava ali. Joyce estava certa, afinal de contas. Tinha alguma coisa acontecendo ali.
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