06.
HÉCTOR FORT
📍 BARCELONA, ESPANHA
A dor imensa que eu estava sentindo em meu peito, não podia ser comparada com nada que já tinha acontecido em minha vida. Nada me ajudaria nesse momento.
A única pessoa que realmente se importava comigo e cuidou de mim a minha infância toda, que me deu amor incondicional que meus pais nunca souberam dar a mim.
Minha avó tinha falecido, e saber que não vou poder ir a Madrid para o velório não adiantava nada, tudo isso se quando eu preciso da minha maldita liberdade eu não posso tê-la.
Encaro a sala de casa completamente vazia e silenciosa. Maya estava viajando com Pablo, não a culpo de não estar aqui agora, mas porra ela ainda é a única pessoa que me resta que eu ainda acho que me ama. Eu só queria poder ganhar um abraço de uma única pessoa verdadeira.
Levanto-me do chão, e, caminho pelos corredores vazios da casa em direção ao escritório do meu pai, abro as portas e entro no local que parecia sombrio, as luzes se acenderam automaticamente, fazia tempo desde a última vez que esse lugar foi aberto. Passo pela mesa e puxo a cadeira giratória me sentando, abro uma das gavetas que a mesa contia, com um gesto automático, tirei um cigarro do maço amassado que estava no fundo da gaveta.
Os meus dedos um pouco trêmulos para acender o isqueiro, a chama finalmente acendendo a ponta do cigarro, dei a primeira tragada, sentindo a fumaça preencher meus pulmões, exalo lentamente, observando a nuvem cinzentada se dispersar no ar.
Tiro o meu celular do bolso do moletom que eu usava, o colocando em cima da mesa e percebendo o visor dele se acender com a ligação da Maya, desligo totalmente.
Puxo a toca do meu moletom, sentindo cada tragada que parecia acalmar os meus pensamentos.
Uma coisa que nunca iria mudar era a sensação de estar sozinho novamente, e, infelizmente, ninguém poderia mudar esse sentimento que eu estava sentindo.
Eu não era uma pessoa que fumava, mas nos momentos que me sentia solitário, isso parecia como o meu refúgio, a sensação familiar do cigarro entre os meus dedos e o gosto amargo na boca eram mas conhecidos. Era algo que eu fazia apenas em momentos sozinhos, e que preferia manter esse segredo longe de todos.
Com um suspiro resignado, dei a última tragada profunda, segurando a fumaça por um segundo antes de liberá-la ao vento, apago o cigarro no cinzeiro, olhando para as grandes janelas de vidro do chão ao teto que oferecia a vista para a cidade de Catalunha.
Passei um longo tempo encarando a vista, enquanto me lembrava da minha infância quando me dei conta que as lágrimas já rolavam pelo meu rosto.
— Héctor! — A voz doce e calma que estava presente em quase todos os meus dias, chamou pelo meu nome —
Viro a cadeira em direção de onde a voz tinha vindo percebendo a silhueta de Luna parada na porta, o meu olhar vago até encontrar os olhos azuis que estavam com uma tonalidade mais escura.
Não precisei dizer nenhuma palavra para ela caminhar até mim e me puxar para um abraço caloroso.
— Eu sempre vou estar aqui com você, eu te prometo — Luna diz com sua voz suave —
Senti um calor inesperado em meu peito, ao mesmo tempo de eu sentir tudo sumir por um momento por estar com ela.
— Luna… — Comecei, sentindo minha voz tremer ligeiramente. — Me desculpa te fazer passar por isso.
Ela afastou seu corpo rapidamente do meu, encarando os meus olhos, talvez, tentando procurar algo que eu não conseguia decifrar.
Luna levantou suas mãos e tocou levemente meu rosto, limpando as lágrimas que escorriam.
— Eu não me importo, você me faz bem, quero te ver melhor ainda, você não merece tudo isso que está passando — Ela respondeu cautelosa tentando me reconfortar com as palavras, algo impossível no momento —
— Ela me deixou a única pessoa que me amava verdadeiramente — Senti um nó em minha garganta, e meus olhos arderam —
— Não diga isso. — Luna murmurou, com a voz cheia de emoção — Você ainda tem a mim. A Maya e os seus pais.
— Eles me odeiam! Nunca realmente fizeram o papel de pais em minha vida, eles acham que o desgosto que dei a minha avó foi um dos motivos da morte dela, Luna — Argumentou baixinho, com a dor evidente em meus olhos —
Luna balançou a cabeça enquanto nossos olhares estavam fixados.
— Sei que é difícil, mas você sabe que isso não é verdade, Héctor — Ela falou segurando o meu rosto firmemente, desvio o olhar do dela —
— Às vezes, parece que nada vai mudar. Que eu sempre vou estar preso nesse ciclo de dor. — Respondi com a voz carregada de ressentimento, ela virou meu rosto para que eu pudesse a olhar —
— Me sinto tão mal de te ver assim, se culpando por tudo oque acontece ao seu redor. Eu repito a você, a culpa de Christian estar morto, não é sua. Muito menos da sua avó — Ela tentou transmitir confiança nas palavras, solto um longo suspiro —
— Eu sei que isso tudo está doendo muito agora, mas você vai conseguir superar, pode parecer impossível nesse momento, mas você vai conseguir. E eu vou estar ao seu lado, um dia de cada vez — Luna contínuo —
— É difícil acreditar nisso agora — Eu tentei encontrar consolo em seu olhar sincero —
— Eu sei — Ela disse suavemente, seus polegares acariciando meu rosto — Mas não precisa acreditar sozinho. Eu vou acreditar por nós dois até que você consiga.
Seus olhos brilhavam com uma determinação que quase me fez acreditar.
— Obrigado, Lua — Sussurrei, sentindo um pequeno sentimento de esperança —
Ela sorriu levemente, e puxou meu rosto para mais perto do dela selando nossos lábios em um beijo, calmo e delicado.
Quando nos afastamos, sorri, os olhos dela estavam brilhando.
— Posso te falar uma coisa? — Ela perguntou, assentindo para que ela continuasse — Você está sendo o meu paciente preferido.
Ela suspirou perto da minha orelha, não pude conter um sorriso pequeno em aparecer em meus lábios
— Posso te contar uma coisa também? — Perguntei, Luna balançou a cabeça em concordância — Você está sendo minha fisioterapeuta preferida, Lua.
Os nossos olhares se encontraram novamente, o clima pesado tinha se suavizado um pouco.
▪︎🇪🇦▪︎
Em um impulso de desespero, ao olhar a cicatriz que ainda era evidente em meu pescoço, virei-me abruptamente e soquei o espelho do banheiro. O vidro estilhaçou-se com um som agudo, e senti uma dor cortante em minha mão, seguido de um calor úmido.
As vozes em minha cabeça me fazendo querer para-lá de ecoar em meus pensamentos.
“Você aprenderá a nunca mais se intrometer onde não é chamado, moleque”
A memória da lâmina sendo passada por meu pescoço, e sentindo o sangue escorrendo, enquanto minha mãe olhava tudo sem fazer nada, o desespero em meu olhar por ver que realmente ela não se importava comigo. Muito menos o meu pai que feriu o filho sem pensar duas vezes.
Escorreguei minhas costas pelas paredes até sentir o chão gelado, me encolhendo e levando as duas mãos para os lados da cabeça.
A dor física se misturando com as vozes que não parava de se repetir em minha cabeça, as lágrimas escorrendo por meu rosto, comecei a soluçar descontroladamente.
“Você foi um erro em nossas vidas”
“A Maya sempre será o nosso orgulho”
“Eu deveria ter aceitado a ideia de seu Pai, e ter abortado quando descobrirmos ser menino”
As palavras que cresci escutando só aumentavam em minha cabeça, fechei meus olhos com força.
Escutei a porta do banheiro sendo aberta.
— O’que você fez? — Luna falou em um tom desesperada, ajoelhando-se ao meu lado —
— Eu… eu não sei… — Balbuciei, sentindo-me perdido e quebrado como os estilhaços do vidro espalhados no chão — Faz essas vozes parar, Luna. Por favor.
Abri os meus olhos para olha-la, ela parecia meio perdida enquanto me encarava, me encolho ainda mais, ela se aproximou e me abraçou fortemente.
— Eu tô aqui, isso é coisa da sua cabeça. Tenta se livrar disso, por mim — Ela se afastou segurando meu rosto — Pare de se prender nisso, Héctor.
Fechei os olhos novamente, sentindo o peso das palavras dela.
— Meu deus, sua mão! — Luna exclamou se levantando rapidamnte e pegou um pano tentando estancar o sangue que escorria do corte — Você não pode se machucar assim…
— Eu não me importo, essa dor não se compara com essa que estou sentindo aqui — apontei para o lado esquerdo do meu peito —
— A gente já conversou sobre isso, você precisa enterrar esse seu passado traumático, se não você irá viver preso a situações similares a essa, Héctor — Ela respondeu, respiro fundo passando a mão por meu rosto tentado enxugar as lágrimas que escorriam —
— Não é tão fácil assim. Eu não consigo colocar para fora tudo oque está dentro de mim, porra eu estou cansado dessa merda de vida. Porque eu só me fodo, sozinho — Despejei as palavras, sentindo o meu peito arder. —
— Não fala isso, você é uma pessoa importante na vida de muitos, pare de pensar dessa maneira — Ela a pediu, olhando no fundo dos meus olhos — Quer me contar porquê fez isso?
Engoli em seco, abaixando a cabeça.
Eu tinha medo de contar isso a ela, nem mesmo a Maya que é minha irmã sabe dessa parte da minha vida. Mas eu sentia que precisava desabafar com alguém, tirar um pouco desse peso que carrego em meus ombros durante anos.
Me calar sobre esse trauma me fez ter que aguentar muitos pesadelos.
— Eu vou te contar. Me promete não falar isso para ninguém? Nem mesmo a Maya sabe sobre isso. — Argumento, encarando Luna que se sentou ao meu lado, segurando minha mão que estava coberta com o pano —
— Eu prometo a você, Héctor — Ela falou com o tom de voz firme, desviei o olhar para outro canto do banheiro —
— Eu tinha sete anos… quando aconteceu o que me marcou, essa cicatriz — Apontei para a cicatriz em meu pescoço — Aconteceu porquê eu estava andando de skate pela casa, eu ainda morava em Madrid. Eu fui no escritório do meu pai para pedir a ele e mamãe para me levaram para jogar bola, mas ao entrar na sala, encontrei eles conversando com umas pessoas estranhas negociando drogas, eu nunca soube o porque deles venderam isso a nossa família era bem financeiramente. Eu tentei sair da sala sem ninguém perceber, mas minha mãe impediu, e bom, eles esperaram as pessoas irem embora.
Dei uma pausa limpando as lágrimas que escorreram pelo meus rosto. Doía demais relembrar o passado.
— Meu pai falou que não era para mim entrar assim e que eu estava no momento errado naquela sala, e, teria uma consequência por entrar no escritório. Ele pegou uma lâmina industrial, e passou no meu pescoço, ele pouco se importou de estar me machucando, minha mãe presenciou tudo e não fez nada, naquele momento eu soube que eu pouco importava na vida deles, a partir desse dia eu pedi para morar na casa da minha avó. Até para ela eu menti, esse corte que eu tive no pescoço para todos foi apenas que eu tinha me machucando com um arame enquanto andava de bicicleta, eu menti para todos e ninguém acreditaria em mim… eu nunca contei isso a nenhuma pessoa, você foi a primeira, e, não quero ninguém sabendo disso ainda, então guarde esse segredo, Luna — Expliquei calmo, desviando o olhar para ela que me olhava tentando processar minhas palavras ditas —
— Isso é horrível. Eu nem consigo imaginar como você se sentiu — Ela começou, com a voz um pouco trêmula, mas firme — Eu prometo que nunca vou contar isso a ninguém, esse segredo está seguro comigo.
Ela fez uma pausa, como se tivesse pensando as suas próximas palavras com cuidado.
— Eu posso? — Ela perguntou apontando em direção a cicatriz, suspirei e assenti, tombei a cabeça para o outro lado —
Senti os dedos dela passando pela cicatriz, o toque dela fez um arrepio percorrer o meu corpo.
Contar tudo a ela me fez sentir um alívio, mesmo que o passado ainda doesse. Luna conseguiu me passar conforto e sentir que ainda tem alguém que se importe comigo mesmo que seja o mínimo.
— Luna… obrigado por me escutar e, me ajudar nesses momentos — Agradeci, e meus olhos encontraram os dela novamente —
— Eu sempre vou estar com você, não importa onde eu ou você esteja, sempre estarei com você — Ela argumentou, sorrindo fraco —
Ela me puxou para um abraço, o único que realmente me fazia sentir bem e que me acalmava.
— Agora vamos! Eu vou te ajudar com sua mão, Héctor — Ela falou ao desvencilhamos do abraço, levantou-se estendendo a mão para mim —
— Certo, eu prometo te obedecer em tudo, Lua — Suspire, aceitando a mão dela e me levantando com a ajuda —
O sentimento que eu estava sentindo em meu peito, não passaria tão rápido. Mas espero que com a ajuda de Luna acho que talvez, possa conseguir superar, esse trauma e culpa que estou carregando durante esse tempo.
001. Esse capítulo me fez chorar tanto enquanto eu escrevia, isso me deixou mal, mas é a algo que vocês precisam saber sobre o Héctor o porquê dele ser como ele é.
002. O trauma dele com os pais, me deixou tão mal escrevendo isso.
003. Desculpa qualquer erro ortográfico. Espero que estejam gostando da Fanfic.
004. Tik Tok Biah.jr e Instagram Autorabiah_
005. Votem e comentem muito no capítulo para a liberação do próximo. Bjos da Bia.
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