23. Confronto

Nós éramos sozinhos.

Crescemos sozinhos, sorrimos e rimos sozinhos por tantas noites, mesmo que você tivesse Charlie e eu Tânia, você entende o que é um mal silêncio. Sempre entendeu.

O medo, a angústia de ter um mundo de confusão e vazio preso na garganta. Às vezes, é preciso saber conter o grito, às vezes, é preciso quebrar algumas linhas. Eu pessoalmente sempre fui péssimo com o segundo.

Você lembra, não é? Foram dias estranhos para nós dois, e sim, agora eu confesso o quanto fui cruel.

Desculpe. Não era imaturidade, era uma forma de engolir todas as palavras na esperança de simplesmente implodir. Então, não havia a mínima chance de eu atender as suas investidas.

E mesmo que tivesse levando a cadeira, jogado as cartas na mesa e sequer olhado nos seus olhos, você obviamente não iria me deixar fugir tão facilmente.

Não tinha nada a dizer, nada que valesse a pena. A máscara cai, eu saio de cena. Esse era o plano. Você era inteligente, eu esperava que entendesse isso também. Mas não. Não, você não iria facilitar, afinal.

Alguma vez antes, diante de seus olhos, eu havia mostrado tanto de mim mesmo? Até aquele momento?Mesmo que hipnotizado, enraivecido e ... Sem intenção nenhuma de deixar você chegar ao ponto que chegou, de me deixar caminhar até o fim da corda bamba. O vinho das mentiras havia me arrancado uma verdade moribunda, porém renascida do túmulo num suspiro intenso.

Mesmo depois que o gosto de vinho se dissolveu nos lábios, pensei que ainda estivesse sonhando.

De alguma forma sempre soube que o retorno daquela relíquia não trazia bons presságios, por causa daquelas últimas semanas, eu mudei um tanto que repentinamente meus cursos, como um criminoso, fugindo de sua própria consciência.

Algumas das minhas atitudes podem ter assustado um pouco Tânia, me lembro de seu olhar firme, atrás do balcão, mesmo que ela não tivesse entendido de primeira que eu estava fugindo... Ela viu através do cansaço, só olhar vago e da irritabilidade, não apenas que estava fugindo, mas também, meio que obviamente de você. Eu não precisei dizer uma única palavra.

No segundo dia, lembro que a chuva forte me deu uma boa desculpa para ignorar a galeria mais uma vez, esticava os dedos no piano, melancólico e se gostasse de beber, provavelmente teria aberto algo forte para combinar com tanta melação, ela me observou a distância, com um olhar divertido, sentou do meu lado e disse simplesmente "Foi mais tarde do que imaginei."

E convenhamos, se tivéssemos brigado, ela estaria certa. E sobre o beijo... De alguma forma, estaria certa também. Naquele momento, não acho que entendi por completo a ironia da afirmação.

Pouco depois passei alguns dias no meu velho apartamento. Não havia nada de muito suspeito nas minhas ações. Só queria um tempo. Não foi de todo uma fuga, poderia considerar com um fôlego, o ar perdido ou mal absorvido, uma pequena pausa para me reconstruir.

Seria ótimo ter conseguido relaxar tão bem quanto queria, mesmo que houvessem aqueles momentos de reflexão, ainda não conseguia esquecer. É obvio. Guardara na minha mente, tão claro, tão lúcido, que o relaxamento se esvaía para voltar a fuga num piscar de olhos.

Ali estava eu, sentado novamente numa mesa abastada, sozinho como um bêbado desolado num balcão de bar. Vejo Joe chegar, deixando as malas pelos cantos, uma bagunça organizada, os sapatos espalhados no quarto. Encaro seus olhos sentindo um frio mais psicológico do que físico. Poucas coisas poderiam me fazer sentir assim naquela época, estava pálido, comentou, despejando um beijo na minha bochecha e começando uma história de como reencontrar seus professores era tão exaustivo.

Precisava de um ar, um ar diferente do meu, claro, e tentei não ir muito afundo em porquê não poderia ficar até o fim da noite, mas ela não perguntou, Joe facilmente se distraia com a própria voz aqueles dias, o que podia ser bom.

Chamou todos para um jantar, era essa sua ideia de "pegar um ar", e também poder usar sua nova coleção de vestidos, o que seria seu assunto principal por muitas noites que se seguiriam dali.

Em meio a seus ouvintes exaltados, observo ela se inclinar, ali sentado no canto, quase tão digno de pena quanto o estado da minha roupa, deveria ter trocado a camisa manchada de tinta, e os olhares seriam um bom incentivo, mas eu estava um caco, feliz por não precisar manter a conversa geral, mas intrigado com seus olhos na minha direção e, andando vagarosamente, ela sorri fino, pondo um cigarro nos lábios e acenando.

Só que não era pra mim que ela estava olhando. E sabendo disso, engraçado lindo em seco com seu objetivo e o que ela nunca notara dos meus, num soluço de susto, quase levantei.

Covarde e estagnado, só consegui inclinar-me discretamente e, no reflexo da janela, ter a certeza que era realmente ele. Porém não havia porque temer algo, afinal, Patrick sequer me vira. Estava distraído, risonho e saltitante, com sua companhia. Nossa velha conhecida, Mercedes.

Na época eu não fazia ideia de como eles se reencontraram. Joe citara posteriormente que ela estaria num hotel próximo, então não estavam mais juntos, mas o que ela realmente significava para Patrick naquele momento, depois do quase casamento, eu ignorava.

Mas depois de certa observação, não foi muito difícil de perceber.

Apenas a maneira como seus risos se entrecortavam graciosamente, cheios de olhares silenciosos, dedos sobre a mesa, luvas retiradas e toques indiscretos, também era fácil notar o quanto a atriz notava os olhares alheios, entre cautelosa e absorvendo a atenção, supus que antes, ele fez rodeios desnecessários porque aquele relacionamento seria tão inconstante quanto sempre foi.

Durante toda aquela noite eles tiveram inteiramente a atenção do outro. Nunca chegamos a conversar mais que algumas frases soltas, mas ao contrário do que Patrick pensaria, não desgostei dela por completo. Quero dizer, ela era uma mulher bem única. E apesar de serem muito semelhantes em vários aspectos, algo nela também os diferenciava por completo, talvez a teatralidade dos gestos ou a indiscrição que chegava a ultrapassar a dele, não sabia bem o que exatamente.

Não durou mais que alguns minutos, era estranho estar e não estar ali ao mesmo tempo, mesmo que fosse escolha minha. Então, me despedindo discretamente, eu saí das sombras e finalmente me retirei. Sem me preocupar se ele não me vira, ou se me vira e ignorara, não queria saber e nem ter mais o que pensar.

Pode soar dramático, mas depois daquela noite eu sinceramente desejei que ele fosse embora. Sem despedidas melosas, sem presentes de consolação. Lembro de caminhar pelas ruas até o apartamento, carrancudo e pensativo, tentando distinguir até que ponto eu poderia decidir ser indiferente, e onde isso se distinguia de insensível.

Era verdade que eu jamais conseguiria me desligar de Patrick, e que também sabia muito bem que o momento em que precisaria voltar a falar com ele chegaria em breve. Mas também ficaria feliz se demorasse o máximo possível.

Não queria que pensassem que Patrick havia feito algo de errado. Uma outra boa razão para não ter de fingir uma interação normal em meio a tanta gente, eu jamais conseguiria fingir isso, e longe de estranho soaria mais grosseiro do que jamais fora em outro momento. Foi quando me recordei da conversa com Tânia, Não demore a pedir desculpas, por favor. Foi o último conselho que ela me deu sobre o assunto.

Diante do empasse, pensei no passado e como não era uma situação tão anormal me ver impossibilitado de abrir aquela porta. Estava bem trancada até ali, e também não estava. Se eu era ruim em finalizar coisas, então por que todos aqueles quadros estavam agora pendurados nas minhas paredes?

É porque fui incapaz de deixá-los estirados pelos cantos, sabendo o que é preciso fazer. E raramente estive a mercê da indecisão quando fui eu quem iniciou o incêndio.

Mas bem, ainda não havia nada que quisesse dizer, só queria acabar com aquilo para aliviar o peso dos meus ombros.

A verdade é que além da hesitação, precisava de alguma certeza. Tudo doía, cada canto do meu corpo parecia não descansar a meses, eu achava que nada poderia ficar pior.

Até agora, falamos somente da chuva. Não se assustem, pois a tempestade trará, daqui pra frente, junto da limpeza da paisagem, com folhas e troncos de árvores, um pouco de esclarecimento, após a revelação.

Agora que fugir já não era mais uma opção, pois até mesmo meu próprio corpo rejeitava aquele outro curso, certo dia acordava sobressaltado, de um sonho, chuvosos como a minha próxima realidade. Pois foi, como num destino zombeteiro, numa noite de chuva que a tempestade metafórica se anunciou.

Voltei a galeria. Não havia nada de diferente, nem mesmo um grão de poeira fora do lugar. Passei a tarde revirando gavetas, desembainhando espadas velhas como um ferreiro nostálgico. Podia ser nostalgia ou apenas mais uma procura vã de alguma luz dentro de mim mesmo.

Mesmo que minha mente estivesse a mais pura bagunça, no fim daquele dia, estava vazio. Calmo e estranhamente linear.

Caminhei sem pensamentos, sem guarda-chuvas, sem entender porquê o ignorei tanto para então ir a sua procura. Acho que só odiava a imagem de Patrick achando que tinha que se desculpar por alguma coisa.

A chuva caia para me banhar da melancolia adequada.

Molhado.

Completamente molhado em frente aquele apartamento. Nuvens carregadas pareciam me perseguir pelo caminho, que ainda hesitante segui.

Enquanto atravessava aquela rua tão a mim conhecida, sentindo a tempestade se intensificar, odiando a sensação da roupa grudando na pele, ainda assim, meus pés pareciam ter vida própria, não me ouviam.

Só... estava ali.

Trêmulo e pensando em uma forma de disfarçar o quanto estava nervoso.

Falhando miseravelmente.

Mesmo já totalmente entregue, diante de sua porta, eu cai. Num tombo rápido demais para se evitar.

Se aquela voz tivesse se demorado só uns dois minutos, míseros dois minutos, eu ainda teria um pouco mais de tempo para dar ouvido a minha hesitação, mas ele já estava ali.

Talvez estivesse ali todo aquele tempo, com o passar dos dias, vendo aquele sujeito estranho de sobretudo preto andando pelo apartamento velho, limpando os móveis lustrados três vezes ao dia, apertando as têmporas em frente a mesma tela porque não consegue se concentrar em nada além de um vinho desgraçado e um par de olhos azuis assustadores, agora parado, no meio da chuva, em frente a sua porta, totalmente esquisito.

Só mais um minuto. Um minuto e eu teria recuado.

__ Entre.__ Foi só o que disse. Foi só o que precisou dizer.

Mas em seus olhos li: "Ou você vai recuar novamente?". Escorado em frente ao portão, com as mãos cruzadas em frente ao torço.

Devo ter engolido em seco, desviado os olhos, quase deixando a coragem esvair num suspiro gelado.

O segui pelas escadas em silêncio, encarando aquelas costas enquanto respondia mentalmente. "Sim, eu pretendia." Sorri amargamente com aquele pensamento. Afinal, eu já estava lá, não havia mais saída visível. Novamente, debaixo da chuva, porém, dessa vez com as mãos vazias. A única coisa que eu pretendia entregar-lhe eram palavras, ele por outro lado, tinha muitas. Dentre elas uma toalha e um café.

Cordialidade, hm? É claro que tínhamos de começar assim. Apesar de estarmos de pé, frente a frente, tão distantes naquela sala, impregnada do cheiro de um cigarro recente, sem sequer nos tocarmos, no instante em que entrei por aquela porta eu soube que estávamos nos invadindo. Bem convencionalmente, até.

Conversas vagas, sorrisos vagos. Patrick, eu ainda me surpreendo com o quão indiferente você parecia ser.

Medo? Sim, eu estava morrendo de medo, você sabe. As mãos tremendo, a garganta seca, isso nunca passou despercebido por você; o medo que eu tinha de tocar você novamente.

Recuar um passo, ocupar as mãos com aquela xícara de café, escondendo o rosto entre os fios molhados da minha franja, escorar as costas na parede oposta de você. Te disse, ainda aquela noite, o quanto eu era covarde. Além de todo o resto.

Não foi nossa conversa mais saudável.

Eu te culpei, te insultei, feri-te com graça. Afinal, ao meu ver, se você não tivesse voltado, nada daquilo precisava ter acontecido. Eu não precisaria fugir de novo, e muito menos me ver num canto sem saída. Não precisaria ter de te dizer qualquer coisa. Antes mesmo de mentir e me enganar, antes de conhecer você, eu não estava disposto a abrir tanto aquela janela, justamente porque aquela luz toda só.. iria me cegar. "Egoísta, você é só um egoísta". Lembra? Eu disse que você só se preocupava em viver à própria sombra.

Enquanto agarrava-se no meu ombro, hipócrita, fingindo que precisava de mim para alguma coisa. Você sempre esteve bem sozinho, jamais saberia o que é duvidar de si mesmo por outra pessoa. Olhando-se sempre no espelho, sem coragem de entender verdadeiramente qualquer um ao seu redor. Sempre indo e vindo, sem se preocupar com quem está sendo arrastado nas suas costas. Um puta egoísta. É isso que você quer ouvir? É essa a verdade? É isso que quer dizer quando pergunta o que há comigo? Cretino. Você é um cretino hipócrita.

Não preciso de você, você não significa nada pra mim, tudo o que nos importou uma vez ficou no passado. Você não pode reviver o passado só porque quer. Nunca se preocupou com nós dois, só o que queria era alguém para pôr acima dos outros, mas nunca ao seu lado.

Egoísta, egoísta, egoísta, egoísta!

Puxei teu colarinho e não desviei os olhos uma vez sequer. Gritei a todos pulmões, já sem me preocupar com o quão patético minha voz soava, ou até que grau a chuva cobriria aquelas palavras.

Rouco e satisfeito, o rosto tão úmido mesmo tremendo de frio... Estava feito. Eu conseguira, em mais de vinte anos, machucar-te, e pra falar a verdade, eu ainda acreditava naquelas palavras. Claro, o que eu disse em seguida foi o que mais importou.

Em algum ponto mal conseguia enxergar o seu rosto. Sem óculos, os olhos lacrimejando, ardia focar em algo, o peito subia com tanta força que podia cuspir meus pulmões fora.

Por isso que parei e respirei, tentando não soluçar, caminhando pela sala, procurando no assoalho as palavras certas pra arrancar os resquícios. Patrick, que expressão você fez quando eu dei de costas? Tenho certeza que não chorou. Apesar de que me viu claramente chorando.

Eu havia esmagado a sua fantasia. Fiz você ver com os próprios olhos o desgraçado que eu me tornei e o filho da puta que sempre fui.

Aqueles dias de leveza e perseguições finalmente acabariam, não haveria mais falatórios irritantes ou visitas inconvenientes, medos estranhos e repentinos arrepios, tudo o que te rodeava e que já se tornava parte da minha vida, acabaria. Estava bem se fosse assim, afinal, não precisavam haver mais mentiras. Mas... é claro, nos conhecendo como conhecia, eu sabia que precisava desatar outro nó. cego, muito cego, e há muito tempo.

Amigos? Não... nós nunca fomos amigos.

Nunca. Nunca. Nunca...

Eu jamais vi você como um.

E Patrick, nunca antes ou depois eu veria tal expressão em seu rosto.

O seu silêncio chegava a esmagar todos os meus ossos por dentro, e seu olhar arrancava-me palavras que eu sequer lembrava que ainda estavam ali, enterradas naquela árvore, distante de todas as outras.

Quando já não podia suportar aquele vão me afundando, na mesma medida que algo desafogava em algum lugar em mim, entre o estômago e a garganta, me virei, escondendo em vão o rosto vermelho, fungando pela chuva e pelo pranto, disse-lhe que aquilo era tudo, não havia mais nada a lhe dizer.

Ia puxando meu casaco, que estirado sobre a cadeira ainda molhado deixara uma poça no chão. Não que eu ligasse, na verdade nem sequer via. Não via nada. Nem a porta, a janela respingada de chuva, ou o rosto de uma das pessoas mais importantes da minha vida após destruir seu coração.

Apenas me virei e andei, exaurido, trôpego, vazio.

Então Patrick me jogou um último enigma.

Quase não ouvira sua voz, mas tive certeza que eram desculpas.

O que você quer que eu desculpe? Cuspi, sequer me virei para olhá-lo. Aquilo já doía o suficiente e toda a minha coragem já havia se extinguido nas primeiras palavras. Só queria que acabasse.

__Tudo. Me perdoe por tudo.

Não pensem que Patrick realmente entendera o que eu disse. É claro, ele pegou bem a parte em que ele era um egoísta e que pintara algo que apenas ele via em mim, mas eu já devia saber, que mesmo praticamente dizendo que o odiava, ele não me odiaria de volta. "Não me peça para ir embora", é uma frase bem forte, não é? Eu também achei, apelativa. Afinal, era justamente aquilo que eu mais esperava que ele fizesse. Não havia pior frase para ajudar a repor as forças após meu discurso acusador.

Ele deveria me odiar. Era fácil imaginar mil motivos para que alguém queira permanecer ao seu lado mesmo após você insultá-lo tanto, mas Patrick... ele sequer cogitava que eu estivesse errado.

Havia dito que ele não me conhecia, e por isso ele queria compreender. Queria entender o meu sofrimento. Quando perguntei se ele não se importava com alguém que nunca o vira como amigo estando do seu lado, ele disse sem hesitar, que não. Eu não me importo.

Se não se importava com o possível fato de desejá-lo naquele mesmo segundo. Não. Eu não me importo.

Quando seu oponente é Patrick Kennedy é preciso de grandes reservas de respostas. Já deveria ter aprendido.

Mas eu me importo, Patrick. Me magoa, finalizei, saber que nada do que me aflige importa pra você. E essa foi minha deixa.

Sai, praticamente correndo naquelas escadas. Sem dar tempo para que ele me alcançasse. Ele nunca ia atrás. Nunca ia atrás de ninguém. Não precisaria mais vê-lo e nunca mais na minha vida eu seria capaz de dizer algo tão cruel novamente, então... só torci pra que ele não me alcançasse.

Sim, como vocês podem imaginar, ele foi atrás de mim. Puxou o meu braço e olhou-me tão fundo nos olhos que achei que meu coração iria parar.

_Não foi o que eu disse, Jony... não foi..__ falou, ofegante, confuso e perto demais __ Você é importante... muito importante. Eu quero que você seja feliz. Me odiando ou não, eu não me importo com isso, com o que você fizer de mim. Não me peça pra ignorar tudo isso.

Imagine como me senti, no meio do corredor, prensado no corrimão, não conseguia pronunciar uma palavra. Fiquei tão boquiaberto e com o peito pulsando de emoção, que mais do que desejo, alegria, medo e até raiva, uma nova e estranha coragem me tomou. Ele estava ali, tão a mostra quanto sempre. Culpa e medo tomavam a minha vida, mas vendo-o ali, sendo apenas o Patrick, aquele que sempre seria capaz de me surpreender, que sempre me fazia agir tão idiotamente, não me restavam dúvidas que o verdadeiro egoísta sempre fui eu. Ele era legitimamente inocente. Não merecia estar ali, a minha total mercê, implorando por alguém tão cruel.

__Eu sou uma pessoa horrível. A pior delas. __Murmurei.__ Eu odeio você. Não implore nada.__ desliguei-me dos seus braços como uma força que não me pertencia__ Não se aproxime de mim de novo.

Eu disse que não foi a melhor das lembranças.

Deixar Patrick naquela escada, toda sua bondade, amizade, seu calor, empatia, caminhar pelas ruas até algum bonde passar, viajar por horas até voltar pra casa, lembrando de cada expressão dele, e sentindo-as como uma facada no peito, tendo de lidar como uma realidade que parecia tão irreal.

Doía... doía muito. Era quase como tê-lo matado, enfim.

Meu corpo tremia tanto que, mesmo chegando no apartamento e afundando na banheira, parecia automático, apertar os dedos, abraçar meu torço como um autoconsolo. Cobrir cada poro com medo de vazar até morrer.

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