𝟬𝟲. 𝗤𝗨𝗔𝗦𝗜 𝗖𝗘𝗥𝗧𝗢

𝟬𝟲. 𝗤𝗨𝗔𝗦𝗜 𝗖𝗘𝗥𝗧𝗢
(Quase certeza)

𝐀𝐘𝐋𝐀

Abro os olhos vagarosamente, tentando não me mexer. O braço de Lukas ainda permanecia na minha cintura, impedindo qualquer movimento meu. Ele dormia, e parecia estar em um sono muito tranquilo.

Meus olhos seguiram a curva do seu rosto, os traços marcantes que eu conhecia tão bem. Se Lukas soubesse o quanto a Ayla de catorze anos sonhou com isso… Ou se a de alguns anos atrás pudesse imaginar essa cena, com certeza ela entraria em surtos. Na verdade, ela diria que eu estaria mentindo ou só teria rido na minha cara.

Mas não era um sonho.

Eu não queria sair daquele momento com ele. Talvez eu tivesse medo que isso nunca mais voltasse a acontecer. Era Lukas, o garoto que eu sempre fui apaixonada e que nunca me deu bola. Por que ele começaria a fazer isso agora? Não iria criar expectativas. Eu não podia.

Sentir o calor do seu corpo, o toque da sua pele na minha, a respiração lenta que fazia cócegas no meu pescoço. Meu coração apertou. Eu sabia a verdade, por mais que tentasse negar para mim mesma.

Eu queria Lukas.

Mas não podia.

Engoli em seco, tentando ignorar a avalanche de pensamentos que vinha com essa constatação. Foi então que senti um movimento leve. Meus olhos encontraram os dele, ainda pesados de sono. Lukas piscou devagar, e um sorriso pequeno surgiu nos seus lábios antes que ele passasse a mão pelo rosto.

Ele não se afastou.

Nos encaramos por segundos longos demais. Meu peito subia e descia rápido, e o peso daquele olhar queimava na minha pele. O que ele estava pensando?

Mas antes que pudesse dizer algo, um barulho de batidas na janela nos arrancou da tensão momentânea.

Lukas afastou o braço da minha cintura, apressado, se movendo para abrir a porta. Assim que ele a abriu, demos de cara com um velho, que arregalou os olhos.

— Desculpe se estava atrapalhando alguma coisa, meus jovens. Mas é que aqui não é o lugar mais adequado, sabe? — Ele disse em um tom brincalhão. — Senti meu rosto queimar. O velho achou que a gente estava…

— Não, senhor. Não é isso que tá pensando — Lukas respondeu rápido, com tom firme. — O carro faltou gasolina e acabamos ficando presos aqui.

O senhor de meia idade arqueou uma sobrancelha, mas logo sorriu.

— Eu me chamo José — ele deu um aperto de mão — A situação de vocês é complicada. Mas eu vou tirar vocês do prego, só me dá um instante. — Ele falou, saindo apressado.

Eu soltei um suspiro que nem sabia que segurava. Meu peito ainda estava acelerado, mas dessa vez foi pela vergonha.

Depois de meia hora o sr. José apareceu segurando um galão de gasolina e uma mangueira. Lukas desceu do carro para ajudar a encher o tanque do carro, enquanto eu os observava da janela.

Assim ele agradeceu a gentileza do mais velho, e logo depois já estávamos seguindo caminho para casa. A volta foi um terrível e completo silêncio. Ao contrário de um silêncio calmo, esse era desconfortável e gritante. Talvez porque tenhamos dormido juntos, ou porque nos olhamos daquele jeito.

Eu não sei.

Lukas estava estranho, e eu morrendo de vergonha por tudo isso.

🧁

Assim que chegamos em casa, fomos recebidos pelo meu primo, que não estava nada contente com o nosso sumiço.

— Onde é que vocês estavam? — Daniel nos interrogou assim que entramos pela sala, seu rosto estava com a feição endurecida.

— Longa história, mano. — Lukas suspirou, passando a mão pelos cabelos.

Daniel soltou uma risada nasal.

— Só vão me dizer isso? Mais nada? — Ele cruzou os braços, balançando a cabeça em desdém. — Vocês sumiram e não deram sinal de vida.

Irônico, não?

Ele ainda me trata como criança, e isso é o que mais me incomoda.

— Daniel, você também sumiu e ninguém disse nada. — Passei ao seu lado — Além do mais, eu sou bem grandinha. Não preciso dar satisfação.  — Daniel gritou meu nome algumas vezes, mas eu o ignorei, subindo as escadas.

Depois dessa noite conturbada, o que menos quero é bater cabeça com ele. Daniel pode esperar.

                                                                  
Passaram alguns minutos que eu tinha subido para o meu quarto quando ouvi algumas batidas na minha porta.

Eu sabia bem quem estava me esperando logo atrás daquela porta e com certeza era a pessoa que eu não queria conversar no momento.

Mas mesmo a contragosto, eu fui até lá e abri. 

E lá estava Daniel me encarando com aqueles olhos de cachorro que caiu da mudança.

— Ayla…. — ele coçou a nuca — Posso conversar com você?

Assenti, dando passagem para ele entrar.

Eu me sentei na cama, esperando meu primo começar a falar.

— Foi mal, tá? — Ele engoliu em seco— Lukas me explicou tudo. Se eu estivesse em casa no momento, não aconteceria tudo o que aconteceu.

Ele parou por alguns segundos, parecia estar  procurando as palavras certas.

— Desculpe pela cena de mais cedo. Eu estava preocupado com você, Ayla. Você é como uma irmã para mim, eu me importo com seu bem estar. — Ele se aproximou — E… você sabe como Lukas é.

— Não entendo onde você quer chegar.

— Ayla, você não conhece Lukas como eu conheço.

— Daniel, eu sou adulta. Além do mais, eu confio nele. Não aconteceria nada se eu não quisesse, você não entende?

— E você quer?

Que pergunta era essa? O que ele estava pensando?

— Eu… — tentei encontrar alguma resposta convincente, mas como? — Eu não quero nada, Daniel.

Procurei soar o mais convincente possível para ele. Mesmo que no fundo, tudo fosse uma grande mentira.

— É verdade, né? Lukas vê você como uma irmã. — Ele suspirou, parecendo um pouco mais aliviado.

Concordei com a cabeça, mesmo sentindo suas palavras pesarem no meu peito.

— Tudo bem, Ayla. Eu acho que viajei legal. — Ele deu batidinhas no meu ombro.

— Ainda bem que você sabe que viajou, Daniel. — Resmunguei, ainda um pouco irritada.

— E sobre eu ter dormido fora, eu queria expli..

— Não precisa me contar nada, Daniel. Eu já sei. — Falei, sem paciência — Agora eu queria ficar um pouco sozinha, tudo bem?

Meu primo não respondeu, apenas assentiu um pouco cabisbaixo e saiu do quarto.

Idiota.

Não queria mentir, mas, eu nunca admitiria para ele o que sinto pelo seu melhor amigo idiota. Seria ridículo demais para mim.

Isso vai passar. Tenho certeza que vai.

Quase certeza.


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