Capítulo 58
Sim eu acabei de postar o cap 57 e iria postar esse depois, mas não aguentei... Espero que vocês gostem desse final tanto quanto eu. Amo vocês <3
"Como a neve que acabou de se assentar
Vamos respirar, como na primeira vez
E você vai ser feliz.
Mude tudo isso
Quando tudo for novo, à meia-noite."
— 00:00, BTS.
2021.
A conversa com Samantha foi a mais curta, mas a melhor possível. Eu sempre achava surreal o fato de como nós dois desenvolvemos uma quase amizade, depois de tanto tempo evitando um ao outro.
A guria também se abriu para mim e contou que ainda não sabia lidar com o luto, cada dia era uma tentativa. Disse que ninguém que não tenha passado por isso iria me entender e que eu precisava me apoiar em minha irmã e minha mãe mais do que nunca naquele momento.
Andressa já estava ciente do ocorrido e, diferente de Camila e eu, ela visivelmente ficou feliz pelo falecimento e fez questão de dizer isso. Também me disse para morar com ela em Porto Alegre e que cuidaria de mim como queria ter cuidado no passado. Também me contou que minha avó estava no hospital, mas que não poderíamos visitá-la pelo risco de exposição ao coronavírus. Sinceramente, eu nem me importava mais com isso.
Mas Samantha sim, por isso ela passou álcool em gel a cada dez minutos e continuou usando máscara. Mesmo assim, isso não afetou o momento e me senti mais próximo dela pelo nível da nossa conversa.
Eu me perguntava se Charlie faria o mesmo comigo também: desde sua volta a Esplendor, as coisas ocorreram tão depressa que não tivemos tempo de ter uma conversa profunda para esclarecer as coisas.
Por isso, quando Sam se despediu e Camila avisou que iria para seu quarto ver como tudo estava e arrumá-lo, um guri de cabelos pretos tingidos apareceu pelo corredor, com o olhar curioso.
— Sammy já foi?
— Tu tava escondido ouvindo a conversa?
— Bah, claro que não, cheguei agora. — Ele riu fraquinho e se aproximou para se sentar ao meu lado. — E a perna? Tá doendo?
— Como tô parade agora, ela tá de boa, me incomoda só quando ando demais.
— Entendi... Depois vou fazer outro desenho no gesso. — Ele olhou para minha perna e fiquei observando seu rosto. Como sempre, Charlie era bonito demais e tinha um olhar leve, diferente dos outros.
— Tu parece ser o mais tranquilo. — comentei e ele olhou para mim. O jeito que seu par de olhinhos redondos e azuis me encaravam era fodidamente bonito.
— É que eu não tô triste, na verdade. Só não vou ficar sair pulando feliz por aí em respeito à tu e Camila, mas meu coração se aliviou muito por eu saber tu vai ficar segure a partir de agora.
Eu o entendia de certa forma. Conforme eu conversava com meu pequeno círculo social e entendia mais minhas emoções, eu compreendi que a morte do meu pai não necessariamente deveria me fazer uma pessoa triste e desesperada de luto constante, pois ele havia me feito sofrer ao extremo. O fato de ser da família não representava muita coisa.
— Eu não queria te preocupar tanto sobre meu estado. — Apoiei a cabeça no sofá e respirei fundo. Charlie se aproximou de mim e pegou na minha mão.
— A gente pode terminar aquela conversa? — Olhei para ele de novo, com a cabeça de lado, ainda encostada no sofá.
— Eu queria ser melhor com as palavras.
— Tu já é, só precisa te esforçar mais. — Seu sorriso pequeno foi um pouco encorajador. — Sabe, ficar longe de ti por um tempo me fez ver que sou muito grudento e meloso às vezes, e acho que isso te pressionou um pouco.
— Não fala isso, a culpa não é tua... — Resmunguei e apertei sua mão.
— Não é como se um tivesse culpa ou não, a gente erra de vez em quando, acontece. Eu tirei esse tempo sozinho pra... Ficar pensando sobre as coisas.
— Que coisas? — ergui o pescoço e olhei mais concentrade para ele.
— Tudo, o que eu tive contigo, minha família, as conversas que eu tive com Sammy também... Não posso falar que a gente é melhor amigo ou super próximos, ainda têm coisas que magoaram muito ela e que eu quero consertar.
— Tu pretende voltar com ela? — Acabei perguntando automaticamente, minha voz claramente preocupada. Contudo, Charlie apenas riu.
— Não, Jay! E nem se eu quisesse, o jeito que tua irmã olhou pra ela me deu até medo de tentar alguma coisa. — Sua risada saiu mais fina e engraçada, então eu não era ê únique que havia notado.
— Tu acha que... — Estreitei os olhos e Charlie deu de ombros.
— Sammy nunca definiu a sexualidade dela, então não sei. Tu lembra quando a gente dizia que era hétero na Marie Curie?
— Fala sério, que piada. — Bufei e balancei a cabeça, recordando do passado. — Eu tinha vergonha de falar que era bi.
— E hoje tem até canal de vídeos falando sobre a comunidade. — O comentário alegre de Charlie me fez arregalar os olhos para ele. Endireitei meu corpo e fiquei parcialmente de frente para o guri, com a perna ainda apoiada na mesa de centro.
— Tu assistiu meus vídeos?
— Todos, até tuas lives, tu só não me via, mas eu tava lá.
A revelação me fez dar o primeiro sorriso aberto e genuíno depois de todos os acontecimentos recentes. Era quase impossível ficar triste com Charlie Stewart por perto.
Seus lábios também se abriram em um sorriso fofo e olhei para sua boca. Ele percebeu a direção que meu olhar tomou e acabou fazendo o mesmo.
— Eu quero tentar ficar contigo. — Sua voz saiu mais baixa e senti meu coração se acelerar. Ele continuava segurando minha mão e eu esperava que ele nunca mais soltasse.
Nunca mais mesmo.
— Me desculpa por ter sido tão irritante. — Voltei meu foco aos seus olhos e ele fez o mesmo. Charlie se aproximou mais de mim, encurtando a distância dos nossos rostos. Isso me deixava tenso, de uma forma boa. — Eu passei esse tempo aprendendo mais sobre mim mesme e o que significa ser arromântique, porque se eu te visse outra vez iria ser mais inteligente na hora de falar como me sinto.
— E tu te considera mais inteligente agora? — Charlie sorriu tanto a ponto dos seus olhos diminuírem de tamanho.
— Acho que sim, porque entendi como funciona esse lance de amar.
— Ah, é? — A testa do guri se enrugou e notei como eu senti saudade até das suas expressões engraçadas. — E como que funciona?
— Bah, a real é que não dá pra explicar mesmo, tanto pra quem é aro quanto pra quem não é. Cada um sente de um jeito.
— É sobre isso e tá tudo bem. — Ele reproduziu o meme da internet e ergueu minha mão para deixar um beijo em meus dedos. O gesto aqueceu meu coração. — Mas tu entende que tu já é suficiente pra mim? Que a gente pode ficar junto mesmo tu sendo arromântique, e que isso não vai me fazer mal?
— Pra falar a real, ainda não entendo não. — admiti. — Mas eu decidi que vou acreditar em ti. Se tu me disser que tá feliz, então tá bom.
— Tu vai ficar comigo então? — o olhar de Charlie aumentou em expectativa. Nossas mãos continuavam juntas.
— E-Em que sentido? — balbuciei meio confuse.
— Não importa, a gente não precisa definir isso. Ou pode definir como queerplatônico, lembra?
— Tu vai mesmo ficar feliz em uma relação assim? Cê não é arromântico, Charlie. — meus argumentos eram insistentemente chatos, mas eu não conseguia evitar, queria que ele tivesse certeza do que estava fazendo.
— Tu acha que prefiro viver um romance com alguém que não amo? Acha que eu seria feliz, hein?
— Bah, não. — minhas bochechas esquentaram. Ele beijou minha mão outra vez, eu poderia facilmente me acostumar com aquilo. — Mas... Como isso vai ser? Vamos ser... Exclusivos?
— Exclusivos tu diz que não vamos ficar com outras pessoas?
— É. — fiquei sem graça outra vez. Eu me sentia besta por propor algo para Charlie que não seria considerado um relacionamento tradicional, e ainda querer que não ficássemos com outras pessoas.
— Bom, eu não tenho vontade de ficar com outras pessoas no momento, e eu sou demissexual, então tu já sabe a resposta. Mas e pra ti? Tu quer ficar com outras pessoas?
— Não. — neguei rapidamente com a cabeça. A ideia de ver Charlie com alguém também me causava ciúmes, mas esse era um sentimento que eu ainda não entendia.
— Então vamos fazer o seguinte: vai ser exclusivo, até alguém sentir vontade de ficar com outra pessoa e aí a gente conversa sobre isso e decide de novo. Mas tu vai ter que ser sempre sincere comigo, ok?
— Tá, eu prometo. — Meu segundo sorriso genuíno apareceu.
— É sério, se tu me esconder as coisas ou mentir eu vou te bater.
— Tu incluiu BDSM nessa relação? Tô sabendo não, eu virei teu submisso? — Minha expressão irônica de confusão fez Charlie arregalar os olhos de susto e abrir a boca.
— Jason! Para de falar essas coisas! — O guri enrubesceu e deu um tapa no meu ombro.
— Ai, caramba! Tá ralado aqui, Stewart! — Fiz uma careta de dor e acariciei a região, Charlie ficou preocupado na mesma hora.
— Ai meu Deus, nenis! Me desculpa! — Ele passou a sua mão livre no meu ombro e massageou. — Tá doendo muito?
— Tá não, nem tava machucado ali. — Ri com sua cara irritada por descobrir que foi enganado.
— Tu é uma criança, Jason!
— E tu não me beijou até agora. — Fiz um bico ridículo de manha. Charlie revirou os olhos, mas sorriu e aproximou seu rosto do meu, porém não me beijou.
A ponta do seu nariz se encostou com a minha e ele largou minha mão para passar o polegar por minha bochecha. O gesto me aqueceu por dentro.
— Aceita ser minhe parceire queerplatônique?
— É o mesmo que namoradinhe arromântique?
— Isso aí, sabia que tem até nome pra crush arromântico?
— Qual é? — Sorri, ainda com a boca próxima da dele.
— É squish. Tu é meu squish.
— Não gostei, me lembra aquele Pokémon de água.
— O nome dele é Squirtle, idiota! — Ri com a revolta de Charlie, que estava incrédulo por eu ter estragado o momento fofo. — Sério, a gente nem começou isso ainda e eu já sei que não vou ter paciência contigo!
— Bah, tchê! Por que não?
— Porque não! — Ele se afastou e cruzou os braços, emburrado. — Tu deveria ser pelo menos um pouquinho romantiquinhe comigo! Não vai te matar inventar umas besteiras fofas às vezes!
— Tá, se isso for te fazer feliz, eu vou tentar ser melose igual tu de vez em quando. — O guri revirou os olhos outra vez e colocou as mãos em cada lado do meu ombro. Seu olhar ficou sério de novo.
— Tu tá mesmo de boa com tudo isso?
— Eu tô, Charlie. Vai me beijar ou não? Já tenho muito problema pra lidar ultimamente, ficar sem tua boca não é outro que eu...
Não consegui continuar, pois o guri colou seus lábios nos meus com tanta propriedade e saudade que me surpreendi.
Era o que faltava para meu coração surtar de vez.
A falta que eu sentia daquilo era tremenda, e rapidamente abri mais os lábios para intensificar o beijo. Os dedos de Charlie foram para meus cabelos e ele os puxou levemente, até daquilo eu estava com saudades.
Charlie Stewart era todas as emoções possíveis juntas e me fazia explodir.
De repente, ele parou o beijo e se afastou por poucos centímetros, eu ainda podia sentir sua respiração no meu rosto.
— Tu não me respondeu ainda.
— O quê? — Já estava até perdide pelo efeito do beijo.
— Se quer ser minhe parceire. Meu parceiro. Em qualquer pronome que tu quiser que eu diga. Só me responde, aí dependendo da resposta eu não saio mais do teu lado.
Eu sabia o que dizer. Charlie também já sabia. Mas eu não iria pronunciar, porque não seria típico meu.
Respirei fundo e puxei o guri para meu colo — porque a única coisa ruim no meu corpo era a perna, eu podia aguentá-lo em cima de mim. Então foi a minha vez de beijá-lo e trazê-lo para perto pela nuca com vontade, para mostrar a ele o que eu queria dizer. Minha outra mão rodeou sua cintura e o apertou com força, para explicar que eu não queria que ele fosse embora nunca mais.
Essa era a minha forma de dizer que sim, eu queria viver um relacionamento com Charlie.
Também era minha forma de dizer que o amava, do meu jeito particular e inexplicável, e que eu não me afastaria de novo.
E ele compreendeu tudo isso sem que eu dissesse uma palavra.
Porque almas gêmeas não precisavam ser românticas.
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