Capítulo 35
Abro os olhos, mas nada consigo ver. Tateio o chão o meu redor e não encontro absolutamente nada que me faça identificar o local onde estou. A escuridão é total. Não há um único facho de luz que me indicasse o caminho à saída.
Com muita dificuldade, coloco-me de pé. Quase volto ao chão ao bambear em cima dos saltos altos.
— Argh! Não é à toa que eu nunca gostei de saltos. — resmungo.
Respiro fundo antes de me concentrar e estender os braços tateando o ar. À medida que não sentia nada, avançava. O medo de dar um passo em falso, por não conseguir enxergar um palmo a minha frente, retardava a minha caminhada.
Não faço ideia de quanto tempo permaneci na busca pela saída. Porém em uma das minhas tentativas, sinto algo sólido. Passo as mãos, com cuidado, pela superfície até que meus dedos encostam no metal frio.
Com um sorriso nos lábios, viro a maçaneta e destranco a porta. Na mesma hora me arrependo. Sou recebida por uma infinidade de flashes direcionados a mim. A claridade repentina sega meus olhos, fazendo-me tapa-los com o antebraço.
— ANA!
— ANA CLARA!
— EI, OLHA PARA NÓS!
A multidão grita o meu nome desesperadamente. Abro os olhos e reparo que o ambiente não era tão claro como imaginava. Haviam densas fumaças cinzas ao meu redor. Aos poucos as luzes e a gritaria vão diminuindo. Porém uma sensação estranha cresce em meu peito.
— VOCÊ NÃO PRESTA! É UMA SEM VERGONHA! — viro o rosto para o meu lado esquerdo, dando de cara com Louise — SUMA DAQUI!
Seus olhos eram vermelhos e pareciam pegar fogo. Seus braços e pernas estavam acorrentados, prendendo-a no lugar. Dou alguns passos para trás sem tirar os olhos da mulher furiosa. Acabo esbarrando em algo que me lança para frente. Caio no chão com força.
— O que...
— Você irá se arrepender de ter vindo para cá, senhorita Bianchi. — a voz de Lina, diferente da voz de Louise, era sombria e carregada de um peso macabro.
Arrasto-me para longe das duas o mais rápido que consigo. Consequentemente, a escuridão volta a me cercar. Fecho os olhos e me encolho abraçando meu corpo, ao perceber que não enxergava mais nada. Tinha voltado à estaca zero. Sem perceber, as lágrimas inundam meu rosto.
— VOCÊ DISSE QUE NÃO ME DEIXARIA SÓ! E OLHAPARA MIM! — grito — ONDE VOCÊ ESTÁ?
— Estou aqui, filha! — abro os olhos assustada — Não precisa ter medo!
Posso ouvir sua doce voz. No entanto, a escuridão continuava impedindo minha visão.
— Mas eu não consigo te ver! — sussurro — Não consigo! Eu me sinto perdida!
— Minha menina, você tem se deixado ser conduzida por aquilo que os seus olhos naturais veem. Você tem vivido através de seus sentimentos. Tudo o que eu peço é que confie em Mim. Confie em Minha palavra.
Fecho os olhos e me permito respirar tranquilamente. Um súbito cheiro de lírios invade minhas narinas. Abro os olhos e, para minha surpresa, estou em um campo coberto por lírios. O sol nascia no horizonte, clareando o ambiente.
Fecho os olhos mais uma vez, e inalo aquele perfume maravilhoso. Meus lábios se abrem e a mais pura adoração sai do meu interior. Estava imersa em um ambiente de paz e adoração quando escuto aquela melodia suave. As notas do piano penetram o meu coração, trazendo de volta todos os sonhos que um dia joguei no mar do esquecimento.
Abro os olhos novamente. Diante de mim estava uma jovem menina. Ela bailava ao som da melodia dentro de seu collant rosa bebe. Seus movimentos eram precisos e muito semelhantes aos meus. Ao olhar para mim, abre um sorriso genuíno e se aproxima, dando um passo de cada vez. Ela não me era estranha.
Ergo a sobrancelha. Ela faz o mesmo. Inclino o a cabeça. Ela imita o movimento.
— Você... — digo e seus lábios se mexem como os meus. Sinto os olhos arderem e a respiração falhar — Você sou eu! — ergo o braço. Ela faz o mesmo, e nossos dedos se tocam.
Surpresa pela descoberta, olho para o meu próprio corpo e percebo que minhas vestes são iguais as dela. Ergo o olhar e mais uma vez sou surpreendida. A Ana Clara de dezessete anos tinha desaparecido, dando espaço à de vinte e sete anos.
— Apenas confie em mim, filha! — fecho os olhos e sinto a brisa suave em minha pele.
— Clara! — a voz angustiada do meu esposo se torna mais alta à medida que a brisa se torna um vento gelado — Meu amor, por favor fala comigo!
Tento mover as pálpebras, mas elas estavam pesadas.
— Acho que ela está acordando, Roy.
Thom?
— Graças a Deus! — a voz de Charlotte, assim como a do neto, estava próxima.
Finalmente consigo abrir os olhos e me deparar com dois orbes verdes me fitando com preocupação.
— Ro. — minha voz sai baixa e fraca.
— Shhh! — ele me aperta em seus braços antes de me colocar na cama e me envolver em uma manta grossa — Estou aqui, amor! Estou aqui!
— Minha cabeça! — levo a mão ao lugar que latejava.
— Ela deve ter batido a cabeça na hora da queda. — Thom se aproxima e senta ao pé da cama.
— Não! — digo — Eu não bati com a cabeça. Consegui sentar no chão antes de desmaiar.
— Precisamos ir ao médico. — Roy me ajeita na cama e cogita levantar.
— Não, por favor! Você sabe que não gosto de hospitais! — seguro seu braço — além do mais, eu só preciso dormir um pouco. Estou exausta, minhas emoções estão uma verdadeira bagunça, sem contar todo o estresse d... — arregalo os olhos ao lembrar do ocorrido — Thom, você precisa acreditar em mim, eu não moveria um dedo para machucar a Lina. Tudo bem, talvez um dedo, mas eu não fiz aquilo! Ela que...
— Está tudo bem, Aninha! — toca meu calcanhar — Ela confessou tudo após a chegada de Alain com os seguranças.
— Ela contou inclusive sobre as informações passadas em seu nome, querida. — Roy sorri.
— Sério? O que a fez contar tudo? — pergunto sem entender.
— Ana, minha querida, quando Deus ordena, mesmo sem o consentimento da pessoa, ela abre a boca e fala.
— Pois é, parece que foi exatamente isso que aconteceu. — meu amigo confirma as palavras de vovó — Ela tentou te acusar de várias formas possíveis. Porém ao longo da história entrou, diversas vezes, em contradição. Alain foi firme, e soube muito bem mexer com o psicológico da moça. Até que ela não aguentou a pressão e soltou além do que desejávamos saber.
— Uau! — olho para frente analisando todas as informações — Confesso que me assustei com a Lina hoje. Foi bizarro! Parecia que não era ela.
— Tenho certeza que não era, mon amour! — Roy beija o topo da minha cabeça — Agora você precisa trocar estas roupas encharcadas e descansar um pouco para ver se a dor de cabeça irá passar. Caso não passe, já sabe!
— Certo, senhor Carter! — resmungo retirando as cobertas de cima de mim com a sua ajuda.
— Bom, nós iremos deixa-los a sós. — Chaly se levanta, sendo acompanhada por Thom.
Os dois se despedem e saem do quarto. Roy me toma em seus braços e caminha até o closet.
— Eu não estou doente, amor! Consigo me mover sem problema algum. — digo achando graça de sua preocupação. Óbvio que sou ignorada.
Ele me põe sentada no puff localizado no meio do ambiente e começa a ver minhas roupas de dormir.
— Este está bom? — pergunta estendendo um conjunto de pijama cinza.
— Está ótimo! — Sorrio.
Antes que ele me impeça, vou ao banheiro, retiro a roupa e tomo um banho decente. Meu rosto estava completamente borrado pela maquiagem. Enxugo-me e visto a roupa oferecida por Roy. Em silêncio, voltamos para cama macia e quentinha. Enfio-me debaixo do edredom. Meu esposo retira os sapatos e deita ao meu lado, debaixo da coberta. Apoio a cabeça em seu peito e fecho os olhos.
— Tem certeza que está bem? — pergunta após desligar a luz do quarto.
— Absoluta. Só preciso descansar. — ele suspira e eu sorrio mais uma vez com sua preocupação. Era tão maravilhoso ter alguém que se importa com o seu bem-estar e sentimentos — Onde está a Emily?
— David a levou para a casa do nosso pai. Passará o restante do fim de semana lá.
— Entendi.
— Eu sinto muito orgulho de você! Fez um excelente trabalho hoje. — era possível perceber o orgulho em sua voz. Inevitável sorrir.
— Apesar de tudo, foi um trabalho em equipe. A Louise também se empenhou bastante. — Louise. O sonho volta a minha mente na mesma hora, fazendo-me ficar arrepiada.
— Está com frio? — Roy questiona.
— Não, apenas lembrei de algo. — suspiro.
O quarto é tomado pelo silêncio. O que me faz meditar nos últimos acontecimentos, inclusive em tudo o que Deus falou comigo há pouco. As lágrimas rolam silenciosas em meu rosto. Chegou o tempo de tomar uma decisão importante que poderá mudar completamente o rumo da minha vida.
Pensava que Roy estava dormindo, mas sua mão roçando de leve o meu rosto mostra o contrário.
— Por que está chorando, princesa? — paralisa ao sentir as lágrimas.
— Eu estou exausta! Minha mente e meu corpo não estão mais suportando tanta pressão, Roy! — um soluço baixo escapa dos meus lábios e ele me aperta ainda mais — Essas acusações contra mim sobre eu ser a x9 da Chanel. Todo o meu desentendimento com a Louise, suas palavras duras, ameaças e a dificuldade em trabalhar ao seu lado. Isso me esgotou completamente! Me deixou de uma forma que nunca tinha ficado antes.
— Uma dessas coisas já passou, querida, agora você poderá respirar com mais tranquilidade. — continua acariciando minha face com os dedos — Deus é fiel e justo!
— Você não está entendendo. Eu estou ficando doente, estou me sentindo mal. Essas dores de cabeça... Não quero mais viver assim — ele se apoia em um dos cotovelos e liga o abajur, para me fitar atentamente.
— O que quer dizer? — pergunta com cautela.
— Que eu vou largar o meu emprego! Sairei da Chanel! — mais silêncio.
— Tem certeza, disso?
— Nunca estive tão certa! — digo com convicção, apoiando-me no cotovelo também.
— E o que irá fazer? — mais uma vez as palavras de Deus vem em minha mente. Olho para a área externa e penso bem antes de falar as próximas palavras.
— Eu não sei ao certo! — confesso.
— Olha, Clara! Eu sei como esta situação está sendo difícil para você, e consequentemente para mim também. Sei que você, por ser um ser humano, quer jogar tudo para o ar, pois é a solução mais rápida para por um fim a esses problemas. Mas você não pode tomar uma decisão assim sem antes consultar o Senhor. — assinto e alargo o sorriso.
— Fique tranquilo, — passo a mão por sua barba crescida — pois foi Ele mesmo quem me orientou e chamou a confiar nEle. — digo serena, mas firme — Não sei ao certo como as coisas irão acontecer, mas eu irei confiar no meu Deus! — ele suspira e assente, ainda fitando os meus olhos — E... — volto a brincar com sua barba.
— E...? — pergunta com expectativa.
— Acho que chegou o tempo de, finalmente, viver os meus sonhos. — meus olhos encontram os seus.
A princípio ele não compreende, mas conforme os segundos vão passando, a mente dele começa a trabalhar. Por fim ele arregala os olhos e senta na cama
— Viver os seus sonhos? — atônito, é a palavra que descreve o atual estado do meu marido — Então você irá...
— Serei uma bailarina, Roy! Esperei tempo demais para ir atrás do que eu realmente queria, não posso mais perder um segundo. Agora tenho certeza de que esse é o caminho certo a seguir, de que essa é a vontade do Pai para mim. — mordo os lábios com força. Por mais que eu já tivesse a direção de Deus, a opinião do meu esposo é muito importante para mim — O que acha?
Sou surpreendida com o abraço apertado em torno da minha cintura.
— Não tenho dúvidas de que será a melhor bailarina que já existiu! — relaxo com suas palavras. Passo os braços ao redor do seu pescoço e agradeço.
— Obrigada!
— Estou tão feliz por você, mon amour! Sabia que esse sonho não estava morto. Pelo contrário, estava muito bem guardado esperando o tempo de Deus. — Roy se afasta um pouco e fita os meus olhos com intensidade, toda vez que isso acontecia, meu estomago revirava — E eu estou aqui para te apoiar, incentivar e ajudar em qualquer decisão que você tomar!
— Fico feliz, pois tenho algo em mente! — conto sobre a conversa que tive na noite anterior com a professora da Emily, Jeanne. Falo sobre sua proposta e como tudo se encaixava e cooperava para que o meu sonho se realizasse.
"E sabemos que todas as coisas contribuem juntamente para o bem daqueles que amam a Deus, daqueles que são chamados por seu decreto." A palavra de Deus é totalmente verdadeira quando Paulo diz isso em Romanos 8.28. Ao olharmos a situação ao nosso redor com os olhos naturais, carnais, tudo pode aparentar estar de pernas para o ar. Todavia, para os que andam em Deus, buscando Sua direção e vontade, o caos é exatamente o que irá cooperar para o nosso bem. Pois em todas as coisas o Senhor tem trabalhado em nosso favor, para a glória do Seu nome.
>>>><<<<
Mais um capítulo (LINDO E EMOCIONANTE) surpresa para demonstrar minha gratidão e amor por todos que tem acompanhando essa história tão especial para mim ♥️🙏🏼 Finalmente nossa querida Ana (AC, CLARA, ANINHA...) tomou a decisão certa, não é verdade?! 🙌🏼
Att.
NAP 😘
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