CHAPTER II
Nem Percy, muito menos Darya, esperavam dar de cara com o outro naquela amanhã. Ele não se lembrava de nada da sua vida e queria apenas sobreviver aos ataques frequentes de monstros; ela esperava que Netuno atendesse suas súplicas, mas nunca imaginou encontrar um irmão perdido como resposta.
Darya ainda estava bastante surpresa com a chegada de outro filho de Netuno, principalmente por ele aparentemente ter a sua idade (talvez um pouco mais velho) e ter sobrevivido fora do acampamento.
Percy não possuía lembranças da sua família, mas ter uma irmã bem a sua frente lhe dava muitas esperanças e trazia um grande conforto. Após meses sem ter ideia do que fazer, para onde ir ou quem ele era, totalmente sozinho, enfim ele encontrara uma luz. Mesmo sem conhecê-la, já se sentia próximo dela e feliz por tê-la por perto.
— Quem é Jason?
Foi a primeira coisa que Percy perguntou logo que os outros jovens de armadura começaram a retornar para o acampamento.
— Meu amigo. Ele está desaparecido — Darya respondeu. — A maioria já perdeu as esperanças de encontrá-lo, mas eu não. Se Juno disse que você pode me ajudar a encontrar ele, então ainda há esperança. Por hora… Vamos cumprir as ordens de Reyna.
— Darya… Você pode me dar uma ajudinha aqui? — A voz de Frank se fez presente.
Percy e Darya voltaram-se para ele, que ainda estava encharcado pelo mergulho no rio, assim como Hazel, que continuava ao seu lado.
Alguns fios do cabelo curto de Frank estavam grudados na testa. Ele cruzava os braços sobre o peito, a aljava e o arco caídos no chão aos seus pés. Os pequenos olhos escuros ainda expressavam choque e surpresa, transitando entre Percy e Darya sem parar.
Hazel não estava muito diferente, talvez um pouco menos encharcada. Os olhos dourados também não paravam de oscilar entre os filhos de Netuno.
Darya apenas sorriu fraco e tocou os ombros de ambos, concentrada. As roupas e os cabelos rapidamente ficaram secos, como se nunca tivessem entrado no rio.
— Prontinho! — disse e voltou-se novamente para Percy. — Bom, uma vantagem de ganhar um irmão é que agora não serei a única secadora humana do acampamento.
— Eu… Ainda não acredito que tenho mesmo uma irmã. — Percy riu baixo, com um pequeno sorriso.
— Netuno não tem tido filhos com mortais com frequência nos últimos anos. — Darya deu de ombros.
De repente, tão rápido que ela mal teve tempo de reagir, Percy abraçou a irmã. Ela piscou e permaneceu paralisada por alguns instantes, sem saber o que fazer. Apenas afagou as costas dele e deu leves tapinhas, completamente sem jeito.
Não estava acostumada a ser abraçada daquela forma por outras pessoas além de sua família.
— Também estou feliz de ter um irmão — ela disse, sem jeito e desconfortável, afastando Percy. Hazel e Frank apenas observavam a cena em silêncio, sem saber como reagir.
Percy percebeu o desconforto dela e encolheu os ombros, com o rosto levemente vermelho, um tanto envergonhado. Afastou-se mais dela e exibiu um fraco sorriso de desculpas.
— Me desculpe por isso tão de repente — disse. — É só que… Eu estou há tanto tempo por aí sem conseguir me lembrar de nada, nem uma única informação sobre minha família… — Suspirou pesado. — Fiquei realmente feliz de saber que minha irmã estava por perto, mesmo que eu sinta que talvez não te conheça tanto.
— Nós realmente não nos conhecemos nem um pouco. Nunca te vi antes de hoje — ela disse. — Somos irmãos apenas pelo lado divino.
— Bom… Ainda assim somos irmãos, de qualquer forma. — Ele tentou ser otimista. — Acho que ainda vale muito. Realmente nunca me viu antes?
Darya negou com a cabeça. Percy murchou, levando as mãos aos cabelos loiros e tornando a suspirar. Uma pequena parte de sua esperança havia se esvaído, mas não totalmente. Juno garantiu que sua irmã o ajudaria a recuperar sua vida, que precisavam um do outro. Ele precisava acreditar que era verdade.
Eles ainda poderiam se ajudar. É o que irmãos fazem, mesmo que tenham vindo de mães diferentes.
— Você realmente não se lembra de nada?
— Nada antes de dois meses atrás, quando encontrei Lupa.
— Isso é realmente intrigante. Mas vamos dar um jeito nisso, aí você me ajuda a encontrar meu amigo — ela falou. — Vamos indo logo para a Principia.
Os quatro seguiram pela entrada, com vários olhos sobre si. Percy observou tudo impressionado, ao mesmo tempo que com uma sensação familiar. Vários jovens de armadura transitavam pela via. Passaram por um arsenal, um quartel. Tudo isso parecia familiar.
O mais impressionante eram os fantasmas.
Espíritos arroxeados vagavam para todo lado quase como almas vivas. Poliam armas no arsenal, conversavam entre si, um de cor vermelha berrante no estábulo cuidava de um unicórnio. Percy não conseguiu impedir a expressão de surpresa e admiração ao ver o cavalo com um único chifre no meio da testa. Ele tinha certeza que nunca vira um unicórnio antes e pensava que fosse apenas um… Bom, um mito.
Considerando que ele era um semideus, talvez devesse acreditar menos que mitos são… Mitos.
Todos os fantasmas olhavam para Percy, parando tudo o que fazia. Ele pôde ouvir bem alguns falarem "graecus".
— Se eu não estou maluco, acho que estou vendo gente morta — comentou. Nenhum dos outros campistas pareciam dar atenção aos fantasmas.
Darya riu.
— São Lares. Deuses da Casa.
— Também existem os de apartamento ou estão todos na mesma categoria?
— São espíritos ancestrais — Hazel explicou e olhou para ele com seus olhos dourados como ouro polido.
— São tipo mascotes do acampamento que ajudam os campistas de vez em quando — complementou Frank. — Eles costumam ser inofensivos.
— Costumam?
— Alguns deles realmente são fantasmas da Antiga Roma. Você não vai querer encarar um cara do exército de Júlio César em um dia ruim — Darya disse. — Nessas horas é sempre bom ter Hazel ou o irmão dela por perto.
— Estão todos olhando pra mim. Ainda bem que Hazel está aqui então.
— Eles não vão fazer nada com você — Hazel garantiu.
— Estão me chamando de graeggus. É algum xingamento fantasma? Perdi a memória, mas ainda me lembro de uns muito bons para rebater.
— Graecus — Darya disse. — Significa grego. Logo você deve começar a entender melhor o latim. Os semideuses possuem um talento natural para isso.
Percy franziu o cenho, sentindo uma leve pontada na cabeça. Ele tinha sim talento natural para um idioma antigo, mas tinha a impressão de que não era latim, mesmo que já tenha estudado.
Ele estudou latim? Achava que sim… Parecia uma lembrança importante, ao mesmo tempo que assustadora.
— Ser chamado disso é ruim?
— Depende — Frank coçou a nuca. — Romanos e gregos possuem uma rivalidade ancestral. Às vezes romanos usam graecus como um insulto…
— Isso me parece ruim.
— Também é uma forma de se referir a alguém estranho, um inimigo — Darya explicou. — Um estrangeiro invadindo suas terras.
— Roma que invadiu a Grécia. Os gregos que deveriam usar romano como forma de insultar estrangeiros.
— Se contarmos todos os povos que invadiram a Grécia, eles teriam um grande leque de nomes para estrangeiros.
— Mas os inimigos gregos já não existem mais. Apenas Roma sobreviveu com o passar do tempo. Só restam, bom… Os mortais nascidos na Grécia atual. Você não nasceu na Grécia, nasceu? — Frank perguntou.
— Não… Acho que não. Não lembro onde nasci…
Tinha quase certeza de que não nasceu na Grécia, mas também não se lembrava de onde realmente vinha.
— Você nasceu aqui? — perguntou a irmã.
— Nasci, mas toda a minha família mortal é da Inglaterra.
— Existem muitos semideuses de outros países?
— Os deuses costumam se relacionar mais com as pessoas do lugar onde estão residindo, de fato. Mas eles ainda têm em outros lugares do mundo. Inglaterra, Itália, Porto Rico, México… Onde algum mortal lhe chamar a atenção, eles vão deixar um semideus para trás que pode ou não encontrar o acampamento.
— E se não encontrar?
— Aí vai depender de muitos fatores. A maioria não conseguiria sobreviver sem nenhum treinamento. Você ter sobrevivido tanto sem ter chegado aqui é um feito do qual deve se orgulhar.
Percy tinha muito orgulho de ainda estar vivo, com certeza.
Eles pararam no meio de um interseção que unia duas ruas. Para um lado, uma placa nomeava uma rua como Via Praetoria. Outra rua se chamava Via Principalis.
Haviam outras placas pintadas a mão que indicavam direções e lugares:
BERKELEY A 8 QUILÔMETROS
NOVA ROMA A 1,6 QUILÔMETRO
ROMA ANTIGA A 11.648 QUILÔMETROS
MUNDO INFERIOR A 3.696 QUILÔMETROS
(apontando diretamente para baixo)
RENO A 332 QUILÔMETROS
MORTE CERTA: VOCÊ ESTÁ AQUI!
Parecia um belo lugar para uma morte certa. Os prédios majestosos pareciam ter sido projetados por um arquiteto bastante extravagante e fissurado em arquitetura e engenharia antiga que não poupava exageros. Os quartéis tinham varandas, jovens campistas descansavam em redes e jogavam cartas. Os dormitórios tinham uma coleção de diferentes algarismos.
Annabeth gostaria daqui, Percy pensou.
O pensamento fez o coração de Percy dar um salto. Annabeth. Annabeth gostava disso. Monumentos e arquiteturas chamativas. Lembrar desse fato deixou-o feliz, ao mesmo tempo que triste por não ter ela ali consigo.
— Isso com certeza é obra da Lavínia — Hazel suspirou.
— Apesar de sabermos sobre seu grande senso de humor, ela não está errada. Eu não tiraria a placa — Darya disse.
— Eu prefiro deixar a morte certa para outro dia — Percy falou.
Na Via Praetoria, eles pararam em frente ao prédio mais impressionante daquela rua. Uma enorme construção de mármore branco com colunas majestosas. Acima da porta, uma enorme faixa roxa exibia bordada uma coroa de louros com as inscrições SPQR por dentro.
Guardas romanos estavam parados à porta, assim como Reyna.
— Belo quartel-general.
— Bem vindo a Principia — ela disse, os olhos frios encarando Percy. — Todos de volta às suas funções. Teremos atualizações esta noite após o jantar.
A menção do jantar quase fez o estômago de Percy roncar. Ele nem se lembrava da última vez que comeu alguma coisa.
— Darya, você vem conosco. Zhang, para o arsenal. Levesque, avise Octavian que em breve receberá um novato.
— Mas eu também estava lá! Eu…
— Arsenal, Zhang. Chamarei caso precise. Lembre-se de que ainda está em probatio e já tivemos problemas demais essa semana.
Frank suspirou e encolheu os ombros, atendendo as ordens. Mesmo relutante, Hazel também seguiu o ordenado.
Principia parecia ainda mais impressionante por dentro. As paredes de veludo lhe davam um ar sofisticado e luxuoso. O chão era de mármore polido, e mosaicos brilhavam no teto ilustrando Rômulo e Remo com sua mãe loba, Lupa. A loba contou essa história a Percy muitas vezes.
No centro havia uma enorme mesa de madeira com vários pergaminhos, tablets, notebooks, adagas e um pote de jujubas. Dois cães de metal estavam parados de cada lado dela, um prateado e outro dourado, ambos com belos olhos de rubi.
Reyna sentou-se numa das cadeiras de encosto alto atrás da mesa. Havia outra ao seu lado, vazia. Percy e Darya ficaram de pé perante ela.
Os cães rosnaram quando o garoto fez menção de dizer algo.
— Meninos, quietos — Reyna ordenou. Os cães silenciaram, mas continuaram encarando Percy. — Não irão atacá-lo, a menos que tente pegar algo ou eu mande. São Aurum e Argentum.
— Ouro e Prata — Percy disse. Os significados surgiram em sua mente sem esforço.
Reyna deixou sua adaga sobre a mesa. Percy analisou-a. Ele sabia que a conhecia de algum lugar.
— Eu te conheço, tenho certeza. Mas… Não consigo me lembrar.
— Isso não é importante agora — Reyna disse firme. — Do que se lembra? Não minta, meus cachorros irão saber.
Aurum e Argentum rosnaram. Percy decidiu não contrariá-los.
Ele contou toda a sua história desde o início. Desde o início do que se lembrava, é claro. Acordar na Casa do Lobo e o treinamento com Lupa. A loba o ensinou tudo o que precisava para sobreviver. Sobre os monstros, os deuses e semideuses. Como semideuses como ele mantinham a memória da Antiga Roma viva. Quando enfim seu treinamento pareceu suficiente, mandou-o para o Sul.
— Você realmente não possui nenhuma memória?
— Nenhuma. Não além de meu nome e coisas muito vagas, nada significativo que diga quem eu sou ou de onde eu vim.
Não mencionou Annabeth. Não se sentia confiante para falar dela, não ainda. Não para a pessoa que parecia querer matá-lo a qualquer instante. Não arriscaria.
— Tudo o que contou é normal para semideuses nascidos fora daqui. De um jeito ou de outro, em algum momento, podemos encontrar Lupa e seremos treinados e testados para entrar para a legião. Nunca recebemos alguém sem memória. Como encontrou o acampamento?
Novamente, ele contou tudo com detalhes. Todos os últimos três dias escapando das górgonas e outros monstros e quando encontrou Juno e conheceu Darya, Hazel e Frank. Sua irmã fez o trabalho de contar toda a luta contra Euríale e Esteno, descrevendo-o como corajoso e elogiando sua performance no rio.
Percy não achava que havia feito grande coisa. Apenas carregou uma velha hippie que se transformou em deusa e ajudou a irmã que corria perigo nas costas de uma górgona.
— Você é um pouco velho para um recruta. Tem dezesseis anos? Dezessete?
— Dezesseis. Eu acho… Acho que tenho dezesseis.
— Darya está prestes a completar dezesseis anos, e ela é uma legionária há bastante tempo. Já enfrentou muitos monstros em situações bastante complicadas que quase custaram sua vida. Tanto tempo sozinho e sem treinamento, deveria estar morto. Um filho de Netuno possui uma aura muito forte para atrair monstros.
— Eu fui avisado disso.
— Deve ter ficado em algum lugar antes da Casa do Lobo. Onde?
Percy deu de ombros. Ele realmente não se lembrava.
— Aurum e Argentum te deixaram inteiro, então está falando a verdade.
— Na próxima, acho que um polígrafo seria mais seguro. Gosto de cachorros, mas não quando sei que podem me matar.
Darya exibiu um pequeno sorriso, contendo uma risada.
Percy novamente sentiu uma sensação familiar e uma pontada na cabeça. Ele realmente gostava de cachorros e tinha certeza de que já enfrentou alguns bastante perigosos.
Ele tinha um cachorro?
Reyna ficou de pé.
— Ainda que aceite que não seja um inimigo, você não é um recruta comum. A própria Rainha do Olimpo o trouxe até nós. Ela não costuma aparecer e anunciar novos semideuses. E um filho de Netuno… Não é um bom sinal, especialmente agora… Sem ofensa, Darya.
— Ah, já estou acostumada com isso — Darya disse dando de ombros.
— O que tem de errado com Netuno? Por que especialmente agora?
— Você lutou contra as irmãs de Medusa, que não têm sido vistas há milhares de anos. Agitou nossos Lares. Veste esses símbolos… A camisa e o colar. O que querem dizer?
Percy olhou para sua camiseta laranja. Algum dia, já deve ter tido algo escrito, agora estava suja e gasta demais para se compreender algo. O colar possuía quatro contas de argila com símbolos diferentes: um tridente — claramente significava o símbolo de seu pai, Netuno —, um velocino de ouro, um labirinto e a última um edifício com vários nomes que não reconhecia inscritos em volta. As contas pareciam importantes.
Não sabia o porquê. Apenas sentia.
— Não sei o que significam.
— Sua espada?
Percy pegou a caneta em seu bolso. Havia voltado para lá como de costume. Ao tirar a tampa e ter a espada em sua mão, ele percebeu.
Ele não havia mencionado sua espada para Reyna. Nunca havia mostrado para alguém. Como sabia sobre ela?
Darya ofegou ao ver a espada. Observou-a com extrema atenção, desde o cabo de couro até a lâmina afiada que brilhava em bronze. Sua mente viajou para muito antes dali, reconhecendo o objeto.
— Isso não é Ouro Imperial — Darya declarou, analisando a espada. — Eu… Eu já vi essa espada antes.
— Viu? — Reyna encarou-a com interesse.
— Não pessoalmente… Em um sonho.
— Quando?
— Já faz um tempo. Foi há uns dois ou três anos. Eu estava em uma missão com Jason do outro lado da baía quando Saturno estava se reerguendo… Não achamos que fosse importante — explicou, com os olhos fixos na espada. — Anaklumus... Correnteza…
— Contracorrente — Percy disse, sem perceber.
— De quê é feita?
— Bronze celestial — Reyna respondeu. — É tão mortal para monstros quanto ouro imperial. Essa espada é de um modelo antigo… Grego.
— Ela é grega. Da Grécia… Grécia Antiga. Antes de Roma.
— Viu isso no seu sonho?
— Talvez… Eu tenho muitos sonhos. Não tenho certeza.
— O que é ouro imperial? — Percy perguntou.
Darya pegou uma flecha dourada de sua aljava e Reyna desembainhou sua adaga. Com certeza eram feitas de ouro.
— O metal foi consagrado nos tempos antigos, no Panteão de Roma durante o Império. Sua existência era rigorosamente guardada em segredo. A maior parte de nossas armas é feita de ouro imperial, como minha adaga e as flechas de Darya — Reyna explicou. — Sua arma não é romana, de todo modo. Mais um sinal de que você não é um semideus qualquer. Seu braço…
— O que têm?
Reyna mostrou o seu próprio. Havia uma tatuagem no antebraço: as letras SPQR, duas espadas cruzadas e uma tocha e quatro linhas logo abaixo, como um código de barras.
Percy olhou para Darya. Ela mostrou sua própria tatuagem, também as letras SPQR, mas com um tridente. Abaixo, em vez de quatro como Reyna, haviam onze linhas.
— É a marca da legião, todos os membros possuem — disse Darya. — Você não tem, então nunca foi um membro da legião. E estou aqui há tempo o bastante para ter certeza de que nunca chegou nem perto do acampamento. Se sobreviveu tanto tempo sozinho… Você já viu alguém com essa marca antes? Talvez com uma águia…
— Darya, Percy já tem muito com o que se preocupar.
— Juno me disse que ele me ajudaria a encontrar Jason. Ele pode tê-lo visto ou ter alguma informação que apenas não entende.
— Eu nunca vi ninguém como vocês antes. Há quanto tempo esse Jason sumiu? Ele era importante?
Darya cruzou os braços, comprimindo os lábios e desviando o olhar para o mosaico no teto com pesar. Claro que Jason era importante!
— Jason é… Era meu colega. — Reyna apontou para a cadeira vazia. — A legião normalmente tem dois pretores eleitos. Jason Grace, filho de Júpiter, era nosso outro Pretor. Ele desapareceu em outubro.
— Grace… — Percy murmurou. — Eu conheço alguém com esse sobrenome…
Os olhos de Darya rapidamente tornaram a focar no irmão, esperançosos. A chama da esperança acendeu em seu peito, uma pequena chance de encontrar Jason realmente existia. Depois de meses, ela enfim tinha uma pista.
— Conhece?
— Acho que sim. Não estou conseguindo me lembrar… — Percy fez um esforço. Ele sentiu um arrepio na espinha, como se levasse um choque.
Um choque… Droga! Era terrível sentir que a resposta estava ali, mas não lembrar. Ele conhecia um Grace. Conhecia!
Por que ele não conseguia se lembrar de nada?
— Eu realmente não consigo me lembrar, sinto muito…
— Mas você conhece. Existe uma chance… Nós vamos te ajudar a se lembrar!
— Outubro… Então vocês não o vêem há oito meses?
— Mas ainda não desisti. Passe oito meses ou oito anos, eu não vou desistir de encontrá-lo. — Darya olhou para Reyna com certa frieza.
Reyna suspirou. Percy teve a impressão de que já houve uma discussão quanto àquele assunto.
— As eleições só acontecem de duas maneiras — Reyna disse. — Ou a legião coloca alguém como um Pretor depois de uma grande batalha ou temos uma votação na noite de 24 de junho, no Festival da Fortuna, que será na próxima semana. Não tivemos nenhuma grande batalha.
— Festival da Fortuna… As górgonas e Juno falaram sobre isso! O acampamento será atacado nesse dia por um exército de uma deusa chamada Gaia, eu acho, e algo sobre a Morte ser libertada.
— Peço que não espalhe isso para a legião, por enquanto. Não quero causar mais pânico.
— Então vai acontecer. Precisamos parar isso!
— Já conversamos o suficiente. Instale-se no acampamento e futuramente veremos o que mais pode ser feito — Reyna concluiu. — Darya, leve-o ao Octavian e apresente tudo da legião.
— Eu ainda tenho muitas perguntas.
— Talvez Darya possa respondê-las. Nossa audiência está encerrada. Boa sorte com o agouro.
Reyna voltou a se sentar em sua cadeira, e os cães de metal rosnaram para Percy. Darya segurou o braço do irmão e o puxou para fora de Principia sem dizer mais nada.
— Primeiramente, quem é Octavian e por que preciso vê-lo?
— Agoureiro do acampamento. Ele lê os agouros, basicamente o destino e supostamente a vontade dos deuses.
— Supostamente?
— Eu não o chamaria de fonte profética confiável.
— Okay… — disse um pouco incerto. — Segundo… Eu posso adiantar o jantar? Estou faminto! Nem sei quando foi a última vez que comi alguma coisa.
A expressão dura no rosto de Darya suavizou e ela riu, enfim soltando o braço de Percy. Eles seguiram até um café ainda na Via Praetoria, onde um barista de duas cabeças atendia aos clientes.
— Gosta de bolinhos de mirtilo?
— São azuis?
— Azuis? — Darya franziu o cenho.
— Gosto de bolinhos azuis.
— Não são azuis, mas são deliciosos — garantiu. — Bom dia, Bombilo! Quatro bolinhos de mirtilo, um café e um cappuccino.
O barista atendeu ao pedido. Darya pagou com moedas de prata, as quais disse logo a Percy serem denários, a moeda que eles usavam. Os dois saíram do café devorando os bolinhos, dois para cada um.
Os bolinhos eram realmente deliciosos, e o café estava ótimo.
Em um prédio do qual saía fumaça por uma chaminé, Percy viu jovens em roupas de banho com toalhas na cabeça e nos ombros. Era possível ouvir o som de risadas e água ecoando de dentro.
— Essa é a Casa de Banho. Você pode vir depois do jantar.
— Estou mesmo precisando de um banho — constatou Percy. Ele faria qualquer coisa por um banho quente e uma daquelas redes agora.
— Garanto que não existe nada melhor que um bom banho romano — disse Darya e sorriu largo. — Já perdi a conta de quantas vezes não senti o tempo passar e Jason teve que ir me buscar.
Percy riu, mas viu o sorriso da irmã murchar após alguns instantes enquanto seus olhos perdiam o foco antes de balançar a cabeça e continuar a seguir em frente.
Enquanto se aproximavam do portão, os quartéis ficavam maiores e mais bonitos com símbolos diferentes sobre os prédios.
— Vocês são divididos em chalés diferentes?
— Não exatamente chalés — Darya disse, e eles desviaram de fantasmas no meio do caminho. — Somos cinco Coortes de em média quarenta a cinquenta cada uma. Esse número pode variar dependendo de quantos chegam e quantos saem, mas essa é a média geral. E cada Coorte é dividida em quartéis de mais ou menos dez pessoas, que dividem o dormitório no alojamento.
— Eu não sou bem em matemática. Isso daria em média…
— Pouco mais de duzentos legionários, eu acho.
— Os deuses têm estado bastante ocupados.
— Nem todos são semideuses. Alguns são filhos de deuses maiores, outros menores, mas muitos daqui são legados. Seus pais, avós ou bisavós talvez tenham sido semideuses.
Percy paralisou no lugar, piscando desconcertado.
— Filhos de semideuses?
— É. Por que está tão surpreso? Nós também podemos ter filhos!
Percy voltou a andar, pensativo. Não parecia certo um semideus viver o suficiente para chegar a fase adulta e formar uma família. Ele gostaria muito de formar uma algum dia, mas não sabia se viveria o bastante.
— Lutamos para sobreviver todos os dias. Me parece quase impossível sobreviver tempo o suficiente para ter filhos.
— Realmente, não é fácil. Mas o treinamento no Acampamento Júpiter é justamente para sobrevivermos o bastante para termos uma vida e nossas próprias famílias. E a cidade é bem protegida para todos terem a vida mais longa e próspera possível.
— Os legados também têm poderes como semideuses?
— Depende. Alguns sim, outros não. De todo jeito, todos podem ser treinados. Octavian, por exemplo, é um legado de Apolo, o que para a minha infelicidade nos torna parentes ainda mais próximos, e supostamente ele tem o dom da profecia.
— Supostamente...
— Como eu disse, não o chamaria de fonte profética confiável. — Ela deu de ombros. — E não é incomum alguns semideuses também serem legados. Eu sou um, por exemplo.
— Você é um legado? Tipo… Sua mãe ou algum de seus avós era um semideus?
— Meu pai.
Percy franziu o cenho confuso.
— Netuno?
— Meu pai mortal. Ele é um semideus, filho de Apolo. Então, eu sou uma semideusa de Netuno e um legado de Apolo. Sol e mar… Uma bela combinação tropical.
— Você foi tipo… Adotada?
Darya respirou fundo e bebeu um longo gole de seu cappuccino após dar uma última mordida em um bolinho. Já estava cansada de responder isso para novatos.
Era sempre a mesma surpresa, as mesmas perguntas inconvenientes que testavam seu autocontrole.
— Não, ele é meu pai biológico, assim como Netuno. Semideuses podem nascer de relacionamentos homoafetivos também. E, pelo amor dos deuses, não me pergunte como eu nasci.
— Era minha próxima pergunta.
— Nós somos semideuses. Nosso mundo é confuso por si só para os ideais mortais atualmente, mas eu ser fruto de um romance de um semideus homem cis gay com o deus dos mares com certeza não é o mais estranho. Nosso querido irmão deus do amor correspondido nasceu exatamente assim… Só que o outro pai dele era um tritão.
— Bom, isso é verdade — Percy concordou.
— Não me surpreende Netuno se interessar por meu pai, ele é realmente incrível. Meu pai se envolver com um deus mesmo após anos na vida de semideus... Até hoje me pergunto o que ele viu em Netuno.
— Um surfista bonitão?
Darya se engasgou com sua bebida ao gargalhar. Ela riu como não o fazia há muito tempo, contagiando Percy.
— Nunca vi nosso pai pessoalmente, mas ele com certeza não se parece com um surfista.
— Espere!
Um fantasma correu na direção deles, e Darya choramingou. Ele chegou até eles tropeçando na própria toga.
— Recruta para a Quinta Coorte?
— Vitellius, temos que ver o Octavian.
Vitellius fez uma careta ao analisar Percy de cima a baixo.
— Só precisamos do melhor para a Quinta, esse aí parece que devia aprender com você a passar mais tempo na Casa de Banho.
— É difícil arranjar tempo para um banho enquanto se é atacado diariamente por górgonas e outros monstros — Percy rebateu.
— Percy, este é Vitellius, um dos Lares. Ele adora recrutas.
— Nos dias de César... Júlio César, lembre-se, a Quinta Coorte tinha alguma coisa! Décima Segunda Legião Fulminata, orgulho de Roma! Mas nesses dias? A vergonha veio a nós. Uma filha de Netuno que usa um arco e flecha, uma cria do Mundo Inferior que usa uma espata… UMA ESPATA! O mais perto do orgulho romano foi ter o filho do Senhor do Olimpo entre nós, mas agora ele está…
— Diga que o Jason está morto, e eu vou chamar o Nico.
Vitellius arregalou os olhos, aterrorizado com a ideia.
— Que tal ir ver Frank no arsenal?
— Deixaram um probatio arsenal? Por Júpiter!
O fantasma correu tropeçando na toga para longe deles. Darya suspirou aliviada e voltou a guiar o irmão pela via até os portões.
— Vitellius é um dos Lares mais antigos e bastante excêntrico. Inconveniente, mas com o tempo você se acostuma.
— Quem é Nico?
— O irmão da Hazel. Ele consegue lidar muito bem com fantasmas.
— E o que significa Fulminata? Ele e Reyna chamaram a legião assim.
— Armada do Relâmpago, lema da legião. Nós participamos do Império Romano e fomos uma das únicas a sobreviver após sua queda. Nos protegemos sob ordens de Júpiter no subterrâneo para manter o legado de Roma vivo recrutando e treinando semideuses.
— Você é da Quinta Coorte?
— Sou — respondeu Darya enquanto atravessavam os portões. — Meu pai era da Quarta, mas digamos que a Coorte não ficou muito feliz com a ideia de me receber e acabei ficando na Quinta.
— Por quê?
— Netuno não está entre os mais populares, assim como a Quinta Coorte.
— Acho que as chances de eu ficar na sua Coorte são altas então. — Percy sorriu fraco.
— Talvez. — Ela retribuiu o sorriso dele.
Percy ficava feliz com a ideia. Mesmo que a Quinta Coorte talvez não fosse muito bem vista, ao menos estaria perto de Darya e poderia conhecer melhor sua irmã.
— Seu pai está no acampamento? O pai mortal.
— Ele já se aposentou. Agora ele vive em Nova Roma.
Darya indicou o vale abaixo e viu o brilho surgir nos olhos de Percy. Para o norte, a rua levava a cidade, uma versão menor da Antiga Roma. Ainda que longe, era possível ver pessoas reunidas pelas ruas e praças.
— Foi nessa cidade que você nasceu?
— Sim… Tecnicamente. Meu pai ainda estava terminando o serviço na legião quando nasci. E antes que pergunte, ele já tinha vinte e um anos.
Eles continuaram a caminhar enquanto Darya explicava.
— Quando se é aceito na legião, você precisa prestar serviço por no mínimo dez anos. Ao fim desse tempo, pode decidir se quer ir embora para o mundo mortal ou residir em Nova Roma — disse. — O vale é um santuário protegido. Tem uma escola e uma universidade. Você pode crescer, casar, ter filhos, aposentar… Ter a sua vida como quiser. Esse é o lugar mais seguro para semideuses.
— Todos na cidade são descendentes de deuses?
— Em algum grau, sim. Todos são.
Parecia até utópico para Percy. Um lugar onde semideuses poderiam realmente ter uma vida tranquila e segura, sem precisar se preocupar.
— Nossas fronteiras são mágicas e a legião está sempre pronta para casos de ataque que cheguem à cidade. Então, estamos todos seguros.
— Posso conhecer a cidade depois? — perguntou Percy, ansioso.
— Claro! Eu te mostro tudo. Mas primeiro, precisamos ver logo aquele imbecil e nos livrarmos dessa parte. Quanto mais rápido falarmos com ele, mais rápido nos livramos dele.
— Você não gosta muito desse Octavian, não é?
— Não. E é totalmente recíproco. Ele está louco para ocupar o posto de Pretor.
— As pessoas teriam que votar nele.
— Ele consegue ser bastante manipulador e persuasivo quando quer.
Ele rumaram para o sul, onde se encontravam todos os enormes templos, santuários e altares para os deuses. Seguiram por um caminho de pedras a medida que se aproximavam, e Darya nomeava alguns dos templos.
— Aquele é o templo de Belona, mãe de Reyna.
— Aqueles crânios humanos são de verdade? — Percy perguntou apontando para outro templo, uma cripta vermelha com estacas de ferro e ossos.
— Eu não gostaria de saber a resposta. É o templo de Marte.
— Marte… Ares, deus da guerra?
— Sim. Ares é o nome grego. Segundo deus mais importante de Roma.
— Imagino que Netuno não esteja no Top 5 mais importantes, está?
— Não… Mas ainda o respeitam muito. Os romanos não gostam muito do mar, sempre sentiram medo.
— Então eles têm medo de nós dois?
— Talvez. — Darya sorriu de lado, satisfeita com a ideia. — Com certeza ninguém quer estar na mira das minhas flechas ou minhas facas.
Eles se aproximaram do maior templo de todos. Uma grande construção com colunas brancas e nuvens se amontoando logo acima, como se uma tempestade se aproximasse. Hazel estava parada na entrada os esperando.
— Esse é o de Zeus… Júpiter. É a cara dele.
— Acertou. Octavian lê os agouros ali. Templo de Júpiter, Optimus Maximus.
— Maior e melhor… Tenho a impressão de que Júpiter gosta muito de amaciar seu ego.
— Eu não diria isso bem aos pés do templo dele — Hazel falou.
— Mas não acho que seja mentira. É o Rei dos deuses, afinal.
— Onde está o templo do nosso pai?
Darya apontou para um templo menor. Era azul — Percy gostou muito disso — e possuía um grande tridente acima da entrada.
— Se não fosse por mim, estaria cheio de teias de aranha e poeira.
— Ninguém mais cuida do templo?
— Como eu disse, papai não está entre os deuses mais queridos. Vamos em frente.
Eles adentraram o majestoso templo de Júpiter, Hazel também junto a eles. O teto de ouro brilhava assim como o chão de mármore branco sob seus pés. Tudo ali era realmente optimus e maximus.
No centro havia um grande altar, onde um garoto estava ajoelhado murmurando baixo palavras incompreensíveis. Uma alta estátua logo a frente exibia o grande Rei do Olimpo segurando um raio.
— O raio não é assim.
— Eu sei — Darya disse. — Tive um sonho com ele uma vez. Ninguém acreditou em mim.
— Eu já vi o raio-mestre.
— Do que vocês estão falando? — Hazel indagou confusa.
Percy franziu o cenho. Não sabia de onde veio tudo o que disse.
— Não sei… Nada demais.
— Acho que suas memórias perdidas escondem muitas aventuras, maninho — Darya comentou. — Ou muitos sonhos malucos.
O garoto no altar ergueu os braços e uma luz vermelha iluminou o céu, trovões ecoando por todo o templo, e então as nuvens se desfizeram.
— Acho que o dom dele não é apenas suposição — Percy sussurrou para a irmã.
— Se visse meu pai na época em que era o Agoureiro, saberia do que estou falando — disse ela. — Já acabou o show, Octavian? Estamos com um pouco de pressa.
O garoto levantou-se de repente e voltou-se para eles. Ele era alto e magro, os cabelos loiros mais claros que os de Percy. A toga branca caía por seu corpo como um lençol por cima dos jeans e a camiseta roxa do acampamento. Exibia um sorriso torto, os olhos azuis brilhando com loucura, segurando uma faca em uma mão e algo que Percy achou muito parecido com um animal morto na outra.
Parecia um psicopata de filmes de terror. Se houvesse sangue, seria uma representação extremamente fiel.
Darya cruzou os braços e suspirou entediada, encarando o garoto com uma chama tempestuosa de raiva, como um mar agitado e perigoso. Havia uma pequena tensão no ar que não passou desapercebida, mas Octavian soube disfarçar muito bem.
— O graecus! Interessante. Estava ansioso para vê-lo.
— Eu com certeza não estava ansioso para te ver matando animaizinhos.
— Ah, não. Nos tempos antigos usávamos tripas de animais, verdade. Hoje preferimos outros tipos de animais.
Octavian lançou o que havia em sua mão para Percy, que segurou agilmente. Percebeu então que era um ursinho de pelúcia estripado e haviam vários outros no altar.
— Ursinhos de pelúcia? Sério?
Octavian aproximou-se e estreitou os olhos. Haviam um brilho perigoso em seu olhar, embora fisicamente não parecesse tão ameaçador. Ele lembrava Percy de alguém.
— Nervoso?
— Você me lembra alguém.
— Provavelmente meu homônimo, Octavian Augustus César. Todos dizem que tenho uma notável semelhança. Ou com meu ancestral, o grande Apolo.
Percy tinha certeza que aquele garoto não lembrava nem um pouco a Apolo, mesmo que não soubesse como poderia constatar isso.
— Eu diria que possui uma semelhança maior com uma doninha albina — comentou Darya tediosamente. Hazel precisou levar a mão a boca pra conter uma risada. — Ou uma lombriga.
— Achei que já tivéssemos superado nossas diferenças, Lancaster. — Apesar do sorriso no rosto, os olhos de Octavian brilhavam com pura raiva e desprezo.
— Você e Bryce quase me decapitaram no treinamento semana passada.
— Você está precisando de um corte de cabelo.
— Eu gosto do meu cabelo como está — Darya retrucou ríspida e puxou uma mecha dos longos cabelos escuros entre os dedos.
Octavian voltou-se novamente para Percy após mais uma troca de farpas por olhar com a filha de Netuno.
— Vi sua chegada nos agouros. — Apontou para a pilha de pobres ursinhos de pelúcia destroçados. — O grego voltou.
— Eu não chamaria um fantasma ou um de seus capangas de agouro — Darya sussurrou.
— Lancaster, você pode ser um legado de Apolo também, mas quem tem o dom da Profecia e substitui seu pai sou eu, não você, então boquinha fechada enquanto trabalho, por favor — Octavian disse. Era perceptível a raiva em sua voz, embora ele tentasse disfarçar. — Eu previ muitas coisas bem antes dos seus sonhos insignificantes e nada proféticos.
— Apenas diga logo que ele pode entrar na legião.
— Não posso dizer sem ler os agouros antes, você conhece o nosso regulamento, embora seja mestre em desrespeitá-lo assim como a qualquer tradição romana.
— Okay. Que tal estripar logo mais um ursinho e falar se estou dentro ou não? — Percy disse impaciente. Não estava gostando do tom que o garoto usava com sua irmã.
— Conte como chegou até nós.
Darya revirou os olhos e começo a andar de um lado para o outro, enquanto Percy mais uma vez descrevia tudo o que aconteceu, com ajuda de Hazel.
Octavian pareceu surpreso ao citarem Juno.
— Ela aparece em tempos de crise para avisar Roma sobre grandes ameaças — disse olhando sugestivamente para Percy. Uma mensagem clara: ele poderia ser essa ameaça.
— O Festival da Fortuna é semana que vem. As górgonas disseram que o acampamento será atacado nesse dia — Percy disse. — Você viu essas no estofamento das suas pelúcias?
— Na verdade, não. A vontade dos deuses nem sempre é fácil de se ler.
— Não me diga — Darya e Percy murmuraram juntos.
— Vocês não tem um oráculo? — Percy perguntou.
— Não, receio que estamos com oráculos em falta. Agora, se formos questionar os livros sibilinos, como recomendei…
— Octavian, os livros já se perderam há séculos. Foram queimados com Roma — Hazel disse.
— Alguns acreditam nisso, outros não. Se Reyna autorizasse uma busca…
— Seria uma busca idiota sem rumo algum — Darya disse.
— Assim como a busca pelo seu pretorzinho.
— Jason vai adorar saber que o chamou de "pretorzinho" quando voltar.
— Ele não vai voltar, Lancaster. Eu vi…
— Eu não acredito.
— Acredite no que quiser. Ele está morto!
A mão de Darya seguiu para uma das facas embainhadas em sua cintura, porém Hazel foi rápida e colocou-se à frente, segurando seu pulso. Encarou-a firme, tentando dizer em silêncio que aquela era uma péssima ideia.
Hazel voltou os olhos dourados para Octavian, séria.
— Apenas leia o agouro — disse. — Ele pode entrar para a legião ou não?
Octavian analisou Percy por longos segundos silenciosos, a mente trabalhando em sua possível utilidade para a legião.
— Posso?
Percy olhou-o com confusão. Então Octavian se aproximou e pegou o travesseiro de panda que havia no topo de sua mochila, o qual vinha usando para dormir nos últimos dias após pegá-lo no Mercado da Barganha.
Talvez, só talvez, também o tenha abraçado durante a noite algumas vezes. Era bastante confortável e aconchegante.
— Ei! Isso é meu! — protestou ao ver Octavian jogá-lo no altar e erguer a faca.
Tarde demais. Octavian já cortava o panda que acompanhou Percy nas últimas noites frias, espalhando a espuma no altar. Murmurou algumas palavras baixas em latim e então virou-se com um sorriso.
— Boas notícias! Percy pode entrar para a legião. Vamos nomeá-lo a uma Coorte no jantar essa noite.
— Ótimo. Vamos, Percy — Darya disse, parando de rodear o templo.
— Hazel, estou feliz em dar as boas-vindas a Percy na legião. Mas quando as eleições para pretor chegarem, espero que se lembre…
— Jason não está morto, e eu não vou apoiar você — Hazel declarou, convicta. Octavian não ficou feliz com a resposta.
— Reconsidere. Se Jason não aparecer até o Festival da Fortuna, um novo Pretor deverá ser escolhido. Posso ajudar você. Seria um desperdício se aqueles rumores terríveis sobre você ficassem circulando... Ou, que os deuses proíbam, se eles virassem realidade.
Percy levou a mão ao bolso e agarrou a caneta. Daquela vez, Hazel não impediu Darya de sacar uma faca de ouro imperial da cintura, a lâmina longa e claramente afiada brilhando contra a luz. Ela atirou sua faca, tão rápida quanto uma flecha. Ele sequer notou o movimento da irmã até ver o garoto se encolher e levar a mão à cabeça.
Octavian olhou para os fios de cabelo loiro em sua mão com os olhos arregalados, logo voltando-os furiosamente para a garota enquanto recuava para trás.
— Enlouqueceu?! Me atacar no templo de Júpiter? — esbravejou.
— Você só estava precisando de um novo corte de cabelo — Darya rebateu e caminhou na direção dele.
Octavian recuou mais para o altar.
— Você já está passando dos limites, Lancaster. Esta não é a primeira vez que me direciona uma faca. Irei fazer uma acusação formal a Reyna de tentativa de assassinato! E certamente Júpiter não aprova essa afronta em seu templo vinda de um filho de Netuno.
— Se eu quisesse realmente te matar, teria acertado. — Ela passou reto por ele e puxou a faca que ficou cravada no altar. — É realmente tentador, mas não sujarei minhas mãos por você.
— Jason não está mais aqui para te proteger de suas façanhas. Isso não ficará impune.
— Que provas tem de que atirei minha faca em você? Eu não tirei sangue dessa vez — ela disse com a voz transbordando fúria e cinismo enquanto se aproximava do Agoureiro outra vez com a faca. — Vocês viram alguma coisa?
Ela olhou para Hazel e Percy. Os dois negaram com a cabeça, entrando no jogo.
— Ameace Hazel de novo para conseguir apoio tentando chantageá-la e serei bem menos piedosa no corte de cabelo. Pense duas vezes antes de se meter com uma filha de Netuno. — Disse apontando sua faca para Octavian, guardando-a em seguida.
Octavian encarou com ódio e fúria, sem fazer questão de disfarçar dessa vez. Ele arrumou a posta, ajeitando a toga sobre o corpo.
— Me escolher como inimigo é uma péssima ideia — disse friamente e voltou os olhos para Hazel. — Seu irmão está te esperando no santuário de Plutão. Agora, se me dão licença, tenho muito o que fazer.
Eles não esperaram nem mais um segundo. Percy e as garotas seguiram para fora do templo, caminhando a passos rápidos e duros pela trilha que Hazel seguia.
— Não gostei desse cara — Percy comentou.
— Odiamos ele — Hazel disse. — Se ele for eleito Pretor… O acampamento está perdido.
— Quem votaria nele?
— Você viu como ele convence as pessoas. E dinheiro para comprar votos também não é problema para ele — Darya resmungou.
— Vamos esquecer o Octavian. — Percy e Darya concordaram com Hazel imediatamente. — Vamos ver meu irmão. Tenho certeza que ele vai adorar te conhecer, Percy.
Os três seguiram até uma cripta de pedras pretas ao lado colina. Em frente a ela, havia um garoto vestindo roupas escuras e uma jaqueta de aviador parado de pé.
— Ei, Nico! Temos um novo amigo.
Quando o garoto voltou-se para eles, Percy sentiu um flash estranho. Novamente uma pontada na nuca e um arrepio, como se devesse se lembrar de algo.
O garoto paralisou, travando por alguns instantes com uma expressão surpresa que logo tratou de disfarçar. A pele era extremamente pálida, como se não visse a luz do sol há anos; os cabelos com cachos bagunçados e os olhos muito escuros, como pérolas negras. Possuía um anel de caveira de prata em seu dedo e uma corrente na cintura junto a uma espada preta.
Apesar de disfarçar rapidamente sua surpresa e o pânico que passou por seu rosto, isso não passou despercebido por Darya, que franziu o cenho e observou atentamente, desconfiada.
— Esse é Percy Jackson, chegou hoje. É irmão da Darya — apresentou Hazel. — Percy, esse é meu irmão, filho e embaixador de Plutão.
O garoto hesitou por um instante, suas orelhas ganhando uma coloração avermelhada, mas logo recuperou a compostura. Ele estendeu sua mão.
— Prazer, Percy. Sou Nico di Angelo — disse ele com um leve sotaque italiano.
Percy apertou a mão dele, hesitante. Os ombros de Nico ficaram tensos.
— Eu… Eu conheço você.
— Conhece? — Nico franziu o cenho em confusão, olhando para a irmã e a filha de Netuno.
— Percy perdeu a memória — Hazel explicou.
— Se o conheço, também devo ter perdido a minha, porque não me lembro de tê-lo visto antes — disse, rapidamente soltando a mão de Percy e se afastando, enterrando as mãos nos bolsos da jaqueta.
— Não sei de onde, mas… Você é familiar… O sotaque…
— Você conhece muitos filhos de Plutão italianos?
— Plutão é tão popular quanto nosso pai, então certamente não conhece — Darya disse parando ao lado do irmão e riu. Ela encarou Nico atentamente. — Você viaja tanto. Talvez tenha visto Percy em algum lugar.
— Não, Darya. Nunca o vi antes.
Ela não desviou os olhos de Nico, e o garoto olhou-a de volta em desafio.
Ali Darya soube: Nico di Angelo estava mentindo.
————————————
Olá, Semideuses!
Tudo bem?
Trouxe mais um capítulo e espero muito que tenham gostado do Percy se aproximando da Darya. Quero construir uma linda relação de irmãozinhos 🥺
Vamos dar um Oscar para Nico di Angelo, por favor! 👏👏 Ele ainda vai aparecer um pouquinho mais antes da missão, então aproveitem!
O feedback de vocês é muito importante, então não deixem de comentar, okay?
Em breve retorno com mais!
Até a próxima!
Beijinhos,
Bye bye 😘👋
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