12. I like me better

❝ I like me better when,
I like me better when i am with you

Assim que entrei no carro de Shawn, joguei minha mochila no banco de trás e me afundei no assento do passageiro, soltando um suspiro pesado. Meu irmão ligou o motor sem pressa, me lançando um olhar de soslaio antes de sair dirigindo pelas ruas de Reseda. O carro estava silencioso, exceto pelo som baixo da rádio tocando alguma batida antiga de hip-hop. Mas minha mente estava longe, presa no dojo, ou melhor, presa na conversa que acabara de acontecer.

Eu realmente tinha falado aquilo para Lizzie? Confirmar algo? Sério?

Afundei ainda mais no assento, levando a mão até o rosto e esfregando os olhos. Sempre que ficava perto dela, acabava dizendo mais do que devia. Não era como se eu não tivesse filtro, eu tinha. Mas com Lizzie, era diferente. Ela sempre me pegava de surpresa com aquela honestidade crua, com aquele olhar direto que fazia parecer que ela enxergava tudo dentro da minha cabeça.

E agora? O que ela estaria pensando sobre aquilo?

Respirei fundo, tentando me convencer de que não era grande coisa. Eu só queria ter certeza de que não estava alucinando. De que não estava confundindo as coisas. Afinal, Lizzie era uma das minhas melhores amigas. A gente sempre saía, sempre treinava junto, sempre zoava um ao outro. Mas ultimamente... Não era só isso. O jeito como eu me pegava olhando para ela mais do que deveria. O jeito como o sorriso dela me deixava inquieto. O jeito como o tempo parecia passar diferente quando estávamos juntos.

Talvez, se agíssemos como se estivéssemos em um encontro de verdade, eu conseguisse confirmar minhas dúvidas. Talvez eu percebesse que era só amizade, e tudo voltaria ao normal. Ou talvez... Eu ficasse ainda mais confuso.

— Certo, que foi? — A voz de Shawn cortou meus pensamentos, e eu pisquei algumas vezes antes de virar o rosto para ele. Ele tinha um sorriso de canto, aquele típico sorriso provocador de irmão mais velho que sabia muito bem quando eu estava escondendo algo. — Você tá aéreo desde que entrou no carro.

Revirei os olhos, cruzando os braços.

— Não é nada.

— Ah, claro. "Não é nada" — Ele repetiu, sarcástico, dando uma risadinha enquanto virava uma esquina. — E aposto que esse nada tem um nome que começa com L.

Bufei, desviando o olhar para a janela.

— Dá um tempo, Shawn.

Ele riu mais alto.

— Aí, Kenny, não mente pra mim. Eu vi a cara que você fez saindo do dojô. Parecia que tinha visto um fantasma. Ou melhor, parecia que a garota tinha te dado um fora sem nem saber.

Cruzei os braços ainda mais forte, tentando ignorá-lo, mas meu rosto estava quente, e eu sabia que era inútil disfarçar. Shawn sempre foi bom em ler as pessoas, principalmente quando se tratava de mim.

— A gente só vai sair hoje — Murmurei, finalmente cedendo um pouco. — Só isso.

— "Só isso" — Shawn fez aspas com os dedos enquanto segurava o volante com uma mão só. — Tá bom, maninho. Se você tá dizendo.

Ele não perguntou mais nada, mas eu sabia que ele ainda estava se divertindo às minhas custas. Quando finalmente chegamos em casa, saí do carro rápido, pegando minha mochila no banco de trás e indo direto para dentro.

Minha mãe estava na cozinha, mexendo em algumas panelas, e acenou para mim quando entrei. Dei um aceno de volta antes de subir direto para o meu quarto, fechando a porta atrás de mim e soltando outro suspiro.

Eu precisava de um banho. E de um tempo para organizar meus pensamentos.

Joguei a mochila no chão e comecei a tirar o quimono, sentindo os músculos doloridos do treino. Caminhei até o banheiro e liguei o chuveiro, deixando a água esquentar um pouco antes de entrar. O vapor tomou conta do pequeno espaço, e eu fechei os olhos por um momento, deixando a água cair sobre minha cabeça e escorrer pelo meu rosto.

Respirei fundo.

Tudo bem. Era só um encontro. Quer dizer... Não um encontro. Mas um encontro.

Ótimo. Agora eu estava me confundindo com as próprias palavras.

Assim que terminei o banho, saí do banheiro, passando a toalha pelos cabelos enquanto olhava para o relógio. Ainda tinha tempo, mas precisava escolher uma roupa decente. Tudo bem que íamos para o Olive Garden, mas já era bem mais sofisticado do que qualquer lanchonete onde costumávamos sair. E era o que cabia no meu bolso.

Abri o guarda-roupa, puxando algumas camisetas e jogando na cama. Nada parecia bom. Nada parecia certo. Bufei, pegando uma camiseta preta simples e uma jaqueta jeans, junto com uma calça mais ajustada.

Eu estava mesmo me preocupando com isso?

Revirei os olhos para mim mesmo no espelho antes de terminar de me arrumar. Não era como se fosse uma ocasião super especial. Era só...

Só um encontro.

Suspirei.

Talvez eu realmente precisasse confirmar algumas coisas.

Depois de me vestir, parei em frente ao espelho do banheiro e dei uma última conferida no meu reflexo. Jeans preta, camiseta branca com um desenho discreto nas costas e meu Air Force, o tênis que ganhei no Natal e que era, sem dúvida, o meu favorito. Nada chamativo, nada exagerado, mas também nada que me fizesse parecer desleixado.

Passei a mão pelos cabelos, tentando ajeitá-los de um jeito minimamente decente, mas rapidamente percebi que não fazia muita diferença. Eles agiam do jeito que queriam, como sempre. Melhor deixar pra lá.

Dei um passo para trás, analisando o conjunto completo. Parecia... Bom. Eu parecia apresentável. Certo?

Suspirei e balancei a cabeça, saindo do banheiro. Não ia começar a me preocupar com minha aparência agora.

Enquanto descia as escadas, vi Shawn sentado no sofá, com os pés apoiados na mesinha de centro, segurando o celular. Ele ergueu os olhos assim que me viu e, no mesmo instante, um sorriso sacana se espalhou pelo rosto dele.

— Olha só quem resolveu se produzir todo — Ele provocou, largando o celular no sofá e me avaliando dos pés à cabeça. — Fez tudo isso para encontrar a namorada, é?

Revirei os olhos, pegando minha carteira e o celular da mesinha ao lado da porta.

— Ela não é minha namorada.

— Ainda.

Suspirei, ignorando o comentário enquanto abria a porta e saía. Mas, assim que fechei a porta atrás de mim e entrei no carro, senti um aperto no peito.

Lizzie não era minha namorada. Isso era um fato. Mas então por que, diabos, eu estava tão nervoso?

O caminho até o restaurante parecia mais longo do que realmente era. Eu me afundei no assento do carro, olhando pela janela, tentando não pensar muito, mas isso só fazia minha mente trabalhar ainda mais.

E se fosse estranho? E se Lizzie não gostasse? E se ela não falasse muito durante o jantar?

Isso seria um péssimo sinal, porque Lizzie sempre tinha algo a dizer. Sempre. Se ela estivesse quieta, significava que algo a incomodava. E se o que a incomodasse fosse... Eu?

Engoli em seco. Isso estava me deixando maluco. E a gente nem tinha se encontrado ainda.

Fiquei em silêncio no carro, observando as luzes da cidade passarem pela janela, as mãos inquietas sobre os joelhos. Meu pé batia levemente contra o assoalho, e eu nem percebia o quão ansioso estava até Shawn me lançar um olhar de canto e erguer uma sobrancelha.

O que eu estava fazendo? Sério, o que deu na minha cabeça quando convidei Lizzie para isso?

Não era como se eu tivesse um histórico de encontros ou soubesse como agir. Na verdade, nunca estive em um. Tudo o que eu sabia vinha de filmes e das conversas aleatórias que escutava nos corredores da escola. Mas agora eu estava indo para um de verdade. Com Lizzie.

Lizzie.

A garota que se mudou há quase dois meses e virou minha vida de cabeça para baixo.

Desde que ela chegou, foi um turbilhão de emoções inesperadas e desconcertantes. Primeiro, a gente se deu bem rápido demais. Eu não costumo confiar nas pessoas tão rápido, mas com Lizzie foi... Fácil. Depois, foi a raiva que senti quando a vi andando com Anthony, rindo das piadas dele, se dando bem com ele.

Isso me irritava. Mas por quê?

Era só porque Anthony e eu tínhamos um passado? Porque ele me infernizou durante anos e agora parecia querer fazer o mesmo com Lizzie? Eu não queria que ela passasse pelo que eu passei. Ou será que era outra coisa?

Essa dúvida estava me matando. Eu precisava descobrir. E, no fundo, era por isso que estava aqui agora.

Quando o carro finalmente parou em frente ao restaurante, engoli em seco. Meu coração acelerou um pouco mais, e eu quase disse para Shawn dar meia-volta. Mas antes que eu pudesse abrir a boca, ele apontou para a entrada do restaurante e disse:

— Vai lá, não deixa sua garota esperando.

— Ela não é minha garota. — Retruquei, estalando a língua contra os dentes.

Shawn só riu de um jeito presunçoso, e eu revirei os olhos antes de sair do carro, fechando a porta atrás de mim.

E então eu a vi. Tal qual um sonho.

Lizzie estava lá, parada na calçada, e, por um momento, o mundo ao meu redor pareceu sumir.

Uau. Ela parecia surreal.

O cabelo, que normalmente estava solto ou preso num rabo de cavalo desleixado, agora estava levemente preso na parte superior, com algumas mechas caindo sobre os ombros. O vestido de um tom azul com alças finas, estampado, abraçava o corpo dela de um jeito que eu nunca tinha notado antes. E ela tinha se maquiado. Não muito, só o suficiente para destacar os olhos e os lábios.

E, droga, ela estava linda.

Demorei alguns segundos para processar. Fiquei parado ali, na calçada, como um idiota. Então respirei fundo, recuperando o controle, e caminhei até ela, acenando meio desajeitado.

— Você está ótima.

Ela semicerrou os olhos levemente, um sorriso travesso surgindo em seus lábios.

— Obrigada. — Disse, antes de segurar meu braço.

Eu congelei.

Senti o toque quente dos dedos dela na manga da minha camisa, a leve pressão da mão dela segurando meu antebraço.

Lizzie arqueou uma sobrancelha, divertindo-se com minha reação.

— Ué, você não queria que fosse um encontro 'não como amigos'? — Ela inclinou a cabeça, o sorriso se alargando. — Só estou exercendo o meu papel.

Engoli em seco, rindo nervosamente.

— C-claro.

Me forcei a relaxar, mas meu coração já estava disparado. Isso poderia ser mais desconcertante do que eu esperava.

Assim que entramos no restaurante, o cheiro de comida italiana quente e temperos frescos tomou conta do ambiente. O som abafado das conversas e o tilintar dos talheres criavam um fundo agradável, mas, mesmo com toda essa movimentação, minha atenção estava focada em Lizzie ao meu lado.

Eu sabia que precisava escolher uma mesa rapidamente, então procurei um canto mais afastado, algo que nos desse um pouco mais de privacidade, mas sem parecer que eu estava tentando fazer disso algo muito íntimo. Foi quando vi uma mesa redonda, com assentos acolchoados, quase como um pequeno sofá circular.

— Aqui tá bom? — Perguntei, apontando para a mesa.

Lizzie deu de ombros, sorrindo.

— Perfeito.

Nos sentamos lado a lado, e foi aí que percebi o problema.

O espaço era menor do que eu tinha calculado. A proximidade era inevitável.

Eu conseguia sentir o perfume de Lizzie, algo fresco, levemente doce, e dava para perceber o calor do corpo dela ao meu lado. Minhas mãos estavam sobre a mesa, mas senti a ponta do cotovelo dela roçar levemente no meu. Uma parte de mim queria deslizar um pouco mais para o lado, criar algum espaço, mas outra parte...

Bom, outra parte não se importava tanto assim.

Lizzie, como sempre, quebrou o momento com seu tom leve e natural, preenchendo o ambiente de uma maneira que só ela sabia fazer.

— Já veio aqui antes? — Ela perguntou, pegando o cardápio.

Balancei a cabeça, relaxando um pouco.

— Uma vez. Jantar de família. Mas faz um tempo.

Ela assentiu, sem tirar os olhos do menu.

— E agora é mais você e seu irmão, né?

— É... — Murmurei, inclinando a cabeça levemente para trás. — Meu pai tá no exército, e minha mãe tá trabalhando muito ultimamente. Shawn ficou um tempo no reformatório... Ele era meio briguento.

Lizzie ergueu os olhos para mim, um brilho curioso neles.

— Meio?

Ri baixo, balançando a cabeça. Ela já ouviu algumas das histórias sobre ele durante nossas conversas no treino.

— Tá bom, muito briguento. Mas agora ele tá mais tranquilo. E pelo menos agora eu tenho alguém em casa pra contar, sabe?

Ela abriu um sorrisinho genuíno, aquele que fazia os olhos dela brilharem levemente.

— Isso é ótimo.

A forma como ela disse aquilo me fez sentir um calor estranho no peito. Peguei rapidamente o cardápio para disfarçar e, antes que eu pudesse olhar direito, Lizzie já estava apontando algo na página.

— Olha só, os crostinis são aperitivos gratuitos e são deliciosos.

Ergui uma sobrancelha, encarando-a. Era como se ela já soubesse dessa informação.

— Você já veio aqui antes?

Ela sorriu de lado.

— Na cidade onde eu morava, tinha um Olive Garden no mesmo quarteirão da escola. Eu e meus amigos íamos lá almoçar às vezes.

Inclinei um pouco a cabeça.

— Tipo, sempre?

Ela riu, dando de ombros.

— Na verdade... A gente mais ia pelos crostinis de graça.

Soltei uma risada, fechando o cardápio.

— Você é uma espertinha, hein?

— Sempre.

Nos olhamos por um segundo antes de rirmos juntos. A tensão inicial finalmente parecia estar desaparecendo aos poucos.

Chamamos o garçom, e eu percebi que, pela primeira vez naquela noite, eu estava me sentindo realmente confortável.

Assim que fizemos os pedidos, Lizzie apoiou as mãos sobre a mesa, estreitando os olhos para mim com um sorriso travesso. Eu já deveria saber que ela estava aprontando alguma.

— Então... — Ela inclinou um pouco a cabeça, como se analisasse minha expressão. — Sobre o que as pessoas conversam em encontros?

Eu quase me engasguei com a própria saliva.

Sério?

Como alguém simplesmente pergunta isso assim, sem qualquer aviso?

Forcei uma risadinha, tentando ganhar tempo para formular uma resposta que não me fizesse parecer um completo idiota.

— Eu... Não sei. Talvez sobre o clima? Sobre seus empregos? Sobre seu tipo ideal?

Lizzie arqueou uma sobrancelha e cruzou os braços.

— Essa foi bem específica.

— Eu vi isso num reality que minha mãe gosta de assistir. — Confessei, dando de ombros.

Ela soltou uma risadinha baixa.

— Fascinante.

Depois, suspirou, se encostando no sofá e ajeitando o vestido no colo.

— Certo, então, Kenny, qual sua profissão dos sonhos?

Estalei a língua, parando para pensar.

Essa era uma pergunta difícil. Eu ainda não tinha certeza sobre isso. Nunca tive. Meu foco sempre foi karatê, e, além disso, minha vida girava ao redor da escola e do Cobra Kai. Mas, se eu realmente parasse para refletir...

— Algo relacionado à música, talvez produção — Respondi, meio incerto. — É algo que eu gosto bastante.

Lizzie assentiu devagar, como se estivesse me analisando.

— Hm... Interessante. Combina com você.

— E você?

Ela molhou os lábios, pensativa, e então estalou os dedos, como se tivesse acabado de lembrar.

— Psicóloga.

Franzi o cenho, surpreso.

— Sério?

Lizzie assentiu, olhando para as próprias mãos por um instante.

— Eu quero ajudar pessoas como a minha mãe a superarem traumas difíceis. Eu sei que só dar porrada nos "problemas" não resolve tudo. As pessoas sempre saem quebradas, emocionalmente. E eu queria poder ajudar com isso.

Fiquei em silêncio por um momento, observando-a.

Era a primeira vez que eu a via falar sobre o futuro com tanta clareza. E, ao mesmo tempo, eu sabia o que estava por trás daquela resposta. Eu sabia que as coisas na casa de Lizzie eram complicadas.

Desde que ela chegou na cidade, já dava para perceber que existia algo que a incomodava, que ela carregava um peso maior do que a maioria das pessoas da nossa idade. Mas agora, com a mãe dela no hospital, sendo tratada por psiquiatras, e o pai dela preso, Lizzie estava praticamente sozinha.

Engoli em seco, tentando não ser invasivo.

— Você sabe quando sua mãe vai ter alta?

Lizzie suspirou, abaixando os olhos para a mesa.

— Eu fui visitar ela depois do treino, com o Terry. Os médicos disseram que ela está passando por uma depressão severa e... No estado de choque em que ficou depois daquele "acidente", ela simplesmente não consegue mais falar. É como se tivesse um bloqueio.

A voz dela vacilou, e eu percebi o brilho úmido em seus olhos antes mesmo das lágrimas caírem.

Sem pensar muito, estendi a mão e, com o polegar, enxuguei a primeira lágrima antes que ela escorresse. Lizzie ergueu o olhar para mim, surpresa com o gesto. Por um momento, apenas nos encaramos.

Meu coração deu um salto estranho no peito. A proximidade, o olhar dela... Tudo aquilo mexeu comigo de um jeito que eu não sabia explicar.

Eu rapidamente afastei a mão, pigarreando.

— Sinto muito por isso, Lizzie — Murmurei, tentando ignorar a sensação estranha em meu peito. — Mas aposto que logo ela vai melhorar.

Lizzie forçou um pequeno sorriso e assentiu.

— Estou torcendo por isso... — Ela desviou o olhar, brincando com a borda do guardanapo antes de completar — Até lá, Silver disse que eu poderia ficar na casa dele. Assim, eu não fico sozinha.

Franzi o cenho automaticamente. Terry Silver era um ótimo sensei. Eu nunca poderia negar isso. Mas ele não era pai. Ele sabia dar aulas, sabia ensinar a lutar, mas será que sabia realmente cuidar de alguém?

Lizzie não tinha mais ninguém na cidade. Ela estava completamente vulnerável, e agora estava vivendo na casa de um velho rico e solitário. Isso me preocupava mais do que eu gostaria de admitir. Mas ela confiava nele. E, no final das contas, talvez essa fosse a melhor escolha para ela agora.

— Entendi... — Murmurei, tentando esconder a inquietação na minha voz.

Lizzie ergueu o olhar para mim, como se esperasse que eu dissesse algo a mais. Mas o que eu podia dizer? Eu só podia torcer para que Terry Silver realmente estivesse cuidando dela do jeito certo.

Lizzie suspirou pesadamente e apoiou um dos cotovelos sobre a mesa, recostando o queixo sobre a palma da mão. Seus olhos castanhos brilharam sob a iluminação suave do restaurante, e um sorrisinho brincalhão dançou em seus lábios.

— Certo, pra cortar esse clima de velório, que tal explorarmos outro tópico? — Disse ela, erguendo as sobrancelhas de um jeito exagerado.

Soltei uma risada nasal, sacudindo a cabeça. Era impossível não me divertir com a forma teatral com que Lizzie falava, como se estivéssemos interpretando um casal de trinta anos recém-saído do Tinder, tentando forçar uma conexão no primeiro encontro. A verdade é que essa brincadeira tornava tudo mais leve. Mais fácil.

— Beleza — concordei, cruzando os braços sobre a mesa. — O que quer saber agora?

Ela estalou os dedos e apontou para mim com um ar investigativo.

— Seu tipo ideal.

Engoli em seco. Por essa eu não esperava. Senti meu cérebro travar por um segundo, a boca se abrindo sem que nenhuma resposta concreta surgisse. Gaguejei por reflexo antes de me recompor rapidamente.

— Eu... Eu não tenho um tipo ideal — Respondi, tentando manter a voz estável. — Só alguém com quem eu me sinta bem de estar perto.

Lizzie inclinou a cabeça levemente, observando-me com uma expressão contemplativa antes de sorrir.

— Isso é muito fofo.

Senti minhas bochechas esquentarem instantaneamente. O calor subiu pelo meu rosto como uma onda inevitável, e desviei o olhar para a mesa, lutando para não parecer tão óbvio.

Lizzie, por sua vez, desviou o olhar para o lado, brincando com a borda do guardanapo antes de continuar.

— Eu gosto de um desafio a mais — Ela disse, sua voz saindo levemente sonhadora. — Alguém que me provoque, mas que traga, sei lá... Mais movimento pra minha vida. De um jeito bom, é claro. Porque eu quero conhecer o mundo todo um dia. Tem que ser com alguém que também esteja disposto a esse tipo de aventura.

Eu a observei enquanto ela falava, notando a firmeza em suas palavras. Ela parecia tão certa daquilo, tão segura do que queria. Enquanto isso, eu não fazia ideia. Eu nunca tinha parado para pensar sobre esse tipo de coisa. Relacionamentos. O futuro. Como eu me sentia em relação a alguém. Eu sempre fui o cara que vivia o agora, sem planos muito concretos para nada além do karatê e do que vinha pela frente no Cobra Kai. Mas Lizzie... Ela já tinha tudo desenhado em sua mente.

E, por algum motivo, isso me deixava inquieto.

Eu queria explicar isso para ela. Eu queria que ela entendesse que eu não sabia onde estava pisando, que meus sentimentos estavam confusos, que tudo isso ainda era um território completamente desconhecido para mim.

Abri a boca para começar.

— Lizzie, eu...

Mas, no exato instante em que comecei a falar, ela também soltou uma frase ao mesmo tempo.

— Eu gosto de você.

Ela fechou os olhos com força, como se pudesse se arrepender no segundo seguinte, mas as palavras já tinham saído.

Eu congelei.

Simplesmente travei.

O tempo ao meu redor pareceu desacelerar. O som ambiente do restaurante, as vozes, os pratos tilintando... Tudo ficou abafado, distante. Meu coração martelava no peito, pulsando tão forte que eu conseguia senti-lo nos ouvidos.

Lizzie desviou o olhar, parecendo nervosa, mordendo levemente o lábio inferior antes de soltar, num tom hesitante:

— Você... Me chamou pra esse encontro...

Ela deixou a frase no ar, como se esperasse que eu completasse. Meu cérebro não estava funcionando direito, mas as palavras simplesmente escaparam antes que eu tivesse tempo de processar.

— Porque eu acho que também gosto de você.

Saiu automaticamente. Instintivo. Sem que eu sequer tivesse medido as palavras.

E então foi a minha vez de ficar em choque.

Eu disse isso mesmo?

Sim. Eu disse.

E talvez fosse verdade. Dois meses convivendo com alguém não eram pouca coisa. E não era só "alguém". Era Lizzie.

O silêncio que se seguiu foi curto, mas pareceu uma eternidade. Lizzie arregalou os olhos por um instante, como se estivesse absorvendo minha resposta. Então, um sorriso tímido, porém genuíno, surgiu em seus lábios.

Antes que eu pudesse sequer pensar no que dizer a seguir, ela fez algo que me pegou completamente de surpresa.

Ela se inclinou ligeiramente para frente e me deu um selinho.

Foi rápido. Um toque suave e fugaz de seus lábios nos meus. Apenas um instante. Mas, para mim, pareceu que o mundo inteiro tinha parado. Meu coração esqueceu como bater, e uma corrente elétrica atravessou meu corpo da cabeça aos pés.

Lizzie se afastou no segundo seguinte, rindo baixinho, talvez constrangida, talvez apenas brincalhona. Eu, por outro lado, soltei um suspiro profundo, ainda tentando processar o que tinha acabado de acontecer.

E então nós dois rimos. Levemente. Talvez pelo nervosismo, talvez pela situação ridícula de dois adolescentes descobrindo sentimentos que nem sabiam que tinham. Mas antes que eu pudesse dizer qualquer coisa, antes que qualquer um de nós pudesse quebrar aquele momento e verbalizar qualquer reação, o garçom chegou com nossos pratos.

E, de repente, toda aquela atmosfera intensa e sentimental foi quebrada por um prato fumegante de massa e um cesto de crostinis.

Lizzie limpou a garganta, voltando a sua postura habitual, e eu rapidamente me recompondo, tentando ignorar o fato de que meu rosto ainda estava quente.

O encontro continuava. Mas, de alguma forma, tudo parecia diferente agora.

Depois de terminarmos de comer, o clima entre nós continuava carregado de uma estranha tensão. Não era ruim, longe disso. Era desconcertante, sim, mas ao mesmo tempo, trazia uma sensação de satisfação, como se algo muito importante tivesse sido resolvido sem que nenhum dos dois precisasse colocar tudo em palavras. As conversas fluíam naturalmente, mas com uma nova camada de consciência, como se estivéssemos nos medindo sob essa nova perspectiva.

Cada pequeno gesto parecia mais significativo agora. Quando Lizzie tocava o cabelo, quando me olhava rapidamente e desviava o olhar, quando ria de algo que eu dizia, tudo ganhava um novo peso, como se tivéssemos passado para um outro nível da nossa relação, mesmo sem definir exatamente o que éramos agora. E, por mais que fosse um pouco confuso, era bom. Realmente bom.

Saímos do restaurante juntos, o ar noturno mais fresco do que eu esperava. A rua estava tranquila, iluminada pelos postes amarelos, e as vozes das poucas pessoas que passavam soavam como um eco distante. Lizzie avistou um carro na beira da calçada e apertou um pouco os olhos para confirmar antes de falar:

— Terry já está ali. Ainda vou treinar, então não posso voltar muito tarde. — Sua voz soou quase como um pedido de desculpas, mas ela não precisava se desculpar. Lizzie era assim, determinada e disciplinada.

Pisquei algumas vezes, absorvendo a informação antes de responder:

— É... Claro. É melhor você ir...

Minha própria voz saiu meio hesitante, não porque eu discordasse, mas porque minha cabeça ainda estava a mil por hora, tentando processar tudo o que tinha acontecido naquela noite. Meu coração ainda estava um pouco acelerado, e eu sabia que, assim que me visse sozinho no carro com Shawn, a ficha iria cair de vez.

Lizzie mordeu o lábio inferior, hesitante. Eu percebi a movimentação, mas antes que pudesse sequer pensar no que fazer, ela deu um passo à frente e, em um gesto rápido e inesperado, se inclinou e pressionou um beijo suave na minha bochecha. O toque foi breve, mas deixou um calor espalhando-se por toda a minha pele.

Ela se afastou quase no mesmo instante e virou-se para mim com um sorriso de canto, o olhar brilhando de maneira divertida.

— Me liga. A gente pode jogar uma partida de Dungeon Lord. — A forma como ela disse aquilo fez parecer tão simples, como se não tivéssemos acabado de confessar nossos sentimentos um para o outro.

Um sorriso largo se formou no meu rosto antes que eu pudesse controlar. Eu apenas assenti e a vi se afastar até entrar no carro de Terry Silver. Assim que o carro arrancou, soltei um longo suspiro e passei as mãos no rosto, tentando me recompor. Meu coração ainda batia rápido, e agora eu sentia uma mistura estranha de euforia e confusão. O que isso significava para nós dois? De amigos para... O quê, exatamente? Tudo tinha acontecido tão de repente, e eu ainda não sabia como lidar com a ideia de que agora havia algo mais entre nós.

Sacudi a cabeça para afastar os pensamentos e segui até a esquina, onde Shawn tinha dito que me esperaria. Assim que o vi encostado no carro, já soube que ele ia dizer alguma coisa assim que eu entrasse. E eu estava certo.

Assim que fechei a porta, ele virou-se para mim com um sorrisinho presunçoso.

— Cara, você tá vermelho. O que foi? — Ele zombou, cutucando meu ombro com o cotovelo.

Eu abaixei a cabeça por um momento, ainda sentindo a adrenalina daquela noite correndo pelo meu corpo. Então soltei, quase num sussurro:

— Ela... Me beijou.

Shawn arregalou os olhos por um segundo, mas logo deu um soco leve no meu braço e riu.

— Tá brincando?! Esse é meu garoto! — Ele me olhou com um ar de aprovação exagerado, como se estivesse realmente orgulhoso de mim.

Eu ri junto, mas ainda sentia meu estômago revirando, não por nervosismo, mas pela nova realidade que estava se formando entre mim e Lizzie. Eu gostava dela. Ela gostava de mim. Mas e agora? O que vinha depois?

Fiquei em silêncio o caminho todo para casa, encarando a janela e sentindo as luzes da cidade passarem borradas diante dos meus olhos. A única coisa que eu sabia era que minha mente estava uma bagunça e, por mais irônico que fosse, talvez uma sessão de treino me ajudasse a clarear as ideias. Eu precisava disso. Precisava encontrar um jeito de entender tudo o que estava acontecendo, porque, uma coisa era certa, Lizzie não era alguém que eu poderia simplesmente ignorar. Ela já tinha se tornado parte da minha vida, e agora, eu precisava descobrir exatamente qual era o nosso próximo passo.

Obra autoral ©

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