• Capítulo 7 •
Em uma das enormes salas de jantar da mansão, Adrien tinha quase certeza que cavaria um buraco no chão se continuasse andando de um lado para o outro daquele jeito.
Mas o que ele podia fazer? Por mais que não quisesse admitir, a perspectiva de encontrar a garota que agora estava hospedada em sua casa por um tempo indeterminado o deixava nervoso. Isso para não dizer apavorado.
Adrien tinha evitado Beatrice Morgan o máximo que conseguira, tinha esperado com anseio que a tempestade de neve cessasse e ela pudesse voltar para Roseville, mas é claro que o destino não seria assim tão bom com ele.
Samantha Sandoval estava tornando sua vida um verdadeiro inferno por conta de... Como é que ela falava mesmo? Ah, sim. "Imensa falta de cortesia, educação e cavalheirismo com a pobre moça."
Como se ele realmente se importasse em ser alguma daquelas coisas...
Por fim, Adrien acabou ficando sem escolha. A garota ficaria ali enquanto as estradas não estivessem seguras o suficiente para que ela voltasse para sua pequena cidade. Ele tinha conseguido fugir dela por uma semana inteira, agora não tinha mais jeito.
Na sala de jantar, com três de seus criados mais próximos o rodeando como um porco para o abate, Adrien não conseguiu deixar de comparar sua antiga vida com a nova mais uma vez.
Três anos antes, Adrien Fletcher não era do tipo que se intimidava com a presença de garota nenhuma. Na verdade, ele se sentia completamente à vontade cercado por qualquer jovem do sexo feminino. Todas ficavam bem perto dele, todas o queriam para si por uma única noite. E Adrien, como sempre, nunca se incomodara com aquela atenção toda.
De fato, a vida - a sua pelo menos - era cercada de ironias cruéis. Três anos depois e ele estava isolado em uma mansão no interior do país, escondido e sentindo-se completamente intimidado por uma garota qualquer.
Dois anos inteiros morando ali e Adrien nunca tinha sido visto por ninguém além de seus criados, e agora, em uma única semana, tudo tinha mudado.
Quando se apresentara para Marco Morgan e Dr. Davey dias atrás, ele havia recordado muito bem do motivo pelo qual não queria ser visto de novo pelas pessoas. A repulsa e o medo ficaram estampados nos olhos dos dois homens quando eles o viram, e, por mais que tentassem disfarçar enquanto conversavam, aquele sentimento parecia rondar o ar.
Adrien sabia que estava muito bem sozinho em sua casa, sem ninguém para atrapalhar o sossego que havia estabelecido ali, mas agora as coisas estavam bem mais complicadas do que previra.
"Senhor?", ele ouviu uma voz dizer, despertando-o dos devaneios. Ergueu os olhos e viu Samantha do outro lado da enorme mesa de jantar, com um avental em volta da cintura e um pequeno sorriso no rosto. Luke, o mordomo, ajeitava a toalha de mesa ao seu lado. "Se me permite dizer, acho que vai acabar sofrendo um infarto antes que Beatrice venha jantar. Por que não senta e tenta se acalmar?"
Adrien resmungou, virando-se para Samantha.
"Eu estou muito bem", ele respondeu bruscamente. "É só um jantar idiota."
Ela cruzou os braços na frente do peito, revirando os olhos como se o achasse profundamente patético.
De todos os criados que trabalhavam para sua família e que havia trago consigo dois anos antes, Samantha era a que menos parecia ter medo de contrariá-lo. Algo que, sem dúvida, era bastante irritante.
Adrien conhecia a mulher desde sempre, já que ela trabalhara na casa de seus pais desde que ele era criança. Quando sofreu aquele terrível acidente, Samantha havia sido a única a se oferecer para servi-lo prontamente no interior, quando a mudança ficou certa.
"Howard", a mulher mais velha chamou alguns minutos depois, virando-se para um senhor de meia-idade com enormes bigodes e barriga proeminente. "Acho que você já pode avisar a Srta. Morgan que o jantar está pronto", falou, depois de dispensar as três últimas criadas que arrumavam a mesa com todos os deliciosos pratos da noite.
"Sim, claro", respondeu o chefe da criadagem para ela, ajeitando seu casaco vermelho e virando-se para Adrien logo depois. "Senhor, posso ir chamá-la?"
Adrien se sentou em uma das cadeiras estofadas, aquela que ficava no topo da mesa, sentindo o estômago revirar tolamente.
"Não sei se posso fazer isso", admitiu com um suspiro, fitando a toalha de mesa rendada à sua frente, sem querer encarar os criados.
"Ora, por favor", soltou Sra. Sandoval com um suspiro exasperado, aproximando-se dele. "Já deveria ter superado isso, não é? Por acaso algo deu errado quando teve a cortesia se apresentar para Dr. Davey e Marco Morgan? Tem que superar essa bobagem uma hora ou outra."
Adrien segurou a língua, desejando rebater rispidamente Samantha.
Bobagem? Ela não sabia o que estava dizendo...
"Aliás, pelo que Samantha nos contou, a mademoiselle é bastante gentil e educada, senhor", acrescentou Luke, que largou a travessa que ajeitava e também cercou Adrien. "Se me der licença, eu mesmo despacho Howard para ir chamá-la."
"Ora, quem você pensa que é para me dar ordens, seu cabeça oca?", resmungou o outro criado, fechando a cara para Luke.
"Seu grande e velho gordo, você está mais rabugento ultimamente", implicou Luke com um sorriso, dando uma cotovelada nas costelas do colega.
Adrien revirou os olhos. As provocações dos dois eram insuportáveis na maior parte das vezes.
"Howard", Adrien chamou, a paciência se esgotando. O homem ficou imóvel como uma pedra.
"S-senhor?"
"Vá logo chamar a garota", ordenou, antes que mudasse de ideia em relação ao jantar e tivesse que escutar mais um mês de reclamações de Samantha.
"Muito bem!", parabenizou Luke, faltando dar piruetas quando Howard desapareceu pela porta da sala. "Será um jantar esplêndido, senhor!"
"Garanto que caprichamos bastante essa noite", informou Samantha com um sorriso radiante. "Será a melhor comida que ambos já provaram."
Adrien soltou um suspiro pesado, afundando-se na cadeira com a perspectiva de que a qualquer momento teria que lidar novamente com a situação insuportável de ser visto por alguém desconhecido.
"Ora, Adrien, está com a cara de quem vai para forca", falou Samantha de repente. "O que pode dar errado?"
Ele quase riu ao ouvir a pergunta.
"Posso listar uma quantidade impressionante de coisas", respondeu friamente.
"Se quer saber, tenho certeza que ela não vai sair correndo e gritando como deve estar pensando", disse Luke. "Não se o senhor, quem sabe, agir como um cavalheiro."
"Cavalheiro?", indagou Adrien, soltando uma risada desprovida de qualquer humor. "Pelo amor de Deus, Luke, estamos no século XXI."
Samantha franziu as sobrancelhas, com um olhar carrancudo. "Bem, nunca é tarde para ser um pouco mais educado, não é?", ela ralhou. "Se quer saber minha opinião, Beatrice nem vai ver essas cicatrizes se tentar ser gentil com ela."
"Isso não existe", disse Adrien em uma convicção profunda, afastando o olhar do dela.
"Não senhor", interviu Luke no mesmo instante. "Mulheres são como flores, gostam de ser tratadas com jeito e elegância." Não as mulheres que já conheci, ele pensou descaradamente. Em sua outra vida, as garotas que conhecera gostavam de tudo, mas sua gentileza não parecia ser lá um problema para elas. "Quando ela chegar, tente sorrir, ser doce..."
Sorrir? Havia tanto tempo que não fazia aquilo que nem se lembrava mais de como era. Ele, porém, tinha certeza que se tentasse ao menos esboçar um sorriso, seu rosto se transformaria na mais hedionda careta que alguém já vira.
Olhando para Samantha e Luke, que tagarelavam sobre como ele poderia fazer para que Beatrice se sentisse confortável perto dele, Adrien perguntou-se como havia se metido naquela conversa absurda com os dois criados.
"Eu não preciso agradá-la", ele rugiu, fazendo com que os dois se calassem. "Esse jantar foi ideia sua, Samantha, e somente sua." A mulher abriu a boca para dizer algo, mas ele a cortou. "Isso não passa de uma apresentação. Uma apresentação que nem precisaria estar acontecendo. Eu estou na minha casa, e se ela está presa aqui o azar é todo dela. Depois disto, acabou."
"Senhor", Luke começou com uma voz branda e cautelosa, como se ele estivesse tentando dialogar com um animal irracional. "Só pensávamos que seria bom o senhor e a garota se darem bem."
"Só Deus sabe por quanto tempo ela ficará aqui", apoiou Samantha, fitando-o tão diretamente que chegou a deixar Adrien desconfortável. "Não é demais tentar fazer com que ela se sinta bem-vinda. Além do mais, por mais que não queira admitir, seria bom que conhecesse uma nova pessoa. Está trancado aqui há dois anos, Adrien."
Ele não queria que as palavras causassem algum efeito nele, mas causaram e foi difícil se manter no controle.
"Eu estou muito bem", disse mais para eles do que para si mesmo, mas era óbvio que estava mentindo e todos ali sabiam disso. "Você não é minha mãe, Samantha, então não tente imaginar o que é melhor ou pior para mim, muito menos como tenho que agir." A mulher ficou em silêncio, aparentemente sem saber o que dizer. Adrien voltou os olhos também para Luke, que se encolheu ligeiramente ao encará-lo. "Tenho certeza que ambos têm tarefas a fazer antes de se deitarem, por isso, façam o enorme favor de sumirem da minha frente."
Samantha pareceu querer rebater, mas Luke deve ter percebido o perigo e puxou-lhe pela manga da blusa, fazendo com que o seguisse sem contestar.
Quando ficou sozinho na sala enorme, Adrien suspirou e permitiu-se esconder o rosto nas mãos em um claro gesto de fraqueza.
Luke, Howard e Samantha eram as únicas pessoas com quem Adrien mantinha, pelo menos um pouco, algum tipo de relação frágil. Mas nem mesmo eles conseguiam esconder completamente o que sentiam em relação ao patrão, assim como todos os outros.
Observando a lua brilhante pelas grandes janelas de vidro do outro lado da sala, Adrien Fletcher sabia que, para ele, era bem mais fácil afastar as pessoas do que mantê-las por perto.
Quando Beatrice fitou seu reflexo no espelho do banheiro, pensou que estava pelo menos apresentável.
Uma das peças de roupa que seu pai havia mandando trazer para ela era sua calça jeans preferida, além de um casaquinho e uma blusa escura de mangas compridas. Apesar de ser bem quente dentro da mansão, o frio era intenso e atravessava as paredes grossas. A temperatura com certeza estava bem abaixo de zero.
Pegando o celular no bolso da calça, Beatrice conferiu o horário.
Segundo Samantha, que havia passado ali mais uma vez ao longo do dia, alguém viria buscá-la para mostrar onde ficava a sala de jantar. Beatrice realmente não estava acostumada com aqueles modos tão requintados das pessoas ali. Desde quando alguém precisava de um acompanhante para mostrar onde iria jantar? Loucura.
Naquele instante o celular apitou, sinalizando uma mensagem de Eliza.
Como está por aí prisioneira? Tentando não enlouquecer por ficar sem trabalho? Sabe de uma coisa? Estou morrendo de inveja de você, pegando férias antecipadas. Por que não sou eu a perseguida por lobos?
Assim que terminou de ler, Beatrice soltou uma gargalhada. Eliza era mesmo impossível.
Ela estava pronta para responder a mensagem quando ouviu duas batidas suaves na porta. Guardando o celular no bolso, fez uma nota mental para bater papo com a amiga mais tarde, quando já estivesse na cama.
Quando abriu a porta, Beatrice deparou-se imediatamente com um senhor de cabelos negros e bigodes compridos, além de estar vestido a esmero e ter um sorrisinho no rosto.
"É um grande prazer finalmente conhecê-la, Srta. Morgan", ele disse com um sorriso caloroso. "Meu nome é Howard. Sou o chefe da criadagem."
"O prazer é meu", respondeu Bea também sorrindo, divertindo-se com a formalidade do homem. "Mas pode me chamar apenas de Beatrice."
"Como quiser", falou ele, os pequenos olhos castanhos simpáticos e gentis olhando diretamente para ela. "Vim acompanhá-la até a sala de jantar. Bem sabe que a casa é grande e pode se perder por aí."
Beatrice assentiu, fechando a porta do quarto atrás de si e seguindo o pequeno homem.
Enquanto caminhavam pelos extensos e aparentemente infinitos corredores da casa, Bea ficou impressionada com a quantidade de portas, janelas e riquezas que havia em toda parte. Sem dúvida, aquele lugar mais parecia um castelo.
"É realmente impressionante", disse Howard ao seu lado, percebendo seu espanto diante da arquitetura e decoração do lugar. "Seria uma honra acompanhá-la para um tour na casa um dia desses. Não que eu esteja me gabando, mas realmente sei tudo que há para saber sobre a mansão."
"Deve ter um enorme conhecimento então", comentou Beatrice, abrindo um sorriso. "É realmente uma casa grande."
Bea já tinha perdido a conta de quantos corredores e pequenos lances de escada tinha subido quando finalmente deparou-se com duas imensas portas duplas, abertas no fim de um corredor largo e comprido. A luz que saía da sala era dourada e forte, iluminado seu rosto sem que ao menos cruzasse as portas.
"Tenho coisas para ajeitar do terceiro andar, Beatrice", ela ouviu Howard dizer ao seu lado. "Pode entrar e ficar à vontade. O jantar está à mesa e Frederick já está a sua espera."
"Eu...", ela tentou objetar, por algum motivo nervosa com o pensamento de ser deixada sozinha ali.
"Caso tenha algum problema para voltar para seu quarto depois, basta mandar um criado me chamar que acompanharei a senhorita", ele certificou-se com seu sorriso e pose simpáticos. "Até mais."
Antes que Beatrice pudesse dizer mais alguma coisa, Howard desapareceu pelo corredor de onde eles tinham vindo, deixando-a sozinha. Ela engoliu em seco, de repente não tendo ideia do que fazer.
Passando as palmas suadas das mãos pela calça jeans, Beatrice respirou fundo e entrou na sala de jantar.
Quando o ambiente se abriu diante de si, Beatrice não conseguiu deixar de conter um arquejo de admiração. O lugar era mais bonito do que qualquer outra coisa que ela já tinha visto na vida.
Quatro enormes lustres de cristal pendiam do teto por toda a extensão da enorme sala, janelas enormes revelavam o céu noturno e as paisagens cobertas de neve ao longe, uma lareira enorme e antiga estava acesa do outro lado da sala, com as chamas douradas crepitando suavemente. E aquela mesa... Céus, ela era como aquelas de contos de fadas, onde um enorme banquete repousava e cadeiras e mais cadeiras de encosto alto se estendiam por toda sua extensão.
Beatrice sentia que poderia observar as belezas daquele lugar um dia inteiro sem se cansar, sentindo-se dentro de um livro que lera, porém, exatamente no momento em que observava a enorme mesa e o banquete que se encontrava nela, foi que se deu conta do homem sentado em sua outra extremidade, a alguns bons metros de distância de Beatrice.
Dias mais tarde, quando relembrasse sua reação ao ver Frederick Harris pela primeira vez, ela se sentiria um pouco envergonhada.
Beatrice era do tipo que não enxergava muito bem de longe, por isso sabia que um dia, mais cedo ou mais tarde, teria que consultar um oculista para se certificar que não era míope, então, de imediato, tudo que viu de Frederick Harris não passava de alguns traços indistintos. Ele realmente estava bem distante dela.
Enquanto se aproximava dele, cautelosa e não tendo ideia se deveria sorrir ou esperar chegar mais perto para cumprimentá-lo, sua visão foi se ajustando e ela começou a enxergar o rapaz com mais clareza.
Não foi como se Beatrice reparasse em todos os seus traços de uma só vez, na verdade, foi tomando o registro de seu rosto aos poucos.
A primeira coisa que lhe chamou completamente a atenção foi os cabelos de um vermelho vívido, ruivos como a cor do céu quando se põe no fim da tarde. Os fios eram levemente encaracolados e chegavam quase que aos ombros, em um estilo que a lembrou dos cavalheiros dos romances de época que lia. Em seguida, veio os olhos. Azuis como o céu límpido de verão, claros e incrivelmente duros, eles carregavam algo que Beatrice de imediato não conseguiu identificar.
Ela, então, já estava bem perto quando percebeu as cicatrizes. Não que não houvesse reparado algo estranho em seu rosto antes, mas de primeiro achou que seus olhos estavam lhe pregando alguma peça maldosa.
Mas não era peça nenhuma. Era real.
O lado esquerdo do rosto, quase toda a testa e maxilar de Frederick, era tomado por cicatrizes enormes, retorcidas e profundas. Eram como sulcos na pele, cortes enormes e aparentemente antigos. Uma das cicatrizes em particular, serpenteava tão perigosamente perto do olho esquerdo dele que fez um arrepio sinistro subir pela espinha de Beatrice. O cabelo, embora comprido, não conseguia esconder totalmente as marcas que lhe tomavam parte do pescoço, descendo e desaparecendo por baixo do casaco que ele vestia.
A pele, sem dúvida, estava desfigurada, transformando seu rosto em algo que Bea nunca havia visto, recortando a pele de um jeito quase nauseante.
Claro que Beatrice não tomou nota de tudo àquilo quando finalmente enxergou com clareza o rosto de Frederick Harris, na verdade, seu cérebro meio que pareceu registrar tudo em uma fração de segundo, e sem que ela percebesse, um arquejo involuntário escapou de seus lábios, e o tempo, que parecia ter transcorrido em câmera lenta desde que ela andara na direção dele, voltou ao normal.
Ela deve ter ficado parada ali, a três cadeiras de distância dele, durante bons segundos. Segundos suficientes para que, depois que ela tomasse consciência do modo absurdo como agira, desejasse se jogar da janela mais próxima.
"É muito bom conhecê-la finalmente", a voz grossa de Frederick disse, antes que ela pensasse em algo para consertar aquela situação constrangedora. "Pode ficar à vontade, Beatrice."
A menção ao seu nome pareceu fazer com que seu cérebro descongelasse. Murmurando algo que nem ela mesma conseguiu identificar, Bea avançou uma cadeira e se sentou, considerando que havia um espaço respeitável entre os dois.
"Acho que devo pedir desculpas por não ter conseguido vê-la antes", ele disse quando ela se sentou, os olhos azuis encarando-a sem recuar. Sua expressão mais parecia pedra, sem demonstrar qualquer emoção. "Estive ocupado."
Beatrice ficou em silêncio, ainda meio que sem saber como agir diante dele.
Ela fitou suas próprias mãos, pousadas no colo, remexendo-se no assento perfeitamente confortável da cadeira.
"Tudo bem", ela respondeu. "Eu... entendo."
Na verdade não entendia não, e bem queria falar aquilo para ele.
Antes que algum dos dois falasse mais alguma coisa, criados pareceram surgir como que por magia, carregando pratos e servindo tanto Beatrice quando Frederick.
Antes que ela pudesse dizer que poderia muito bem se servir sozinha - como todas as pessoas normais - já havia um enorme prato fumegante à sua frente, parecendo tão saboroso e com um cheiro tão inebriante, que a única coisa que pareceu importar naquele momento foi a comida.
"Suponho que já saiba que ficará conosco por algum tempo", ela escutou Frederick dizer, depois de provar um pouco da carne que havia em seu prato.
"Bem, sim, é o que parece", ela respondeu. Assim de perto, Bea percebeu o quanto Frederick era jovem. Seus traços, apesar do campo de guerra que havia se tornado boa parte do seu rosto, eram bastante atraentes dependendo do modo como se olhava. "A nevasca só está piorando."
"O inverno veio forte esse ano", ele disse, e Beatrice sentiu que nenhum dos dois parecia ter muito a dizer. "Enquanto estiver aqui, saiba que qualquer coisa que precise os criados vão atendê-la", ele continuou, parecendo tão inexpressivo e rígido que Bea o comparou com uma estátua de mármore. "Pode ir aonde quiser na casa também, exceto a ala oeste."
Beatrice voltou os olhos para ele, sua curiosidade costumeira florescendo.
"O que tem lá?"
Frederick encarou-a, as cicatrizes próximas à boca se repuxando quando ele cerrou o maxilar.
"Simplesmente é proibida."
Beatrice ergueu uma sobrancelha involuntariamente. Agora sim estava curiosa, embora bastante irritada com o modo de agir daquele cara. Ele tinha uma postura tão prepotente e arrogante que ela se pegou apenas engolindo o jantar sem saboreá-lo, desejando sair logo dali.
"Como não tive a... oportunidade de falar com você antes", começou Beatrice, fitando o prato a sua frente e forçando-se a ser pelo menos um pouco mais educada que ele, "não pude agradecer por ter permitido que ficasse aqui, além de ter chamado meu pai e Dr. Davey."
"Bem, não havia muito que eu pudesse fazer, não é?", ele disse, nem se preocupando em olhar para ela. "De algum modo conseguiu ser perseguida por lobos e sofrer uma concussão cerebral. Certamente não lhe deixaria ao meu portão para morrer congelada."
Beatrice largou o garfo e a faca, olhando para Frederick boquiaberta.
Ele, por sua vez, soube que havia dito algo errado pela expressão no rosto dela.
"Obrigada pela sensibilidade", falou Beatrice, mal conseguindo acreditar nas palavras dele.
"Não sou alguém realmente sensível", respondeu, sem se deixar abalar. Mulheres eram difíceis como o pior tipo de criatura selvagem, todas elas.
"É mesmo?", perguntou a garota com sarcasmo, cruzando os braços na frente do corpo. "Eu nem percebi. Quer dizer, não que a sua total falta de cortesia não tenha ficado clara nessa última semana, quando fiquei naquele quarto acreditando ser completamente indesejada por você aqui, já que nem se deu o trabalho de se apresentar."
Mas você realmente não é desejada aqui, pensou Adrien, olhando para a garota como se tivesse levado um tapa. Como ela tinha coragem de falar daquele jeito com ele quando na verdade não tinha dito nada demais?
"Se sou assim tão descortês, antes tivesse deixado com que os lobos fizessem picadinho de você", respondeu ele com acidez, que bem sabia rebater palavras que o desagradavam.
Beatrice, mesmo que sem querer, deixou cair o queixo quando ouviu aquilo. Aquele patife! Como se atrevia?!
"Talvez seja melhor virar comida de lobo do que aguentar sua grosseria sem tamanho!", rebateu Bea, a voz aumentando em um nível que ela própria não gostava.
"Se está tão incomodada assim com a minha grosseria", devolveu Adrien, agora quase no mesmo tom de voz que o dela, "por que simplesmente não vai embora?"
"Eu iria se pudesse", ela rebateu, empurrando a cadeira para trás e levantando-se desajeitadamente. "Mas pelo visto estou aqui presa com um homem que mais parece uma criança!"
"Você não...", Adrien já estava se levantando também, sem saber como reagir. Ninguém nunca havia falado daquele jeito com ele.
Beatrice, porém, já estava saindo da sala, pisando forte e sentindo mais raiva do que julgava normal para o seu temperamento.
"Não pode sair desse jeito!", Adrien quase gritou, determinado a não deixá-la dar a última palavra. "Ainda nem acabou seu jantar."
Beatrice se voltou para ele, soltando uma gargalhada que fez a fúria de Adrien arder mais um pouco.
"Eu preferiria dividir a mesa com um ogro do que com você Frederick Harris!", soltou ela, os olhos castanhos tempestuosos. "Talvez, quando aprender um pouco sobre boas maneiras, eu pense no caso."
Ela então saiu marchando da sala, deixando Adrien Fletcher furioso.
Maravilha, pensou, ao se sentar de volta na cadeira e arremessar um copo de vidro para o outro lado da sala, se meu rosto já a assusta, meus modos parecerem ser tão terríveis quanto.
E saindo da sala de jantar segundos depois, ele caminhou furiosamente até a ala oeste, deparando-se com Samantha, Luke e Howard no caminho, que o olharam com tanto assombro e medo que nem se atreveram a pará-lo.
Quando bateu a porta de seu quarto com toda a força que tinha, teve certeza que, dois andares abaixo, Beatrice Morgan havia escutado.
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Hello galera! Sei que atrasei super essa capítulo, mas está aqui <3
Estou MUITO, MUITO mesmo, curiosa para saber a opinião de vocês sobre esse capítulo! Vou amar ler e responder todos os comentários!
O que acharam desse primeiro encontro dos protagonistas? Contem tudo! hahaha
Também não se esqueçam das estrelinhas, que são super importantes para o crescimento do livro. Aliás, obrigada pelos 1K de leituras! Rumo aos 2K hein <3
Muitos e muitos beijos,
Ceci.
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