𝐂𝐡𝐚𝐩𝐭𝐞𝐫 : 𝟎𝟐

Senju encontrava-se em um estado parcialmente razoável, visto que sua aparência refletia sinais de um confronto recente.

Os cabelos estavam levemente desalinhados e sujos, como se tivesse passado por uma luta ou algum tipo de tensão física, e havia algumas marcas de arranhões em seu rosto e nos braços, indicando que se envolveu em um embate difícil. Mas eu não me importava com nada disso, pois meus olhos vacilam e rapidamente se voltam para os corpos sem vida espalhados pela sala.

─ Ah, olha só o que você fez com o meu belo carpete... ─ lamento com pesar, me virando novamente para agachar ao lado da mesa ─ Agora vou ter que limpar tudo sozinha.

─ [Nome], nós precisamos mesmo conversar.

Eu me nego a encará-la e ignoro a sua presença, ficando em completo silêncio. Logo, sem receber nenhuma resposta, a sinto se aproximar cautelosamente e não hesito em erguer a mão para cima ainda de costas, o que a faz recuar e estreitar os olhos.

─ Saia, você não é bem-vinda aqui.

─ Nem se eu tiver a informação que você procura? Sabe, para suprir essa sua necessidade maluca de mudar o passado ─ sua voz continha aquele tom irritante de julgamento que sempre odiei ─ Mas não que fosse adiantar muita coisa, Emma já está morta.

Sem ter a chance de revidar, Senju é rapidamente surpreendida ao se deparar com a visão do teto branco e vazio, enquanto a domino por cima para imobilizá-la. Ela tenta desesperadamente se levantar ao ouvir um estalo ecoando, mas aparenta ter sido atingida por uma dor intensa e latejante na parte de trás da cabeça.

 Com um gemido dolorido escapando de seus lábios, ela é forçada a retornar à posição inicial quando é incapaz de resistir. Eu era mais forte do que ela em diversos sentidos, e Senju não poderia negar esse fato para medir forças em seu estado de vulnerabilidade.

─ Diga algo relacionado a esse assunto novamente e não vai ter o prazer de sair viva daqui ─ estreito os olhos, apertando levemente o pescoço da platinada para reforçar o meu ponto.

─ Tanto faz, eu... Não quero ter uma... Discussão... Com você ─ ela fala com dificuldade e segura o meu braço para tentar se livrar do aperto, mas apenas o intensifico.

─ Então se comporte, princesa ─ praticamente cuspo o título, a soltando para se levantar ─ Vou te dar só mais uma chance.

A platinada se senta rapidamente, procurando recuperar o fôlego que lhe foi abruptamente retirado. Enquanto realiza esse ato, ela também acaricia suavemente toda a área em torno do pescoço, evidenciando uma expressão de alívio visível em seu rosto.

─ Eu deveria te contar algo urgente, as garotas devem estar preocupadas por eu ter demorado tanto.

─ Você já foi melhor do que isso. Se quer tanto assim conversar, apenas chegue falando, não atirando nos meus convidados.

─ Ah, foi mal por isso ─ ela se levanta, limpando a sujeira das roupas ─ Mas parecia que você também queria se livrar deles a qualquer momento.

─ Independente, eles ainda estavam vivos, Senju. Você assassinou pessoas ─ dou enfâse a ação, aborrecida com a finalidade dela.

─ Pff, e você diz isso como se nunca tivesse o feito ─ ela segura uma risada com um sorriso divertido estampado em seu rosto.

Incapaz de refutá-la, eu apenas paraliso completamente conforme um frio intenso percorre todo o meu corpo. Também mordo os lábios com força em uma tentativa desesperada de encerrar a sensação desconfortável, mas Senju não parece perceber essa minha reação.

─ Enfim, eu serei breve. Nós estamos lidando com um problema dos grandes no submundo do crime e as coisas saíram do controle muito rápido ─ ela suspira profundamente, passando a mão pelos cabelos ─ Pensamos bastante nisso e decidimos voltar com o antigo esquadrão para contornar a situação. Precisamos de você para lid-

─ Não.

─ Não o que? Você nem me deixou terminar de falar! ─ ela reclama exaltada.

─ E nem vou deixar, minha resposta é não ─ insisto, me distanciando rapidamente para desviar o rumo da conversa.

─ [Nome], espera! ─ ela segura o meu braço antes que possa ir longe demais, me forçando a encarar um certo desespero em seu olhar ─ Você precisa ser a nossa líder mais uma vez, todos conhecem o seu nome e com certeza teríamos sucesso na missão se estiver conosco.

─ Ficou maluca? Você sequer está se escutando? É vergonhoso que a grande líder da Brahman venha pedir a minha ajuda ─ declaro com rispidez, tentando me soltar do aperto da mulher ─ Aliás, pare de me olhar assim, eu não sou mais desse mundo.

A última frase quase foi capaz de destruir minha última fagulha de sanidade, estava mentindo tão descaradamente para um fantasma que inventei para suprir minha própria decadência. Não sou mais desse mundo? Uma verdadeira piada. Realmente, eu estava em uma fase muito pior do que apenas "ser" parte disso, esse mundo havia simplesmente me consumido por completo ao ponto de viver exclusivamente por ele.

Essa não era mais uma etapa boba da adolescência onde eu apenas batia em alguns delinquentes frouxos e me vangloriava pelo poder que tinha. Eu agora matava, e teria que carregar o peso do sangue manchado em minhas mãos pelo resto da minha vida.

─ Foi exatamente o que eu pensei antes de concordar com esse plano, mas sinceramente, a sua tentativa de exílio me dá nojo ─ ela finalmente me solta, voltando ao semblante neutro habitual ─ Por onde andou todo esse tempo para esquecer de quem você foi, afinal?

─ Vá em frente, diga o que quiser, mas nada vai me convencer a entrar para toda essa bagunça de novo.

─ Manjiro Sano ─ ela diz, satisfeita por ter o efeito que gostaria ao ver a minha expressão se tornar sombria ─ O que acha desse nome? É o suficiente para te convencer?

Merda, ela sabia o que estava fazendo. E também sabia exatamente como me ter na palma da mão para realizar seus caprichos.

─ Depende, qual é o problema em questão? ─ questiono com determinação, ignorando o que havia acabado de declarar.

─ Tráfico.

─ Tráfico? ─ levanto a sobrancelha, incentivando a mulher a continuar.

─ Não sabemos ao certo, mas a principal suspeita da atividade é a Bonten. Recebemos uma informação de que Mikey é o líder, e eles provavelmente estão tentando implantar algum produto novo no mercado para expandir os negócios e monopolizar o submundo de maneira definitiva ─ ela explica, esperando alguma objeção em seu ponto de vista ─ Agora entende o nosso desespero?

─ Não, ainda não saquei qual é o problema. Eles sempre estiveram se esgueirando por aí. As atividades que fazem ou deixam de fazer não afetam em nada e, mesmo que afetasse, não somos nós que temos que resolver.

─ Presta atenção, essa nova droga está matando pessoas inocentes todos os dias e continua piorando a comunicação entre as outras organizações criminosas do Japão. É simplesmente impossível pegá-los, esses caras nunca deixam nenhum rastro para trás.

─ Uhum, e você acha mesmo que a gente vai conseguir? ─ questionei sem esperar uma resposta positiva, sabendo que seria impossível ─ Acorda, somos nós contra a maior organização de todos os tempos.

─ E por que não podemos? Não estaremos sozinhas, temos a força da Rokuhara ─ a platinada retira do bolso uma identificação com o símbolo da organização para me mostrar que a informação era verídica ─ Não que precisássemos, de qualquer forma.

─ Você acabou de dizer que a comunicação entre as organizações ficou pior, então como podemos confiar neles?

─ Bom, agora não dá pra esperar muito da Rokuhara Tandai, eles estão bem mais vulneráveis com os conflitos internos e externos acontecendo e nenhum deles aceitaria ter mais gente envolvida nisso. Mas não significa que não possuem poder e contatos para nos oferecer ─ ela gesticula com os braços, confiante de sua visão ─ Como tiveram um forte vínculo com uma das três divindades, eles conseguiram bastante influência no submundo.

─ Ah, claro. Essa aí fez parte da época das três divindades... ─ pondero, perdida nos meus próprios pensamentos ─ Deve ter sido dureza para a gangue seguir em frente depois de perder seu líder e alguns integrantes importantes, hein?

Na verdade, eu sabia muito pouco do que realmente acontecera naquela fatídica noite em que a guerra sobreveio, mas não era boba a ponto de não me manter informada do necessário. 

O submundo dos delinquentes esteve em grande conflito e novas gangues surgiram para reivindicar o poder. Muitas delas falharam miseravelmente sem nem mesmo terem tentado, afinal, apenas os mais fortes poderiam disputar.

De certa forma, estava aliviada pelo fato de que a minha gangue já não existia mais, pois assim as garotas participantes não precisariam entrar em riscos desnecessários para proteger o meu legado. No entanto, Senju escolheu seguir outro caminho e continuou com os velhos hábitos, o que resultou na formação da Brahman e na integração dela como uma das três divindades.

Durante aquela ocasião, eu felizmente não estava mais nos holofotes e nenhuma alma se interessava pela minha história de ruína, então foi muito fácil desaparecer no mapa como um sussurro ao vento.

A partir disso, acabei ficando conhecida como um verdadeiro fantasma. Ninguém nunca me viu pessoalmente e nem sabiam por onde eu andava - suspeitavam até que estava morta -, mas todos se lembravam do meu domínio e autoridade. 

Nesse sentido, se tornou inegável que fiz uma grande diferença para a era dos delinquentes, e teria ascendido ainda mais se as circunstâncias tivessem sido diferentes. Talvez levado até mesmo a consolidação da tão desejada era pacífica.

─ Foi dureza para todos nós, [Nome]. E vai acontecer de novo se não fizermos nada, você querendo ou não. Dessa vez, a guerra será muito mais sanguinária e haverá diversas perdas inocentes, então vou perguntar apenas uma vez ─ ela endireita a postura, com um ar de seriedade na voz ─ Você está comigo ou não?

Diante dessa pergunta, acabo me vendo vulnerável em uma corda bamba. Por um lado, estaria me colocando novamente no palco para encenar um desfecho trágico, onde eu desconhecia quem seria o vitorioso e poderia facilmente ser a derrotada. Por outro, seria muito divertido arriscar a própria vida em uma missão suicida, onde o perigo e a emoção seriam extremos. 

Ambos os pontos possuíam destaques atrativos que mereciam ser considerados. Entretanto, era necessário escolher logo se deveria aceitar aquela proposta, pois Senju ainda aguardava uma resposta.

Com passos decididos, me dirijo até o canto mais distante da sala para pegar um casaco confortável escondido em um velho baú, o vestindo rapidamente enquanto a platinada apenas acompanha os meus movimentos com o olhar; eu havia novamente cedido espaço para a maldita tentação.

─ Tudo bem, reúna o seu grupinho ─ solicito, colocando o capuz sobre a cabeça ─ Eu sei exatamente quem pode ajudar.

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