𝑬𝒑í𝒍𝒐𝒈𝒐 (30K!)







𝑬𝒑í𝒍𝒐𝒈𝒐,
ato dois











A luz suave do sol matinal atravessava a cortina fina do quarto, banhando o rosto de Aaron com um brilho dourado. Os olhos dela piscaram, pesados e cansados, enquanto ela tentava se situar. A respiração ainda era um pouco irregular, e a dor constante nas costelas a lembrava de onde estava. O ambiente ao seu redor era silencioso, exceto pelo som monótono dos monitores cardíacos e pelos passos suaves que ecoavam do corredor.

Aaron virou a cabeça lentamente, e então percebeu que não estava sozinha. Sentada em uma cadeira ao lado de sua cama estava Carmen Diaz. As mãos dela estavam cruzadas sobre o colo, os dedos apertados com força, como se lutasse contra algum tipo de emoção que tentava transbordar. Os olhos de Carmen estavam fixos no chão, mas, ao notar que Aaron acordara, ela levantou o olhar, mostrando uma expressão que misturava cansaço e preocupação.

— Dona Carmen? — A voz de Aaron saiu baixa, rouca, como se cada palavra exigisse um esforço imenso. Ela sentiu o coração acelerar. — O Miguel... como ele tá?

Carmen respirou fundo antes de responder. Sua expressão endureceu por um instante, mas logo um pequeno sorriso forçado surgiu em seus lábios.

— Ele... vai ficar bem. — Sua voz era hesitante, quase quebrada, como se cada palavra carregasse um peso insuportável. — Eles vão levá-lo para a operação em breve.

Aaron sentiu o corpo afrouxar um pouco contra o travesseiro. Ela fechou os olhos, deixando um suspiro escapar, misturado com um alívio que fazia suas lágrimas ameaçarem cair novamente.

— Que bom... — murmurou, a voz trêmula.

O silêncio que se seguiu foi sufocante. Carmen parecia querer dizer mais alguma coisa, mas hesitava. Ela olhou para Aaron por alguns segundos, estudando o rosto da garota. Aaron percebeu aquele olhar e desviou o dela, tentando não parecer tão vulnerável quanto se sentia.

— E você, Aaron? — Carmen perguntou finalmente, sua voz carregada de uma preocupação genuína, mas também de algo mais profundo, algo que Aaron ainda não conseguia identificar. — Como você está?

Aaron deu de ombros levemente, seus dedos brincando com a ponta do lençol sobre ela.

— Acho que tô bem... — respondeu, quase sussurrando. — Me disseram que vou ter alta amanhã.

Carmen assentiu, mas o desconforto dela era palpável. Ela desviou o olhar, como se estivesse reunindo coragem para continuar a conversa. Aaron sentiu o coração apertar. Aquilo não era só uma visita de cortesia. Havia algo errado.

Depois de alguns instantes de hesitação, Carmen finalmente falou, mas sua voz parecia ainda mais pesada.

— Aaron... eu sinto muito.

Aaron ergueu os olhos para ela, confusa.

— Pelo Miguel? — perguntou, quase de imediato. — Eu também... — Mas antes que pudesse continuar, Carmen balançou a cabeça.

— Não. — Ela respirou fundo, os olhos marejados. — Não é sobre isso.

O coração de Aaron disparou. A tensão no ar era quase tangível. Ela olhou para Carmen, esperando pelo que vinha a seguir, e cada segundo parecia durar uma eternidade.

— O que foi, então? — Aaron perguntou, hesitante, tentando ignorar o pânico que começava a se instalar em seu peito.

Carmen olhou para as mãos, respirou fundo mais uma vez e, finalmente, soltou:

— Eu sei quem começou a briga. O Johnny... ele me contou. E ele não vai mais chegar perto da minha família outra vez.

As palavras pareceram ecoar no quarto. Aaron congelou. Era como se o chão tivesse desaparecido sob seus pés. Ela sentiu a respiração falhar e desviou o olhar, sem saber como reagir. Seus dedos apertaram o lençol com força, e o silêncio entre as duas se tornou ainda mais insuportável.

Carmen continuou, sua voz vacilando, mas determinada.

— Eu sei que você não queria que isso acontecesse... sei que não foi sua intenção. Mas... — Ela pausou, olhando para Aaron como se buscasse forças para continuar. — Eu não posso deixar você ficar na minha casa... Agora que o Miguel... Não dá mais, Aaron...

Aquelas palavras atingiram Aaron como um soco no estômago. Ela piscou rapidamente, tentando impedir que as lágrimas caíssem, mas falhou. Sentiu o rosto esquentar enquanto o peso de tudo que aconteceu parecia desabar sobre ela de uma só vez.

— Eu... eu entendo. — Sua voz era quase um sussurro, tão fraca quanto ela se sentia por dentro. Uma lágrima escorreu pelo rosto dela, e ela olhou para Carmen com os olhos marejados. — Sinto muito, de verdade... por tudo.

Carmen a observou por mais alguns segundos, claramente dividida entre a compaixão e a determinação. Finalmente, ela se levantou, ajeitando a bolsa no ombro, e deu um último olhar para Aaron antes de sair do quarto.

— Sinto muito... — ela sussurrou envergonhada uma ultima vez

A porta se fechou lentamente, e Aaron ficou sozinha novamente. A culpa a consumia, sufocando-a. Ela se deixou cair contra o travesseiro, encarando o teto enquanto as lágrimas corriam silenciosamente pelo seu rosto.









O quarto do hospital estava silencioso, iluminado apenas pela luz suave que entrava pelas persianas semiabertas. Daniel LaRusso entrou com passos rápidos, segurando um saco de papel em uma das mãos, o cheiro familiar do lanche preferido de Samantha preenchendo o ar. Seu rosto mostrava uma mistura de cansaço e determinação. Ele olhou ao redor, procurando pela filha.

— Oi, ué, cadê ela? — perguntou, a voz carregada de preocupação. — Eu trouxe o lanche preferido dela.

Amanda, que estava sentada em uma poltrona próxima à cama vazia, ergueu o olhar. Havia algo no rosto dela, um cansaço profundo que não vinha apenas da falta de sono, mas de algo mais pesado.

— Ah, eu tô esperando ela voltar do Raio-X. — Amanda respondeu, cruzando os braços de maneira defensiva. — O médico acha que ela quebrou uma costela.

Daniel parou no meio do quarto, o saco de papel quase escorregando de sua mão. Seus ombros caíram, e ele balançou a cabeça devagar, tentando processar as palavras.

— Ah, meu Deus... — Ele murmurou, antes de se aproximar da poltrona onde Amanda estava sentada. — Isso tem que parar, Amanda.

Ela levantou o olhar para ele, os olhos cansados mas ainda cheios de uma intensidade que ele conhecia bem.

— Eu sei, você tem razão. — Daniel continuou, com mais firmeza. — Eu juro. Eu não vou deixar o Cobra Kai se safar dessa. Não vou...

Amanda se levantou da poltrona abruptamente, interrompendo-o. O movimento dela foi tão brusco quanto as palavras que vieram a seguir.

— Já chega de Cobra Kai, Daniel! — A voz dela ecoou no pequeno quarto, cortante. — Não viu o que essa rivalidade estúpida causou?

Daniel abriu a boca para responder, mas Amanda continuou, sem lhe dar chance.

— A nossa filha tá no hospital, Daniel! — A voz dela tremia, um misto de raiva e tristeza, enquanto gesticulava para a cama vazia. — A melhor amiga dela rasgou o rosto dela com um cinto! Isso passou de qualquer limite!

Daniel apertou os lábios, tentando manter a calma, mas o peso das palavras de Amanda era difícil de ignorar.

— Amanda... — Ele começou, mas ela o cortou de novo, os olhos agora brilhando de frustração.

— Chega de caratê, Daniel. — Ela deu um passo para trás, os braços cruzados novamente, como se criasse uma barreira entre eles. — Você acha que só dizer que vai resolver é suficiente agora?

Ele respirou fundo, tentando encontrar as palavras certas.

— Amanda, eu sei, você tem razão... — Ele começou, mais uma vez, mas sua voz soava fraca, como se a força de sua determinação tivesse sido roubada.

— Não dá mais. — Amanda disse, firme, os olhos fixos nele. — Acabou isso.

Ela se afastou dele, cruzando os braços de novo e virando o rosto para a janela, encerrando a conversa de forma definitiva. Daniel ficou parado no meio do quarto, segurando o saco de papel como se aquilo fosse a única coisa sólida que restava em suas mãos. A tensão entre eles era palpável, e ele sabia que, desta vez, Amanda estava realmente determinada.










As ruas de Reseda estavam movimentadas como sempre, mas Aaron sentia que estava andando por um mundo diferente, alheia à pressa e ao barulho ao seu redor. O celular na mão tremia enquanto ela deslizava a tela, os olhos fixos na infinidade de notificações que acumulavam semanas de silêncio. Ligações do pai. Ligações de Kreese. Muitas, uma atrás da outra. Mensagens não lidas. Tudo parecia gritar com ela, mas nada fazia sentido. Ela se sentia uma completa idiota por ter aceitado entrar no
Cobra kai só pra ajudá-lo a espionar. Tudo parecia rodar em volta de uma briga infantil que ela tinha se posto no meio.

Ela guardou o celular no bolso, tentando afastar os pensamentos que começavam a surgir. Cada passo era um esforço, uma pontada aguda na costela a fazia caminhar torto. O rosto ainda latejava sob os pontos e as talas. A dor era um lembrete constante de como as coisas tinham saído do controle.

Quando chegou ao centro comercial de Reseda, o coração dela afundou. A fachada do Cobra Kai estava ali, imponente e intacta, como se nada tivesse acontecido. A porta de vidro refletia o rosto cansado dela, marcado pelos curativos e pelas olheiras profundas. Aaron parou. Respirou fundo. O peito doía não só pela costela, mas pela confusão que fervilhava dentro dela.

Entra ou não entra? A pergunta girava em sua mente enquanto ela olhava para o lugar. Seus pés hesitaram na calçada. Ela deu um passo na direção da entrada, mas parou de novo, os ombros tensos. Sentia as lágrimas se acumulando, mas segurava, mordendo a parte interna da bochecha para não desabar.

Aaron bufou, revirando os olhos. Tudo isso por causa daquele lugar. Tudo isso. O pensamento a fez encarar o logo do Cobra Kai com uma mistura de raiva e tristeza. Sem pensar muito, ela chutou com força um vaso de planta que estava ao lado da pilastra na entrada. O som da cerâmica quebrando foi alto o suficiente para fazer um barulho alto

— Que merda... — ela murmurou, sentindo a dor subir pelo pé, agora latejando junto com o resto do corpo. Ela mancou alguns passos para longe da fachada e, finalmente, deixou o peso do momento vencer. Sentou-se no meio-fio, as mãos tremendo enquanto tentava conter as lágrimas. Mas era impossível.

O choro veio com força, o rosto escondido entre as mãos. Ela estava cansada. Perdida. Não sabia para onde ir, o que fazer ou como consertar o caos que parecia seguir cada passo dela. O som do mundo ao seu redor parecia sumir enquanto ela chorava, até que sentiu uma presença próxima. Uma sombra caiu sobre ela. Aaron levantou a cabeça lentamente, as lágrimas escorrendo enquanto seus olhos procuravam a pessoa ao seu lado.

Aaron levantou o rosto lentamente, sentindo os músculos tensionarem com o esforço. Seus olhos estavam avermelhados, marejados de lágrimas não derramadas, enquanto tentava focar na silhueta imponente que se aproximava. A sombra de Kreese era inconfundível, e ele se projetava diante dela como uma muralha. Seus braços estavam cruzados com autoridade, a postura rígida, e seus olhos a estudavam com uma precisão calculada, como se estivesse avaliando cada fragmento da fragilidade de Aaron. Ela podia sentir seu olhar pesado, examinando cada detalhe — os curativos visíveis em seu rosto, as roupas amassadas, a postura que denunciava a exaustão e a dor. Era como se ele estivesse desnudando sua alma, em silêncio, de forma fria e impessoal.

— Tá chorando? — A voz de Kreese era áspera, impregnada de uma provocação deliberada. Ele inclinou levemente a cabeça, como se achasse graça do momento, e o tom seco, quase cruel, cortou o ar entre eles. — Sério isso, criança?

Aquelas palavras se entranharam profundamente em Aaron. Ela apertou os punhos até as unhas cortarem a palma das mãos, um gesto involuntário para evitar se entregar à vergonha. A humilhação de ser pega naquele estado — vulnerável, quebrada — era uma ferida a mais, mas ela não sabia como esconder aquilo que não podia controlar.

— O que você acha? — respondeu Aaron, forçando um tom ácido, uma tentativa de se proteger, mas a sua voz ainda soava carregada de dor. O sarcasmo não disfarçava a vulnerabilidade que ela ainda não conseguia disfarçar.

Kreese se aproximou, os passos firmes e calculados. Cada movimento dele era preciso, imponente, e a distância entre eles parecia diminuir a cada segundo. Ele parou à sua frente, tão perto que Aaron sentia o peso de sua presença, como se ele fosse uma sombra projetada sobre ela, sem espaço para respirar. Seus olhos não saíam dela, não deixavam de decifrá-la, como se estivesse desmontando cada camada de resistência que ela ainda tentava manter.

— Soube o que aconteceu no colégio. — A voz dele soou casual, quase como se estivesse compartilhando uma notícia comum, mas havia algo em seu tom que denunciava uma intenção por trás das palavras. — Me contaram que você acabou com a garota do LaRusso.

Aaron ergueu o olhar com cautela, tentando buscar algum indício de sinceridade nos olhos dele, mas só encontrou aquela calma inabalável. Sua boca se apertou em um sorriso frio e cínico, sem humor algum.

— Jura? — disse ela, o sarcasmo saltando dos lábios, uma tentativa de se esquivar do impacto da revelação. Mas, ao mesmo tempo, uma sombra de dúvida se formou em seu peito.

Kreese deu uma pausa, observando o efeito das suas palavras. Ele então se inclinou levemente, como se fosse compartilhar um segredo, e a cada movimento seu, o clima ao redor se tornava mais tenso.

— Não é algo que me orgulhe, exatamente... mas admito que foi necessário. E na situação, você foi a melhor e disso, criança, eu me orgulho.

Ela soltou uma risada curta, sem vida, um som sem energia que soou mais como uma reação involuntária à frustração do que qualquer outra coisa.

— E de que adianta? — perguntou, a voz quase quebrando, a tristeza se misturando com o tom amargo. — Nada mudou.

Kreese abaixou um pouco o tom, a postura suavizando momentaneamente, como se estivesse tentando criar uma intimidade forçada. Ele queria penetrar nas defesas dela, infiltrar-se nas suas emoções, e agora a voz soou mais baixa, mais calma, quase paternal.

— Agora você provou o seu valor. Sabem do que você é capaz.

Aaron revirou os olhos, a frustração se espalhando por cada parte de seu corpo. Ela enxugou apressadamente as lágrimas com as costas da mão, mas não conseguiu esconder a sensação de impotência que crescia dentro dela. Era como se estivesse presa em uma rede invisível, sem conseguir escapar.

— Grande coisa... — resmungou, a amargura em sua voz misturada com um toque de desesperança. Não podia acreditar no que estava ouvindo.

Kreese não perdeu o ritmo. Ele descruzou os braços e deu um passo à frente, abaixando-se ligeiramente para ficar mais próximo dela, mas sem perder a postura de superioridade. Ele estava ali, como um predador que sabia exatamente onde e como atacar.

— Seu pai aceitou ir para a reabilitação.

As palavras dele cortaram o ar, e Aaron parou. O mundo pareceu desacelerar por um segundo, o tempo se esticando enquanto ela tentava processar o que acabara de ouvir. Seu corpo ficou paralisado, como se as palavras não conseguissem se encaixar na realidade que ela conhecia.

— O quê? — Ela mal conseguiu formar a palavra, sua voz um sussurro surdo.

Kreese, impassível, continuou com a frieza que lhe era característica, os olhos focados nela.

— Eu fiz ele devolver o dinheiro. Como você pediu. Não, como prometido. Agora ele está sob vigilância. Não sai de lá por pelo menos seis meses.

O impacto das palavras o atingiu como um soco no estômago. Aaron sentiu o corpo inteiro tremer. Aquela sensação de alívio, de algo finalmente sendo resolvido, a fez desabar. Antes que pudesse se controlar, o impulso a levou até ele, e ela se jogou nos braços de Kreese. O choro irrompeu de dentro dela, incontrolável, os soluços quebrando o silêncio de maneira brutal.

— Obrigada... — repetia, entre os soluços, a voz falhando a cada palavra. Ela não sabia se ainda estava consciente de onde estava ou o que estava fazendo, mas parecia que, pela primeira vez em muito tempo, ela sentia algo próximo ao consolo.

Kreese a manteve próxima, sem pressa de afastá-la, mas sua expressão não se alterou. Quando o abraço terminou, ele colocou uma mão firme sobre o ombro dela, um toque calculado, um lembrete de que não havia espaço para dúvidas sobre o papel dele naquilo.

— Não me agradeça — ele disse, com calma, mas seus olhos penetrantes deixaram claro que não havia espaço para questionamentos. — Você merece isso. E acredite, o seu trabalho comigo ajudou mais do que imagina.

Aaron afastou-se lentamente, os olhos ainda marejados. Ela forçou um sorriso tímido, mas ele não passou de um reflexo da sua incerteza. Uma parte dela queria acreditar nas palavras dele, mas outra parte ainda estava em dúvida, lutando contra a sensação de estar se entregando a algo que não compreendia completamente.

— Foi tudo culpa minha... o que aconteceu com o Miguel, com a Sam... foi tudo minha culpa — ela murmurou, a dor apertando seu peito.

— Não foi — respondeu Kreese imediatamente, a voz baixa, impositiva, como uma verdade absoluta.

— Foi sim! — insistiu, a voz mais alta, as lágrimas voltando a ameaçar. Ela parecia em conflito consigo mesma, com o peso da culpa que sentia. — Se eu não tivesse feito aquilo... nada disso teria acontecido.

Kreese não hesitou. Ele a interrompeu, sua voz profunda e direta, cortando o raciocínio dela com a certeza de quem controla a conversa.

— Eles tentaram te apagar — disse ele, a voz fria e calculada. — Tentaram te transformar em algo menor do que você é. Mas eu não vou deixar você fazer isso consigo mesma.

Aaron piscou, confusa. Suas palavras ecoavam dentro dela, mas uma parte sua ainda resistia, uma força invisível tentando impedi-la de se render. Ele estendeu a mão para ela, a palma virada para cima, como se convidasse à rendição final.

— Vem. Vamos resolver isso juntos.

Ela hesitou, os braços cruzados, uma barreira invisível levantada entre eles. Mas, por fim, o olhar dele a desarmou. O peso da decisão caía sobre ela como uma pressão insuportável.

— Resolver? — Ela soltou uma risada amarga, sem humor. — Tudo isso aconteceu por causa do seu método, eu...

Kreese arqueou as sobrancelhas, o olhar desdenhoso e impassível. Ele não se abateu pela acusação.

— Meu método acaba com pessoas fracas. Pessoas como Johnny Lawrence. Pessoas que não entendem o real significado do Cobra Kai.

Aaron desviou o olhar, mas ele não deu espaço para ela se afastar. Continuou, a voz agora ainda mais carregada de uma intensidade crescente.

— Meu método nunca apagaria alguém como você, Aaron. Ele te dá força. E você tem mais força do que imagina.

O peso das palavras de Kreese foi implacável. A resistência de Aaron começou a se desfazer, como se ela estivesse sendo lentamente engolida por aquela sensação de controle que ele impunha sobre ela. Com os lábios trêmulos, ela aceitou a mão dele. Kreese a puxou, ajudando-a a se levantar, e ela, ainda vulnerável, se entregou ao abraço dele novamente. Desta vez, ele não a afastou, mas a segurou firme.

Como já tinha feito antes, com a Rayken.









A noite estava abafada, com o ar pesado e denso, como se o próprio céu soubesse da pressão crescente no peito de Johnny. Os faróis do seu carro, os únicos pontos de luz na rua deserta, iluminavam o caminho tortuoso até o dojo. Bêbado, ele sentia o peso de cada passo, a mente turva pela bebida e pelo sentimento de falha que o consumia. Miguel ainda estava no hospital, inconsciente, e Johnny não conseguia se livrar da culpa que apertava seu coração, como uma camisa de força. Ele balançava para os lados enquanto caminhava, a chave em sua mão quase se quebrando de tanto esforço até que, com um movimento brusco, conseguiu enfia-la na fechadura e abrir a porta.

A porta do dojo rangeu quando se abriu, o som seco ecoando pelo ambiente vazio. O cheiro característico de suor, madeira antiga e ar estagnado tomou conta das narinas de Johnny. Mas algo estava errado. O lugar, normalmente familiar, parecia diferente, mais sombrio, como se as sombras estivessem mais densas, mais ameaçadoras. Johnny avançou para dentro com cautela, seus passos desajeitados e instáveis, tentando entender o que havia mudado. O silêncio era opressor, e logo o barulho vindo dos fundos chamou sua atenção. Não era o tipo de som que ele estava acostumado a ouvir no dojo. Algo estava acontecendo ali, algo que não deveria estar.

A porta dos fundos estava entreaberta, e Johnny sentiu um arrepio gelado na espinha. Ele se aproximou devagar, a tensão crescendo em seu peito, até que, ao empurrá-la, a cena à sua frente se desdobrou. Kreese estava ali, de pé, com um sorriso malicioso no rosto. Ao seu redor, estavam vários alunos — não os habituais, não os que ele confiava, mas os mais problemáticos, os mais agressivos, aqueles que não pertenciam à verdadeira filosofia do Cobra Kai. E, no meio deles, estava Aaron.

Johnny sentiu uma sensação de choque ao vê-la ali, com os olhos vazios, fixos em Kreese como se estivesse sob algum tipo de feitiço. Ela não era mais a mesma. A garota que ele conhecia, com seu olhar intenso e sua energia nervosa, agora parecia distante, desprovida de vida. Ela estava com Kreese, ela estava com aqueles alunos. E isso doía mais do que qualquer coisa.

Johnny parou na entrada, seu coração batendo forte e descompassado. A raiva e a frustração se misturavam em seu peito, mas também havia uma sensação de desamparo, como se ele tivesse perdido algo importante e não pudesse fazer nada para recuperar. Ele tentou alcançar Aaron com o olhar, mas ela não o reconheceu. Ela estava irredutível, como uma parede de gelo.

Kreese, com aquele sorriso sádico, se virou lentamente para Johnny, como se já soubesse o que ele estava pensando. Ele se aproximou, a voz rouca e afiada como uma lâmina, cortando o silêncio pesado.

— Seus alunos? — Kreese perguntou com desdém, como se a palavra "alunos" fosse uma piada. — Você os abandonou quando mais precisaram de você. Alguém tem que lembrar o que é preciso para vencer.

Ele olhou para Aaron, e ela desviou o olhar, como se tivesse medo de encará-lo. Ela não o queria ali, não o queria de volta.

— Depois de tudo o que fiz por vocês... — Kreese continuou, com uma risada amarga que reverberava pelas paredes do dojo.

— Você não fez nada por mim. — Aaron interrompeu, sua voz cortante como vidro quebrado. Ela estava distante, com a armadura erguida, sem um pingo de vulnerabilidade. Johnny a observou, tentando entender, mas não havia mais nada ali que ele reconhecesse.

Falcão, que estava ao lado de Kreese, se virou para Johnny com um olhar acusador. Seu tom era cheio de rancor.

— Olha o que aconteceu com Miguel. Ele está no hospital por sua causa. Só porque ele mostrou compaixão. Se ele morrer, a culpa é toda sua. — A acusação foi lançada como uma pedra afiada, atingindo o centro do peito de Johnny, que engoliu em seco, a culpa apertando sua garganta.

A raiva subiu dentro dele, mas Johnny não cedeu. Ele queria gritar, queria defender Miguel, mas as palavras simplesmente não vinham.

— Eu avisei sobre isso — A voz de Kreese estava congelada — Falei para não demonstrar fraqueza.

Johnny se sentiu desmoronar diante dela, sem saber o que fazer, o que dizer. Ela o havia deixado para trás, perdido para sempre para a influência de Kreese. Ela olhou para ele com desprezo, como se ele fosse insignificante. E isso foi pior do que qualquer golpe que ela poderia ter dado.

— Vai embora — Aaron disse, e suas palavras cortaram como uma lâmina afiada. Não havia arrependimento, nem emoção. Apenas um comando frio, impessoal.

Johnny deu um passo à frente, a raiva e a dor se misturando dentro dele. Seus dentes estavam cerrados, mas ele não podia mais se controlar. Ele olhou para Kreese com ódio. Ele sabia o que aquele homem representava, o que ele havia causado em sua vida.

— Esse dojo é meu — Kreese disse, tentando manter a compostura, mas sua voz traía a raiva que fervia dentro dele.

Kreese soltou uma risada sibilante, um som de vitória. Ele caminhou até Johnny, se aproximando lentamente, com o olhar fixo nele.

— Ah, esqueci de contar... — disse, com um sorriso arrogante. — Quando você esteve fora, eu conversei com o proprietário. Ele não gosta muito de você. Sabe o problema com esses acordos verbais? Não há garantias.

Johnny ficou paralisado, a sensação de perda preenchendo seu corpo como um veneno. Ele tentou protestar, mas as palavras de Kreese ecoavam em sua mente, fazendo com que ele se sentisse mais impotente a cada segundo.

— Você não pode fazer isso — Johnny murmurou, sem acreditar no que estava ouvindo. Ele estava perdendo o Cobra Kai, sua criação, sua identidade, e isso o estava destruindo por dentro.

Kreese continuou, implacável, como se a vitória fosse sua há muito tempo.

— É claro que eu posso. Eu fundei o Cobra Kai. Ele me pertence. Sempre pertenceu. E sempre vai pertencer. Jamais meus alunos perderão, Johnny. Mesmo que eles aprendam do jeito difícil. Um dia, você vai me agradecer por isso.

Johnny sentiu o nó na garganta apertando. Ele olhou ao redor, os alunos ao lado de Kreese, todos pareciam cegos pela sua presença. A raiva queimava em seu peito, mas havia algo mais, algo mais profundo e sombrio.

Ele olhou para Aaron uma última vez, tentando encontrar um vestígio da pessoa que ele conhecia, mas ela estava irremediavelmente distante.

— Isso foi um erro — Johnny disse, sua voz fraca, cheia de pesar e arrependimento. Ele olhou para ela, tentando, mas já não havia nada ali que ele pudesse alcançar.

Ele então se virou para Kreese, o ódio tomando conta de seu olhar, seu corpo tremendo de frustração.

— Você quer o Cobra Kai? — Johnny perguntou, com raiva e frustração. — É tudo seu.






Johnny estava no volante, os olhos focados na estrada que parecia se estender infinitamente diante dele, mas ele não via nada. Sua mente estava distante, perdida em pensamentos que se chocavam com a mesma intensidade das ondas que ele ouviria em breve. Ele tinha bebido demais. O cheiro da cerveja em seu hálito misturava-se com o suor e a dor de uma noite que parecia não ter fim. O peso da culpa o sufocava, mas ele não conseguia parar. As imagens de Miguel no hospital, a cena do garoto desacordado, a voz de Kreese ecoando na sua cabeça, tudo aquilo o atormentava enquanto ele dirigia sem rumo, sem direção.

O carro parecia estar no piloto automático. Johnny não se importava com nada, apenas queria esquecer. Mas a cada quilômetro, a culpa se tornava mais densa, mais apertada. Ele girou o volante e, sem pensar, seguiu para a praia. Quando o carro parou na areia, ele não pensou em mais nada. Apenas abriu a porta e saiu, a areia fria contra seus pés descalços. Ele tirou uma garrafa de cerveja da bolsa térmica e tomou um gole, o líquido gelado queimando sua garganta, mas não aliviando a pressão em seu peito.

Ele sentou-se na areia, olhando para as ondas que se quebravam na praia. O som das ondas batendo nas pedras parecia um reflexo do turbilhão em sua cabeça, uma onda de pensamentos que não parava de bater. A raiva o consumia. Como ele tinha falhado? Como ele deixou tudo aquilo acontecer? Aquelas perguntas o assombravam, mas ele não tinha respostas. Só raiva. Raiva de si mesmo, de Kreese, de tudo o que aconteceu.

Ele pegou a chave do carro, com a intenção de jogá-la contra a água, mas a jogou longe, sentindo o metal frio contra sua mão antes de largá-la. A chave voou pela areia, se perdendo na escuridão da noite. Johnny olhou para o celular que estava na sua mão, e o brilho da tela iluminou seu rosto tenso. Ele sabia que não queria ver, mas a curiosidade foi mais forte. Ele abriu a notificação, o coração disparando quando viu a mensagem sobre o estado de Miguel. Coma.
O garoto estava em coma, a notícia o atingiu como um soco no estômago.

Ele olhou para o celular e, com um gesto de raiva, o atirou contra a areia, fazendo com que o aparelho se enterrasse um pouco. Ele se levantou, seu corpo tenso com a frustração. A raiva não o deixava. Ele olhou para o carro, agora iluminado pela luz fraca da lua, e viu o que não queria ver: o carro todo escrito, com o nome do Cobra Kai pintado em letras garrafais. O ódio foi instantâneo. O que ele fez? O que ele se tornou? Ele não conseguiu mais segurar, e chutou a areia com força, sentindo o grão gelado se espalhando por seus pés.

Enquanto ele se afastava, caminhando de volta para a estrada, com a mente fervendo, o celular apitou novamente.

O celular continuou lá, imerso na areia fria, silencioso por um momento. Mas, logo, um novo som cortou a quietude da noite: o aviso de uma mensagem que ecoou pela praia, perdida entre as ondas e a escuridão. A notificação de Rayken MacGyver aceitou sua solicitação de amizade ficou ali, visível por um instante, antes que uma nova surgisse de Alison Mills te enviou uma mensagem de texto. Mas Johnny já estava longe demais, sem perceber as palavras que flutuavam ali, esperando por atenção.

Enquanto ele caminhava pela areia, o celular continuava sua jornada em silêncio, enterrado na escuridão da noite, como uma mensagem que ninguém mais veria.

















_________________
5000 palavras

fim do ato dois, uau
o que estão achando da história até agora?
to ansiosa pra vocês verem o que está vindo aí!
comentem,
bjs Back
💋

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