Capítulo Trinta e Nove
Enzo Miller
Escuto o barulho de um soluço e quase esqueço como se respira quando vejo Ângelo caído no chão. Droga! Ele deve ter ouvido tudo.
Não penso muito e vou até ele, me abaixando em sua frente no chão.
- Ângelo... - Falo com a voz baixa e levanto seu rosto, que está banhado pelas lágrimas.
- Meu pai, Enzo... El...Ele foi assassinado. - Ele diz entre soluços e isso faz meu peito se apertar.
Abraço ele e deixo ele chorar em meus braços, olho para Cláudio e ele entende que não é uma boa hora para continuar a conversa.
- Vou te levar para nosso quarto. - Sussurro perto de seu ouvido e pego ele em meus braços com um pouco de dificuldade.
Ando devagar com ele em meu colo e demora um pouco até chegarmos em nosso quarto. Deito ele na cama e tiro seus sapatos, o deixando mais confortável. Fecho a porta e me deito na cama ao lado dele, o trazendo para mais perto de mim e deixo ele chorar tudo o que precisa.
- Por que fizeram isso com ele? - Ele pergunta após um tempo e percebo que ele não chora mais.
- Olha, eu vou ser sincero com você. Durante a nossa viagem pra casa de praia, Cláudio ligou me contando que havia descoberto quem foi o culpado dos desvios de dinheiro da empresa. Rogério fez tudo a mando de Vicente, que mesmo depois de tudo, ainda tem uma grande influência em muitas pessoas nesse país. Seu pai descobriu sobre o esquema deles e eu acho que ele estava prestes a contar tudo. De alguma forma os dois descobriram e armaram o acidente que tirou a vida do seu pai. Eu sinto muito, Ângelo, mas seu pai foi mais uma vítima da maldade de Vicente. - Falo e ele se afasta de mim, para me olhar.
- Por que não me contou tudo antes há duas semanas? Me deixou descobrir ao ouvir uma conversa sua. - Ele diz com raiva e eu entendo.
- Amor, eu só estava pensando no melhor pra você, mas eu sei que errei. Só que veja o meu lado, você está superando ainda a perda que tivemos e nós fomos para lá pra você se sentir melhor, eu não queria trazer mais isso pra você. Entende? - Pergunto olhando para seu rosto, mas ele desvia seu olhar do meu.
- Entendo, mas... Você pode me deixar sozinho? Eu preciso pensar. - Ele fala sem olhar pra mim.
- Tudo bem, mas eu só não falei antes porque queria poupar você. Eu te amo demais pra te ver sofrer. - Falo e me levanto da cama.
Pego meus sapatos ao lado da cama e saio do quarto depois de pegar minha bengala. Desço às escadas devagar e encontro apenas minha mãe sentada na sala, lendo uma revista. Fico parado a olhando por alguns segundos, até que resolvo ir até lá.
Caminho a passos lentos até onde ela está e me sento no sofá em frente ao que ela está sentada. Assim que me nota, ela abre um sorriso pequeno e fica me olhando como se quisesse dizer algo e depois de muito pensar ela fala.
- Está tudo bem? - Ela pergunta com calma. Como sempre, ela não invade meu espaço e pela primeira vez em anos, eu gostaria de ter minha mãe como antes. Coisa que eu nunca mais tive depois que deixei a mágoa crescer em meu peito.
- Só Vicente estragando a vida de todos novamente. - Falo de forma amarga e o sorriso em seu rosto some.
- O que ele fez dessa vez? - Ela pergunta com preocupação.
- Além de conseguir ficar livre novamente? Ele mandou matar o pai de Ângelo, já que ele descobriu coisas que não devia. - Respondo com um pouco de ironia, para tentar tirar o peso de tudo, mas sei que não é possível.
- Meu Deus! Como Ângelo está? - Pergunta preocupada e vejo em seu rosto que é algo real.
- Magoado, triste e chateado comigo. - Respondo e calço meus sapatos, já que estava só de meias.
- Por que chateado com você? - Ela pergunta me olhando, mas desvio meu olhar do seu.
- Eu soube de tudo antes, mas fiquei com medo dele piorar já que está superando a perda do bebê. E por não contar antes, ele descobriu da pior maneira possível. - Solto um suspiro e me encosto no sofá.
- Agora entendi, mas logo ele vai entender que você só fez isso pensando no melhor para ele. Às vezes as pessoas não entendem os motivos que temos para algumas coisas, mesmo que tenhamos os mais nobres dos motivos. - Ela fala e sinto que suas palavras querem dizer mais do que minha situação com Ângelo.
- O que está querendo dizer com isso? - Pergunto, mesmo já sabendo do que se trata.
- Você sabe, Enzo. - Ela diz simples.
- Não quero falar sobre isso. - Corto, mas ao invés de sair de perto, eu continuo onde estou.
- Acha mesmo que eu não sofria vendo o que Vicente fazia com você, Enzo? Acha mesmo que eu não tentei várias vezes me ver livre dele? - Ela faz essas perguntas e posso ver a dor através de seus olhos.
- Desculpa, mas não parecia. Quantas vezes eu te pedi para o deixar, mas você não o fazia. - Falo com raiva e me sinto como o garoto assustado de anos atrás.
- Eu não podia, Vicente me ameaçava dia e noite. Acha que eu também não queria me ver longe daquele pesadelo? Quando seu avô nos trouxe para cá, eu senti alívio. Mas anos depois ele voltou e ainda me obrigou a ficar com ele novamente. Vicente sempre teve controle sobre mim, mesmo eu não querendo. Eu nunca o amei, Enzo, jamais consegui. - Ela diz chorando e olho para ela sem acreditar.
- E por que se casou com um homem igual a ele, então? - Pergunto sem entender.
- Por que eu fui obrigada a isso, jamais porque eu quis. - Ela responde e isso me deixa desnorteado.
- O quê? Isso não pode ser possível. - Falo desacreditado.
- Mas é! Eu namorava quando conheci seu pai e eu amava o homem com quem estava, mas nunca pude ficar mais tempo com ele. Eu era pobre, Enzo e só tinha meu pai ambicioso. Vicente criou uma fixação por mim e fez de tudo para que eu ficasse com ele, e louco por dinheiro meu pai praticamente me vendeu a ele. Eu era nova, não tinha muito controle sobre a minha vida e tive que fazer o que meu pai me mandava. Por isso acabei em um casamento arranjado e sem um pingo de amor. Você e sua irmã foram as únicas coisas boas que me restaram de tudo isso. Então acredite em mim quando eu te falo que fiz de tudo para proteger vocês dois. - Ela fala entre soluços e à essa altura eu também derramo algumas lágrimas.
- Todas às vezes que ele te batia ou fazia algo com você, eu queria sair correndo para longe com você comigo, mas as ameaças dele me impediam. Ele sempre me dizia que iria te levar para longe e sumir com você. Você não faz ideia como eu me sentia na época, mas eu aguentei tudo calada, porque eu te amava muito mais para ligar pra mim mesma... É uma coisa que pais de verdade sempre fazem, protegem seus filhos. - Ela fala e nesse momento eu sinto toda a mágoa que eu sentia dela ir embora do meu peito.
Me levanto de onde estou sentado e me ajoelho em sua frente.
- Me perdoa mãe, eu juro que nunca pensei um dia sequer em você e só na minha dor. Eu achei que não se importava e fui deixando a mágoa crescer em meu peito. Só me perdoa, por favor! - Peço chorando e sinto o momento em que ela me abraça, exatamente como fazia quando eu era um garotinho.
- Oh meu amor, não há nada que eu tenha que perdoar. Eu te entendo, sempre entendi. - Ela fala baixinho e sinto ela acariciar meus cabelos.
- Eu senti falta disso. - Falo com a voz ainda embargada e escuto ela rir em meio ao choro.
- Eu também meu filho... Eu também. - Ela sussurra e eu a abraço ainda mais apertado pela cintura. - Te amo Enzo, sempre vou estar aqui para você... Como estive por todos esses anos. - Ela completa e sinto meu peito se aquecer com suas palavras.
- Eu te amo, mãe! - Falo as palavras que ficaram entaladas em minha garganta por anos e me sinto em paz.
Fecho meus olhos e aproveito o colo de mãe que Vicente indiretamente também tirou de mim.
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Momento lindo, não?! ❤❤❤
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