𝐂𝐀𝐏𝐈́𝐓𝐔𝐋𝐎 𝟑

 

Minha mãe era a personificação da bondade e da gentileza. Seu sorriso era capaz de contagiar a todos, e sua voz suave acalmava até mesmo as tempestades mais fortes em meu coração. Ela sempre estava lá para mim, pronta para me ouvir, me aconselhar e me apoiar em todos os momentos.

Lembro-me claramente das vezes em que eu aprontava alguma travessura e era Satoru quem recebia o sermão, enquanto me consolava para que eu não chorasse - uma das minhas lembranças favoritas. Sua paciência e amor incondicional eram incomparáveis.

No entanto, um dia, de maneira misteriosa e abrupta, minha mãe desapareceu. A casa ficou silenciosa, seu perfume já não pairava mais no ar. Meu irmão, com os olhos marejados, me contou que ela havia desaparecido em uma missão de feiticeiros, e foi dada como morta.
Aquelas palavras ecoaram em minha mente, como um punhal perfurando meu peito. Minha mãe, a mulher mais incrível que já conheci, agora habitava apenas em minhas lembranças e em fotografias.

Quando vi a maldição se passar pela minha mãe, um turbilhão de emoções tomou conta de mim. Ódio, raiva, impotência. Ver aquele mal atingindo a pessoa que sempre foi meu porto seguro foi como ter meu coração dilacerado em mil pedaços. A sensação de injustiça e revolta queimava dentro de mim.

No entanto, em meio aos sentimentos negativos, fiquei feliz por um momento. Lembrei-me dos momentos felizes ao lado da minha mãe, de seu sorriso acolhedor e do brilho em seus olhos quando olhava para mim. Recordações da sua presença amorosa e dos gestos gentis que marcaram minha vida inundaram minha mente.
A dualidade entre o ódio pela maldição que a atingiu e a saudade da mulher incrível que ela era me deixou em um estado de confusão emocional.

E o que mais me deixou com raiva foi o fato de eu ter apenas derramado lágrimas. Não consegui expressar meus sentimentos naquele momento, apenas chorei. Como uma criança. A frustração que sinto em relação a mim mesma agora é avassaladora. Eu deveria tê-la feito se arrepender amargamente por ter sequer pensado em fingir ser minha mãe. Mas só consegui chorar. E no fim fui salva pelo Fushiguro.

-- Achei que estivesse dormindo. - disse assim que passou pela porta e a fechou novamente. E dirigiu-se à geladeira.

Eu estava na cozinha, comendo algo, pois quando cheguei, e ter uma breve conversa com meu irmão, apenas dormi. Eu estava extremamente exausta.

-- Eu estava. Acordei há alguns minutos para comer alguma coisa. - Eu saboreava um pedaço de pizza que encontrei na geladeira.

Ele pegou outro pedaço e colocou no micro-ondas, saindo da cozinha e me deixando sozinha novamente com meus pensamentos. Dei uma última mordida em minha fatia de pizza e corri para a geladeira para pegar outra. Coloquei-a no micro-ondas ao lado da fatia de Fushiguro e me peguei rindo sozinha ao perceber que ele havia esquecido de ajustar o tempo. Configurei para um minuto e retornei à cadeira. Meus pés batiam seguindo o ritmo dos dedos que batucavam sobre a mesa, inquieta. Cruzei os braços sobre a mesa e deitei minha cabeça sobre eles, enquanto aguardava pelo tal UM minuto, que parecia uma eternidade.

Assim que o micro-ondas desligou, andei até ele e retirei minha fatia. Desta vez, fui em direção para a acolhedora sala de estar, que dispunha de um sofá para duas pessoas, diversos vasos de flores dispostos pelo ambiente, bem como alguns quadros chatos nas paredes, e uma televisão logo à frente.

Me pergunto se o dormitório de Itadori e Nobara são assim também.

Coloquei um filme de terror e, obviamente, mais tarde ficarei morrendo de medo de dormir sozinha. Levantei minhas pernas, saboreando minha pizza.
Megumi desceu as escadas com o cabelo ainda úmido, vestindo uma calça preta folgada e uma camisa branca, passando direto sem olhar para trás.

"- A Jenny abriu a porta e viu... a boneca". Olhei para a televisão, dei de ombros, concentrando-me em minha pizza e no filme que passava. A tensão que o filme estava causando me arrepiava dos pés à cabeça. Meus olhos estavam entreabertos enquanto focava em uma parte escura do filme, e tudo estava silencioso.

-- Posso assistir também? - dei um grito com sua aproximação repentina, no mesmo instante em que a bolinha que a garotinha jogava no escuro voltou em sua direção. Fushiguro me olhava julgando e, imediatamente, tratei de me recompor. - estranha.

-- Pode assistir. Mas nada de comentar sobre minhas reações, e estranho é você. - assim que terminei de comer, cruzei os braços, olhando irritada para a televisão.

Quando foi que eu comecei a sentir raiva de Fushiguro? Não recordo se ele me deu motivos, mas simplesmente não consigo suportá-lo.

Durante todo o filme, mesmo com minhas reações exageradas, Fushiguro não fez nenhum comentário sobre elas. E assim que o filme acabou subiu para seu quarto. Isso me deixou surpresa.
Agora estou organizando minhas prateleiras, depois de ter arrumado minha gaveta de acessórios. As roupas que tirei das malas e dobrei para colocar no guarda-roupa estão sobre a escrivaninha próxima à janela para eu guardar.
Coloquei meus livros, bonecos em miniatura, flores, quadros, fotos e outras bugigangas alinhados nas prateleiras e nas paredes.

Deitei-me brevemente em minha cama, já era tarde da noite, talvez por isso me sentia tão cansada novamente. Puxei o lençol e me cobri, sentindo-me confortável.

Entrei na sala dos anciões pela primeira vez, eles possuem os rostos todos embaçados, observando todos os alunos e alguns professores. Eu estava ofegante, sentindo meu coração pulsar rapidamente, enquanto meus olhos lacrimejavam sem parar.

—— Onde está o meu irmão!? — Gritei desesperada, sentindo uma imensa falta de ar começar a se fazer presente.

Todos ali permaneciam em silêncio, sem proferir uma única palavra. Observei uma mulher de cabelos castanhos e longos se aproximar, ela pegou minhas mãos e me olhou com um olhar distante, me deixando ainda mais nervosa.

—— Tori, infelizmente seu irmão faleceu em meio a uma missão. — Meu coração foi despedaçado em mil pedaços, me deixando sem chão. Caí sentada, sentindo como se todas as lembranças com meu irmão passassem diante de mim. O grito de dor que eu soltei foi tão alto que assustei a mim mesma.

—— Onde está o corpo dele? — Murmurei entre lágrimas que caíam incessantemente, encharcando um pouco minha blusa.

—— O corpo dele... Foi desmembrado pelo inimigo, infelizmente. Do jeito que está, não poderemos permitir que você o veja.

Abri meus olhos um pouco ofegante, confusa, nervosa; eu não sabia quanto tempo havia dormido, mas o sol já estava se pondo, então creio que dormi cerca de seis horas.

Desvencilhei-me do cobertor, sentando-me na cama e olhando ao redor do meu quarto. Ao ver os lençóis desordenados e as roupas espalhadas sobre a escrivaninha, senti uma imensa agonia.
Levantei-me devagar, um pouco zonza, e comecei a arrumar minha cama até que estivesse alinhada. Em seguida, dirigi-me à escrivaninha e, após separar uma muda de roupa, guardei minhas roupas no guarda-roupa.

Entrei no banheiro, retirando minhas roupas e jogando-as no cesto de roupas sujas. Parei em frente ao pequeno espelho da pia, observando meu próprio reflexo. Sempre que me vejo, é como se estivesse vendo meu irmão; pelo menos, sei que sou bonita. Ao fitar meus próprios olhos as lembranças daquele maldito sonho retornou.
Adentrei o box, ligando o chuveiro e sentindo a água escorrer pelo meu corpo, relaxando meus músculos.

Saí do banheiro enrolada na toalha, peguei minha muda de roupa em cima da cama e voltei para o banheiro novamente para me vestir. Escolhi um vestido branco com flores azuis, uma jaqueta azul e, por fim, um All Star nos pés. Após aplicar cremes corporais e arrumar meu cabelo, certifiquei-me de ter trancado o quarto antes de descer para o andar de baixo.
Fushiguro estava subindo, mexendo no celular, sem notar minha presença. Ele só percebeu quando eu estava embaixo e ele, em cima. Virou-se para baixo, me encarando confuso enquanto guardava o celular. E no mesmo instante me lembrei de algo.

—— Fushiguro, me passa o endereço do meu irmão? — Disquei meu celular e abri um bloco de notas, aguardando sua resposta. — Ouvi dizer que ele tem um apartamento nas redondezas, para os momentos em que prefere não ficar por aqui. — Ele assentiu e me passou o endereço, confirmando que era realmente próximo dali. Peguei minha bolsa no cabideiro logo na entrada, quando ouvi Fushiguro me chamar.

—— Pretende voltar muito tarde?

—— E por qual motivo deseja saber?

—— Após as nove horas, irei trancar tudo. Não gostaria de ser incomodado, ou melhor, de ser acordado tarde da noite por uma esquisitona pedindo para destrancar a porta enquanto estou dormindo. — Coloquei as mãos na cintura e respirei fundo para manter a calma, concordando com ele.

—— Não se preocupe, a esquisitona não irá chegar tarde. Ela não é irresponsável. Até mais, Sr. Chatonildo. — Virei-me de costas, abri a porta, passei por ela e a fechei em seguida.

Passei pelos alojamentos em silêncio, todos com as luzes apagadas, apenas alguns poucos com iluminação acesa, incluindo o de Itadori e Nobara, de onde podia ouvir Kugisaki repreendendo-o.

Realmente era próximo, como Fushiguro havia dito, apenas alguns minutos a pé. Bastou descer a montanha, pegar dois metrôs e então chamar um táxi para ser levada ao maldito apartamento de Satoru.
O apartamento de Satoru estava localizado entre diversos prédios elegantes, sendo o dele um deles. O porteiro fez uma ligação para anunciar minha chegada, o que me proporcionou alguns momentos para descansar. Após ter minha entrada autorizada, peguei o elevador e subi até o 6º andar.

Toquei a campainha, irritada com a demora de Satoru em abrir a porta. Cheguei até a considerar voltar para casa, mas o trajeto foi longo demais para voltar sem mais nem menos.

Assim que a porta se abriu, entrei rapidamente e abracei meu irmão assim que ele se virou para mim, ouvindo-o resmungar.

—— Tori, está tudo bem? Como diabos você conseguiu chegar até aqui? Além disso, é muito longe para você ter vindo sozinha a essa hora. — Suspirei contra seu peito, apertando meu braço ao redor de sua cintura. — Você poderia ter me mandado uma mensagem, eu teria ido te buscar pessoalmente.

—— Assim como daquela vez em que te pedi para me buscar e você disse para eu ir de metrô?

—— Você realmente não esquece, não é mesmo?

Satoru me conduziu até o sofá, sentou-se e logo em seguida me sentei, deitando minha cabeça em seu peito. Ao acordar, senti uma imensa necessidade de vê-lo, especialmente após aquele pesadelo.

—— Agora me conta, o que veio fazer aqui? — Ele começou a fazer carinho em minha cabeça, e logo comecei a me acalmar. Eu estava ali apenas para ter certeza de que ele estava vivo.

—— Eu tive um pesadelo. E nele você morria. — Afastei-me um pouco dele, encarando seus olhos azuis. — Eu não conseguiria me acalmar sem ter certeza de que foi apenas um sonho.

—— Estou vivinho. Não irei morrer tão cedo, maninha, pode ter certeza disso. — Concordando com a cabeça, voltei a deitar minha cabeça em seu peito, sentindo-o retomar os carinhos. Estar com ele agora, mesmo que raramente no passado, me faz lembrar da mamãe, tem um pouco do cheiro dela. Ah, se ele soubesse que nunca o culpei por nada e o amo tanto.— Nunca mais irei te deixar sozinha.

Fechando meus olhos, com meus lábios entreabertos em busca das palavras certas para responder, mas nada parecia se encaixar. No entanto, eu precisava perguntar aquilo.

Ou...

Melhor não estragar o momento.

Deixando de lado a pergunta que martelava na minha cabeça há muito tempo, meu irmão me convidou para dormir na casa dele esta noite. Mais tarde, ele pediu uma pizza para nós, e foi então que lembrei de mandar uma mensagem para Fushiguro, avisando que não voltaria para casa hoje. Ele nem sequer visualizou a mensagem. O problema é dele.

Peguei uma camisa e uma bermuda do meu irmão, coloquei minhas roupas na lavadora e segui em direção à cama dele, pulando ao seu lado e ouvindo-o resmungar. Ele tinha colocado um colchão no chão para eu dormir, como se não soubesse o quanto sou fresca. (Estou com medo daquela boneca que assisti mais cedo.

—— Vou dormir aqui, Satoru, nem pense em dizer não.

—— Apenas cale a boca e durma. — Ele ainda de bruços, pegou um travesseiro e colocou em cima do meu rosto.


















Eles foram 07h para a missão e voltaram 11h, Tori dormiu e acordou 12h (logo teve momentos fofis entre Fushiguro e Tori), depois ela dormiu e acordou as seis horas. Teve um lindo sonho e escapou para a casa do irmão.

Próximo capítulo será na visão do Fushiguro tabão??

Boa leitura!


Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top