09. California Girls

Acordei com a luz da manhã atravessando a cortina mal fechada, um raio insistente queimando direto nos meus olhos. O latejar na cabeça me atingiu antes mesmo de eu conseguir me mover. Levei a mão ao rosto, esfregando os olhos, mas o gesto só trouxe uma pontada ainda maior na minha testa. Meu corpo parecia pesado, quase como se eu tivesse carregado todo o peso do mundo nas costas na noite anterior.

E então, como uma maré cruel, as lembranças da noite passada começaram a se formar, ganhando nitidez.

O karaokê.

Hanna.

O palco.

Minha tentativa patética e completamente descontrolada de... O quê exatamente? Impor algo? Mostrar que eu tinha alguma espécie de controle, quando claramente estava fora de mim?

A vergonha subiu como fogo, queimando meu peito e se espalhando pelo meu rosto. Passei a mão na nuca, tentando afastar o calor que sentia, mas era inútil. A humilhação estava cravada em mim, me deixando com uma sensação amarga que parecia impossível de ignorar.

Como eu pude ser tão idiota? Tão fraco?

Me virei na cama, encarando o teto. Cada palavra que Hanna havia dito, cada risada sarcástica dela e de Yoon, tudo parecia ecoar na minha mente. E então, a pior parte, o olhar dela quando me derrubou. Não era só raiva. Era desprezo. Como se eu fosse insignificante, menos que um adversário. Como se eu fosse algo para ser descartado, irrelevante.

E ela estava certa. Pelo menos naquele momento, eu era.

Suspirei profundamente, tentando empurrar o nó na garganta para longe. Mas os problemas não paravam por aí. Kwon. Ele estava irritado, furioso, para ser mais preciso, e com razão. Não que eu temesse aquele moleque. Ele podia ser ágil, mas eu sabia que era mais forte. Ainda assim, ter mais um inimigo, especialmente alguém tão perto de Hanna, só tornava tudo mais complicado. Era como se eu tivesse me enfiado em um ninho de cobras por vontade própria.

E Wolf... Se ele descobrisse o que aconteceu, o quanto eu me perdi, o quanto eu deixei Hanna me tirar do sério, eu estaria morto. Ele não precisava de um membro da equipe que se deixasse manipular assim. Ele precisava de força, de controle, e claramente eu não tinha nenhum dos dois.

Com outro suspiro, me forcei a sair da cama. Cada movimento parecia pesar toneladas, mas ficar ali remoendo o que aconteceu não ia ajudar. Precisava me levantar, me recompor, mostrar que, pelo menos para mim mesmo, ainda havia algo a ser salvo.

Caminhei até o banheiro, sentindo os músculos rígidos e uma leve dor nos ombros e nas costas. Provavelmente da maneira como caí no chão depois que Hanna me derrubou. Só de lembrar disso, cerrei os punhos, a raiva misturada com o arrependimento pulsando em minhas veias.

Entrei no chuveiro, ligando a água no máximo. O jato gelado me atingiu como um soco, mas era exatamente o que eu precisava. Deixei a água correr pelo meu corpo, tentando lavar não só o suor e a ressaca, mas também a sensação sufocante de humilhação.

Encostei as mãos na parede do chuveiro, deixando a cabeça pender para frente. A água escorria pelo meu rosto, pingando no chão, e tudo o que eu conseguia pensar era em como consertar isso. Não podia mudar o que aconteceu, mas também não podia permitir que isso me definisse.

Eu precisava ser melhor. Mais forte. Mais inteligente.

Hanna podia ter vencido aquele round, mas isso não significava que ela ganharia a guerra.

Saí do chuveiro com a determinação renovada, ainda que frágil. Peguei a toalha e me enxuguei rapidamente, sentindo o corpo mais acordado, ainda que a cabeça continuasse pesada. Me olhei no espelho por um momento, o reflexo me encarando de volta com olhos cansados e uma expressão dura.

Hoje era um novo dia. E eu ia me levantar, não importa o quão fundo eu tivesse caído.

⋆౨˚ ˖

Eu estava no meu canto, aquecendo os braços e pernas enquanto tentava afastar a sensação de tensão no peito. Meu corpo estava pronto, mas minha cabeça ainda lutava para focar. O círculo no centro do tatame parecia maior do que nunca, como se a gravidade dali me puxasse mais forte do que qualquer treino já feito.

Zara não parava de falar ao meu lado, e isso me deixava ainda mais inquieto.

— Sério, Axel, hoje é o dia. Eu vou acabar com aquela loira. Tory, né? A garota acha que pode fazer o que quiser porque tem Robby e sabe-se lá mais quem debaixo do dedo.

Ela bufou, alongando os braços enquanto continuava.

— Eu não vou ficar assistindo ela rebolar por aí achando que manda no pedaço. Se ela acha que pode me enfrentar, mal posso esperar para vê-la cair de cara no tatame.

Revirei os olhos. Não sei se era o nervosismo, mas o jeito como ela estava obcecada com esse triângulo amoroso entre ela, Tory e Robby me deixava impaciente.

— Zara, sério... Tanto faz. Isso aqui é o Sekai Taikai, não um programa de reality show. Foca na luta, pelo amor de Deus.

Ela me lançou um olhar de canto, mas não rebateu. Talvez tivesse sentido o peso no meu tom. Ou talvez soubesse que, no fundo, eu estava apenas tentando me convencer de que deveria fazer o mesmo.

Minha mente já estava em outro lugar. Não importava o quanto eu tentasse ignorar, meu foco sempre acabava voltando para ela, Hanna. Era inevitável.

A equipe do Cobra Kai estava na borda do tatame, exatamente oposta a nós. Kwon estava inquieto, marchando para lá e para cá como um animal enjaulado. Não era surpresa, o moleque tinha uma energia explosiva, e, depois da noite de ontem, eu sabia que ele estava me aguardando. Mas não era ele que fazia minha respiração pesar.

Era Hanna.

Ela estava ali, ajustando as faixas dos pulsos com movimentos precisos, quase cirúrgicos. Os olhos dela mal desviavam para qualquer outro lugar, como se cada fibra do corpo estivesse em alerta. Quando nossos olhares finalmente se cruzaram, senti como se o tempo parasse por um segundo.

O sorriso dela era afiado, quase cruel. Não precisava dizer nada; seus olhos faziam o trabalho de transmitir a mensagem: Você é um alvo, e eu vou acabar com você.

Engoli seco, desviando o olhar. O nervosismo subiu como uma onda, mas tentei sufocá-lo. Ela queria que eu me abalasse. Queria que eu me enfraquecesse antes mesmo de pisar no círculo. Eu não daria esse gostinho a ela.

No entanto, a voz grave de Wolf cortou meus pensamentos.

— Atenção, alunos. Vocês sabem o plano. Não é só força que vence aqui, é estratégia. Lutem como uma equipe, mas não hesitem. Se for necessário, passem o bastão. Não pensem, só ajam.

Assentimos em uníssono, e eu respirei fundo. Minhas mãos estavam fechadas em punhos, suando levemente.

O árbitro chamou as equipes para o centro do tatame, e fomos nos posicionando ao redor do círculo. Meus olhos imediatamente buscaram os de Hanna, mas, dessa vez, ela não estava olhando para mim. Isso, de algum modo, era ainda pior.

O apito soou, e o primeiro lutador da nossa equipe entrou no círculo. Era um dos novatos, claramente nervoso. Do outro lado, Kwon já estava pronto. Não precisei nem olhar muito para saber o que ia acontecer.

O moleque partiu para cima como um raio, com uma sequência de chutes rápidos que deixou nosso novato na defensiva. Ele nem teve chance. Um chute giratório no peito o desequilibrou, e, antes que pudesse reagir, um soco rápido no rosto selou o ponto para o Cobra Kai.

Engoli minha frustração enquanto o novato cambaleava de volta para o nosso lado. Kwon estava sorrindo, apontando diretamente para mim enquanto voltava para o canto dele. O moleque queria me provocar, e, pior, estava conseguindo.

Respirei fundo. Minha vez chegaria. Eu só precisava segurar firme e me lembrar de quem eu era, não do que eles queriam que eu fosse.

Eu estava ali, com o peso do olhar de Kwon em cima de mim, e ele parecia tão confiante quanto um leão prestes a devorar sua presa. As palavras dele, baixas e carregadas de desafio, ficaram ecoando na minha cabeça enquanto ele murmurava sobre "acabar com a minha raça". Por um momento, não pude deixar de sentir um calafrio, mas forcei a sensação para longe. Eu sabia que ele estava mais focado em me derrotar do que em qualquer outra coisa.

A luta estava prestes a começar, e o árbitro deu a sinalização. Primeiro, era a vez de Zara enfrentar Tory. Zara parecia estar dominando no início, seus golpes rápidos e certeiros estavam fazendo Tory parecer... Perdida, como se não soubesse para onde estava indo. Cada golpe de Zara parecia um estalo de precisão, enquanto Tory hesitava, claramente desconcentrada. Eu me senti um pouco aliviado por ela estar com a vantagem, mas logo Tory bateu a mão com Yoon, e ele entrou no círculo com uma velocidade surpreendente. A luta ficou equilibrada por um momento, mas, no final, Yoon teve a vantagem e Zara, embora esforçada, teve que recuar.

Zara passou rapidamente a mão com Chad, e logo ele estava no centro do círculo. O novato parecia disposto, mas era claro que a experiência de Chad não era suficiente para lidar com a intensidade de Yoon. Após alguns segundos de troca de golpes rápidos, Chad foi derrubado, e o Cobra Kai marcou um ponto. A frustração começou a me apertar ainda mais, eu sabia que seria minha vez logo.

E então, chegou o momento.

Wolf me deu um olhar que me dizia tudo, o olhar de um comandante que esperava vitória. Respirei fundo e entrei no círculo, sentindo o peso de todo o treinamento e das expectativas pesando nos meus ombros. Eu tinha que mostrar que não era só um gigante de aço de fachada. Kwon entrou no tatame para me enfrentar, seu sorriso era tão arrogante quanto sempre. Ele parecia ansioso para a luta, cada movimento calculado, como se já soubesse o que iria fazer.

Os primeiros movimentos foram rápidos, Kwon era ágil, seus socos eram bem colocados, suas pernas como lâminas cortando o ar. Eu consegui desviar de alguns deles, mas ele também me acertou, e a cada golpe que me atingia, eu sentia o impacto reverberar, mas não ia me deixar abalar. Eu era forte, e essa força me dava vantagem.

Mas algo estava errado. Eu podia ouvir o som das vozes ao fundo, as provocações de Kwon, mas algo mais cortava o barulho, como uma lâmina que cortava o silêncio. O som do grito de Hanna, logo seguido pela sua voz alta e imponente.

Me deixa entrar!

Aquela palavra, entrar, foi o suficiente para me desconcentrar. Não sabia o que esperar, mas o pior aconteceu. Kwon parecia irritado, mas ele rapidamente bateu a mão em minha direção, dando a vez a Hanna. A visão dela entrando no círculo foi como um choque elétrico em meu corpo. Eu hesitei, um maldito momento de dúvida.

Você é meu, gigante de aço.

Eu nunca pensei que seria tão difícil manter a compostura quando ela estava ali, encarando-me com aquele sorriso vitorioso. Eu sabia que estava em desvantagem, e, ao contrário do que eu queria acreditar, Hanna tinha essa habilidade de desestabilizar qualquer um, especialmente eu.

Ela avançou com uma velocidade impressionante, o corpo dela fluindo como uma sombra, e eu... Eu hesitei. Era como se o tempo tivesse desacelerado, e todos os meus pensamentos se confundissem. O que eu estava fazendo? Eu sabia o que ela queria, mas estava paralisado, meu foco em pedaços.

Ela me atingiu com um golpe rápido, sem aviso, e, antes que eu pudesse reagir, ela me derrubou no chão. O impacto foi tão rápido que nem percebi o que aconteceu. Tudo que eu sabia foi que, de repente, a vitória estava do lado do Cobra Kai, e a equipe deles comemorava enquanto eu estava no chão, incapaz de entender como isso aconteceu.

Eu bati o punho no tatame, a frustração me consumindo por dentro. Como pude ser tão fraco? Como pude ser tão idiota? Toda a luta, toda a preparação, tudo aquilo tinha sido em vão.

Eu saí do círculo, sentindo os olhares de todos sobre mim. Wolf, claro, estava me fuzilando com os olhos, esperando que eu sentisse o peso do fracasso. Mas nada disso parecia tão importante quanto o sorriso de Hanna. Ela estava vitoriosa, mas eu sabia que essa vitória dela tinha um preço. Ela queria me ver fraco. E, por um momento, ela conseguiu.

Enquanto ela enfrentava agora Zara, seus olhos me encontraram, e a sensação de derrota aumentou. Mas eu não podia me deixar abater. Não ainda.

A tensão no ar era palpável. Eu estava fora do círculo, ainda sentindo o impacto da derrota que Hanna me causou. O Cobra Kai parecia ter tomado o controle da situação, e tudo o que eu queria era sumir. Não apenas pela derrota, mas por como me senti vulnerável diante dela. No entanto, minha mente ainda estava presa àquela cena, o jeito como ela lutava, como seus olhos queimavam com raiva e confiança. Era impossível ignorar isso. Era como se, por mais que eu tentasse, ela estivesse enraizada em minha cabeça.

Tory, com a expressão tensa, pediu para entrar no lugar de Hanna, mas ela balançou a cabeça negativamente, seus olhos fulgurantes de raiva. Eu podia perceber que ela sabia o que estava fazendo. Havia uma estratégia ali, e ela estava ciente de que Tory, com toda a sua força, não tinha a calma e a precisão para lidar com Zara. Tory estava desestabilizada, talvez com a pressão, talvez por tudo que estava acontecendo com o Keene. Eu não sabia, mas não era hora de questionar. Era hora de agir.

A luta entre Zara e Hanna começou, e as duas se encararam com intensidade. Zara, com sua técnica precisa e a força de quem havia treinado por anos, partiu para a ofensiva logo de início. Ela se movia rápido, seus socos parecendo blocos de cimento que atingiam o ar com uma força avassaladora. No começo, parecia que Zara tinha o controle. Cada golpe que ela desferia parecia acertar Hanna com precisão. Mas então, Hanna, com a calma de quem sabia exatamente o que fazer, começou a girar e a se mover com uma fluidez impressionante. Ela esquivava, se abaixava e se deslocava de maneira quase hipnótica. Seus pés pareciam deslizar pelo tatame, e ela começou a dominar a luta de forma calculada, como se estivesse apenas esperando pelo momento certo para atacar.

Eu podia ver o esforço em Zara, mas não era o suficiente. A precisão de Hanna estava destruindo as defesas dela aos poucos. Um soco certeiro de Hanna acertou o abdômen de Zara, fazendo-a cambalear para trás. Ela tentou se recompor, mas, antes que pudesse se levantar, Hanna já estava em cima dela, um chute rápido que Zara não conseguiu evitar. O impacto foi tão forte que a vi cair no tatame, e o árbitro sinalizou que o Cobra Kai marcava um ponto.

A vitória do Cobra Kai na rodada estava praticamente garantida agora. Se o Iron Dragons perdesse contra o Miyagi-Do em seguida, a nossa eliminação seria iminente. E era nisso que minha mente se fixava. Não na derrota pessoal, mas na pressão do que estava por vir. A raiva, a frustração, tudo estava se acumulando dentro de mim.

Eu me sentia como se tivesse falhado. Como se tivesse deixado Hanna mexer com a minha cabeça, e agora estávamos à beira da eliminação. Mas, mesmo com toda a revolta, não conseguia tirar os olhos de como Hanna lutava. A maneira como ela se movia, como tudo parecia tão natural para ela, como se nada fosse um desafio. Ela tinha uma destreza, uma força que eu não podia ignorar, e, por mais que eu tentasse, ela continuava ali, em minha mente, desafiando minhas emoções, meu controle, minha própria definição de quem eu era como lutador.

Aquela sensação estranha... Era como se eu fosse impotente diante da habilidade dela, e isso me irritava profundamente. Não importava o quanto tentasse, não conseguia parar de pensar nela. O jeito como ela movia seu corpo, como seus olhos pareciam que podiam ver através de qualquer coisa, a maneira como cada golpe parecia uma extensão natural de si mesma. Ela não estava apenas lutando contra uma oponente. Ela estava lutando contra mim o tempo todo, e eu estava perdendo essa batalha sem nem perceber.

A vitória de Hanna, embora me deixasse furioso, também me deixava com uma sensação de algo mais, algo complexo. E tudo isso me fazia querer apagá-la dos meus pensamentos. Mas quanto mais tentava, mais ela voltava, com sua presença desafiadora, inatingível.

⋆౨˚ ˖

A noite na praia estava fria, mas o som das ondas quebrando contra a areia era reconfortante. Meu corpo ainda doía dos treinos e das derrotas acumuladas, mas não conseguia parar. Cada golpe que eu desferia no ar ou no saco de pancadas improvisado era como uma tentativa de exorcizar as vozes na minha cabeça, Wolf me pressionando, Hanna rindo, Kwon me xingando. Tudo isso me corroía.

Eu estava concentrado, suor escorrendo pela testa, quando ouvi passos atrás de mim. Por um instante, meu coração acelerou. Hanna? Pensei. Talvez fosse ela de novo, pronta para jogar mais insultos na minha cara. Mas, quando me virei, encontrei Samantha, a garota do Miyagi-Do.

Ela me deu um sorriso suave, quase brincalhão, enquanto se aproximava.

— Uau, você está realmente dando duro, hein? — Disse ela, apontando para os golpes que eu estava praticando.

Soltei uma risada curta, pegando minha regata e a vestindo.
— Só quero ser o melhor — Respondi, tentando soar casual, mesmo que minha voz carregasse o peso da exaustão.

O olhar dela se estreitou, focando nas marcas nas minhas costas enquanto eu ajeitava a camisa.

— Isso... Está tudo bem? — Perguntou, hesitante.

Toquei instintivamente as costas. Os hematomas ainda estavam sensíveis.

— Me machuquei no treino, só isso — Menti, tentando parecer desinteressado.

Ela balançou a cabeça, claramente cética.

— Eu vi o que seu sensei fez hoje. Ele sempre os machuca assim?

— Não é isso. — Respondi rápido demais, talvez. — Ele só quer que sejamos os melhores.

Ela pareceu querer dizer algo, mas suspirou e desviou o olhar. Para evitar mais perguntas, perguntei por que ela estava ali.

— Só queria esvaziar a mente. A praia parecia o lugar certo.

Eu assenti, compreendendo mais do que gostaria de admitir. Aquele era meu motivo também.

— Quer companhia?

Antes que ela pudesse responder, um som seco ecoou na noite. Palmas. Meus ombros ficaram tensos imediatamente. Eu conhecia aquele som.

Levantei o olhar e lá estava ela, Hanna. Ela se aproximava, com aquele sorriso sarcástico estampado no rosto.

— Olha só se não é o gigante de aço tentando beijar outra garota...

Meu corpo congelou, e um calor subiu pelo meu rosto. Atrás dela, Yoon e Kwon surgiram como sombras, claramente prontos para causar problemas.

Samantha deu um passo à frente, a voz firme.

— Eu estava indo embora. Deixem a gente em paz.

Kwon, com aquele ar debochado que parecia genético, bloqueou o caminho dela.

— E pra onde você pensa que vai, princesa?

Eu não pensei duas vezes. Dei um passo para frente, colocando-me entre eles.

— Deixa ela ir, Kwon.

Antes que ele pudesse responder, Hanna se colocou na minha frente, aquele sorriso desdenhoso ainda mais afiado.

— E você acha mesmo que vai sair assim tão fácil, depois do que fez no karaokê?

Levantei as mãos, tentando evitar mais confusão.

— Eu estava bêbado. Não queria fazer nada daquilo, juro.

Ela estreitou os olhos, a raiva evidente em seu rosto.

— Agora a merda já tá feita.

Kwon gritou, apontando o dedo para mim.

— Você é um pervertido nojento!

Eu senti meu sangue ferver, cerrando os punhos. Mas, antes que pudesse reagir, Yoon avançou. Ele era rápido, mas eu estava preparado.

Ele tentou me acertar com um soco direto, que bloqueei com o antebraço. Retaliei com um golpe no peito, fazendo-o cambalear para trás. Ele recuperou o equilíbrio rapidamente, chutando em um arco baixo. Pulei para trás, sentindo o vento do golpe passar por mim, e aproveitei a abertura para acertar um cruzado de direita no rosto dele. Ele grunhiu de dor, mas não parou.

No canto do meu olho, vi Samantha tentando se defender de Kwon, mas antes que pudesse fazer algo, Hanna gritou.

— Ninguém bate no meu irmão, sua vadia!

Hanna avançou sobre Samantha, e as duas começaram a lutar. Não pude ver os detalhes, mas era óbvio que Hanna estava ganhando. E isso só aumentava minha frustração.

Yoon voltou a atacar, e mais uma vez eu bloqueei, mas Kwon entrou na briga, chutando minha lateral enquanto eu defendia Yoon. O impacto me fez cair de joelhos. Eu mal tive tempo de levantar antes de levar outro soco de Kwon no rosto, seguido por um chute de Yoon que me jogou na areia.

Tossi, sentindo o gosto de sangue na boca, mas me forcei a levantar. Eles não iam me derrubar tão fácil, mas, no fundo, eu sabia que estava em desvantagem. E tudo isso porque Hanna não saía da minha cabeça.

A luta continuava feroz, mas meu corpo já estava cansado. Cada golpe que eu dava, cada defesa que tentava, parecia insuficiente. O som abafado das ondas misturava-se ao som de gritos e impacto de golpes, tornando tudo surreal. Eu vi de relance quando Hanna, com uma precisão impressionante, acertou Samantha com um chute giratório. A força a derrubou na areia com um baque seco, e algo em mim se partiu naquele momento. Eu quis correr até ela, mas antes que pudesse sequer mover um músculo, senti uma mão me empurrando para trás.

Hanna afastou Kwon e Yoon com um movimento firme, quase como se estivesse protegendo algo, e se ajoelhou sobre mim, o joelho cravado na boca do meu estômago. A dor era intensa, mas o que mais me paralisava era o olhar dela. Aqueles olhos cheios de raiva, desafiadores, pareciam despir minha alma.

Eu fiquei parado. Não era medo. Era algo mais profundo, algo que eu não sabia como nomear. Lágrimas quentes começaram a se formar nos meus olhos, não de dor, mas de pura frustração e humilhação. Como ela conseguia me desmontar dessa forma, me reduzir a nada?

Ela me agarrou pelo colarinho da regata, puxando-me para mais perto. Sua voz era baixa, mas cada palavra carregava um peso que parecia esmagador.

— Se formos mesmo começar esse jogo sujo de tentar mexer um com o outro, eu sugiro que esteja preparado. — Sibilou. — Porque vou te fazer engolir o choro e esse seu sotaque ridículo.

Eu não conseguia reagir. Era como se eu estivesse preso naquele momento, apenas absorvendo tudo o que ela dizia.

— Guarde minhas palavras, "dragão de ferro". — Ela continuou, ironizando o nome do meu dojô com aquele tom cortante. — Você está prestes a entrar num mundo de dor.

Ela se levantou, me empurrando de volta contra a areia com força suficiente para me fazer tossir. Meu peito subia e descia rapidamente, os músculos tensos, mas minha mente era um caos. Eu deveria ter dito algo, feito algo, mas não consegui.

— Vamos embora! — Hanna ordenou, e, como se fossem cães bem treinados, Kwon e Yoon a seguiram, jogando olhares de desprezo enquanto se afastavam.

Eu fiquei ali por alguns segundos, olhando para o céu noturno. As estrelas pareciam tão distantes, quase como uma lembrança de algo inalcançável. Minha cabeça latejava, mas era minha dignidade que doía mais.

Forçando meu corpo a se mover, me levantei e fui até Samantha. Ela estava sentada, limpando a areia das mãos, com a bochecha levemente vermelha do impacto, mas parecia bem.

— Ela machucou você? — Perguntei, a voz rouca, ainda cheia de emoções que eu não conseguia processar.

Samantha balançou a cabeça, dando um sorriso pequeno, quase resignado.

— Não... Ela só me derrubou. Mas foi estranho. Ela estava lutando como se não quisesse me machucar de verdade.

— Como assim? — Perguntei, franzindo o cenho.

— É como se ela quisesse só machucar você. — As palavras dela eram simples, mas carregavam uma verdade que ecoava dentro de mim.

Respirei fundo, deixando o ar frio encher meus pulmões.

— É... Parece que é exatamente isso.

Fiquei ali parado, olhando para o mar. A noite era fria, mas o calor da humilhação e do embaraço me fazia ferver. Eu sabia que não tinha terminado. Hanna não era o tipo de pessoa que deixava as coisas pela metade, e agora, mais do que nunca, eu precisava encontrar uma maneira de me recompor. Não por mim, mas porque eu sabia que a próxima vez que nos encontrássemos, ela viria ainda mais forte. E eu não podia deixar que ela me quebrasse novamente.

Obra autoral ©

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