1. Lápide
Afastei a lembrança de quando vi Kareno pela primeira vez e continuei a trançar o circulo feito de folhas longas. Por algum motivo eu tinha que fazer aquilo, mesmo ali, naquele pequeno pedaço de bosque ao lado do lago rosado do reino de Rubi.
Eu tinha que fazer algo, já que eu não podia entrar a força no castelo de ouro e exigir o corpo de Kareno de volta, já que não poderia destruir a garganta do filho da puta da névoa assim como ele tinha feito com o grande mago.
Não ainda. Primeiro eu tinha que descobrir como derrotá-lo.
Quando terminei de enlaçar o círculo, prendi-o a um galho robusto da árvore grande que tinha escolhido. Nada mais apropriado para um mago que tinha magia natural como sua especialidade, que preferiu viver grande parte da sua vida recluso, nas mais distantes florestas e bosques dos cinco reinos.
O caminho do destino é circular, Ailin, lembre-se disso.
Peguei uma pequena faca que trouxera especialmente para isso, e cravei as iniciais do mago na madeira escurecida do galho. E esperei, encarando aquele pequeno circulo de folhas ao lado das letras MK. Esperei que meu cérebro pudesse pensar em algo para dizer. Esperei que a sensação estranha em minha garganta deixasse que eu falasse sem engasgar.
O vento frio soprou por entre as árvores, bagunçando levemente meu cabelo cada dia maior. Dei um suspiro longo e abaixei a cabeça, encarando o chão de terra avermelhada, apenas para voltar meu olhar para a lápide improvisada que não guardava nenhum corpo.
— Obrigada. — Foi tudo que pude pensar em dizer antes de dar meia volta, em direção ao castelo, de onde tinha me esforçado para sair despercebida.
Modesh devia estar longe, caçando, ou dormindo em alguma caverna nas montas ao leste. O castelo de Rubi não tinha proteções como a academia de dragões da madeira tinha, deixando o dourado livre para ir tão longe quanto ele desejava ir.
Nossa ligação ainda era sua prisão, me lembrei, mas agora tínhamos um objetivo comum. Modesh parecia odiar tanto quanto eu tudo que vinha da névoa e seu campeão. Uma raiva em comum.
Quando estava quase nos limites do castelo ouvi dois pés rápidos se aproximarem, eu tinha ficado longe por tempo suficiente, faltando a apresentação que a rainha tinha ordenado que me fizessem sobre os costumes do Reino e meus afazeres como Herdeira.
Minha corte de fracassados não precisou que eu pedisse duas vezes quando os fiz me deixar em paz e voltar para o que quer que eles costumavam fazer por ali. Para maioria deles, bebedeiras e banquetes.
— Herdeira. — Uma mulher mais velha falou, fazendo uma mesura complicada. Minhas sobrancelhas se arquearam. — Meu nome é Helgan, sou a assistente que mandaram para te ajudar com as tarefas de sua posição.
— Está dispensada. — Falei sem rodeios. Retomando meu caminho até o castelo.
A mulher apertou os lábios, e quando se afastei limpou a garganta para chamar minha atenção.
— O que foi? — Perguntei, me virando mais uma vez para ela.
— A Rainha mencionou que podia dizer isso. — A mulher de cabelos curtos e negros falou. Uma trança bonita e elaborada combinada com tecidos verdes adornava o lado direito de sua cabeça. — Seu próximo encontro é com ela. E já está atrasada.
Xinguei baixinho. Eu devia reconhecer que a Rainha de Rubi era inteligente, apesar de extremamente ardilosa. Ela tinha o que eu precisava, o diário de Alintanie, a antiga general que conseguiu finalmente acabar com os dias de terror e derrubar o Campeão da Névoa, a primeira Rainha de Rubi. A rainha estava disposta a me entregar o tesouro mais bem guardado de seu reino, e em troca, eu precisava descobrir quem estava matando seus preciosos herdeiros.
Estava mais do que claro que era um trabalho de alguém de dentro.
Pelo que eu já tinha descoberto, dois herdeiros tinham sido mortos, ambos já tinham sido substituídos mesmo antes de minha chegada. E um dia antes da missão ser dada a mim, a primeira herdeira, e favorita da rainha, Nira, tinha sido empurrada do topo de uma das escadas do castelo, por alguém que não viu o rosto.
Segui silenciosamente Helgan pelos corredores do castelo, alguns deles, mesmo depois de um dia naquele lugar, que eu ainda não tinha conhecido.
Ela me levou para um lado diferente do castelo, menos adornado e brilhante, quando passamos um portal de madeira clara por entre dois guardas fortemente armados e equipados com armaduras prateadas, me surpreendi. Parecia outro lugar. Em nenhum lado se via as cortinas pesadas vermelhas de veludo que adornavam os salões do castelo. Tudo ali era mais simples, mas não deixava de ser extremamente bem decorado.
— Toda essa ala é privativa da Rainha. — Helgan informou. — Poucos podem vir aqui.
Paramos na frente de uma porta grande e pesada, da mesma cor clara do portal que tinha visto anteriormente. Ela se abriu devagar e eu entrei.
Para minha surpresa minha corte já estava lá, e nenhum deles parecia muito feliz com isso.
— Já falei o que tinha para falar com vocês. — A Rainha falou severa, seu tom de voz cortante como uma faca afiada. — Sabem as consequências do comportamento que estão tendo, o que isso pode trazer para vocês e suas famílias.
Continuei calada até que a rainha terminasse com eles.
— Fizeram um juramento, se ela se machucar sabem o que a magia fará com vocês.
Senti o olhar profundo de Davos quando ele me lançou uma rápida encarada pelo canto do olho. Eles me odiavam. E eu não podia me importar menos.
— Esperem lá fora. E não deixem que eu os pegue descumprindo seus deverem mais uma vez. —Ela terminou, e os quatro assentiram rígidos.
Kiram não estava lá. Ele era um príncipe da madeira depois de tudo, e não tinha feito qualquer juramento. Assim que minha corte saiu, a rainha dispensou Helgan com um abano de mãos, e seus olhos caíram sobre mim.
— Lorilae. — Chamou meu nome. — Se aproxime.
— Serei breve com você, as notícias do que está acontecendo no reino de ouro chegaram até mim. E logo mais, todos aqui vão saber. Estamos na iminência da guerra e eu sei exatamente porque quer o diário. — A rainha falou. — Não vai conseguir matá-lo, por melhor guerreira que seja, não conheço ninguém que possa ir contra a magia que Ailintanie descreve. E tudo sobre seu destino é tão complexo, que nem ao menos sei o que minha visões tentam me dizer sobre você.
Eu me mexi, desconfortável.
— Sou eu que faço meu destino. — Resmunguei. — Eu decido se vou matá-lo ou não.
A rainha curvou os lábios em um curto sorriso.
— Por que quer isso? — Ela perguntou. — O campeão, por que quer matá-lo?
Não respondi.
— Eu investiguei de onde veio, assim que a Ursa avisou o castelo que a cavaleira do ultimo dourado selvagem estava no reino de Rubi. — Ela continuou. — Chegou no reino da madeira de uma forma inexplicável vestida como homem, vinda das terras sem lei, acompanhada de um príncipe e montando Modesh. Foi acusada de assassinato de um jovem que sempre foi conhecido por seu sadismo, e principalmente, era próxima de Moreale Kareno, o grande mago frio e calculista, parecia tratá-la como família.
— Se já sabia de tudo, porque está me fazendo perder tempo aqui para responder? — Irrompi, arrancando um olhar surpreso da Rainha.
— Mas não é tudo, não é?
Estralei os dedos impaciente. Não tinha paciência para esse tipo de joguinho.
— De onde exatamente você surgiu?
Não sabiam quem eu tinha sido antes de ser a Cavaleira de Modesh,
— O que exatamente você vai fazer?
Não sabiam do que eu era capaz.
Quantos eu já tinha matado.
— Quem exatamente você é?
Eu era Ailin, o assassino de Racon.
Eu era Lorilae, a cavaleira de Modesh.
E agora uma Herdeira de Rubi.
— Não espero que responda essas perguntas, mas preciso que me responda apenas isso: Por que você, sem reino, sem família, sem o que proteger, quer se meter na guerra dos reinos, quer se meter com a própria incarnação do caos?
A imagem do corpo de Kareno veio a minha cabeça, seu pescoço destroçado enquanto o campeão pisava sobre ele como se fosse apenas um tapete alto demais.
— Vingança. — Respondi sincera, e a rainha assentiu.
— Moreale Kareno era um homem formidável. Estou ansiosa para ver o que ele viu em você. — Ela respondeu, e então depois de uma pausa, continuou. — Vou manter minha palavra sobre o diário, desde que mantenha a sua sobre os assassinatos. Mal chegou e já está levantando algumas suspeitas, sua corte não deve sair de seu lado, deve cumprir as obrigações de herdeira, se quiser que os demais te aceitem, e confiem em você. Se não se misturar, vão desconfiar, e não vai conseguir seu objetivo. Treine sua corte para os jogos que se aproximam, vá até as lições, escolha suas vocações, cuide de sua porção. É o mínimo que se espera de uma herdeira.
— Porção? — Perguntei.
— Nada com que deve se preocupar muito. Helgan vai te explicar depois.
Por mais que eu odiasse a ideia, ela estava certa. Eu precisava do diário, rápido, então tinha que descobrir quem era o assassino.
— Vou seguir seus costumes. Vou achar quem está matando seus herdeiros. — Falei por fim, e a rainha deu um sorriso satisfeito.
Sem dizer qualquer palavra eu sai do cômodo, apenas para encontrar os rostos furiosos da minha corte. Meu plano era simples, eu iria me tornar a melhor entre eles. Me destacar, e chamar a atenção de quem quer que estivesse matando os herdeiros.
— Acabou a vida boa. — Anunciei para eles. — Pelo visto, tenho algumas semanas para tornar vocês a melhor corte de todas.
Estalei os lábios analisando cada um deles. Tinha muito o que fazer.
Virei-me para sair pelo portal, quando vi o príncipe passar pelos soldados robustos que guardavam o lugar. Seus olho se conectaram com os meus e ele sorriu, assim como eu tinha o visto fazer tantas vezes. Estava prestes a deixar meus lábios me trairem quando uma voz rouca irrompeu em minha mente.
Lorilae. Modesh me chamou.
Acordou? Pensei que ficaria o dia todo dormindo.
Se meus olhos estão fechados ou abertos, Lorilae, não é algo que te diz respeito.
Eu ri.
Se temos que ganhar os jogos das cortes. Ele falou. Vamos ter que trabalhar com os dragões.
— Chamem seus dragões. — Minha voz saiu autoritária, mas sarcástica. — Vamos ver o que podem fazer.
Estou ansioso. Modesh tornou a falar, sua voz entediada e irônica.
Olá pessoas maravilhosas! Finalmente Modesh e Lorilae voltaram para sua rotina!
O que acharam desse capítulo? E oq esperam para os próximos?
Ahh. E estou publicando um livro fisicamente, e se der certo A Manipuladroa do Caos, tem muito mais chances de esse aqui ser publicado, então já deixo meu pedido, para que apoiem essa publicação comprando um livrinho e espalhando para o máximo de pessoas possível!
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