04. Kill of the night
Nós todos fomos separados para lutar como equipe e eliminar o máximo de adversários possíveis dessa rodada, cada vez mais diminuindo sua pontuação no ranking até que sejam eliminados. E nesse desafio, tínhamos de agir em conjunto, formando um círculo ao centro do enorme tatame, intercalando entre nossos lutadores, e do dojô adversário. Teríamos de também intercalar nossas lutas, com um membro da equipe ao centro, lutando contra o adversário, e estrategicamente, sabendo a hora exata para trocar com alguém de nossa equipe, além de saber escolher quem iria assumir a luta.
Um desafio à altura de um campeonato mundial, mas nada que não estivesse ao nosso alcance. Observando alguns aquecimentos, eu pude notar que muitos seriam fáceis de enfrentar, nosso verdadeiro desafio estava no myiagi-do e principalmente, no cobra kai. Não porque são melhores, mas porque suas motivações são mais agressivas, e em uma partida de xadrez como essa, ingênuos peões serão devorados, enquanto a batalha entre as rainhas é verdadeiramente cravada. Não tenho medo de pessoas como Larusso, e sim, Kreese, que incriminado por Silver teve sua vida arruinada, e sua sede por vingança será refletida em seus alunos, que são alimentados pela raiva, como a gasolina alimenta o fogo.
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Depois de anunciarem o primeiro desafio, fomos dispensados para finalizar os treinamentos e para um descanso, e as provas de fato, começariam no dia seguinte. E como eu não poderia esperar diferente, fui a última a sair da sala a qual estávamos treinando. Sensei Wolf acredita que canalizando minha raiva nos golpes, não haverá chance alguma para minhas adversárias, então ele provocou todos os meus limites nesse último treino, e ainda posso sentir minhas costas arderem, além do gosto da madeira ainda estar presente em minha boca, lembrando-me que eu preciso honrar o meu lugar, ou então toda essa dor fora sem significado algum.
— O que quer que esteja mantendo sua mente presa — Ele segurou meu braço firmemente, fazendo eu soltar um suspiro pesado, não desviando o olhar por um único segundo, sabia o risco de dar às costas para ele —, elimine agora. Se não estiver focada, vai acabar nos levando à derrota, Silver.
— É Calista, Sensei — Trinquei os dentes, me afastando do aperto. Eu odiava como ele sempre me lembrava desse maldito sobrenome, e o peso de carregá-lo. Ele me encarou com os olhos inundados de fúria, mas eu me curvei, demonstrando o respeito que ainda tinha por ele, apesar de sua insanidade ser a causa de meus hematomas — Não vou decepcioná-lo quando pisar naquele tatame amanhã.
Ele respirou fundo, curvando-se em resposta, e eu finalmente deixei aquela sala, sentindo as batidas de meu coração errôneas. Eu não temia tão nitidamente muitas coisas em minha vida, mas desde que o karatê retornou das cinzas para minha vida, estar vivendo um contínuo pesadelo tem trazido consigo seus fantasmas, e Wolf, ele realmente me assusta. Seu ar imponente, ainda que profundamente sanguinário, traz-me à sensação de que a derrota pode me causar não só um encargo negativo emocional, mas também muita, muita dor física.
Enfim, poderíamos seguir para o hotel. Eu sentia meus punhos dormentes de tanto acertar repetidamente aquele saco de pancadas, e sinto que as marcas em minhas costas graças ao treino de hoje, ainda me deixarão passar a noite em claro, sentindo cada fibra de meu corpo gritando em dor, mas nem que eu tenha de dormir no caminho do ônibus amanhã cedo, por míseros vinte minutos, eu o farei, se necessário. Meu desempenho não pode ser abalado. Preciso entregar uma performance perfeita, sem margem alguma para erros, como meus senseis disseram repetidas vezes.
Enquanto minha equipe se movia em direção ao balcão para o check-in, percebi um burburinho familiar vindo da entrada. Um grupo de competidores do Miyagi-Do acabava de entrar, as faixas brancas e pretas contrastando com os uniformes impecáveis. O ar parecia se carregar de eletricidade, como se a simples presença deles bastasse para reacender rivalidades enterradas sob meses de treino.
Do canto do meu olho, o vi. Kenny. Ele era o motivo de eu estar aérea no treino, eu sabia que lhe tinha feito uma promessa, e a quebrei no mesmo instante, o deixando sem apoio nenhum, mas não porque eu quis, mas sim, porque não tive escolha. E por um instante, ele me viu também, mas em vez de um aceno ou um sorriso, desviou o olhar e se afastou rapidamente. Foi como um soco no estômago.
— Olha só, parece que nossos velhos amigos chegaram — Alguém do meu dojô comentou com sarcasmo, quebrando o silêncio. Mas eu mal ouvi. Minha atenção estava presa a Kenny e ao vazio que senti quando ele virou as costas.
Sem pensar duas vezes, pedi licença e me afastei do grupo. Atravessei o hall, passando pelas colunas imponentes, e segui Kenny pelo corredor que levava a uma área mais tranquila, onde os quartos começavam. Ele andava rápido, mas eu consegui alcançá-lo.
— Kenny! — Chamei, a voz carregada de urgência. Ele parou, mas não se virou de imediato. —Por favor, espera.
Ele se virou lentamente, os olhos fixos nos meus, e o peso daquele olhar era quase insuportável. Não era raiva pura, mas algo mais profundo, uma mistura de mágoa e desapontamento. E isso me atingiu como um golpe.
—O que você quer, agora? — Ele perguntou, cruzando os braços. — Desistiu do karatê antes, sumiu, e agora volta como se nada tivesse acontecido? Como se fosse a mesma pessoa?
Engoli em seco, sentindo cada palavra dele como uma acusação que eu sabia que merecia, eu desapareci sem lhe dar respostas, tornei-me o que eu mais temo para ele, um fantasma do passado.
— Eu... sei que te deixei na mão, Kenny. Sei que foi errado. Não tem desculpa. — Dei um passo à frente, mesmo que ele parecesse pronto para recuar. — Mas eu não podia continuar... na época. Minha cabeça estava toda bagunçada. O karatê não era mais o que eu precisava. Eu precisava de tempo.
— Tempo? — Ele riu amargamente. — Enquanto você sumia, eu continuei nas mãos do Silver e do Cobra Kai. Treinei. Cresci. E agora estamos aqui, mas você aparece como se nada tivesse acontecido. Só porque decidiu que é hora de voltar?
— Eu não tive outra escolha — Meus olhos se preencheram de água, e eu senti um nó se formar em minha garganta, então apenas virei o rosto de lado, passando a mão por debaixo de meus olhos, enxugando uma lágrima prestes a escorrer —, minha mãe precisava de mim, e agora eu perdi ela. Por favor, não quero te perder também.
Minha voz estava carregada de dor e frustração. Eu sabia que o tinha decepcionado, mas esperava que ele entendesse minhas circunstâncias agora. Mas então, quando meus olhos voltaram a encarar os seus, ele franziu o cenho, se aproximando e me surpreendendo com um abraço apertado. Esse tipo de contato, isso é o que eu mais senti falta, e desde que voltei para essa vida, não cheguei nem perto de experimentar um abraço outra vez.
Eu dei uma risadinha em meio às lágrimas, feliz por ter alguém que ainda se importa por perto, e o envolvi de volta em meus braços, apertando-o, esperançosa de que não o abandonaria novamente. E assim que me afastei, segurei seus ombros, meu olhar se manteve sério sobre ele.
— Vamos ter tempo para colocar a conversa em dia, irmãozinho — Zombei, dando um leve soco em seu ombro e abri um sorriso —, mas espero que descanse. É o que vou fazer agora. Amanhã temos alguns babacas pra chutar, certo?
— Mas você está bem agora, Cali? — Eu não queria mentir para ele, mas sabia que insistiria em saber os detalhes se eu dissesse que não, então apenas optei por omitir tudo por enquanto.
— Vou me sentir melhor quando eu vencer — Afirmei em um tom confiante e ele riu, então soltei um suspiro, estreitando os olhos na direção de Zara, que me chamava para irmos encontrar nosso quarto, então voltei a olhar para Kenny — E você garoto, vê se descansa.
— Eu estava com saudades da minha irmã do karatê... — Ele disse apontando em minha direção, sinalizando uma pistola, e sorriu, finalmente dando às costas e seguindo com seus novos parceiros de equipe.
Eu sempre fui como um pilar para Kenny, e apesar de ambos termos sido manipulados por Kreese por um tempo, e depois, Silver por mais tempo ainda, eu ainda tinha um pouco mais de noção do que ele, já que na época era só um garoto, que finalmente cresceu e escolheu um lado certo para lutar. Eu queria poder subir ao pódio com ele, meu pupilo, como eu costumava chamá-lo, mas as circunstâncias só me permitem a vitória, e não importa se somos amigos, porque encima do tatame, nos tornamos rivais.
Eu acompanho Zara e Axel até o elevador, e assim que nos aproximamos da caixa metálica, Axel aperta o botão. As portas ligeiramente se abrem e está repleta de membros de nossa equipe. Eu suspiro profundamente, dando um passo para trás, não caberia nós três, provavelmente, e tudo o que menos preciso é ser sufocada por mais pessoas. Prefiro esperar o tempo que for preciso até que esteja completamente vazio.
— Vocês podem ir na frente — Afirmei, estendendo a mão e apontando para o elevador, nenhum deles parecia ter problemas em ir na lata de sardinhas. Troquei um olhar com Zara que me encarou ressabiada, ela sabe me ler bem, ou eu sou transparente demais — Eu encontro você logo, prometo.
— Vou te esperar para assistirmos Meninas Malvadas de incentivo para amanhã, ouviu? — Perguntou em um tom levemente sarcástico, apontando para mim enquanto entrava no elevador, e eu apenas acenei, logo deixando de os ver, quando a porta se fechou.
Eu fui até o elevador do lado, que estava no subsolo e subindo para o mesmo andar que o meu, e assim que chegara até o térreo, apertei o botão, fazendo-o parar e as portas se abrirem. No entanto, de primeiro momento, tampouco consegui disfarçar minha expressão de desprezo ao ver a figura do lado de dentro. O líder da equipe do Cobra Kai, o garoto asiático de cabelos bagunçados e sorriso ligeiramente escroto.
— Não está com medo de entrar, está? — Sua voz estava carregada de sarcasmo, e uma risada irritante ressoou de seus lábios — Relaxa, gatinha, não vou te atacar fora dos tatames, a menos que peça por isso.
— Gatinha é uma ova. — Murmurei mais para mim, do que para ele, e revirei os olhos, entrando no elevador e apertando para que as portas fechassem. Meu único desejo naquele instante é que o elevador fosse rápido feito uma nave, para eu evitar sujar as mãos antes do início do campeonato.
As portas do elevador se fecharam com um leve som metálico, e eu imediatamente me virei de costas para ele, tentando ignorar sua presença. O ar parecia mais pesado naquele espaço apertado, e eu tinha certeza de que era por causa dele. O silêncio entre nós era incômodo, mas eu sabia que se ele começasse a falar de novo, minha paciência poderia acabar antes de chegar ao meu andar.
O painel de botões iluminou-se conforme o elevador começou a subir, o movimento suave por alguns segundos, até que a luz deu uma piscada. Foi uma pequena interrupção, quase insignificante, mas o bastante para que meu corpo ficasse tenso. Ignorei. Devia ser só um mau contato. Mas então, do nada, o elevador sacudiu levemente e parou, simplesmente parou. O que me fez soltar um suspiro de indignação. Como eu poderia aliviar o estresse antes do torneio estando presa com a droga de uma cobrinha falante em um espaço apertado?
— Ah, fala sério — Murmurei, olhando para o painel. Os números congelados na tela brilhante me confirmavam o que eu temia. O elevador não ia a lugar algum.
— Bem — Ele disse atrás de mim, e eu podia ouvir o sorriso na voz dele mesmo sem olhar —, parece que vamos passar um tempo juntos, gatinha. Não foi isso que você pediu?
Fechei os olhos, respirando fundo, tentando controlar a vontade de virar e socar aquele sorriso irritante do rosto dele. O Sensei Wolf me disse que eu deveria canalizar toda a raiva para a primeira prova amanhã, mas se fosse necessário descarregá-la antes, e eu estivesse sob circunstâncias legais, não teria motivos para fugir de uma briga. E eu faria isso, se não corresse o risco dessa porcaria de elevador despencar.
— Se você me chamar de gatinha mais uma vez, juro que esqueço as regras do torneio e resolvo isso agora, meu bem. — Afirmei ironicamente, com um tom levemente irritado ao fundo de minha voz.
Sua risada ecoou pelo pequeno espaço, um som despreocupado e insuportável, o que só aumentavam minhas chances de cometer um crime de ódio nesse cubículo metálico. E eu chego a me perguntar se não é o carma, porque um hotel luxuoso como esse não deveria ter esse tipo de problema, certo?
— Relaxa, foi só uma brincadeira. Além disso, quem sabe isso não é um sinal? Talvez o universo esteja tentando me dizer que você é quem precisa pedir ajuda, não o contrário.
Ignorei sua provocação e me abaixei para abrir o painel de emergência do elevador. Mas antes que pudesse tentar qualquer coisa, as luzes piscaram de novo, desta vez mais intensamente, mergulhando-nos em escuridão total por alguns segundos antes de uma luz fraca de emergência se acender. O tom amarelo pálido fazia o elevador parecer ainda menor, quase claustrofóbico. Eu queria simplesmente chutar aquele painel, gritar ou socar a cara dele. Acredito que qualquer um poderia resolver facilmente meu pequeno acesso de raiva.
— Que merda! — Vocifero, passando as mãos nos cabelos, então vasculhei meus bolsos, até encontrar meu celular, a tela exibindo um brilho que quase me cegou assim que o liguei — Não poderia ser mais inconveniente.
— Aqui não tem sinal — Ele sinalizou, com a luz também brilhosa de seu telefone, seu tom de voz debochado estava à beira de me fazer colapsar —, já que está com tanta raivinha, deveria usar sua força bruta para nos tirar daqui.
— Eu vou usar minha força bruta para quebrar seus dentes — Ameacei, procurando respirar fundo, então murmurei —, idiota.
— Se não consegue colocar sua raiva nos punhos, não vai conseguir nem se classificar na primeira prova — Zombou, dando uma risada e esbarrou em meu ombro, caminhando na direção da porta, o que me tirou uma risada desacreditada. As luzes começaram a piscar de novo, até que ficara meia-fase. Era isso, o prédio, ou apenas o elevador, estava sem força — Um vencedor pode acabar com qualquer situação.
Ele afirmou com confiança, e eu apenas cruzei os braços, o observando com divertimento no olhar, seria fascinante vê-lo tentar abrir a porta maciça de metal frio, mas não sei quando passaria de fascinante à mortal, porque sinto que não poderei suportar muito até esmagar uma cobra com minhas próprias mãos.
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Obs: Estou postando com frequência no tiktok, o @ é livpswriter. Sigam a conta e curtam os vídeos, é muito importante para que eu continue a dar vida à essa história e para que vocês, leitores, consigam imaginar cada palavra com clareza, tornando-as reais.
Conto com o apoio de vocês. Beijos 💗.
(Fiquem com essa manip que fiz dos meus filhos)
Obra autoral ©
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