30
"Transformações são estritamente proibidas até segunda ordem. Qualquer assassinato de ser humano dentro da cidade também está estritamente proibido. Violações desta nova lei serão punidas com morte.”
Taeyong levantou seu olhar do pergaminho, a leitura interrompida pela cacofonia de ruídos vinda de seus colegas do Conselho.
Hyunjin já estava de pé.
– Estas leis tiram nossa capacidade de aumentar nosso número e de nos defender. – Ele baixou os olhos raivosos para a Princesa. – Seu decreto significa a morte!
– Sente-se. – A Princesa falava em voz baixa, um tom um pouco acima de um sussurro.
Hyunjin hesitou, mas só por um instante. Então jogou seu corpo de volta na cadeira.
A Princesa o encarou, estática, com seus olhos castanhos frios e irritados.
– Se me permite, minha senhora. – Taeyong olhou para o trono. Jimin acenou na direção dele.
Taeyong se virou para encarar Hyunjin.
– Estou ávido para ouvir suas alternativas, Hwang Hyunjin. Mas, antes de considerá-las, gostaria que me acompanhasse até a biblioteca do principado. Quero mostrar os relatos do massacre da Ordem em Pequim.
Os outros membros do Conselho começaram a murmurar. Taeyong continuou encarando Hyunjin até que ele baixou o olhar.
– Precisamos fazer tudo o que pudermos para evitar o destino de Pequim. O melhor curso de ação é que o principado permaneça em silêncio e evite uma atenção indevida. Vocês cuidariam dos novos recrutas? Evitariam que eles matassem quando se alimentassem?
Hyunjin permaneceu de cara fechada.
Taeyong voltou sua atenção para os outros membros do Conselho.
– Amigos, as medidas de segurança são temporárias, mas necessárias. Precisamos agir juntos para divulgá-las entre os cidadãos e persuadi-los a obedecer.
– Precisamente – disse a Princesa. – Não sabemos os planos da Ordem. Quando tivermos mais informações, podemos modificar nossa resposta. Mas, a não ser que vocês desejem centenas de caçadores tomando nossas ruas, devem apoiar e executar as novas leis.
Jimin olhou para cada integrante, demorando-se talvez um pouco demais em Jisu. Ela assentiu para seu chefe de segurança continuar.
O homem fez uma reverência.
– Quanto à Ordem, há círculos dentro de círculos. É possível que queiram fazer do principado um exemplo de seu poder para os americanos, que são notoriamente desregrados. Se ganharmos tempo, talvez os olhos deles se fixem em outro lugar e consigamos retomar nossa antiga liberdade.
– Poderíamos distraí-los. – Yeji ficou de pé e fez uma reverência. – Por que não mandar um bando de assassinos para Tokyo, Taiwan ou Bangkok? Fazê-los empilhar corpos em praça pública. O pânico vai se propagar e a Ordem não terá opção a não ser esquecer Seul e cuidar dos assassinatos.
– Pensei nisso também – comentou a Princesa – Se forem pegos, a distração não adiantaria. Viraríamos alvo de uma observação ainda mais atenta e entraríamos em guerra com outro reino.
– Eles teriam que lidar com humanos em pânico primeiro – retrucou Yeji. – Se o espetáculo fosse grande e público, a Ordem precisaria investigá-lo. Eles voltariam seus esforços para outra cidade, não para Seul.
– Eles costumam lidar com mais de um principado ao mesmo tempo. Mas concordo, iria atrair atenção. – A Princesa olhou para Yeji com interesse renovado. – Está se oferecendo como voluntária?
– Seria uma honra, Mestre – Yeji fez uma mesura.
– Os conselhos em Taiwan são esparsos e fracos. Não precisamos temer retaliações deles e certamente a Ordem ficaria surpresa com assassinatos naquelas fronteiras.
– É verdade, Mestre. – Uma sombra de desconforto cruzou seu rosto. – Mas eu havia pensado no Japão.
– Os conselhos desse país estão em guerra com os patriarcas – intrometeu-se Aeri, batendo impacientemente o pé no chão de pedra. – Os patriarcas desprezam a Ordem e nunca a deixaria cruzar suas fronteiras.
– Uma boa justificativa. – A Princesa espiou Yeji, pensativa. – Taiwan é a opção óbvia, dada sua história com a Ordem. Eles ficariam preocupados demais em evitar um massacre para declarar guerra contra nós, mesmo que descobrissem quem o enviou. Quem você escolheria para acompanhá-lo?
– Hyunjin.
O vampiro grunhiu.
– É uma tarefa para tolos.
– Você estava há pouco lamentando que não poderia matar ou angariar novos recrutas. – O tom de Jimin era incisivo. – A sugestão de Yeji vai dar a você sua cota de assassinatos.
Fez um gesto para Hyunjin se levantar.
– Hyunjin, ordeno que ajude Yeji em sua missão. Você vai ficar sob o comando dela.
– Isso é um insulto! – despejou Hyunjin. – Sou mais velho que ela.
– Por breves minutos, caso eu não esteja enganada. Yeji vai liderar a missão em Taiwan e você vai acompanhá-la. Se fracassar, será condenado à morte. Se tiver sucesso, será recompensado. – A Princesa inclinou-se para a frente em seu trono. – Se recusar, considere-se morto.
Se pudesse ficar mais pálido, Hyunjin teria ficado. Seus olhos pareciam que iam saltar das órbitas, e ele fechava e abria os punhos. Desviou seu olhar para o lado, onde sua gêmea o encarava com um olhar sério.
Hyunjin voltou a encarar a Princesa e assentiu. Ela se virou de novo para Yeji.
– Quero que partam imediatamente. Ningning vai cuidar para que sejam trajados para sua jornada. Não contem a ninguém sobre a missão. Não podemos arriscar que a notícia chegue aos ouvidos da Ordem dos Caçadores.
Yeji e Hyunjin fizeram uma reverência e deixaram a sala.
A Princesa olhou para os três membros restantes do Conselho.
– Estamos cada vez em menor quantidade e vamos ficar sem Yeji e Hyunjin por tempo indeterminado. Aeri, convide Ning Yizhuo para se juntar a nós na próxima assembleia.
– Como quiser – Aeri fez uma reverência –, mas ela carece dos anos exigidos para ser membro do Conselho.
– Ela é influente, apesar da juventude – respondeu a Princesa. – Vamos retomar o assunto da reunião. Há mais alguma objeção às novas leis?
Jisu ficou de pé.
– Nenhuma de minha parte, minha senhora. Vi o que a Ordem fez em Daegu com um conselho de antigos. Vim para Seul porque todos sabiam que era um dos poucos principados da Ásia que a Ordem ignorava. – A expressão dela se alterou. – Eu apoio a Princesa e as novas leis.
A Princesa assentiu e Jisu retomou seu assento. Jimin esperou um minuto antes de se voltar a Taeyong.
– Lembre aos irmãos de que eles são livres para deixar a cidade se considerarem as novas leis rígidas demais. Sugira que eles usem os trajes de segurança que adquirimos para protegê-los dos caçadores, mas avise-os de que, se a Ordem invadir, os trajes não vão protegê-los. Vamos torcer para receber boas notícias de Taiwan em breve.
A Princesa se levantou, imitada pelos membros do Conselho, que fizeram uma reverência enquanto ela deixava a câmara em direção ao seu escritório, sendo acompanhada por Aeri.
– Encarregue Ningning de levar esta carta a Busan. Ela deve dizer a Kim Hongjoog que entregue o tributo imediatamente ou vai enfrentar as consequências – disse Jimin a sua conselheira, entregando-lhe um envelope fechado com o selo de Seul.
Irritava a Princesa ter que lidar com problemas menores: o fantoche que ela instalou como príncipe após derrotar Busan numa guerra recente.
Aeri olhou atentamente para o envelope.
– Minha senhora, estou preparada para servi-la em tudo. Mas não acha que se Ningning entregar esse envelope, eles vão matá-la?
A Princesa jogou o envelope na mesa.
– E arriscar outra guerra? Duvido. Nós reduzimos o exército deles a nada quando os derrotamos.
A expressão da conselheira ficou levemente menos tensa, o que não passou despercebido.
Jimin cruzou os braços na frente do corpo.
– Se Busan é tola o suficiente para executar um membro do meu principado, eu invadirei a cidade e executarei sua liderança.
– Com todo o respeito, minha senhora, e quanto à Ordem?
– Vai ser bom que a Ordem veja que estamos preocupados com assuntos de Estado e não nos preparando para um ataque. A ameaça de guerra contra Busan deve deixá-los tranquilos a respeito de seus espiões.
– Se me permite, Princesa – Aeri adotou um tom conciliatório –, por que não Jisu? Ela os seduziria facilmente. Hongjoog já está caído por ela.
– Sim, eu sei – murmurou Jimin. – É uma das razões pelas quais o escolhemos. Mas tenho minhas ressalvas em relação a Jisu.
A Princesa retirou uma folha de papel e escreveu nela. Então a dobrou e derreteu um pouco de cera com uma vela. Selou o envelope, marcando-o com o anel que tinha o símbolo de Seul.
Ela colocou a segunda carta sobre a primeira.
– Diga a Ningning para ler a mensagem de cima e entregar a segunda. Ela deve partir imediatamente.
Aeri pegou as cartas.
– Como desejar.
– Ordene a Ningning que traga o tributo quanto antes. Quando a tiver enviado, gostaria que se encontrasse com Jisu.
– Por quê?
A Princesa franziu a testa.
– Está bem atrevida nas perguntas esta noite, Aeri.
A conselheira respirou fundo.
– Perdoe-me, minha senhora. Jisu é, digamos, desafiadora. Prefiro me armar antes de enfrentá-la.
– É verdade. – A Princesa se permitiu um pequeno sorriso. – Em vista do possível conflito contra Busan e do decreto que promulgamos, acho que o principado precisa de diversão. Quero que você e Jisu planejem um evento.
Aeri levantou as sobrancelhas.
– Sim, Princesa. Mas diante da atenção da Ordem...
Jimin foi rápida em interrompê-la.
– É tempo de recompensar meus cidadãos pela lealdade e inspirar fidelidade. Desde que não haja morte, os irmãos devem ser livres para comer, beber e aproveitar os prazeres da vida.
– Claro, Princesa. – Aeri fez uma reverência e se encaminhou até a porta.
– Aeri? – Chamou antes que ela saísse.
– Sim? – A conselheira parecia grata que a chamasse.
– Eu entendo sua preocupação quanto a segurança da sua companheira, mas você precisa confiar que ela vai executar bem o seu trabalho – Ela fez uma pausa, pensativa. – De qualquer forma, envie um destacamento de soldados para acompanhá-la.
Aeri assentiu em satisfação.
– Obrigada, Jimin – Ela se retirou, deixando a Princesa sozinha com seus pensamentos.
\[...]
O quarto estava silencioso quando Jimin retornou do submundo horas mais tarde. Uma luz fraca entrava pelas janelas e pela varanda, iluminando o lugar onde Minjeong estava.
– Me desculpe. – Jimin se inclinou em frente à poltrona em que ela estava sentada e beijou seus lábios.
– Porque está se desculpando?
– Minha reunião com o Conselho acabou se estendendo bem mais do que eu gostaria.
Minjeong balançou a cabeça.
– Não se preocupe com isso. Eu sei que você tem muitas responsabilidade para com a cidade. – Ela se aninhou, apoiando-se no braço da poltrona.
Jimin segurou o rosto dela. Pressionou seus lábios em cada bochecha, lentamente, como se saboreasse o contato.
– Faz muito tempo desde que precisei lidar com tantos problemas.
– Você parece cansada, como se carregasse o peso do mundo em seus ombros.
Jimin se afastou e ficou de pé, correndo os dedos pelo cabelo.
– A Ordem dos Caçadores só está esperando por uma oportunidade. Já matei muitos deles antes, mas fazer isso agora seria uma declaração de guerra. – Ela suspirou. – Preciso encontrar o traidor. Rápido.
Minjeong se aproximou de Jimin lentamente. Pegou uma das mãos fechadas dela e a aconchegou nas suas.
– Embora você demonstre plenitude diante de todas essas questões, eu consigo sentir sua inquietação.
A Princesa abriu um meio sorriso.
– Seus sentidos foram aguçados após a transformação. Além disso, compartilhamos uma ligação de sangue.
– Não consigo acreditar que exista uma ligação maior do que a do amor.
Jimin levantou a mão dela e deu-lhe um leve beijo, como se fosse uma resposta.
– No momento, você está em perigo por ser a consorte de uma princesa vampira. Sem dúvidas aqueles que querem a minha ruína não vão hesitar em machucá-la para me atingir.
Minjeong estremeceu novamente.
– Você acha que eles fariam isso?
Jimin colocou a mão no ombro dela.
– Não subestime a sede por poder desse traidor. Ele têm uma missão, uma única missão, que é me destruir. Qualquer alternativa que possa existir para se alcançar esse objetivo será considerada.
– Parece que me tornei sua fraqueza mais aparente.
Jimin balançou a cabeça e levantou a mão para acariciar o rosto de Minjeong.
– Posso carregar muitos arrependimentos, mas escolher ter você ao meu lado jamais será um deles – sussurrou ela.
– Você imaginava que sua ascensão ao principado significaria lidar com uma vida ainda mais sombria?
– Sem dúvida. A história da nossa espécie já é retratada dessa forma.
– Do que você está falando?
Jimin deixou a mão cair.
– Tentei explicar isso uma vez enquanto estávamos na biblioteca.
– Só me lembro de você falar de luz e trevas.
Minjeong se apoiou na parede e cruzou os braços na frente do corpo.
– É apenas assim – explicou Jimin. – Você pode perceber o poder possessivo que existe em nosso mundo. Ele está ao nosso alcance. Os vampiros mantêm a sua essência original após a transformação, mas em certas ocasiões as trevas a escondem. Ou a vencem.
Seu olhar parou em uma das velas em sua mesa e ela ficou observando sua chama oscilante.
– As trevas são um demônio?
– A Ordem acha que sim.
– O que você acha?
Os olhos de Jimin buscaram os dela.
– Nossa lenda diz que os vampiros originários foram criados pela Virgem Escriba como seu legado, como suas crianças escolhidas. Eu também sinto seu poder e sua influência. Mas sou capaz de controlá-la, pelo menos às vezes. – Ela pigarreou. – Quando a encontrei no beco, fiquei tentada a me alimentar de você, a dividi-la com Jisu e os outros.
– Mas não se alimentou.
Minjeong juntou as mãos.
– Não, não me alimentei. Lembrei-me de como me senti quando não consegui salvar minha família. Fracassei com eles, mas não iria fracassar com você.
Minjeong tocou a manga da camisa dela.
– Sua humanidade me salvou.
– Não. – Jimin se afastou. – A humanidade tem a própria escuridão. Você sabe disso mais do que ninguém. Foi a lembrança da bondade e a decisão de preservar essa lembrança que me permitiram salvá-la. Eu faria essa escolha novamente, e novamente, e não me arrependeria. Se eu vivesse mil anos, decidiria a mesma coisa.
Jimin parecia resignada e vulnerável.
Minjeong piscou para evitar as lágrimas que tomavam seus olhos.
– Você escolheu se tornar vampira, Jimin?
Ela fingiu não ouvir e se aproximou da mesa. Passou a mão pela chama da vela, seguidamente, em movimentos rítmicos e hipnóticos.
– Jimin? – insistiu Minjeong.
– De forma prática, a transformação só ocorre se os humanos estiverem dispostos a se entregar a ela.
– Foi por isso que você respeitou o meu tempo?
– Sim – confessou ela, mantendo a mão na chama. – Se você não desejasse isso, eu nem mesmo tentaria.
– Pare. – Minjeong agarrou o pulso de Jimin e tirou a mão dela do fogo.
– Não dói. – Ela colocou a palma da mão diante do rosto dela. – Viu? Nenhuma ferida.
– Você me machuca fazendo isso na minha frente. E se machuca tratando seu corpo com indiferença.
Jimin colocou a mão com a palma para cima sobre a coxa dela.
– Não pretendia magoar você. – A voz dela era como a de uma criança.
A musicista levou a palma dela aos seus lábios e a beijou, surpresa pelo calor que irradiava de sua pele, sem ferida alguma.
– Estou feliz que esteja bem.
Jimin desviou o olhar para a superfície da mesa.
– Lembro quando tentei provar que eu era uma vampira. Enfiei uma adaga na mão. – Ela levantou o olhar até os olhos dela. – Você ficou tão incomodada... Queria me ajudar mesmo estando com medo.
– Eu amo você, Jimin. Claro que não quero vê-la se ferir.
– Há muito pouca coisa neste mundo que pode me ferir – sussurrou ela, com uma expressão séria. – Mas devo ser mais cuidadosa, minha garota de coração grande.
– Só quando se trata de você.
– Ah, isso não é verdade, meu amor. E nós duas sabemos.
Minjeong a puxou, e ela ficou em pé entre os joelhos abertos dela.
– Me diga então por que escolheu essa vida.
Jimin enterrou seu rosto no pescoço dela antes de começar sua história.
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