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23 de outubro de 2010
𝙃𝙖𝙣𝙣𝙖𝙝 𝙄𝙨𝙖𝙗𝙚𝙡 𝙂𝙧𝙞𝙢𝙚𝙨
Esbarrar com o Daryl na floresta não estava nos meus planos, não mesmo. Eu só queria aliviar a bexiga onde ninguém pudesse me ver. Faço a trilha de volta ao acampamento em silêncio. Até pisar no local e Lori e Shane virem correndo até mim, os olhos carregados de preocupação.
— onde você se enfiou? — ela questiona, me olhava de cima a baixo, a proucura de ferimentos.
— estou bem — forço um sorriso — eu só precisava... você sabe, tirar a água do joelho.
Ela franze a testa, Shane olhava em volta, parecia buscar algo.
— tudo bem, só me avise antes, para que eu não fique preocupada.
Lori sempre foi super protetora comigo. Ela meio que me criou, então eu entendo, é o lado mãe falando mais alto. Afirmo e voltamos para o centro do acampamento. Logo encontro Glenn, já está com sua barraca montada e conversa com uma garota loira, ele sorri ao me ver chegar.
— Hannah, que bom que chegou, quero te apresentar a alguem. Essa é a Amy — ele diz, a garota sorri amigavelmente — Amy, essa é a Hannah.
Cabelos loiros, pele branca, magra, Amy é linda. Retribuo o sorriso agradável e aperto sua mão com gentileza.
— oi Amy, é um prazer conhecer você.
— o prazer é meu. Você é gata — ela diz, toda entusiasmada, sorrio tímida.
Está bem na cara de que Amy é extrovertida, e eu gostei muito disso.
— obrigada, você também é muito bonita — agora ela sorri animada. — Glenn, você não sabe o que acabou de me acontecer.
Eles param e ficam me encarando. Glenn logo se anima, é louco por fofoca.
— não mesmo, conta logo. — diz apressado, fazendo a garota rir
Olho em volta, verificando se alguém nos ouviria. Não conheço ninguém por aqui, mas não gostaria que todos ficassem sabendo sobre a minha vida. Gosto de ser misteriosa.
— entrei na floresta para fazer um xixi em paz, entende? Sem pervertidos para me olhar pagando calcinha — ele levanta as sobrancelhas, está pronto para brigar comigo por ter me afastado — sem esporros, este não é o foco do assunto.
— estou te ouvindo — ele diz, agora está sério
— esbarrei no Daryl por lá — ele abre a boca — eu me perdi e ele me trouxe de volta.
— e como foi? — pergunta baixinho, Amy presta atenção em cada frase, mas não entende muito
— caótico — balanço os ombros — primeiro ele me chamou de idiota, depois me chamou de Isabel.
— seu nome não era Hannah? — Amy pergunta confusa, Glenn ri e eu também
— Hannah Isabel — ele explica, ela afirma com a cabeça — ele a chamou pelo segundo nome. Normalmente quando eu chamo a Hannah de Isabel, é porque estou com raiva ou ela me esconde algo.
— enfim, ele provavelmente acha que somos namoradinhos, eu e você — aponto para nós dois. Ele se espanta, arregalando os olhos.
Não é novidade confundirem eu e Glenn com um casal. Vivemos juntos para cima e para baixo, ele vive na minha casa e eu na dele, eu cuido da irmã dele, somos carinhosos um com o outro e buscamos a gigi na escola juntos, é fácil para isso acontecer. Mas isso acontecia quando ainda tínhamos uma casa para morar. Não pensei que tirando a maioria desses acontecimentos ainda poderíamos ser confundidos com um casal.
— não são namorados? — Amy pergunta, não consegue esconder a surpresa em seu olhar
Glenn a olha incrédulo, como se aquilo fosse o pior xingamento de todo o universo.
— até você? — diz ofendido, nos fazendo rir — Hannah, ele é assustador. E se ele tentar me matar enquanto eu durmo?
— por que ele te mataria? — Amy e eu perguntamos em uníssono
Ele levanta uma sobrancelha, como se fosse algo óbvio e nós duas fôssemos cegas demais para não enxergar.
— eu sei lá, aquele cara me dá calafrios.
— não seja idiota, Glenn. Daryl jamais te machucaria. Mas não tenha tanta certeza quanto ao Merle, o irmão mais velho — digo, ele me olha ainda mais espantado.
Olho para o Dixon mais velho, sentado em uma cadeira de praia em frente à sua barraca já montada. Sua carranca de poucos amigos estava exposta aos quatro ventos, deixando bem claro que não queria papo com ninguém.
— por que você só se envolve com homem problemático? Qual é o problema com os certinhos? — pergunta indignado
O olho com um sorriso saliente, Amy cai na gargalhada.
— você é podre, Hannah.
[...]
A noite já caiu, tem uma fogueira no centro do acampamento, algumas pessoas estão ali reunidas enquanto jantamos em silêncio. Não vejo os irmãos Dixon em lugar algum, o que me leva a pensar que eles devem estar na floresta ou em suas barracas.
O jantar é silencioso, vez ou outra algumas pessoas comentam sobre o que acontece, mas ninguém quer preocupar as crianças, então não nos aprofundamos ao assunto. Giulia está escorada em mim, mais dormindo do que acordada.
— vem, te levo para dormir — digo, a aconchegando em meu colo
Lori e Lara acabaram de sair com as crianças, e por coincidência, suas barracas são próximas umas das outras. Me aproximo da barraca de Glenn, abaixo com dificuldade e abro a portinha. Coloco Gigi em um dos colchões infláveis e tiro seu tênis.
— seu sobrinho é legal, tia Hannah — ela comentou, a voz sonolenta demais para prolongar o assunto.
Sorrio, sabendo que esses dois ainda me darão muita dor de cabeça juntos.
— não era assim que eu imaginei apresentar vocês dois, mas o que importa é que se deram bem — ela sorri.
Dou um beijo de boa noite em seu rosto e a espero apagar. Glenn não demora muito para aparecer, ele me olha atentamente, tentando decifrar algo.
— tem algo de errado — ele diz, ainda me analisa — vem, vou te levar para seu carro e a gente conversa sem medo de acordar a Giulia.
Sem poder rebater, me levanto e andamos até meu carro. Adentramos o banco de trás. Assim que entramos, solto um suspiro frustrado.
Glenn não é bobo, ele já percebeu que tem algo de errado, e ele sabe exatamente o que é. Então, ele fecha a porta do carro e me puxa para um abraço aconchegante. As lágrimas não demoram a cair, os soluços eram baixinhos.
— foi difícil me manter forte durante todo o dia — fungo, ele acaricia meu ombro — o meu irmão está morto, Glenn. Rick morreu e o mundo está em ruínas.
Ele suspira, sem saber o que dizer.
— sinto muito, Isa — beija meu cabelo — mas ainda estou aqui.
— ele me pedia para voltar pra casa nos fins de semana e eu só aparecia nas datas comemorativas. Fala sério, eram só duas horas de carro. — digo entre o choro — eu o abandonei e ele morreu, ele morreu. Eles sempre morrem.
Naquele momento, a dor e o desespero finalmente chegou em meu peito. Naquele momento, a verdade me atingiu em cheio. Não tem para onde correr, Rick está morto e aquilo abriu um buraco enorme em mim. A sensação do luto sendo cravada com uma adaga enorme em meu coração, me tirando o chão e o ar.
Eu quero gritar, espernear, chorar até todas as minhas forças irem embora, mas não posso. O meu choro ainda é baixo, mas é intenso. É como se alguém estivesse apertando meu coração com todas as suas forças.
— vai ficar tudo bem, estou aqui com você.
Choro nos braços de Glenn por muito tempo. Ele me ouve com atenção e cautela, me diz que tudo ficará bem, e eu acabo apagando em seu ombro.
24 de outubro de 2010
Acordo com o sol em meu rosto. Estou coberta e com uma almofada em baixo da cabeça. Não me lembro de muito, mas vi o Glenn sair tarde da noite, provavelmente depois que eu apaguei de vez.
Me sento, esperando a alma voltar para o corpo. Olho em meu relógio, ainda é cedo. Apesar de ainda ser muito cedo, as pessoas se levantavam e já havia movimento pelo acampamento.
Já posso sentir as consequências da noite passada. Minha cabeça dói e meu rosto está vermelho e inchado, revelando que eu chorei até dormir. Pego uma toalha e uma bolsinha com produtos de higiene. As meninas ainda não estão de pé e acho que Glenn e Shane também não, então resolvo descer para o lago sozinha. Provavelmente ouvirei sermões por um bom tempo caso descubram, mas preciso mesmo de um banho.
O lago não fica tão longe, mas tem uma pequena descida até ele e eu certamente iria sofrer para subir de volta. Assim que avisto o lago, enxergo Daryl saindo de dentro d'água, só usa um calção fino para tampar sua intimidade. Tento não reparar no seu físico extremamente definido ou na sua entradinha que está exposta.
Ele me vê antes mesmo de eu chegar até lá, tratando de encontrar sua toalha o mais rápido possível.
— o que faz aqui tão cedo e sozinha? — ele questiona, uma toalha já cobre seu corpo
Deixo minha toalha e a bolsinha em cima de uma pedra e tiro a blusa, ficando só de sutiã. Daryl desvia o olhar imediatamente, se virando para as pedras para me dar privacidade.
— meu carro é quente e minha cabeça está prestes a explodir de tão dolorosa. — murmuro, a voz sai mais rouca do que o esperado.
Ele se vira para mim, me analisando com mais calma, tentando encontrar o problema.
— você chorou? — pergunta, não o respondo e continuo tirando minha roupa — sabe que alguém pode aparecer a qualquer momento, não sabe?
Desabotoo minha calça e a puxo para baixo, Daryl arregala os olhos e me olha incrédulo.
— vai mesmo ficar seminua na minha frente? — desvia o olhar outra vez.
Nada que você nunca tenha visto. Gostaria de dizer, mas me limito a ser educada.
— pode subir, eu me viro sozinha — digo, jogando a calça junto à camiseta e a toalha
Ele bufa e se afasta, sumindo do meu campo de vista. Aproveito que ele foi embora e tiro o sutiã. Tomo um banho calmo e tranquilo, esfriando a mente e afastando a sensação estranha que me invadia e rasgava o peito. Não demoro muito ali, logo saio e visto minhas roupas outra vez. Não sou burra, sei o perigo que corro ao estar aqui sozinha.
Guardo tudo na bolsinha novamente, colocando a toalha no ombro e virando na pedra grande, dando de cara com Daryl. Está com a besta nas costas. Levo minha mão ao peito pelo susto.
— o que faz ai, Dixon? — arqueio as sobrancelhas
— impedindo que alguém te visse sem roupa ou que você morresse por um zumbi — balança os ombros.
— sei me cuidar sozinha — volto a andar, ele me acompanha
— com certeza — ele murmura
Resolvo não dizer muita coisa, minha cabeça dói a cada palavra que sai da minha boca. Daryl me olha outra vez, sinto isso. E toda vez que sinto, cada mísero cabelo em meu corpo se arrepia, o coração palpita mais rápido e a respiração se ofega.
— se me olhar muito eu vou achar que não superou — digo, ele faz uma cara engraçada.
— você se acha demais — ele murmura sério — nem é tudo isso
O olho com as sobrancelhas arqueadas e um sorriso esboçado.
— está mentindo, sou tudo e mais um pouco — brinco, ele faz um barulho com a boca, me fazendo rir.
Logo me arrependo da risada, minha cabeça dói o dobro. Levo a mão à têmpora, a massageando levemente, Daryl parece perceber.
— você... tá legal? — pergunta meio receoso. Me obrigo a lhe dar um sorriso forçado, que claramente foi percebido.
— é só uma dor de cabeça, estou bem.
Ele afirma. Subimos pedreira a cima, três minutos depois já estamos de volta ao acampamento. Antes de seguir caminhos diferentes, eu me viro para ele e sorrio gentilmente.
— obrigada por me esperar — digo, ele afirma com a cabeça — foi legal da sua parte.
— te vejo por ai, até.
— até — respondo, vendo ele se afastar
Sigo caminho de volta até o meu carro. Adentro ele e cubro as janelas com toalhas e lençóis, coloco meu cobertor entre os bancos da frente, evitando que alguém me veja pelada ali dentro. Tiro minha roupa e visto uma limpa e seca que eu já tinha deixado separado.
É uma camiseta branca e uma calça tectel também branca, visto tudo e assim que abro a porta do carro, dou de cara com o Daryl outra vez. Ele estava parado em frente a porta, provavelmente se perguntando se deveria ou não bater.
— Daryl? Precisa de algo? — pergunto curiosa
Ele tenta se explicar, mas falha na tentativa inicial. Seguro o riso e ele respira fundo.
— te trouxe remédio para enxaqueca — estica a mão, me entregando a cartela de remédio — sei que é enjoada com isso, mas esse não tem gosto de nada, é só engolir sem mastigar e fica tudo certo.
Sorrio com seu gesto solidário.
— isso foi fofo — falo, ele estala a língua, me fazendo rir — obrigada, eu não trouxe remédios comigo e ia ter que pedir algum para Lori ou a minha irmã.
— ou o seu namorado — ele rebate, me sento na beirada do banco
— Glenn e eu não somos namorados — digo, o sorriso sapeca nos lábios — está com ciúmes, Dixon?
Ele arqueia as sobrancelhas e me encara sério, mas logo desvia o olhar.
— claro que não — rebate rapidamente — preciso ir. Tome o remédio, Hannah.
Ele me dá as costas e sai. Fico sentada ali por alguns minutos, tentando assimilar o que acabou de acontecer. Daryl me esperou no lago, subimos juntos, demos risada de algo e ele me deu o único remédio que eu tomo. Balanço a cabeça e pego a cartela e uma garrafinha de água que ainda tinha ali, tomo o remédio e me jogo no estofado do carro outra vez.
— por que eu vi o seu ex saindo de trás do seu carro e as janelas estão cobertas? — a voz de mimha irmã me assusta
Levanto a cabeça, a enxergando parada na porta, está com as mãos na cintura.
— não tive uma recaída, se é isso que está pensando — me deito outra vez.
Ela joga minhas pernas para baixo e adentra o carro sem aviso prévio, já vai tirando os lençóis e os dobrando.
— então o que aconteceu e por que você sorri feito boba para o teto do carro?
Fecho a cara e dou um tapa em seu ombro, ela faz careta e massageia o local.
— desci no lago, ele estava lá, me esperou tomar banho porque disse que era perigoso, subiu comigo e me deu remédio para enxaqueca. Só isso, senhora dorameira.
Ela para o que fazia e me encara, me sento e vejo o sorriso saliente nascendo aos poucos. De certa forma, se alguém me dissesse tudo isso, eu teria a mesma reação. É estranho agir assim com ex namorados,
— não diga nada, eu sei como isso soa.
— dou uma semana para que vocês tenham a primeira recaída, depois da primeira vai ser difícil não ter uma segunda, terceira... décima. Até não se tornar mais uma recaída e oficializarem em um relacionamento
— ele só foi gentil. Desencana, Lara.
Ouço Glenn pigarrear e olho em sua direção, ele tem o mesmo sorriso que a Lara. Pelo visto, terei de aguentar esses dois por um longo tempo.
— vim te perguntar se estava melhor, mas eu acho que já consegui a minha resposta — ele brinca
— passou mal, Bebel? — toca meu rosto e nem espera que eu responda, sai me puxando pela mão — vem, vamos tomar café
— estou bem, Larinha. Eu só precisava... de um ombro para deitar e chorar durante horas
Ela me olha, enfim entendendo sobre o que Glenn se referia. Lara suspira pesadamente e posso ver seu olhar triste outra vez. Glenn fala que vai acordar a irmã e sai de cena. Esse garoto só solta a bomba e some.
Sei que Lara não irá me contar como se sente, e eu não a contei como me sinto, pois temos o mesmo problema, não querer incomodar ninguém com a nossa dor e sofrimento. Sempre fomos assim, e por ela não saber lhe dar muito bem com seus próprios problemas, eu escondo os meus.
— é melhor a gente só ir tomar café mesmo, Lara. Não comi muito bem no jantar e estou pagando por isso neste exato momento
— deve começar a se alimentar melhor, Isabel. Como sobreviveu a três anos longe de nós?
— Glenn cumpria o papel de irmão mandão — digo, ela sorri
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