Capítulo 42
Segundo o sorriso mais bonito, é o que esconde os segredos mais profundos. Os olhos mais lindos, foram os que mais derramaram lágrimas. O coração mais gentil, é o que mais sentiu dor. Essa frase sempre me trouxe recordações boas e, ao mesmo tempo melancólicas, e nesse misto de emoções sempre me vi embriagada nelas, por causa dessa descrição estou refletindo esse pensamento atual.
A vida às vezes parece um jogo, onde aquele que é mais esperto vence a partida, e o retardatário fica para trás. Porém, posso não ser a mais esperta nessa história toda, ainda me vejo como uma tremenda idiota, embora, qualquer um seria enganado por uma artimanha dessas, não é? Não tenho certeza, pois, quando o assunto é dinheiro até o santo briga por uma casquinha.
Não posso viver no passado, não sou museu, tenho que aprender a me desprender das coisas corrosivas, com excesso de radiação, que só vão gerar câncer nas entranhas do ser humano.
Desliguei o telefone e olhei para Ryan, chegou a hora da jogada final.
— Me deseje boa sorte. — Pedi colocando minha cabeça em seu ombro.
— Você não precisa de sorte, apenas seja mais esperta do que ele. Tenho certeza de que tudo ocorrerá bem, o seu irmão não quer te matar. — Me acalentou em seu colo como um bebê.
— Sei disso, mas tenho a plena ciência que ele será completamente capaz de fazer tudo para me deixar perfeita, então, isso significa que posso perder o juízo. — Continuei sendo mimada por ele.
— Apenas seja você mesma. — Encerrou a conversa com essa frase.
Agora é só esperar até amanhã, espero que esse dia não se torne o famoso primeiro de abril, pois, quero dar um basta em toda essa mentira.
Me despedi de Ryan e voltei para casa, minha cama no momento é a minha melhor acomodação.
Como não podia ser diferente, após algumas horas, ouvi o celular tocar.
— Quando vai voltar para casa? Por que ainda não voltou? Por qual motivo não fomos os primeiros a saber? Onde está? Posso mandar o nosso motorista te buscar? Queremos notícias. — Fui bombardeada por perguntas, ao que tudo indica, Alexandre se encontra muito animado, e o seu lado super ativo entrou em ação.
— Calma, uma pergunta de cada vez. Primeiro, seu pai e eu ainda não conversamos, por isso tudo tem um tempo determinado. — Minha sensatez entrou em ação.
— Você que não quis voltar. — Ouvi Ryan gritar do outro lado da linha.
Cachorro! Por que colocar lenha na fogueira?
— Provavelmente amanhã pela tarde, estou aí para uma visita — falei para acalmar a confusão no outro lado da linha.
— Você sabe que se colocar os pés nessa casa nunca mais sairá, né? — Tomas comentou com sua voz altiva como sempre.
— Até parece. — Fiz muxoxo.
— Tiana está ansiosa para te rever, ela até já separou as histórias que a senhora vai ler a noite. — Anthony comentou.
Dei um pequeno sorriso e imaginei a cena, a pequena apressada catando livros de princesas, principalmente a história da princesa e o sapo que é a sua favorita, nem vou comentar o porquê!
— Então, até amanhã. — Desliguei o celular, antes que a conversa se estendesse por mais tempo, afinal, amanhã será um longo dia.
Andei pelo quarto e fui de encontro a janela para olhar a plena lua, que se encontra resplandecendo sobre o céu estrelado.
A vida é incrível, tem horas que prega peças infalíveis, ou joga conosco para nos moldar, mas uma coisa é certa, a sua tacada é certeira. E mamãe teve a ciência disso em todo o seu plano, mesmo me magoando com ele.
Ainda contemplando o céu, pensei na minha família. Tive a sorte de não ter necessidades na vida, como muitas pessoas, nunca recebi um não, talvez tenha sido isso a minha queda.
Em uma determinada idade fui adotada, mimada, instruída com os melhores professores nas melhores escolas, sempre fui o centro das atenções, até mesmo por ter sido a única filha mulher. Mas o dinheiro não pôde me educar, porém, tive o destino como o melhor professor, e uma mãe como a melhor vilã, infelizmente.
Na mesma linha de pensamento, tenho a lembrança da sua simpática feição, mãe... doce mãe. Até hoje não entendo o porquê você quis fazer isso comigo, e acho que continuarei sem entender.
Teve uma hora que a dor esteve tão marcante, que me trouxe a lembrança o dia do seu funeral, algo que tento esquecer, mas se torna impossível, para o meu desprazer.
Enquanto encaro o seu rosto, sinto uma dor no coração, me vem à lembrança da sua música mais cantada.
"Lembre-se de mim, hoje eu tenho que partir. Lembre-se de mim, se esforce para sorrir. Lembre-se de mim, eu prometo nunca te esquecer".
Te amo mãe, jamais vou ousar te esquecer.
Mesmo que agora queime tanto, que me faça gritar, ou até mesmo bancar a louca, não me deixe!
— Mãe, por você foi embora? Preciso tanto da senhora, você prometeu que se lembraria para sempre de mim, quem morre não tem lembranças, por que a senhora fez isso comigo? Por que não me levou consigo? Olhe seu rosto, está cheio de cortes, você não vivia sem maquiagem, por que morreu dessa forma? — Disse com os olhos banhados pelas lágrimas. — Pai... O rosto dela está feio. O senhor não vê que ela não está sendo ela mesma...? A quero de volta... isso não pode terminar assim!!! — Gritei em completo desespero, porém, fui arrastada pelo meu pai em completa agonia.
Mesmo depois de dias a dor teimava em sair do meu peito, com o passar do tempo, comecei a reprimir a saudade, o afeto, e tudo que me lembrava dela. Esse foi meu sinal para demonstrar que eu estaria em completo luto, permanentemente.
Minha família, meu noivo e amigos, fizeram de tudo para me ajudar, mas nada adiantou.
Então, será que ela sabia que eu ficaria assim? Por isso escreveu essa carta? Acho que essa resposta nunca terei.
As horas passaram, finalmente outro dia chegou, e com ele a tão esperada conversa. No momento estou na portaria do hotel, esperando Miguel liberar minha entrada, para conversarmos.
Enquanto os minutos passam, fico mais ansiosa, é como se o tic tac do relógio formasse uma pressão no meu peito.
— Olá, Bela. — Deu um de seus sorrisos tortos, o qual me recordo bem.
Encarei os seus olhos mel, transbordando em divertimento, semelhante à época em que éramos crianças.
Entrei no pequeno quarto do hotel, algo muito simples para uma pessoa que esbanja riqueza por onde passa.
Miguel é um grande advogado, algo com muita honra para a nossa família, e motivo de desavença quando não quis que ele se intrometesse nos meus processos judiciais. Contudo, para não haver mais brigas, decidi aceitar a sua proposta em me indicar um advogado de sua total confiança. Me arrependo até hoje, grande banana de advogado.
— A beleza ainda é o seu sobrenome. — Me analisou minuciosamente, com sua costumeira mão no queixo, só para me irritar.
— E a chacota ainda continua sendo o seu fiel escudeiro — respondi no mesmo tom.
— Não seja dura comigo irmã. — Sentou-se em uma das poltronas.
— Irmã? Como você ousa me chamar de irmã depois de tudo que aconteceu? Cara de pau, mentiroso, desgraçado. Por que fez isso? Você quase me matou — falei gesticulando, exagerando só um pouquinho nas palavras.
— Não seja tão dramática, apenas fiz o que mamãe pediu. Olhe para você... — Apontou o dedo na minha direção. — Teve sucesso, conseguiu andar com suas próprias pernas, então, pare de draminha e me agradeça, sei que sou um ótimo irmão. — Cruzou as pernas, como se estivesse satisfeito com as suas palavras.
— Me ajudou? Draminha? Caia na real Miguel, pouco tempo atrás estava destruída, você não tem ideia do quanto fiquei humilhada. Posso estar bonitinha por fora, mas só Deus sabe quanto tempo fui um lixo por dentro. Não sei onde a mãe estava com a cabeça para inventar isso. E como você pôde envolver Clara nisso? — Passei a mão no rosto em completa frustração.
— Foi a melhor escolha, não fazia parte do meu feitio ver minha irmã morrer aos poucos como ser humano. Quando vi as consequências deixadas por todas as suas más escolhas, fiquei transtornado, me senti derrotado. Mamãe me fez prometer que cuidaria de você. Afinal de contas, sou o filho mais velho, precisava assumir essa posição, estava cansado de ser o filho irresponsável, sem juízo algum, precisava tomar a rédea da minha vida. Então, comecei com a sua reconstrução, e aos poucos fui encaixando cada peça no lugar. A irmã de Clara não morreu à toa, nem por acaso. Esse foi o meu jeito de te ajudar, sei que não foi o melhor, mas foi o meu. E funcionou, aceitando você ou não — falou cada palavra sem demonstrar nenhuma emoção na voz. — Mas para falar a verdade não sei o motivo da mãe ter feito isso, no entanto, não tem importância. Sendo que ela me deu uma ótima oportunidade de passar o tempo, você sabe como as questões jurídicas são chatas, já estava ficando entediado. Mas graça a você irmã meus dias têm sido bem promissores, e realmente fico feliz com a sua mudança, é o sinal de que o meu trabalho foi bem feito. — Uma quase sorriso escapou de seus lábios.
Ouvi cada frase dele em silêncio, apenas digerindo tudo que foi pronunciado.
Olhei para os seus olhos e respondi com sinceridade.
— As pessoas são diferentes, você não precisa entendê-las, precisa apenas respeitá-las. — Suspirei.
— Não vejo diferença em destruir pessoas ao seu redor, por puro capricho — respondeu diretamente, jogando na mesa o meu passado.
— Não seja tolo, você fez o mesmo comigo. Algo que tanto julgou, terminou cometendo o mesmo erro. — O encarei com exatidão.
— Não matei ninguém. — Mostrou um semblante de arrependimento assim que pronunciou essas palavras.
Senti o meu coração arder, ao ouvir a bendita frase. Foi como se apunhalasse dez facadas no meu peito.
— Não foi de propósito, você sabe disso — falei pesadamente como se estivesse prestes a ter um colapso.
Apertei as mãos em punhos, e mordi os lábios para impedir qualquer choro.
— Me perdoe, quero começar do zero. — Tentou se aproximar.
— Não... não!!! — Coloquei as duas mãos no rosto me afastando dele.
— Bela... — Deu um passo.
— Agora quem vai arcar com as consequências serão vocês. — Saí o deixando sozinho com o semblante pálido.
Andei o mais rápido que podia, para enfim me livrar daquele martilho.
Não vou gritar com ele, discutir e nem bater. Miguel me viu fazer isso a vida inteira, cansei de fazer sempre as mesmas coisas quando estou enraivada. Mesmo que muitos reclamem, na minha opinião, o melhor castigo é o silêncio, cansei de me estressar, e nada adiantar. Preciso dar um basta e dirigir a minha trajetória, não quero herança, império, nada. Estou feliz com o que tenho, hoje verdadeiramente posso dizer, agradeço a Deus por tudo.
Não vale a pena, preciso seguir o meu próprio caminho, sem pegar atalho de ninguém.
Olhei para dentro de mim, e me senti completamente satisfeita com a minha decisão.
Não guardo mágoa de você Miguel, mas não quero contato. Quem sabe um dia voltemos a conviver, e espero verdadeiramente que Clara também possa viver sem sua irmã, não vale a pena viver no passado e deixar o presente cheio de feridas que só infectam outras pessoas.
Crianças...
Olhei o céu azul e decidi dar um novo rumo a minha vida.
Limpei o rosto e tirei todo resquício de lágrima, sei que não poderei esquecer tudo de uma hora para outra, mas vai valer a pena um novo começo.
Cheguei em casa, arrumei as coisas e dei partida para uma nova jornada. Eu e minha família voltaremos para Corno semana que vem, é o tempo necessário para acertar a minha vida com Ryan.
Enquanto estou na viagem, vou relembrando toda a minha vivência até chegar aqui, olho para o céu muitas vezes, e têm horas que me perco em meus próprios pensamentos.
De uma coisa Miguel tem razão, às vezes a perda nos faz mudar mais do que gostaríamos. Nunca me vi como eu sou hoje, mesmo assim, estou longe de ser a mocinha perfeita, mas essa não é uma história normal, é a minha vida, e ela não precisa ser perfeita, basta ser apenas minha.
Enquanto estou descarregando as malas em frente da bela mansão, sinto braços pequenos envolverem minha cintura com dificuldade.
— Mamãe. — Tiana sorriu quando me virei para ela.
— Oh! Minha linda, como está crescida, uma verdadeira mocinha. — Disse a pegando no colo.
— Estou fleliz por você estar aqui pra o meu aniversari de seis aninhos — Mostrou os seis dedinhos.
Os seus cabelos ainda continuam loiros, mesmo aparentando que futuramente tomará uma coloração mel, combinando perfeitamente com os traços e estilo da mãe. No momento a sua altura não ultrapassa a minha cintura, algo que Ryan revelou é que Tiana está fazendo alguns tratamentos na fala e crescimento, tendo em vista a condição do seu nascimento isso trouxe sequela na criança.
— Sabia que ela seria a primeira a cumprimentá-la. — Tomas disse atraindo minha atenção para ele.
No momento Tomas deve estar prestes a fazer 12 anos, com isso vem a pré-adolescência, propiciando os hormônios a flor da pele. Em poucos anos ele estará do meu tamanho, já que sou baixinha, pois tenho 1 metro e 66 centímetros.
— Você também quer abraço bebê. — Tentei abraçá-lo.
— Saia. — Se esquivou do meu aconchego, quase me fazendo derrubar Tiana.
— Também senti saudade. — Confessei.
— Ahm... eu também. — Confessou baixinho como o sussurro, mesmo assim consegui escutá-lo.
— Esqueceu de nós. — Os gêmeos chegaram quase me derrubando quando se penduraram na minha perna.
Agora, eles no momento têm 10 anos, já que o aniversário foi mês retrasado. E como era de se esperar, estão cada vez mais diferentes um do outro, Alexandre tem um estilo mais despojado e Anthony tem um estilo mais certinho, ou seja, nerd.
— Jamais. — Coloquei Tiana no chão para abraçá-los.
— É a primeira vez que você nos abraça sem ser em um momento triste — confessou Anthony.
Sorri com seu comentário, mesmo havendo um pouco de melancolia em seu semblante.
— O que aconteceu? — Alexandre perguntou curioso.
— É só hoje, aproveitem. — Dei um sorriso de lado, para pirraçar.
— A senhola veio pla ficar mamãe? — Tiana perguntou com o rostinho tão meigo, que quase me deu vontade de apertar, mas não fiz, sou forte!
— Se vocês quiserem. — Sorri para eles, colocando a menina no chão.
— Você ainda pergunta. — Uma voz sonorosa entoou.
Olhei para cima, encarando aqueles olhos, ahhhhh!
— Isso só depende de você. — Prendi o riso para manter postura.
— Você sabe que nunca mais sairá, né? — Chegou bem perto de mim, esquecendo que temos crianças.
— Você sabe, que não poderá ter mais filhos. — Tentei sair do flerte.
— Não precisa cortar o clima assim, contudo, acho que estou satisfeito. Até lá podemos treinar, quem sabe um milagre acontece. — Me deu um selinho na frente das crianças.
Pena, foi tão rápido que nem deu para sentir o sabor dos seus lábios nos meus.
— Idiota. — Dei um tapa em seu braço.
— Ai! Você só me machuca — falou massageando o braço direito.
— Porque você me beijou na frente dos seus filhos. — Franzi a sobrancelha em indignação.
— Até parece que nunca vimos beijos, e esse foi bem murchinho, podia ser um mais quente. — Tomas pronunciou entre pequenos risos.
— O quê? — perguntei abismada — Onde você aprendeu isso seu fedelho? — Correu de mim. — Volte aqui, seu moleque. — Corri atrás dele, enquanto Ryan vinha com os gêmeos e Tiana rindo em gargalhadas.
Sei que a vida não é um conto de fadas, mas prefiro muito mais esse. Gosto da minha família como é, mesmo precisando de ajustes.
Agora tenho uma nova, e meu Ryan... Como ele está mudado, claro que está longe de ser... um príncipe encantado, mas algum encanto ele tem, eu posso ver. Está mais para o amigo encrenqueiro do príncipe, mas isso acho que podemos mudar.... — Sorrir ainda em delírios fazendo uma menção honrosa a Bela e a Fera.
Não sei vocês, mas o meu coração bate a cada dia mais por ele, meu príncipe desencantado.
Enfim, suspirei em pensamentos. Enquanto estou jogada no sofá depois da corrida, feliz por realmente estar vivendo com eles, afinal de contas, a gente tem que sempre lembrar...
Há vilões e mocinhos, tudo depende do seu ponto de vista.
Espero que tenham gostado, até o epílogo do próximo capítulo. ❤❤
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