🪖 ⸳ ⤷ 𝗰𝗵𝗮𝗽𝘁𝗲𝗿 𝘁𝗵𝗿𝗲𝗲

Naquela noite, Coraline se esgueirou para fora do quarto, tomando cuidado para não acordar os garotos. Owen e Liam estavam dormindo profundamente, algo raro nos últimos dias, e ela não queria perturbar esse momento de paz. Com passos silenciosos, ela se dirigiu pelos corredores escuros do CDC até o ponto de encontro marcado.

Merle estava já lá, aguardando, com seu olhar habitual de quem estava preparado para o pior. Os dois não trocaram muitas palavras, a tensão no ar era palpável. Sabiam o que estava em jogo, mas, mesmo assim, o silêncio pairava entre eles como uma sombra pesada. Sem mais demora, os dois seguiram pelo corredor, suas sombras se esticando nas paredes iluminadas apenas pela luz fraca dos corredores.

Chegaram à sala de Jenner, onde o cientista estava os aguardando, sentado em frente a um monitor. O ambiente estava sombrio, e ele parecia mais cansado do que nunca. Quando a porta se abriu, ele os recebeu com um olhar grave, e a tensão no ar se intensificou.

Ninguém falou de imediato. A sensação de incerteza e medo era quase palpável, como se o próprio ar estivesse pesado. O que se sucederia com a vacina? Seria ela a chave para a sobrevivência ou mais um fracasso em um mundo que parecia não dar mais chances?

Jenner olhou para ambos, seus olhos refletindo a mesma dúvida que assombrava todos eles.

── Eu sei o que estão pensando ── ele começou, a voz mais baixa do que o normal. ── Mas temos que tentar. Não temos outra escolha.

Coraline sentiu um calafrio percorrer sua espinha. Ela já sabia o risco, sabia que, ao se oferecer como cobaia, estava colocando tudo em risco, mas o que mais poderiam fazer? A vacina, se funcionasse, poderia ser a única chance de parar a epidemia, mas o risco era grande.

Merle, que parecia mais impaciente com a situação, deu um passo à frente.

── Então, vamos logo com isso. Não temos tempo a perder.

Jenner assentiu, mas o peso da situação ainda pairava entre eles. O que aconteceria a seguir? A esperança, misturada com o medo, fazia o ar ficar mais denso, e a incerteza parecia se arrastar por cada segundo que passava.

A verdade era que, se algo desse completamente errado e Coraline morresse, todos estariam perdidos. Ela era o pilar que sustentava o grupo. Era ela quem tomava as decisões difíceis, quem sempre dava a última palavra, quem encontrava uma solução para cada problema, não importava quão impossível fosse. Ela já tinha visto de tudo nesse mundo quebrado — guerras, doenças, mortes — mas nada disso a preparou para o que estava prestes a fazer.

Merle, por mais que fosse o braço direito de Coraline, não tinha o que era necessário para comandar. Ele era impulsivo, cabeça quente, e em tempos de crise, isso era uma desvantagem. Seu temperamento explosivo era um reflexo de tudo o que ele tinha vivido, e embora ele fosse um aliado forte e corajoso, não podia ser o líder. Ele sabia disso tão bem quanto ela.

Jenner, apesar de sua experiência médica e do tempo que passou servindo como médico no exército, também não tinha a compostura ou a frieza necessária para guiar um grupo como aquele. Sua mente, embora brilhante, estava cheia de fissuras, seus juízos, muitas vezes, influenciados pelo medo e pela pressão. Sua própria instabilidade mental era um risco. Ele nunca poderia ser a pessoa a liderar, e Coraline sabia disso.

Ela olhou para Merle e Jenner, ambos com rostos tensos e preocupados. Nenhum deles queria admitir, mas eles sabiam que, sem ela, a estrutura do grupo desmoronaria. O peso de ser a última linha de defesa não era algo que Coraline levava levianamente, mas ela sabia o que precisava ser feito. Ela não podia hesitar.

Se a vacina falhasse, se ela morresse, se seu corpo não reagisse da maneira esperada... tudo estaria perdido. O grupo, sem a liderança que ela oferecia, não teria para onde ir. Mas, no fundo, ela sabia que essa era a única chance de salvar todos, e isso a motivava a seguir em frente.

Coraline respirou fundo, os olhos fixos no rosto preocupado de Jenner, depois no de Merle, e finalmente, olhou para sua própria mão, que tremia levemente. Ela forçou um sorriso, tentando não mostrar a ansiedade que se formava em seu peito.

── Não se preocupem ── ela disse, com uma confiança que não sentia por dentro. ── Vai dar tudo certo.

Jenner apenas assentiu, os olhos cheios de dúvida, mas ele não questionou. Merle olhou para ela com uma expressão séria, mais preocupada do que gostaria de admitir, mas também não disse nada. Eles sabiam que não havia mais escolhas.

A sala ficou silenciosa novamente, e Coraline sentiu o peso do momento cair sobre seus ombros. O que quer que acontecesse, ela estava pronta para enfrentar. Ela não poderia falhar agora.

Coraline olhou para Merle e Jenner, a seriedade em seus olhos refletindo a urgência da situação. A sensação de que estava prestes a arriscar tudo não a abandonava, mas ela precisava ser firme. A vida dos meninos estava nas mãos deles agora, e se algo desse errado, ela precisava ter a certeza de que eles seriam protegidos, que seus filhos estariam seguros.

Ela respirou fundo antes de falar, a voz tensa, mas clara.

── Eu preciso que vocês me prometam uma coisa. Se algo der errado, se... ── ela hesitou por um momento, mas logo continuou, sua expressão séria ── Se eu não acordar ou se algo mudar, vocês vão proteger Owen e Liam. Vai ser a última coisa que vou pedir, mas é vital. Eles precisam de vocês. Se algo acontecer comigo, vocês cuidam deles, independente do que aconteça.

Merle a olhou com intensidade, já sabendo o que ela queria dizer. Ele não era bom com palavras, mas o olhar que trocou com ela foi o suficiente. Ele assentiu com firmeza.

── Pode deixar, Cora. Eu cuido deles.

Jenner também a encarou, parecendo pesar as palavras, mas no final, fez um gesto com a cabeça.

── Eu... Eu vou fazer o que for necessário. Eles terão proteção.

Ela sentiu o peso das palavras que acabara de dizer. Era difícil, pois ela sabia o que estava em jogo, mas ao mesmo tempo, isso a fez sentir-se um pouco mais tranquila. O último pedaço de humanidade em um mundo desmoronando dependia daquela promessa.

Jenner não demorou para preparar a seringa com a vacina. Ele olhou para ela, os olhos visivelmente cansados, mas sem hesitar, fez o que precisava ser feito. A agulha entrou em sua pele com uma leve dor, e, em seguida, ela sentiu o líquido sendo injetado em seu corpo. Era algo gelado, frio, mas logo se dissolveu, e a dor foi apenas momentânea.

Com a vacina administrada, não restava mais nada a fazer além de esperar.

O silêncio tomou conta da sala enquanto os três permaneciam ali, aguardando qualquer sinal de mudança, qualquer reação. A noite parecia se arrastar de uma forma insuportável. Cada minuto que passava era uma eternidade. Coraline se mantinha acordada, observando qualquer alteração em seu corpo, mas nada parecia acontecer.

Os olhos de Jenner estavam atentos aos monitores, suas mãos firmemente posicionadas sobre os controles, enquanto Merle, mais inquieto, caminhava pela sala, sentindo a tensão em seu corpo. O som das máquinas era quase ensurdecedor na quietude do lugar, e o tempo parecia passar de forma lenta e excruciante.

O que mais poderia acontecer? Pensava Coraline. Ela tentava manter sua mente ocupada, se forçando a ignorar o cansaço e a apreensão que a invadiam. Mas, conforme as horas se arrastavam, nada mudava. Ela não sentia nenhuma alteração em seu corpo. Não havia febre, nem tremores, nem reações visíveis.

A noite seguiu, e nenhum dos três falou mais nada. As palavras pareciam desnecessárias naquele momento, quando cada um estava perdido em seus próprios pensamentos. Não havia mais nada a fazer, senão esperar.

Ao amanhecer, Jenner deu um suspiro de alívio. Ele ajustou seus óculos e olhou para Coraline, a expressão cansada, mas aliviada.

── Nada. Não houve nenhuma reação adversa.

Coraline olhou para ele e, por um momento, se permitiu relaxar. A vacina parecia não ter causado nenhum efeito colateral imediato. Mas, ao mesmo tempo, a sensação de que ainda havia muito pela frente a mantinha alerta.

Merle, que não tinha se sentado durante a noite, cruzou os braços e soltou uma risada baixa, embora não houvesse muito humor em seu som.

── Isso quer dizer o quê? Que deu certo ou que ainda estamos no escuro?

Coraline deu um meio sorriso, a leve tensão que ainda existia em seu corpo não permitindo mais que fosse completamente aliviada.

── Por enquanto, estamos no escuro. Mas o fato de não ter dado errado... é uma boa notícia.

Ela olhou para os dois e, pela primeira vez em muito tempo, sentiu uma faísca de esperança. Mesmo que frágil, talvez houvesse um caminho à frente, talvez aquela vacina fosse a chave para o futuro que eles tanto precisavam. Mas ainda havia muito por fazer, e a luta estava longe de terminar.

O som das vozes alteradas reverberava pelos corredores do CDC, seguidas de gritos e acusações que se misturavam com o som do caos. Coraline, Merle e Jenner trocaram olhares rápidos antes de correrem para fora da sala, todos com um pressentimento de que algo estava acontecendo, algo que não podiam ignorar.

Ao chegarem na cena, o que encontraram foi um confronto tenso e emocional entre Rick, Shane e Lori. A discussão estava longe de ser uma simples troca de palavras; era uma briga aberta, uma batalha emocional que estava prestes a estourar em violência.

── O que você fez, Shane, foi imperdoável! ── Rick gritou, seu rosto contorcido pela raiva. ── Você não tem direito de fazer isso, não enquanto eu estou fora!

Shane, com o rosto vermelho e os olhos cheios de frustração, respondeu, sua voz tremendo de raiva, mas também com uma sensação de justificação.

── Eu achei que você estava morto, Rick! ── ele rebateu, com o peito arfando pela intensidade das palavras. ── Eu agi porque achei que nunca mais ia te ver! E não sou o único errado aqui! Lori também esteve envolvida nisso, ela também fez a sua parte!

O clima esquentou instantaneamente, e Rick, tomado pela raiva, se aproximou de Shane, os punhos cerrados prontos para o golpe. Antes que pudesse fazer qualquer coisa, Merle se interveio, segurando-o com força, evitando que a situação tomasse um rumo ainda mais violento.

── Ei, calma aí, Rick! ── Merle gritou, forçando-o a se afastar de Shane. ── Você tá fazendo tudo isso virar um barraco sem sentido. Não vai dar em nada!

Enquanto os dois homens se encaravam com olhos desafiadores, os outros membros do grupo ficaram parados, em silêncio, observando a situação com uma mistura de incerteza e desconforto. Andrea e Jacqui estavam mais afastadas, os olhos fixos no chão, evitando fazer contato visual com ninguém. Glenn e Dale pareciam preocupados, mas não se atreviam a intervir.

Lori estava de pé, com os ombros tensos, as mãos trêmulas. Ela olhava para Rick com uma expressão de dor e vergonha, mas não sabia como consertar as coisas entre eles. A culpa estava estampada em seu rosto.

No entanto, entre todos, as reações de Owen e Liam eram as mais notáveis. Owen, que geralmente estava na sua própria bolha, parecia quase se divertir com a cena, um sorriso travesso nos lábios enquanto observava os dois homens trocando acusações.

── Isso aqui tá melhor que qualquer filme de ação, hein, mãe? ── ele murmurou, mais para si mesmo, mas ainda assim audível.

Liam, por outro lado, observava tudo com uma curiosidade que, para uma criança de nove anos, parecia além da sua idade. Seus olhos estavam fixos nos adultos, tentando entender o que estava acontecendo, o que todos estavam sentindo. Ele não gostava do que via, mas sua mente ainda tentava processar aquilo tudo, sem conseguir completamente.

Carl, o filho de Lori e Rick, estava logo atrás dela, com os olhos grandes e assustados. Ele sentia a tensão no ar, sua mente ainda incapaz de entender por completo o que estava acontecendo entre os adultos, mas seu medo era evidente. Ele sabia que algo estava errado, algo que ele não podia controlar.

Merle finalmente deu um passo à frente, com a mão ainda firmemente pressionada contra o peito de Rick, tentando afastá-lo de Shane.

── Vamos acalmar isso, porra! Não tem tempo pra esse drama! ── Merle gritou. ── Aqui não é lugar pra isso. Se vocês querem brigar, vão fazer isso em algum lugar fora do CDC, porque o mundo já tá fodido o suficiente, sem precisar de mais confusão entre vocês dois.

Coraline, observando a cena, sabia que algo precisava mudar. Ela olhou para o grupo, viu o caos crescendo, e sentiu a necessidade urgente de colocar ordem naquilo. A última coisa que precisavam era de mais divisões internas. O mundo lá fora já era perigoso o suficiente. O que acontecia ali entre eles poderia destruir o que restava de unidade.

Ela se aproximou rapidamente, sua voz firme cortando a tensão no ar.

── Chega! — ela ordenou, e todos os olhares se voltaram para ela. ── Isso não é lugar para briga. Somos poucos e a última coisa que precisamos é de mais desunião. Rick, Shane, Lori, todos vocês parem agora. Se não conseguirem resolver isso de maneira civilizada, vão para outro canto e resolvem lá. Mas não vão permitir que isso enfraqueça o grupo, entendeu?

O silêncio se instalou na sala enquanto as palavras de Coraline ecoavam. Ela sabia que, sem liderança forte, todos poderiam se perder. Ela olhou para Merle, que estava ao seu lado, e então para os outros membros, com um olhar que dizia claramente que nada mais poderia acontecer enquanto eles estivessem em risco.

A tensão ainda pairava no ar, mas, ao menos por enquanto, o confronto parecia ter sido controlado. Eles não podiam mais se permitir a luxúria de brigas pessoais. O mundo lá fora já estava acabando, e eles precisavam mais do que nunca trabalhar juntos para sobreviver.

Coraline observou cada um dos membros do grupo enquanto todos se acomodavam na cozinha. O ambiente estava pesado, o silêncio preenchendo cada canto da sala como uma nuvem densa. Os olhares ainda estavam carregados de tensão, mas a necessidade de ordem e liderança era inegável. Liam, como sempre, interrompeu o silêncio, soltando uma de suas típicas curiosidades aleatórias, mais uma tentativa de distrair-se da situação tensa.

── Mamãe, você sabia que os golfinhos têm um nome para cada um dos outros golfinhos? ── ele perguntou, com a voz calma e curiosa. Mas o momento não era para curiosidade. Owen, como esperado, respondeu em tom sarcástico, fazendo com que ambos entrassem em uma rápida discussão sobre o que era mais interessante: golfinhos ou caminhantes.

Coraline não teve paciência para esperar que a conversa se alongasse, então cortou a discussão de imediato.

── Chega! ── Sua voz soou firme, cheia de autoridade. ── Se vocês acham que isso é hora para piada, então vão ter que esperar mais um pouco. Agora, todos sentem e escutem o que eu tenho a dizer.

Ela se levantou de sua cadeira, todos os olhares se voltaram para ela enquanto ela tomava a liderança da situação. Ela não hesitou, nem mesmo por um segundo. O tempo de suavidade havia acabado. O mundo lá fora não permitia mais hesitações ou fraquezas. Se ela não tomasse a dianteira, o que restava do grupo estaria perdido. Ela precisava garantir a segurança de seus filhos, da sua sobrevivência, e de todos ali.

── A partir de agora, tudo será do jeito que eu disser. ── Ela olhou para cada um deles, um a um, fazendo questão de que todos sentissem o peso de suas palavras. ── A liderança será minha. Vocês seguirão minhas ordens, sem contestar. Se eu disser para sentarmos, comermos ou, se necessário, matar, é o que farão. Não há espaço para discussões ou dúvidas. Eu sou a líder aqui.

O silêncio tomou conta da sala por um momento, mas não durou muito. Lori, visivelmente desconfortável, foi a primeira a quebrá-lo, seu rosto cheio de resistência.

── Eu não concordo com isso, Coraline ── ela disse, sua voz trêmula, mas firme. ── Rick deveria ser o líder. Ele é o marido, o pai... Ele deveria estar à frente de tudo.

Coraline manteve o olhar fixo em Lori, sentindo a tensão crescer a cada palavra. Ela não ia permitir que ninguém questionasse sua autoridade, especialmente não diante da situação crítica em que estavam.

Ela deu um passo à frente, seu olhar cortante atravessando Lori, e com uma calma quase ameaçadora, disse:

── Lori, você precisa decidir de uma vez por todas: quem é o seu homem? O marido ou o melhor amigo dele? Não me venha com essa história de que Rick é o líder, porque se você não souber onde colocar sua confiança, o que será de todos nós? ── A voz de Coraline era uma mistura de firmeza e desafio, como se ela estivesse desafiando Lori a tomar uma decisão real, sem rodeios.

Merle, que até então observava o cenário com um sorriso irônico, não perdeu tempo e soltou uma frase sarcástica.

── É, parece que a senhora "marida" aqui não sabe muito bem o que quer, né? Se o Rick for o líder, então o melhor amigo dele deve ser o co-líder, não é? ── Ele deu uma risada debochada. ── Vai ver é isso que eles têm, uma verdadeira democracia da confusão.

O tom de Merle não ajudou em nada a suavizar a tensão, mas isso também não parecia ser o objetivo dele. Ele gostava da confusão, do caos, do caos que quebrava as regras. A situação ficou ainda mais desconfortável, mas Coraline sabia que, naquele momento, precisava manter sua postura firme. Ela não poderia vacilar, não agora.

O ambiente estava prestes a explodir novamente, mas Coraline sabia que precisava ser mais forte do que nunca. Ela olhou para todos, e sua presença era um convite claro para a obediência.

── Se não sabem quem é o líder agora, vão aprender da maneira mais difícil ── ela disse com uma calma que fez até mesmo os mais resistentes ficarem em silêncio.

Antes de sair, Coraline olhou para Merle com uma expressão firme. Ele a conhecia bem o suficiente para entender o que ela queria.

── Merle, leva os meninos e ensina a eles o que conversamos sobre as armas. Eles precisam saber como se defender, mesmo que não gostem disso ── ela ordenou, sua voz sem espaço para contestação.

Merle assentiu sem dizer uma palavra, sabendo que não havia mais espaço para hesitar. Ele se levantou e foi em direção ao corredor, onde Owen e Liam ainda estavam, os dois provavelmente absorvendo o caos que havia acontecido na cozinha. Mas Coraline sabia que era importante, para o futuro deles, que aprendessem a lidar com as armas e as defesas. Ela não sabia se estaria lá para protegê-los o tempo todo.

Depois que Merle se afastou, Coraline foi até a janela, olhando para o vazio do lado de fora. Sua mente estava a mil, seus pensamentos se dividiam entre o que acabara de acontecer e o que viria a seguir. O silêncio do lugar parecia se arrastar, até que uma voz familiar a interrompeu.

Shane apareceu, caminhando em direção a ela com um olhar de remorso. Ele parecia tenso, os ombros caídos como se carregasse o peso de algo muito maior do que ele próprio podia carregar.

── Cora, eu... ── ele começou, com a voz baixa, antes de se calar por um momento, como se tentasse encontrar as palavras certas. ── Eu não queria que aquilo acontecesse, tudo saiu do controle. Lori foi tirar satisfação comigo, ficou brava por eu contar a verdade para Rick. E aí, tudo foi para o inferno quando Rick chegou. Eu... eu não sabia como lidar com isso, tudo aconteceu tão rápido...

Coraline o observou atentamente, ainda em silêncio, antes de finalmente responder. Ela sabia que a situação tinha escapado do controle, mas não podia culpá-lo por isso. Ela mesma havia dado o conselho para Shane, e os sentimentos e as decisões de Lori não ajudaram em nada a tornar as coisas mais fáceis.

── Não posso te culpar, Shane ── ela disse calmamente, sem levantar a voz. ── Eu mesma pedi para você contar a verdade. Sabia que, mais cedo ou mais tarde, isso teria que sair. Não sabia que isso ia virar um caos desse tamanho, mas... a verdade sempre sai. O problema é que, às vezes, ela sai na pior hora possível. Mas o que importa agora é que as coisas estão feitas. Não adianta chorar pelo leite derramado.

Shane a olhou, seu rosto mostrando um misto de frustração e alívio, como se, finalmente, alguém o entendesse. Coraline tinha uma maneira de fazer as pessoas verem as situações sob uma perspectiva diferente, mais pragmática. A verdade, agora, já não tinha mais volta.

Ela deu um pequeno suspiro e olhou para ele com seriedade.

── Rick e Lori vão ter que resolver isso entre eles, não podemos fazer nada. O que precisamos agora é ficar unidos, ao menos por enquanto. E qualquer outro problema, a gente resolve depois.

Ela colocou a mão no ombro dele, um gesto simples, mas que carregava a intenção de transmitir um pouco de apoio. Mesmo em meio ao caos, Coraline sabia que era importante manter a ordem dentro do grupo, e mais ainda, mostrar que a liderança dela era uma necessidade para todos.

Coraline caminhava pelos corredores, sua mente ainda trabalhando a todo vapor. Ela se movia com a cautela de alguém que sabia o peso de cada decisão, observando atentamente cada canto, cada som vindo das sombras, como se estivesse em patrulha. O CDC, em um momento de aparente calmaria, ainda estava repleto de tensões não resolvidas, e ela sentia que precisava manter o controle sobre cada situação que surgisse. Era sua responsabilidade garantir a segurança de todos, ainda mais com o caos interno que estava se formando.

Enquanto cruzava o corredor principal, ela deu de cara com Daryl. Ele estava parado, encostado na parede, com os braços cruzados e um olhar atento. Ele não parecia muito interessado nas conversas que rolavam nas outras salas, mas com certeza estava bem ciente de tudo o que acontecia. Coraline sabia que ele não era de falar muito, mas também sabia que, por trás de sua postura rude e silenciosa, Daryl tinha mais a oferecer do que muitas pessoas imaginavam.

Ela hesitou por um momento, não sabia muito bem como começar. Ela e Daryl ainda não haviam conversado muito, e ela sentia que precisava entender melhor o homem que era irmão de Merle, um homem que parecia tão silencioso quanto perigoso.

── Não te vi muito por aqui ── Coraline comentou de forma simples, tentando quebrar o gelo. Ela estava ciente de que a conversa poderia não ir muito longe, mas precisava entender com quem estava lidando, especialmente quando ele parecia ser uma peça tão crucial no que viria a seguir.

Daryl olhou para ela por um instante, os olhos azuis intensos e penetrantes, como se estivesse avaliando suas palavras e o porquê dela se aproximar. Não parecia ser algo que ele esperasse, mas também não o incomodou tanto assim. Ele não era um homem de muitas palavras, e Coraline sabia disso.

── Não sou de ficar muito no meio disso tudo ── ele respondeu, a voz rouca, como se estivesse mais interessado em ficar fora da agitação do que em se envolver nas conversas do grupo.

Coraline deu um pequeno sorriso, tentando entender sua perspectiva. Ela sabia que nem todo mundo tinha o mesmo impulso de se envolver nos conflitos ou nas dinâmicas internas de um grupo. Daryl parecia ser do tipo que preferia agir mais do que falar, algo que ela, de certa forma, respeitava.

── Entendo ── ela disse, mantendo o tom casual. ── Mas, com o que aconteceu hoje, você não acha que todos precisam estar mais unidos do que nunca? Tem algo que você acha que o grupo precisa saber ou fazer para estar mais preparado para o que está por vir?

Daryl olhou para ela mais uma vez, seus olhos não deixando transparecer muito, mas havia algo ali, um reconhecimento silencioso. Ele parecia estar refletindo por um momento antes de responder.

── O que precisamos é de ação ── ele disse finalmente. ── Não dá pra ficar aqui esperando que tudo se resolva sozinho. O mundo não vai esperar, e esse lugar... ── ele fez uma pausa, olhando em volta. ── Não é mais seguro do que qualquer outro. Se a gente não sair daqui, a hora vai chegar. E se não estivermos prontos, isso aqui vai ser o fim.

Coraline o observou com atenção, percebendo que, embora Daryl fosse um homem de poucas palavras, ele tinha uma clareza de visão que muitos no grupo pareciam faltar. Ele sabia que não podiam se dar ao luxo de esperar. O perigo estava lá fora, mas talvez o maior perigo fosse o que acontecia dentro do próprio grupo, com suas desavenças, incertezas e desconfianças.

── Eu concordo ── ela respondeu, a decisão firme em sua voz. ── Estamos todos em perigo, seja aqui ou lá fora. Precisamos ser mais estratégicos, e isso envolve trabalhar juntos.

Daryl fez um pequeno aceno com a cabeça, como se aquilo fosse o suficiente para ele. Sem mais palavras, ele se afastou, indo para o seu próprio caminho, provavelmente em busca de algo mais produtivo para fazer.

Coraline ficou ali por um momento, refletindo sobre o que ele disse. Ela sabia que ele tinha razão. A sobrevivência dependia da ação, e a unidade do grupo estava cada vez mais fragilizada. Ela sentia o peso da responsabilidade em seus ombros, mas, ao mesmo tempo, estava ciente de que não poderia hesitar. Ela precisava ser a líder que todos precisavam, mesmo que isso significasse fazer escolhas difíceis e assumir o comando de uma forma que nem todos concordariam.

Ela continuou seu caminho pelos corredores, mais certa do que nunca de que o que aconteceria a seguir dependeria das decisões que ela tomasse agora.

4319 palavras.

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