˖ ֹ 𝘱𝘳𝘰𝘭𝘰𝘨𝘶𝘦 ⊹ ࣪
Johnny Lawrence tinha muitos arrependimentos, entre eles estava a sua péssima relação com o filho, além das péssimas escolhas para emprego. Mas a que lhe assombrava toda noite antes de dormir, definitivamente era o torneio do vale em 1984. Sua derrota não foi apenas no tatame, mas sim no resto da sua vida depois de perder para Daniel Larusso, seu inimigo mortal.
Sua vida foi cheia de fracassos, enquanto o Larusso tinha o rosto estampado em outdoors e fazendo propaganda para a sua concessionária no rádio e na televisão. Ele se perguntava onde errou enquanto caminhava em frente ao ginásio ─ onde o torneio aconteceu ─ com uma garrafa de cerveja em mãos. Talvez fosse a sua décima garrafa da noite, sem contas as que tomou ao amanhecer.
O gosto amargo na sua garganta não era apenas o da bebida, e sim do arrependimento de ter confiado cegamente em John Kreese, o seu sensei e o mais perto que chegou de ter um pai, o que foi por água abaixo quando o mesmo quebrou o seu troféu de segundo lugar e lhe deu um mata leão como punição pela colocação no torneio. Sua vida estava péssima, mas não tinha como piorar.
Perto do ginásio, quatro adolescentes aproveitavam a noite fora durante o restante das férias. Yasmine e Moon iam na frente, comandando a trilha sonora, que alternava entre pop e alguma música indie que Moon indicava e a loira logo mudava. No banco de trás, as gêmeas Larusso ─ Margaret e Samantha ─ aproveitavam a música em silêncio, embora apenas Sam estava realmente feliz em estar no carro, já que a outra estava prestes a parar o carro para pedir um uber e ir embora.
As duas compartilham a data de nascimento e semelhanças na aparência ─ menos as mechas coloridas no cabelo de Margaret ─, mas o que sempre diferenciou ambas foi a personalidade. Enquanto Sam guardava as suas opiniões para si mesma, Mae soltava elas para o mundo como planfetos em época de eleição, mas não de maneira mal educada, pois sua dicção e sabedoria faziam parte do DNA herdado pela mãe das gêmeas, Amanda Larusso, que sempre ensinou o que aprendeu na sua adolescência para elas, e mesmo assim Margaret continuava sendo a mais parecida com ela.
Deixando os pensamentos sobre fugir da própria situação, Mae olhou a tela do celular, notando ter passado do seu horário de dormir e também do seu remédio controlado. Por sorte, ela sempre levava um pote na bolsa ─ além da sua garrafinha rosa ─ , e logo foi pegá-lo para prevenir outro problema em seu joelho.
─ Ainda tem que tomar remédio? - A pergunta de Sam era genuína, mas seu tom confuso como se não conhecesse a própria irmã fez a garota respirar fundo.
─ A cirurgia foi a cinco anos, mas o joelho fudido é para a vida toda. - Respondeu de forma sarcástica, jogando a pílula na própria língua e em seguida tomando um longo gole de água, com a atenção da Larusso em seus movimentos.
Ela se preocupava com as "brincadeiras" que a irmã fazia sobre a cirurgia. Margaret sempre foi a mais apaixonada por esportes entre elas e, considerando o histórico de Daniel Larusso, o caratê foi o primeiro esporte que praticaram juntas, até Sam desistir aos oito anos para começar o balé, o qual Mae também participou. Mas o caratê sempre foi a sua primeira paixão, e ela culpava o seu pai e o Sr. Miyagi por terem apresentado o Miyagi-do para ela de forma tão cativante.
Em 2011 Margaret foi pega de surpresa com uma lesão no seu joelho enquanto praticava no dojô improvisado na casa dos Larusso's. Imediatamente, Daniel e Amanda levaram a filha para a emergência, onde descobriram que a lesão foi pior do que eles pensavam, resultando em uma cirurgia que levou cicatriz ─ não apenas as visíveis ─ para o resto da vida da garota. Ela pensou que poderia voltar a lutar, prometendo ao Sr. Miyagi que voltaria ao dojô assim que seus pés tocassem o chão sem ajuda de muletas novamente. O que, infelizmente, não aconteceu.
Ainda naquele ano o Sr. Miyagi morreu por causas naturais, levando com ele a paixão do caratê da garota. Mae nunca mais praticou outro esporte, nem mesmo o balé, seu foco mudou para atividades extracurriculares menos agitadas.
─ Ei, Margaret, você ainda tá no teatro do colégio? - Moon acordou dos seus devaneios, olhando para ela pelo espelho, que abriu para retocar a maquiagem.
─ Sim, esse ano vamos apresentar o musical de "Meninas Malvadas". - Respondeu animada, passando os dedos pelos fios de cor rosa.
Claramente a indicação foi dela e ─ felizmente ─ seus colegas de teatro aceitaram, até mais animados do que ela.
─ Não sei como você aguenta. - Yasmine julgou no banco do motorista, sua feição refletida pelo retrovisor era de puro julgamento. - Aquele lugar tá cheio de nerds nojentos, você deveria sair de lá se quiser manter a sua reputação e não estragar a nossa.
Imediatamente, o rosto de Margaret se contorceu em irritação, fazendo-a franzir as sobrancelhas e arregalar os olhos ao olhar para a irmã, como se perguntasse se aquelas palavras realmente saíram da boca da garota. Sam não teve reação, pois mesmo conhecendo a índole da amiga, não imaginava que as suas farpas encontrariam o caminho da sua gêmea, mas uma coisa ela tinha certeza, Mae não deixaria a ofensa passar.
Não porque se ofendeu, mas porque ofendeu os seus colegas e ─ consequentemente ─ a sua melhor amiga, Avery Darling, mais conhecida como parceira de palco da Larusso do meio. Elas se conheceram quando a garota entrou na equipe aos 13 anos, ambas eram novas na equipe e a conexão foi instantânea quando seus primeiros papéis foram as árvores no fundo da cena. Não era o principal, mas para quem começou era muita coisa, e depois da primeira apresentação elas viraram inseparáveis. Por isso Margaret nunca ─ nem mesmo no fim do mundo ─ deixaria alguém falar dela desse jeito.
─ Talvez se você pensar com os neurônios sobreviventes da sua cabeça, você vá entender o porque eu não ligo para isso. - A Larusso retrucou, deixando um sorriso falso crescer em seus lábios quando enxergou Yasmine bufar discretamente enquanto pegava o seu celular em seu colo.
─ Yasmine, eu já pedi para largar... - Quando Sam ia relembrar as regras de trânsito ─ pela terceira vez na noite ─ as quatro foram pegas de surpresa quando o carro novo de Yasmine bateu em um carro vermelho.
─ Meu deus. - A loira gritou exagerada, freiando bruscamente e logo desligando o carro em choque.
A batida foi tão rápida que nem mesmo Yasmine conseguiu entender o que aconteceu, e o celular em suas mãos acabou caindo entre os bancos. As gêmeas tentavam ao máximo não entrarem em desespero, mas Samantha já estava pensando nos diversos problemas que uma batida podia causar, enquanto Margaret se preocupou em "desgrudar" seu corpo ─ que foi praticamente jogado para os lados ─ da porta.
─ Porra, Yasmine! Que merda foi essa? - Ela reclamou, massageando a lateral da cabeça que bateu no vidro.
─ Eu disse pra não ficar no celular. - A Larusso disse desesperada, se apoiando entre os bancos para olhar as amigas.
Mas Yasmine mal se importou com as reclamações, pois sua atenção estava voltada em achar o aparelho jogado entre os bancos.
─ O que vamos fazer? - Moon perguntou com os olhos arregalados.
─ Temos que chamar a polícia. - Como se fosse óbvio, Sam encarou as duas pronta para pegar o celular no bolso.
─ Você quer matar os nossos pais do coração? - Margaret se envolveu, dando um tapinha no ombro da irmã, que a olhou engolindo a seco antes de murmurar algo inaudível.
─ Não podemos! Meus pais vão me matar. - Yasmine exclamou, soltando um sorriso ao pegar o celular em suas mãos.
─ Que merda é essa?! - Johnny bateu no vidro irritado, sua feição acabada assustou as adolescentes, que começaram a gritar.
Seu carro ─ que estava estacionado a poucos metros dele ─ tinha acabado de ser atingido pelas quatro. Sua confirmação de que não tinha como sua vida ficar pior estava errada, e ele soube naquele momento que o seu problema era quatro vezes pior.
─ Ah, merda! O que a gente faz? - Moon repetia na mesma intensidade dos gritos do Lawrence.
─ Dirige o carro, Yasmine! - Mae pediu desesperada, pulando para ficar entre os bancos enquanto a irmã olhava assustada para o homem que batia no vidro em sua frente.
─ Calma, eu já tô ligando. - A motorista quase gritou ao girar as chaves, logo escutando o som dos pneus raspando no asfalto, deixando o Lawrence para trás com o prejuízo.
As adolescentes prenderam a respiração até virarem na primeira esquina, onde todas se entreolharam sem saber o que dizer. O resto do caminho foi silencioso, apenas cortado pelo pedido rápido de Sam para que Yasmine deixasse as duas em casa o mais rápido possível. E assim foi feito. Minutos depois a enorme casa dos Larusso's apareceu no campo de visão delas. O bairro era privilegiado e seguro, o único perigo eram os animais que visitavam os quintais de vez em quando para diversificar a rotina dos moradores.
─ Obrigada, meninas. Me liguem assim que puderem, e boa sorte, Yasmine. - Sam se despediu das amigas rapidamente, pois Margaret já tinha pulado para fora do carro sem pensar duas vezes. - Ei, Mae, me espera!
A garota não a respondeu e continuou subindo pela pequena rampa, onde ficavam os carros da família, que não eram poucos devido à concessionária.
─ Foi a última vez que eu saio com as suas amigas. - Ela determinou sem pensar duas vezes, escutando os passos apressados da irmã atrás dela.
─ Não vai contar para os nossos pais, certo? - Sam perguntou com receio, recebendo o silêncio como resposta. Não, Mae! Promete que vai deixar isso entre nós, por favor. - Implorou, puxando o braço da irmã para que ela a olhasse.
─ Não. - Deu de ombros, determinada a contar a verdade para fugir do castigo.
Era melhor os seus pais descobrirem por elas, do que por um policial batendo na porta deles no meio da noite.
─ De dedinho, Maggie. - Pediu, usando o apelido e uma promessa que fizeram quando eram crianças.
Elas tinham sete anos e a péssima mania de esconder segredos dos pais, mas coisas leves, como comer doce de madrugada ou ir dormir tarde. Porém ambas fizeram a promessa de que aqueles seriam os segredos delas, selados por um juramento de dedinho, que é mais seguro do que um contrato assinado a mão.
─ Eu te odeio. - Ela respirou fundo, virando o corpo com o dedinho levantado e entrelaçando ele com o da irmã, que tinha um sorriso aliviado nos lábios. - Mas não prometo aturar as suas novas amizades pelo resto do ano. Quando foi que você virou outra garota metida? - Seu tom não era nada agradável ao dar as costas para abrir a porta principal, sendo seguida pela morena.
─ Elas são as minhas amigas! E não tem nada errado em fazer novas amizades. - Sam se defendeu enquanto deixava sua mochila no sofá branco, ainda atrás da irmã.
─ Ah, claro! Não tem nada errado quando essas amizades te deixam popular. - Acusou a mais alta, virando para olhá-la de forma irônica, fazendo o rosto da outra se contorcer de irritação.
─ De onde você veio? Planeta dos perdedores? - Perguntou maldosa, parando nos primeiros degraus da escada, a qual Margaret subiu até a metade antes de olhar para baixo.
─ Ao contrário do planeta "olha para mim, olha para mim"? - Retrucou em um tom enojado, cruzando os braços enquanto encarava a irmã.
Sam não a respondeu ao virar o corpo e revirar os olhos, soltando um murmúrio inaudível enquanto ia para outro cômodo do primeiro andar, ao mesmo tempo que Mae também revirou os olhos antes de subir os últimos degraus em passos pesados pela irritação. As palavras foram jogadas da boca para fora, não passando de mais uma briga boba entre irmãs, mas Margaret sabia que seria impossível conviver bem com a irmã se envolvendo com os "populares", e Samantha tinha noção que seu novo estilo de vida não era nada agradável para a mais nova entre elas.
Ainda no primeiro andar, Amanda e Daniel se entreolharam com as sobrancelhas franzidas enquanto tentavam ao máximo não rir com a discussão das filhas. Sentado em uma das cadeiras, com uma tigela cheia de cereal e leite na sua frente, Anthony ─ o filho mais novo do casal ─ revirou os olhos como se aquilo fosse normal para ele.
─ Isso tem nome, sabiam? E é tratado em um manicômio! - O mais novo sugeriu para os pais, voltando a comer o seu cereal com leite e assistir o jogo em seu celular.
Os mais velhos olharam para ele com a expressão mais suave, mesmo que a "piada" do filho fosse preocupante, eles sabiam que fazia parte da relação entre irmãos. Aquela foi apenas mais uma noite normal para a família Larusso.
Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top