ㅤㅤ.˚ 𝗖 - 𝟬𝟲. 𝗍𝗁𝖾 𝖺𝖼𝖼𝗂𝖽𝖾𝗇𝗍

06. o acidente

Washington, Decatlo Acadêmico dos EUA.
Quarto 217
(Terra-616)

── Você fica invisível! ── Foi a primeira coisa que saiu da boca de Peter Parker quando Violeta abriu a porta do quarto naquela manhã.

Por sorte, MJ havia saído cedo para protestar novamente antes da competição começar à tarde, e Violeta estava apenas esperando o momento em que seu colega ─ ou amigo, tanto faz ─ iria aparecer. Ela quase não dormiu, passando horas revivendo o momento em que Peter descobriu quem ela era. Ou o que ela era.

── Fala baixo. ── Violeta murmurou, dando um passo para o lado, permitindo que Peter entrasse.

Ele passou rápido por ela, fechando a porta atrás de si com força. Violeta tomou um susto, seus olhos se arregalando antes de se encolher contra a parede mais uma vez, sentindo-se exposta sob o olhar brilhante de Peter. Era uma curiosidade e animação tão inocente que ela sentia estar diante de um filhote de cachorro.

── Você fica invisível! ── Peter repetiu, gesticulando de maneira exagerada, como se precisasse dar ênfase ao que dizia. Ele se sentou ponta da cama de Violeta, sem desviar o olhar animado dela. ── Isso não devia ser possível! A física diz que até poderia ser possível, dependendo de como a luz interage com sua superfície, mas você- Você só desliga e some! E volta! Como?

Violeta sentiu seu rosto esquentar. Já havia imaginado vários cenários em que contaria a um amigo sobre sua... condição, mesmo quando não tinha amigos. Todas as vezes sua mente fazia com que o cenário se distorcesse em desgosto e medo, mas Peter não estava assim. Nem perto disso.

Ela esperava tudo, menos admiração.

Por isso, não estava nem um pouco preparada para lidar com a inocência da reação de Peter. Tudo bem que ele era o Homem-Aranha, mas ainda era diferente. Mesmo sem saber como as habilidades dele funcionavam exatamente, não era o mesmo que Violeta. Ela nasceu assim, por ser filha de duas pessoas que foram frutos de um experimento do governo.

── Você solta teias. Por que tá tão... assim? ── Violeta murmurou, inclinando a cabeça para deixar parte de seu cabelo cair na frente de seu rosto. Ficou mais tranquila quando a cortina familiar a cobriu, e cruzou os braços. ── E não devia estar mais preocupado por eu ter te visto ontem?

Violeta viu Peter arregalar os olhos por um segundo, como se tivesse esquecido completamente daquele detalhe. Sua boca se abriu levemente, e Violeta quase conseguiu ver os pensamentos correndo na mente dele. Mas, então, ele relaxou, surpreendendo Violeta mais uma vez. ── Confio em você.

Foi tudo que ele disse, como se fosse tão simples. Violeta sentiu uma surpresa tão grande que parecia ter sido jogada contra a parede, mesmo sendo exatamente onde ela estava. Como ele conseguia falar isso daquele jeito?

De novo, não era o que ela esperava. ── E você sabe guardar um segredo. ── Peter sorriu. Mais uma vez, tão inocente que Violeta sentiu um aperto. Não conseguia acreditar que aquilo era real. ── Porque você fica invisível. ── Destacou as últimas palavras, voltando à animação infantil.

Violeta não conseguiu evitar uma pequena risada, e ficou ainda mais vermelha ao ver a surpresa no rosto de Peter, seguida por outro sorriso. Virou o rosto para o lado, evitando olhar diretamente para ele. ── Você já disse isso.

── Eu sei, mas ainda não superei! ── Peter exclamou, suas mãos parando nos joelhos. ── Ok, e tem mais alguma coisa? Você tem superforça? Você voa? Você, sei lá, solta laser pelos olhos?

Violeta revirou os olhos pelo exagero, mas estava se divertindo. Internamente. ── Não. Eu não.

── Ah, que pena. Seria leg- ── Peter balançava a cabeça como se estivesse resignado, olhando para o chão. De repente, sua cabeça levantou. O movimento foi tão rápido que a própria Violeta levantou a cabeça, seu cabelo descobrindo seu rosto. ── Você não? Vi- Violeta, você- você conhece o Olho Laser? ── Os olhos dele estavam arregalados, parecendo uma criança.

Violeta se encolheu com a menção do Olho Laser, o corpo reagindo antes que ela pudesse impedir. Sua garganta secou por um momento, mas ela se forçou a manter a expressão neutra. Sua família ainda não tinha recebido qualquer notícia de seu tio, e isso porque tentaram entrar em contato com todos os outros do experimento. Na verdade, muitos dos antigos colegas de seus pais entraram em contato por conta própria, oferecendo apoio.

O pior já tinha sido revelado, de qualquer forma ─ tirando o fato de ser filha do Sr. Incrível e da Mulher Elástica, óbvio... Por isso, Violeta se limitou a acenar. Foi breve, curto, mas o suficiente para Peter voltar a ficar muito animado. ── Você conhece o Olho Laser?! Tipo, de verdade? Você já viu ele pessoalmente? Ele também mora em Nova York? Como ele é?

Violeta desviou o olhar, tentando reprimir suas emoções, seus ombros ficando tensos por reflexo. Queria ter sido discreta, e sentia como se tivesse sido, mas Peter claramente percebeu. A empolgação dele diminuiu ligeiramente, como se algo tivesse finalmente se encaixado na cabeça dele.

Ele piscou algumas vezes, abrindo a boca para falar, mas parou antes de qualquer palavra sair. ── Ah, cara... ── Peter passou a mão na nuca. Violeta estava tão distraída que não percebeu o quão idiota ele estava se sentindo. ── Foi mal. Eu não devia ter falado assim.

── Tudo bem. ── Violeta murmurou, engolindo em seco. 

Era difícil não perceber como o clima do quarto pesou. Conseguia ouvir o barulho do relógio da parede, dos carros passando na rua, e o quarto em si estava tão silencioso que Violeta jurava conseguir ouvir o barulho do chuveiro no quarto ao lado.

Peter coçou a garganta, atraindo a atenção de Violeta novamente. Ele se endireitou na cama, um sorriso torto tomando conta de sua boca. ── Ei, mas e quanto ao lance de ser invisível? Você consegue passar pelas paredes também? Tipo, já pensou em invadir um banco ou algo assim?

A mudança repentina de assunto fez Violeta soltar uma risadinha surpresa, e por um momento, a pressão no ar pareceu diminuir. Deu um sorriso discreto, sentindo-se um pouco mais à vontade.

── Não, não sou uma criminosa, Peter. ── Violeta respondeu, ainda com um sorriso, mas com a voz mais suave. ── E não atravesso paredes.

 Washington, Monumento Washington.
Elevador 
(Terra-616)

Peter não foi até a competição.

Não era exatamente uma pessoa competitiva, exceto quando estava entre sua família ─ e com isso Violeta queria dizer os amigos próximos que seus pais fizeram durante o experimento. Por isso, não estava irritada. Mesmo se fosse, não teria ficado, já que conseguiram vencer a competição graças à MJ. Liz, por outro lado, estava bastante irritada.

Até mesmo fez Violeta desligar quando Peter tentou ligar para ela antes de passarem pela segurança do prédio, mesmo que não conversassem. Justamente por não conversarem, Violeta não conseguiu se impor para pegar seu celular de volta. Agora, estava subindo até o topo do Monumento Washington de elevador, junto de alguns dos colegas e de seu professor, durante uma visita guiada.

Teria ido até ele sozinha na noite anterior. Tentou, inclusive, mas todas as portas estavam trancadas.

Violeta estava encostada na parede do elevador, ouvindo a guia. Não prestava muita atenção, já sabendo tudo aquilo de cor. ── O Monumento Washington tem aproximadamente 170m de altura. Notem como o mármore e o granito são-

A fala da guia foi interrompida quando feixes de luz emergiram no elevador, atravessando o teto. Violeta arregalou os olhos, levantando a cabeça para tirar seu cabelo da frente, permitindo que visse melhor. O metal do teto do elevador estava delineado por feixes laranja, como se tivesse sido atingido por uma grande onda de calor, e tinha.

── Ai meu Deus, olha o teto. ── Flash exclamou, e Violeta se lembrou que ele estava ali. Não podia estar presa no mesmo lugar que Flash Thompson.

Violeta continuou onde estava, analisando o teto. O elevador tinha parado, obviamente, e não se mexia um centímetro. Isso era bom, pelo menos.

── Calma, pessoal. Sei que estão assustados, mas o sistema de segurança funciona. ── A guia tentou acalmá-los, mas Violeta não tinha certeza se ela mesma confiava nisso. Principalmente quando o elevador balançou pela primeira vez. As mãos de Violeta encontraram as paredes, buscando algum apoio. ── Nós estamos seguros aqui.

O elevador estava cheio, apesar de não estar lotado, e balançou mais uma vez.

Era possível ouvir uma breve comunicação vindo do rádio da guia, que estava conectado a um fone. Por isso, Violeta não conseguia ouvir o que estava sendo falado exatamente. ── Preciso que se mexam devagar, um de cada vez. ── A guia falou, olhando para eles. A própria mulher andou devagar para o centro do elevador, abrindo a tampa de inspeção do elevador.

Violeta não se moveu para o centro, continuando contra a parede. Tentaria ser a última a sair, se possível. Caso o elevador chegasse a cair, conseguiria usar seu campo de força para evitar a destruição, e consequentemente qualquer morte. Seria difícil de explicar como sobreviveu se chegasse a esse ponto, mas duvidava que a primeira conclusão das pessoas seriam que ela conjurou um campo de força.

Usaria o choque para não conseguir explicar o que aconteceu, então julgava ser uma situação relativamente segura para usar seus poderes.

Estava tão distraída olhando os arredores do elevador, buscando qualquer indicação de que estivesse prestes a cair, que sequer percebeu quantas pessoas já tinham saído. Isso até ouvir Liz resmungar. ── Esquece esse troféu.

Violeta virou para olhar, e viu Flash tentando passar o troféu pela tampa de inspeção, antes dele mesmo sair. ── Pelo amor de Deus. ── Violeta resmungou para si mesma. Ainda bem que Flash já estava saindo, porque ela se sentiu um pouco menos motivada a se salvar caso o elevador caísse, sabendo que ele estaria bem ali.

De repente, uma leve vibração fez o chão tremer com mais força, e o elevador deu um tranco forte. Violeta levantou o olhar, encontrando os olhares dos outros com o susto repentino. O metal do elevador arranhou, e um estalo cortou o ar quando o elevador tremeu de novo. ── O que foi isso? ── Liz perguntou, seu rosto pálido.

Violeta sentiu seu coração bater mais rápido, e a tensão no ar ficando mais intensa. A cabine ficou completamente imóvel. Violeta olhou para Ned, que estava encostado na parede ao lado dela. Perto dele, o professor estava apreensivo, mas não havia tempo para pânico.

E então, do nada, o elevador desceu, sem nenhum controle, com a velocidade aumentando a cada segundo. O grito de Liz ecoou pelo espaço apertado, e Violeta deixou os olhos bem abertos para saber quando usar seu campo de força. ── Gente, a gente vai morrer? ── Ned gritou ao lado dela.

De repente, mais uma vez, o elevador parou. O tranco fez com que o corpo de Violeta se saltasse, e ela tentou manter o equilíbrio quando tudo ficou estável. ── Estamos- ── O professor de Violeta tentou falar, mas o elevador caiu mais uma vez.

Violeta esticou as mãos ao lado do seu corpo, seu corpo tremendo com o elevador. Estava ficando tonta pela velocidade, e decidiu tentar criar um campo de força ao redor do elevador. Nunca tinha feito algo tão grande, mas teria que tentar. Na verdade, teria que conseguir. Quando começou a fechar os olhos, um barulho alto se deu no elevador.

Ela arregalou os olhos ao ver o Homem-Aranha ─ ou melhor, Peter trajado com seu uniforme ─ caído no centro do elevador. ── Ei, pessoal, eu peguei vocês no meio do passeio, hein? ── Ele falou com um tom descontraído, forçando a voz tão bem que Violeta quase não reconheceu, como se estivesse em um passeio comum. Sua voz tremia com a queda, e Violeta se preparou mais uma vez quando Peter lançou uma teia para fora do elevador.

Violeta conseguia sentir as fagulhas começando a surgir na sua mão, seu poder correndo pelas veias e seguindo até a mão, quando o elevador parou. Seus olhos se abriram, e ela sequer tinha percebido que havia os fechado, e viu que estavam parados.

── É isso aí! ── Ned começou a comemorar, pulando.

── Ei, grandão, para de pular. ── Peter repreendeu Ned, sua voz soando normal por um segundo. Ninguém pareceu perceber, e sequer Violeta, que sabia quem ele era, prestou atenção direito. Estava aliviada por não cair.

Não tinha certeza se conseguiria fazer o campo que precisavam. E não queria morrer.

Podia ficar bem estressada às vezes, e até mesmo triste, e sua vida não estava sendo uma das melhores, mas gostava de estar viva. Violeta tentava acalmar a respiração enquanto Peter ─ era estranho chamá-lo de Homem-Aranha agora que sabia a verdade ─ puxava o elevador para cima com uma teia. Ainda não entendia como elas eram tão fortes, mas talvez perguntaria depois.

Se tivesse a coragem.

── Tá tudo bem? ── Ouviu Peter perguntar bem baixinho ao passar do seu lado. Violeta viu a máscara de Aranha virando para ela por um segundo, e acenou discretamente.

Peter saiu pela abertura com um pulo estranhamente gracioso para o Peter desajeitado que Violeta conhecia e via todos os dias. Ele ajudou Liz a sair, e depois o professor, enquanto Violeta se mantinha no canto da parede. Queria que Ned saísse primeiro, já que não conseguiria protegê-lo se saísse antes dele. E Violeta gostava de Ned.

Em seu primeiro dia na escola, quando o professor de Estatística passou uma atividade em dupla, Ned deixou Peter de lado para fazer com Violeta. A novata.

── Vai, Vi. ── Ned falou, gesticulando ansiosamente para Violeta ir para o centro do elevador. Peter estava terminando de passar o professor para fora do elevador em segurança.

Violeta balançou a cabeça, gesticulando de volta. ── Pode ir.

Ned estava claramente mais ansioso que Violeta, e não chegou a discutir. Quando Peter voltou a olhar para dentro do elevador, pronto para puxar quem estivesse perto, o elevador disparou mais uma vez. Peter se desequilibrou com o tranco, e caiu dentro do elevador mais uma vez, igual antes.

── Nós vamos morrer! ── Ned gritou, as mãos buscando pela parede do elevador.

── Merda! ── Peter também gritou, tentando soltar uma teia como fez antes. Ele claramente não estava conseguindo.

Violeta, de coração acelerado, se agarrou a sua única carta na manga. Sabia que teria que conjurar o campo. Tinha que conseguir fazer isso, mas o pânico de Ned não ajudava em nada. 

Fechou os olhos, forçando sua respiração a ficar calma. Sua mente passou por imagens de seus pais, de Zezé, e de Flecha. Violeta se lembrou de quando segurou seu primeiro irmão logo após ele nascer, e finalmente conseguiu sentir seu poder superar o medo e passando a fluir.

No último segundo, Violeta estendeu a mão e criou um campo de força.

O impacto foi forte, mas a barreira que ela gerou no último segundo fez com que o choque fosse enfraquecido o suficiente para que ninguém ficasse gravemente ferido. O elevador ainda tremeu violentamente, mas estavam protegidos. O som foi tão alto que Violeta sentiu sua cabeça girar, pontadas de dores surgindo nos cantos.

O corpo de Ned foi lançado para frente, caindo no chão, e o corpo de Peter pulou antes de bater contra o chão de novo. Violeta também foi jogada para frente, mas já esperava por isso e conseguiu se equilibrar.

Ned ainda estava em choque, tentando entender o que tinha acabado de acontecer. Suas mãos se apoiaram no chão para ele conseguir se levantar. ── O que... O que foi isso? ── Ned tentou perguntar, a voz falhando. Ele olhou para Violeta, piscando como se estivesse delirando. ── Você... você fez isso? Como?

Violeta estava tentando parecer calma, mas sentia o quanto estava ofegante.

── Você- Você conjurou um campo de força?! ── Peter exclamou do chão, virando o rosto mascarado para Violeta.

── Espera- ── Ned arregalou os olhos, seu olhar movendo de Violeta para Peter, e vice-versa. ── Você- Você sabe dele?

Violeta fechou os olhos, respirando fundo, tentando controlar o coração que ainda batia acelerado. Ela se inclinou contra a parede do elevador, seu corpo exausto após a tensão, mas já sabendo o que estava por vir. Lá vamos nós de novo, pensou.

Estava começando a aceitar que, com Peter e Ned por perto, as coisas nunca seriam simples.

Nova Iorque, Terminal do Queens.
Plataforma 2B - Área de desembarque
(Terra-616)

Violeta ainda devia uma conversa a Ned, e mais uma a Peter.

Por causa do choque do quase-acidente no elevador, os dois sequer incomodaram Violeta com as novas descobertas na viagem de volta. Durante todo o caminho, até o ônibus parar na área de desembarque, o ônibus permaneceu em total silêncio. Aqueles que estavam no elevador, o que era grande parte da equipe, estavam processando o que aconteceu, e os outros respeitavam o momento.

MJ até mesmo chegou a oferecer um fone para Violeta, enquanto eram parceiras de viagem. Violeta aceitou para se distrair, e foi um estranho momento de bonding com sua colega. Dividiram um quarto, claro, mas ficaram pouquíssimo tempo lá, principalmente juntas.

── Vi! ── Violeta ouviu um grito ao pisar na plataforma. Mal pisou para fora do caminho quando um pequeno corpo se chocou contra o seu. Tudo que viu ao olhar para baixo eram os cabelos loiros de Flecha. As mãos de seu irmão mais novo agarravam sua cintura com força, e Violeta sentiu sua blusa ficar um pouco molhada.

O "acidente" foi transmitido em televisão nacional, e Violeta recebeu várias ligações de sua mãe e irmão quando conseguiu sair dali ─ sim, seu pai não ligou uma vez. Repetiu várias vezes que estava bem, e que tinha conseguido usar seu campo para se proteger, mas não pareceu ter sido o suficiente para Flecha. ── Ei, Flecha. ── Violeta sussurrou para o irmão, abraçando-o de volta.

── Não faz isso de novo. ── A voz fina de Flecha saiu abafada, e Violeta assentiu, mesmo sabendo que seu irmão não veria.

A voz de Flecha estava mais infantil que o normal ─ e seu normal era estar irritando Violeta ─ e isso fazia seu coração doer. Violeta lutaria com toda sua força para salvar sua família, mas morreria por Flecha.

── Não vou. ── Passou a mão livre pelos cabelos de Flecha.

Sua mãe surgiu em seu campo de visão, carregando Zezé. Seu irmão caçula estava distraído como sempre, e Violeta deu um pequeno sorriso com a visão. Para ele, a vida sempre era boa. Violeta gostava que fosse assim, e esperava que durasse. ── Como você está, querida? ── Helena se aproximou, dando um beijo na testa de Violeta. A voz de sua mãe tremeu.

── Bem. ── Violeta respondeu, mantendo uma mão no cabelo de Flecha, que se recusava a se mover, e usando a outra para acariciar a cabeça de Zezé.

Pelo canto de olho, percebia sua mãe agindo de maneira estranha, e sua intuição apitou mais uma vez. Violeta sentiu o peso nas palavras da mãe antes mesmo de elas serem ditas. O tom de Helena estava estranho, como se tentasse esconder algo, mas a preocupação nos olhos dela não passava despercebida. Violeta franziu a testa, tentando juntar as peças.

── Mãe? O que aconteceu? ── Violeta perguntou, mantendo sua voz tranquila. Tentou falar o mais baixo possível, mas sentiu o corpo de Flecha ficar tenso contra o seu, e seu irmão apertou Violeta com mais força. Violeta sentiu seu coração bater mais rápido pela ansiedade ao perceber que algo realmente estava errado. Então, sua mãe suspirou fundo, como se estivesse se preparando para algo que não queria dizer.

── Eu não sei onde ele está, Violeta. ── Helena finalmente falou, as palavras saindo arrastadas. ── Seu pai... sumiu.

Nova Iorque, Insuricare.
Cubículo de Beto - Andar 23
(Terra-616)

── Não deu um trauma? ── Peter perguntou, olhando para cima.

Violeta olhou para o amigo de canto de olho, vendo Peter balançar o corpo para frente e para trás. Sabia que ele estava se referindo ao acidente do elevador no dia anterior, já acabaram de subir 23 andares de elevador. ── Não. ── Violeta respondeu, simples. Trauma era uma palavra bem forte, principalmente porque saíram sem qualquer arranhão.

Teria sido difícil explicar como saíram intactos da queda, e como o próprio elevador sobreviveu. Felizmente, a desculpa do choque foi bem útil para desviar das perguntas. Além disso, muitos acharam que o problema, ou o milagre, estava no elevador, e não neles. Violeta chegou a ouvir pessoas na rua falando sobre o Homem-Aranha ter criado uma grande junção de teias no térreo para amortecer a queda.

Como achavam que ele tinha feito isso quando ele estava dentro do elevador que estava em queda sem morrer, Violeta não sabia. Às vezes as pessoas não faziam sentido, e por isso ela preferia ignorá-las.

── Agora você vai me explicar o que foi aquilo? ── O tom de Peter era esperançoso, a mesma inocência infantil voltando quando falava sobre a condição de Violeta. Violeta, por sua vez, se limitou a revirar os olhos.

Era a quinta vez que ele perguntava isso naquele dia, e estava começando a se arrepender de ter aceitado a ajuda dele para procurar seu pai. Sabia que ele estava lidando com os próprios problemas. Ned ficou resmungando algo sobre um vagalume que Peter trouxe para o quarto até Peter conseguir tirá-los em segurança do elevador, depois da queda.

Violeta deixou de responder, focada em mexer na mesa de trabalho de seu pai.

Quando chegaram no prédio, Gilbert Huph estava sentado atrás de uma mesa gigante, de madeira escura, em seu escritório igualmente enorme. Seus óculos finos descansavam sobre seu nariz enquanto ele vasculhava papéis e digitava freneticamente no computador. Ele somente olhou para Violeta ao ouvir que era filha de Beto, e passou a reclamar sobre Beto estar faltando ao trabalho.

Violeta sentia menos simpatia pelo homem a cada vez que ele abria a boca. Sua mãe disse ter ligado para o escritório dizendo que Beto estava internado, até conseguirem encontrá-lo, e mesmo assim Gilbert Huph reclamava como se o pai de Violeta fosse apenas um preguiçoso. Foram bons minutos até Violeta, e Peter, serem liberados para irem até o cubículo de Beto, alegando que ele havia esquecido ali um documento que descobriram ser necessário para seu registro no hospital.

Foi uma desculpa esfarrapada, a melhor que conseguiam pensar durante o nervosismo, mas funcionou.

── E se o chefe aparecer aqui? Ele é baixinho, mas é assustador. ── Peter resmungou ao lado de Violeta, olhando para o corredor.

── Espero que não. ── Violeta respondeu com um tom impaciente, sua mão tocando o mouse do computador de Beto para ligar a tela. ── Só precisamos ver se tem alguma pista. Não temos muito tempo.

O espaço estava incrivelmente organizado, com papéis alinhados e pastas perfeitamente dispostas. Mesmo assim, não encontraram nada. O computador tinha apenas arquivos de trabalho, e Violeta sabia que não daria em nada. Quando chegou à conclusão, Violeta fechou os olhos e respirou fundo. ── O que foi? ── Peter perguntou com voz baixa, surgindo ao seu lado. Seus olhos estavam cheios de preocupação.

── Não tem nada aqui. ── Violeta murmurou, sua mente correndo para encontrar outras alternativas.

De repente, Violeta se lembrou. Tinha mais um lugar que poderia procurar. Era improvável, não se lembrava de seu pai usá-lo há muito tempo, mas era um chute. O único que tinham.

── Tem... Tem mais um lugar. ── Violeta olhou para Peter, vendo sua expressão se tornar confusa.

Nova Iorque, Edifício Aurora.
Estacionamento - Vaga 73
(Terra-616)

── Um carro?

A voz de Peter soou cheia de confusão, e Violeta viu seu amigo inclinar a cabeça. De novo, parecia um cachorro.

── Já não olhamos o carro do seu pai?

── É, mas esse é outro. É antigo. Ele usa quando minha mãe precisa usar o novo. ── Violeta explicou, usando a chave para desativar o alarme.

O carro de Beto tinha um charme clássico, mas sua aparência poderia parecer abandonada. A pintura azul escura, antes vibrante, estava um pouco desbotada, com manchas sutis de desgaste ao longo da lataria. Dentro estava impecável, já que seu pai costumava dedicar tempo para limpar o interior, por usá-lo de vez em quando, e pelo apego. Só não cuidava tanto do exterior por gostar da lataria desbotada.

Violeta admitia, tinha um certo charme.

Quando Violeta abriu a porta do motorista e passou para o banco do passageiro, para conseguir olhar o porta-luvas, Peter seguiu para sentar no banco do motorista.

── Ah. ── Peter exclamou, acenando. ── É um carro bonito. Sempre quis ter um clássico. Tia May falou que ia me dar um quando eu me formar no ensino médio, mas acho que ela só disse isso porque eu tava anestesiado no hospital e achava que eu não ia lembrar. ── Violeta estava ocupada passando pelas folhas que seu pai deixava no porta-luvas, junto de óculos e outras tranqueiras que Beto considerava importante. Por isso, não viu Peter mexendo pelos botões. ── Qual abre o porta-malas?

Violeta se virou a tempo de ver Peter apertar o único botão que não devia. ── Não! ── Exclamou, o mais alto que sua voz já soou perto de Peter.

Ela sabia exatamente o que aconteceria, já tinha visto aquilo algumas vezes, mas nunca com alguém além de seu pai por perto, muito menos Peter. Quando o som mecânico começou, ela rapidamente apertou os lábios, sentindo seu rosto esquentar. A transformação estava começando, as peças se encaixando e o carro se moldando de forma silenciosa. ── O que- O que tá acontecendo?

Violeta não respondeu. Só queria fazer parar, queria impedir, mas não podia. Não quando já estava acontecendo. Ela abaixou a cabeça, batendo a mão contra sua testa. Devia ter imaginado que isso teria acontecido. Ainda bem que seu pai tinha uma vaga bem no fundo do estacionamento. E que o lugar estava vazio por ser um dia de semana.

O capô se levantou, a lataria começou a mudar, as rodas, o painel... cada parte do carro que antes parecia simples e, basicamente, retrô estava se transformando em um veículo futurista, projetado para um super-herói. Não apenas isso, mas era um carro bem conhecido pelos Estados Unidos. Famoso anos atrás.

A transformação estava completa, e ali estava o carro do Sr. Incrível, sem dúvida alguma.

Violeta pressionou os lábios com mais força, tentando esconder o pânico que começava a tomar conta de sua mente. Ela olhou para Peter, esperando que ele não fizesse perguntas, mas quando ele se virou, seus olhos arregalados não deixaram dúvidas.

── SEU PAI É O SR. INCRÍVEL?!

Violeta mordeu a parte interna da bochecha e virou o rosto, tentando disfarçar a vergonha. "Ops", pensou ela. Mas enquanto tentava criar alguma resposta, viu algo refletir próximo ao painel do carro. Violeta se inclinou, suas sobrancelhas franzindo.

O dispositivo era pequeno, do tamanho de um cartão de memória. Sua estrutura era metálica, de acabamento escuro e fosco, e uma pequena tela brilhante no centro piscava em um tom vermelho intermitente. Em suas laterais, havia fendas finas e um padrão quase imperceptível de símbolos geométricos gravados, como se fizessem parte de um código oculto.

Quando Violeta o pegou, sentiu o peso estranhamente denso para algo tão pequeno. Virando-o entre os dedos, percebeu que não havia botões óbvios, apenas uma discreta ranhura que parecia ser um encaixe para algo.

Ela franziu a testa.

── Violeta?

Se alguém poderia descobrir o que era aquilo, era seu vizinho.

Nova Iorque, Edifício Aurora.
Corredor do sexto andar
(Terra-616)

De frente ao apartamento 615, Violeta segurava o pequeno dispositivo em suas mãos. Estava ansiosa, mas, pelo menos, Peter estava calado. Não sabia se ele estava confuso com o que encontraram, ou se ainda processava o fato de Violeta ser filha de um dos antigos heróis, mas o importante era que estava em silêncio.

── Violeta? ── Sua vizinha abriu a porta, e o sorriso brilhante de Elizabeth cegou Violeta como sempre. ── É sobre Zezé? Estou saindo pro trabalho agora, mas se quis-

── Não. ── Violeta interrompeu, tentando soar educada. Coçou a garganta, já que definitivamente não funcionou. ── Eu- Queria saber se posso falar com Buddy?

As sobrancelhas de Elizabeth levantaram, e Violeta podia jurar ter visto o canto de sua boca levantar por um mísero segundo. ── Ele está lá dentro. E quem é você? ── Se virou para Peter, mas seu olhar era diferente do comum para Violeta. Ela não entendeu. Talvez fosse coisa da sua cabeça.

── Uhm, eu- Eu sou Peter, sen- Senhora. ── Ele gaguejou, parecendo ser pego de surpresa.

Elizabeth acenou com um sorriso. ── Prazer, Peter. Sou Elizabeth. ── Sua vizinha se virou para Violeta de novo, sua voz simpática. ── Buddy está lá dentro, Violeta. Podem entrar. Vou só chamar ele pra vocês.

Violeta não hesitou antes de entrar atrás de Elizabeth, ouvindo Peter fechar a porta. Não conversou muito com Buddy desde que se mudou, principalmente por ter sido bem estranho quando Elizabeth e sua mãe tentaram fazê-los virarem amigos. Buddy sabia segurar uma conversa, pelo menos, e Violeta sabia o suficiente. Ele era um gênio da computação, e Violeta sabia que era a pessoa certa para procurar.

Esperava que ele não fizesse perguntas, mas estava desesperada.

O apartamento era igual o apartamento dos Pêra. Violeta ficou parada ao lado do sofá, sentindo suas mãos suarem, e segurou o dispositivo em apenas uma mão, para secar a outra e segurá-lo. Estava com medo de estragar. Elizabeth parou no corredor que levava até os quartos, colocando a mão na bochecha para que seu grito soasse mais alto.

── Bochecha! Você tem visita!

𝟷 ▃▃ ok, ficou maior do que os capítulos normais, mas pra ser justa o começo não tava no roteiro 😭😭😭

𝟸 ▃▃ arco de redenção do bochecha!!!!!!!!!!! e já aviso: não, ele não é um puto chato aqui, inclusive por isso fiz ele ser da idade da violeta e ser o belíssimo do cameron

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