11 - Bimbo
Ficar escutando as palhaçadas dia após dia de Brizza e Dimitri me torturava mais do que qualquer técnica de tortura medieval. A cada dia, eu o via se aproximar mais dela, caminhar com as próprias pernas e, aos poucos, se distanciar de mim. Ele havia feito amizade com um entregador chamado Brett, que era um garoto que aparentava ser legal e engraçado, então dei graças a Deus que ele não passava o tempo todo com Brizza. Eu realmente não sei o que tem nela que atraiu tanto a atenção de Dimitri. Talvez seja a sua aparência que, querendo ou não, lembrava Sondra, de certa forma, ou o fato dela ser engraçada e doce. Eu criei Dimitri e, pelo menos até o final de Algumas Cartas, eu saberia dizer tudo o que se passava em sua cabeça. Mas naquele momento, depois de quase totalmente integrado no novo mundo, eu não sabia absolutamente nada.
De qualquer forma, ele ainda demonstrava muitas vezes certa dependência de mim. Ele me perguntava diversas coisas a respeito de gírias, pessoas influentes da atualidade, o que era Twitter... eu simplesmente me sentia mal de deixá-lo na mão, então, elaborei um cronograma.
Segundas-Feiras: Estudos para o teste (22:00 às 23:30);
Quartas-feiras: Aulas de Informática e termos (22:30 à 00:00)
Sextas-Feiras: Atualidades (23:00 1:30)
Sábados: Estudos para o teste (14:00 às 18:00)
Parecia muito tempo, apesar da organização. Isso sem falar da hora em que eu saía da Pizzaria. O Sr. Lion não iria gostar muito, se ficasse sabendo. Mas era necessário, sem falar que era o único tempo que eu conseguia ficar sozinha com ele.
Primeiro começamos a estudar química, física, geografia e literatura. Nas aulas de informática, eu o ensinava a mexer no notebook, em seu smartphone e em algumas redes sociais.
"Eu quero esse tal de Facetook.", ele pediu.
"É Facebook, Di. E eu acho que você não vai conseguir se dar bem com isso logo de cara. Demorou anos pra eu conseguir meus 1500 amigos e 110 curtidas em minha foto de perfil.", joguei os cabelos para trás, com falsa modéstia.
Ele provavelmente queria um Facebook por causa de Brizza. Já havia visto ela perguntando para ele se poderia a adicionar. Por isso não cedi a ele esse luxo. Não naquela ocasião.
Ele ia bem nos estudos, mas ainda se travava em muita coisa. Não conseguia compreender o porquê da Guerra Fria, e confundia toda hora capitalismo com socialismo.
"Capitalismo você compra de acordo com o que você ganha, de acordo com o seu trabalho. Socialismo é o governo que te dá."
"Então o Sr. Lion é capitalista?"
"É... Mais ou menos. Mas você precisa entender que às vezes é muito mais complexo do esse conceito básico que eu estou te passando. Isso é o básico dos básicos."
De vez em quando, nas noites mais frias, ele fazia seus famosos chocolates-quentes, e ficávamos tomando em silêncio. Um dia desses, enquanto estávamos na fria cozinha cheia de farinha, onde estudávamos e tomávamos esses chocolates, o peguei me encarando do outro lado da mesa.
"Que foi"? Eu tô suja de chocolate?", limpei o lábio, procurando resquícios de sujeira.
Ele começou a gaguejar.
"Não é que... Bom... É que você...".
"Fala logo!"
Ele suspirou e prosseguiu com sua linha de pensamentos.
"É que eu vi em uma reportagem na TV colorida que bastam cinco minutos olhando alguém que você se afeiçoa, para você se apaixonar."
Engoli em seco.
"E aí..."
"Melhor eu tomar cuidado... Mais dois minutos, eu te peço em casamento."
E começou a rir, um pouco sem graça. Eu fiquei bem vermelha, mas logo rebati a brincadeira.
"Sabe o que dizem também? Que as pessoas falam a verdade e depois riem, só pra quebrar o impacto da verdade."
Ele riu mais uma vez e depois disse sério.
"Mas quem disse que eu quero quebrar o impacto da verdade?"
Essas coisas estavam começando a me irritar. Dimitri não era assim de fazer joguinhos com duas garotas. Ele não sabia, mas eu percebia que ele fazia os mesmos tipos de comentários com Brizza, e uma vez, até mesmo para Kat ele tentava lançar seu charme barato dos anos 40. Mas a Kat estava com os olhos em outra pessoa: Phellix. Depois do primeiro encontro deles, ela demorou uma semana para admitir que havia gostado.
"Ah... Foi legal. Ele me levou para uma sorveteria. No início eu pensava que seria um saco. Mas ele é tão gentil... E temos tanto em comum, e ele até que é gato...", ela me contava, em um certo sábado frio, enquanto estourávamos pipoca.
"Hum... Kat está apaixonada!"
"Para garota, foi só um encontro!", ela ralhou.
Mas depois daquele dia, ela saiu mais duas vezes com ele e toda a vez que voltava, estava radiante. Eu ficava muito feliz por ela, mas ao mesmo tempo triste por estar entrando na terrível saga do amor não correspondido.
E assim se passou um mês após Dimitri se tornar real.
ฯฯฯ ฯฯฯ ฯฯฯ
Duas semanas antes do teste de Dimitri, eu simplesmente explodi com ele. Depois de terminar de lavar os banheiros da Pizzaria vi ele, Brett e Brizza com algo: meu álbum de fotos. Nele tinha fotos bem vergonhosas como, eu pelada e deitada de barriga para baixo quando era bebê, ou chorando com os cabelos bagunçados, fugindo de um cachorro, com a cama molhada de xixi e até uma em que eu mordia o braço do Declan, depois dele quebrou minha boneca. Meus pais eram bem maldosos com fotos. Tudo aquilo se deveu a um fato simples: eu levei o álbum para a Universidade, para escolher algumas fotos para o telão da formatura, que, mesmo estando a um ano e meio de distância, já deveriam ser definidas algumas coisas. E, sem permissão nenhuma, Dimitri e seus amigos estavam olhando todas as fotos e, além disso, estavam rindo da minha cara. Eu odiava quando as pessoas mexiam nas minhas coisas. Ainda mais, quando elas eram tão importantes.
"Nossa Brendy, não sabia que você tinha o cabelo tão ruim assim", Brizza disse, rindo.
Tirei o álbum da mão dela com toda a violência tempestuosa de um furacão.
"Eu não me lembro de dar permissão pra vocês mexerem.", sibilei.
"Nossa amiga, calma a gente só tá brincando...".
"Também não me lembro de te dar liberdade pra isso, muito menos de ser sua amiga."
"Pega leve, Brendy... Eu que peguei.", Dimitri segurava minha mão.
"Pega leve? Não me lembro de você estar tão bom em gírias. Aliás não me lembro de muita coisa, acho que bati com cabeça."
Comecei a caminhar em direção a porta. Porém, antes de partir, me virei, e esbravejei para os três.
"Eu não quero mais que vocês mexam nas minhas coisas, muito menos façam piadas delas. Vocês não são meus amigos e não têm liberdade pra isso."
Então sai, com o rosto fervendo e os punhos tremendo. Eu me assemelhava a uma pimenta quando ficava com raiva.
"Nem eu sou?"
Quando olhei para trás, era Dimitri, com um pano de prato nas mãos, o uniforme engordurado e incrivelmente bonito. Ficar bonito de qualquer jeito também era um fato que eu odiava nele. A noite começava a surgir. Ele esboçava expressões de arrependimento.
"Eu não sei... O que anda acontecendo com você. Mas você não é assim, Strauss. Eu cansei disso."
"Como você sabe que eu não sou Brenda? Você age como se me conhecesse há anos. Você anda rude comigo nem olha na minha cara durante os estudos."
"Porque agora você tem seus novos amiguinhos. Por que não me disse nada disso lá dentro, ao invés de ficar tirando um sarro da minha cara? Você anda tirando muito ultimamente."
"Caramba tudo isso por causa de uma droga de álbum...", ele aumentou o tom.
E eu aumentei ainda mais.
"Essa droga de álbum é o meu passado. Sabe o que é um passado? Ah... me esqueci que você não tem um."
Ele se sobressaltou, com a boca aberta em espanto. Depois fechou a cara e desviou o olhar para a direita. Para os seus pés.
"Pensei que você fosse uma pessoa boa. Como eu me enganei...".
A raiva em mim não se tornou menor.
"Já que eu não sou boa, estude sozinho, se adapte sozinho, passe sozinho naquela droga de teste e trabalhe sozinho nessa porcaria de pizzaria.", joguei meu boné do uniforme em cima dele e dei as costas, indo em direção ao carro que estacionei na rua ao lado.
"Tudo certo pra mim. Adeus, Brenda!"
Cheguei inconsolada, contando para Kat o que houve, tentando conter as lagrimas. Sentada na cama bagunçada dela e recostada na cama, Kat me repreendeu, comendo batatinhas com cheddar.
"Eu acho que você está morrendo de ciúmes da Brizza. E a culpa dessa briga é toda sua."
"Ual Kat, obrigada pelas doces palavras de consolo!", disse, pegando uma de suas batatinhas.
"Veja bem, Brenda... Você tinha ele em suas mãos aqui, podia sei lá, ter demonstrado que tinha algum sentimento por ele, mas não, você expulsou ele daqui, jogou ele naquela pizzaria fim de carreira com a vaquinha da Brizza e agora quer que ele continue sendo o mesmo Dimitri inocente e solteiro de sempre. Ele é homem, Brenda. HOMEM!"
"Não justifica o fato de ele ficar dando em cima dela, de mim e de você, ao mesmo tempo Kat...".
No momento em que eu falei isso, Kat cuspiu todo o refrigerante que ela tomava, num jato que parecia como um de lava- rápido que, claro, veio todo na minha cara. Ela começou a tossir, após o engasgo e eu me levantei.
"KATRINNE, SUA PORCA!", gritei, indo para a cozinha para pegar um pano para me limpar.
Ela largou o pote te batatinhas e me seguiu, com os passos silenciosos de suas pantufas de ursinho.
"Espera, Brenda... Que história é essa que Dimitri estava dando em cima de mim?"
"Naqueles dias, quando ele disse que você estava um 'brotinho' sexy demais com aquele vestido preto, e que estava com saudades de dar uns beijos e se você poderia ajudar ele matar essa saudade..."., senti ardências no coração só de lembrar disso, enquanto me secava com o pano úmido da pia.
"O que? Mitchoff eu quero dar um soco na sua cara agora, então se afasta!"
"Por quê? O que eu fiz?"
"Dimitri falou tudo isso brincando, sua idiota!"
"Ah, é como você sabe?"
"Porque eu conheço ele. Nunca tivemos nada e ele sempre brincou comigo assim. Desde o início, Brenda e você sabe. Seu ciúme tá te cegando."
"Ah... Agora você conhece ele mais do que eu, que foi a pessoa que o inventou?"
"Se você o conhecesse tanto, saberia que ele jamais ficaria flertando com mais de uma garota."
Ela pausou, se aproximou de mim e continuou.
"Você sabe que a única pessoa que o Dimitri namorou foi a Sondra. Ele pode ser bem gato, mas não tem jeito nenhum com as garotas. Ele brinca com a gente assim porque somos amigas dele. Para e pensa, garota."
Me permiti refletir a respeito do que Kat acabara de falar, vislumbrando internamente todos os momentos em minha história que comprovavam suas palavras. Realmente ele não era assim. Minha amiga era mais inteligente do que eu, com toda a certeza.
"Mas, e a Brizza?"
Ela suspirou.
"Com ela, obviamente ele está tentando algo mais."
"Oh não..."
"E aí Brenda... Vai fazer alguma coisa? Ou vai deixar a garota da pizza roubar seu garoto?"
"Ok... Eu vou falar com ele. Mas não hoje e nem amanhã. Vou dar um tempo."
Kat bateu com tudo o copo que estava sobre a mesa, claramente irritada.
"Caramba Brenda, não escutou nada do que eu falei? Para de ser orgulhosa, garota!"
"Não é orgulho! Posso terminar de falar?"
Ela assentiu.
"Estou postergando uma tarefa que eu deveria ter feito há um mês."
"E o que seria?"
Olhei para o livro sinistro, que já estava escorado em nossa estante a tanto tempo, que não sei como não mofou, ou como ainda não foi cobrado pela bibliotecária.
"Era pra eu ter devolvido há uma semana e não investiguei nada. Vou aproveitar essa semana que não vou ajudar Dimitri, para investigar. Não dá pra simplesmente fingir que este livro não está envolvido nessa confusão... Chegou a hora."
ฯฯฯ ฯฯฯ ฯฯฯ
No dia seguinte, após as aulas, comecei minha busca por respostas. Das cinco pessoas do cartão, por sorte (ou por azar), eu conhecia quatro: Lila Storm, Lynn Kount, Mandy Stamos e, obviamente, Kevin Pyro. Antonie eu não fazia ideia de quem era e seria complicadíssimo acha-lo. Então comecei com Lila Storm.
Lila era uma garota simpática, de cabelos loiros e curtos, e um pouco mais nova que eu. Estava no segundo ano de literatura e seu dormitório era a poucos metros do meu. Falei com ela poucas vezes, mas a sensação que eu tinha era que ela era aquele tipo de pessoa agradável que se faz amizade rápido.
Bati em sua porta, torcendo para que ela já tivesse voltado das aulas. Segundos depois, ela abriu a porta, sorridente.
"Lila?"
"Oi Brendy!"
"Posso entrar?"
Ela estranhou. Por qual motivo alguém que quase não fala com ela pediria para entrar?
"Ahn... Claro!"
Tentei jogar uma conversa fora antes de ir direto ao assunto. Seu dormitório era todo decorado por cortinas e colchas alaranjadas, como se ela e sua colega fossem obcecadas por tons de outono. Mas, ela me dissera que sua antiga colega havia trancado a matricula do curso e agora ela estava sozinha. Acho que o quarto outonal era de total responsabilidade dela.
Disse a ela que estava estudando sobre aquele livro e que muitas pessoas afirmavam que ele era estranho e fenômenos sobrenaturais literários aconteciam às pessoas que liam ele. Quando perguntei ela ficou pálida.
"Bom... Já que você mencionou... Na época que peguei esse livro, eu o queria para fazer um relatório sobre livros míticos para a aula de literatura histórica e medieval. Na mesma época, eu estava lendo um livro chamado De estação em estação, que contava a história de uma garota que foi aprisionada por uma bruxa em um quarto magico, que mudava a decoração de acordo com as estações do ano. Quando eu li a frase Conspectus Rerum, que quer dizer Cenário da Realidade, meu quarto ficou assim."
Comecei a encará-lo. Agora tudo fazia sentido e era assustador.
"No verão, ele era quente em tons de amarelo e tinha decoração de praia. Na primavera, tinha muitas flores e toda noite as abelhas me picavam. Agora está assim. Estou com medo de nevar no meu dormitório nos próximos meses."
Aquilo realmente me espantara. Mas já era uma dica e tanto. Me despedi dela, desejando sorte com a possível nevasca e prometendo mais investigações. Prometendo que iria ajudá-la, apesar de saber que tal promessa não seria possível de ser cumprida, enquanto Dimitri estivesse ali. Então, fui atrás de Lynn Kount.
Lynn trabalhava em uma lanchonete no Shopping onde compramos o celular de Dimitri. Ela era morena, de olhos e cabelos castanhos, com rosto de criança. Ela era da minha sala e com toda a certeza, ela era bem maluquinha.
"Brendy! Veio comer um lanche? Vou fazer um caprichado!", disse, assim que me viu, aproximando-me da bancada.
"Pode fazer Lynn! Mas na verdade... não vim só pelo lanche."
Esperei ela encerrar o expediente por meia hora, até se juntar a mim. Sentadas em uma das mesas da praça de alimentação, perguntei a mesma coisa que perguntei para Lila e, por sorte, ela também tinha informações bem interessantes.
"Eu estava fazendo uma resenha para a aula de cinema sobre aquele filme Os Pássaros e também peguei esse livro para outro trabalho. Eu morri de medo daquele filme, mas isso não foi o pior. A maior parte do livro é escrita em inglês e tem algumas imagens. Mas tem aquelas frases em Latim. Quando eu li Metu Vivere (viva o medo), fui acordada... por... um monte de pássaros querendo me matar. Tiveram que ligar para o controle de animais, mas eu saí toda ferida. Foi a pior coisa que me aconteceu."
Me lembrei do caso dos pássaros e do controle de animais, mas não sabia que foi no dormitório de Lynn e muito menos que fora culpa do livro. Medo se apossou de meus órgãos.
No dia seguinte, fui até Mandy Stamos. Usei como justificativa o nosso trabalho, mas assim que eu mostrei o livro para ela, ela me expulsou do quarto. Disse que não queria ver aquele livro nunca mais e que nunca mais eu perguntasse sobre isso. Aquilo foi desconcertante. Mas, ao mesmo tempo, fiquei muito curiosa para saber a história que Mandy Stamos tinha com aquele livro. Jamais saberia.
E, por último, fui até a pessoa que eu evitava há séculos: Kevin Pyro.
Os garotos da Beta me disseram que ele estava na academia, malhando. "Típico", pensei. Quando cheguei, ele estava em um daqueles aparelhos de treinar bíceps, com bermudas escuras e camiseta de exercícios regata branca. Admito que foi difícil me concentrar. Ele não era "bombado", mas também não era magríssimo. Era magro com músculos, o que sempre foi de minha preferência.
Por um instante esqueci que ele era Kevin Pyro, o garoto que eu detestava.
"Kevin?"
Ele se levantou do aparelho e pareceu espantado ao ver que era eu.
"Brenda! Meu Deus é uma miragem.", colocou as mãos em cima dos olhos, como quem cobre o Sol.
Dei uma risadinha totalmente desprovida de graça.
"Engraçadinho. Podemos conversar?"
"Pra você, eu tenho todo o tempo do mundo. E hoje... eu não estou de TPM então, não vou bancar 'A histérica'", ele brinca, lembrando da última coisa que falei para ele na Poison, o que me deixou levemente ruborizada.
Mas só por um breve instante.
Saímos da academia e fomos até um dos banquinhos do parque do Campus. Peguei o livro da bolsa e fui direto ao assunto, evitando os mesmos rodeios que tive que traçar com as garotas.
"Conhece isso?"
Seus olhos brilharam como se milhares de pensamentos se misturassem em sua mente no momento.
"O Imaginare? O que... você faz com ele?"
"Eu... estou fazendo um estudo sobre ele. E... Espera o nome dele é Imaginare?"
"Tá fazendo um estudo, mas não sabe o nome?"
"Isso é detalhe. Mas, e aí... você conhece?"
Ele suspirou, relaxando a postura no banco.
"E como... Esse livro foi a coisa mais estranha que aconteceu na minha vida."
"Pode me falar mais sobre isto?"
Ele colocou as mãos na cabeça, nervoso.
"Olha se eu te falar você tem que prometer que não vai contar pra ninguém. Se o Ty e os outros caras ficarem sabendo, vão me zoar para sempre"
"Ok. Não conto."
"Ah... Tudo bem. No meu primeiro ano aqui na Universidade, eu comecei com a intenção de cursar literatura, não Direito."
"Serio? E por que desistiu?"
"Ah... o velho conto americano de 'seguir os passos do pai'. Enfim... quando comecei aqui, na época que eu era aspirante Beta, escrevia um livro infantil. Mas, por favor, não zombe de mim!"
"Não vou, é sério. Me conta logo."
"Ok... O nome do livro era Bimbo - um cãozinho diferente. Bimbo era um cachorrinho que, aparentemente era comum, mas toda a vez que sua dona, Mary Cabery, dormia, ele a levava para lugares impossíveis, que ela pensava incialmente que eram apenas sonhos, mas realmente Bimbo tinha esse poder."
"Nossa..."
"Idiota né?"
"Não... Isso... é lindo!"
Não menti. Achei maravilhosa a ideia de Kevin. Repleta de inocência e beleza. Não parecia vir do brutamonte Pyro que eu achava que conhecia.
"E o que houve?", perguntei após um silêncio efêmero.
"Estava atrás de inspirações. Fui na biblioteca e encontrei esse livro. Quando li as palavras... Vita quae non est, no dia seguinte tinha um cachorrinho pequeno. Seu pelo era de uma cor clara e, com seu rostinho, ele estava olhando, assim que acordei. Era Bimbo!"
"Como... Pode ter tanta certeza que era ele? Isso parece loucura."
"Eu sei Brenda, mas não é. Toda a noite eu sonhava que estava em um local doido, como um planeta de chocolate, ou a dimensão das criaturas felpudas de olhos grandes e, no dia seguinte tinham indícios de que eu fui pra lá mesmo, como minha roupa cheia de pelos azuis, ou o próprio Bimbo sujo de chocolate. Fora o próprio comportamento dele. Como quando eu dava cereais pra ele comer, ele dava cinco pulinhos como no livro, ou como ele tinha medo de gatos... Como um cachorro qualquer podia ter tanto a ver com o Bimbo?"
"E o que houve com ele?", questionei, curiosa.
O olhar de Kevin se perdeu no chão de paralelepípedos.
"Em um dos trotes de iniciação da Beta, os garotos pegaram roupas nossas, documentos, cadernos, tudo... E colocaram fogo neles de madrugada, no jardim da casa Beta. Entre minhas coisas estavam os manuscritos de Bimbo. Quando fui procurar ele no quarto... Ele... no lugar onde ele dormia, tinham cinzas, e se você as olhasse de perto, veria que elas, na verdade eram letras mortas. Bimbo morreu."
O choque que senti com a história de Kevin foi difícil de controlar. Ele percebeu isso. As palavras não se formavam em minha boca.
"Brenda, me fale a verdade. Qual o real motivo de você estar perguntando sobre esse livro?"
Fiquei em silêncio por um tempo. Tentando simular em minha mente o que aconteceria se eu lhe contasse a verdade. O mais estranho é que Kevin Pyro emanava confiança. Logo ele, que nunca foi confiável.
"Você... Promete que não vai contar pra ninguém... Nem pra ele?", juntei as mãos, como quem ora.
"Ele quem?"
"Lembra do primo da Kat? Dylan Samberg?"
A forma tão veloz com que ele fechou a quase me deu vontade de rir. Quase.
"O que tem ele? "
"Então... O nome dele na verdade é Dimitri Strauss e ele..."
"Ele... Não! Por isso... Ele é seu..."
"Sim. Ele é como o Bimbo. Ele é meu personagem, Kevin."
Capítulo Revisado e Corrigido📝📌
Beijinhos da Carol❤
Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top