ㅤㅤ.˚ 𝗖 - 𝟬𝟯. 𝗍𝗁𝖾 𝗇𝖾𝗐 𝗉𝗅𝖺𝗇
03. o novo plano
Nova Iorque, Apartamentos Ridgewood
apartamento 12 – sala de estar
(Terra-616)
A sala da casa de Ned era um lugar com um ar incrivelmente tranquilo. Violeta não estava acostumada com isso, já que a sala de sua casa estava sempre tomada pelos barulhos constantes de Flecha e Zezé, e por qual seja o desenho dos Vingadores que esteja passando. A de Ned estava envolta pelo som suave do noticiário que passava enquanto ele e Violeta trabalhavam no projeto de ciências.
Os dois estavam espalhados pela mesa de jantar, seus cadernos e diversos papéis misturados. Era mais um sábado fora de casa, e o silêncio era quebrado apenas por ocasionais comentários de Ned.
── Você acha que a gente vai conseguir terminar isso antes do Peter chegar? ── Ned resmungou, enquanto rabiscava algo no papel. ── Porque, a essa altura, não dá nem pra saber se ele vai aparecer hoje.
Violeta deu de ombros, sem saber o que dizer. O clima entre os dois estava ficando cada vez mais tenso, e Violeta conseguia perceber isso mesmo vendo os dois apenas algumas vezes durante a semana, nas aulas, e nos sábados quando faziam o trabalho. Sua mente estava distraída, até que um som mais alto vindo da televisão chamou sua atenção.
── Em uma notícia urgente esta manhã, recebemos a confirmação de que Olho Laser, um dos primeiros super-humanos criados em experimentos governamentais nos anos 80 — está oficialmente sendo declarado como desaparecido. ── A repórter falou, e foi o suficiente para fazer o coração de Violeta disparar.
Meu tio?
Violeta arregalou os olhos, surpresa, e por um instante esqueceu completamente onde estava. Ela precisava ligar para sua mãe. Dessa vez, não era um tio da maneira como chamava tio Lúcio ou os outros amigos próximos que seus pais fizeram durante o experimento, que chamava assim por consideração. Olho Laser, ou Lucas Truax, era irmão biológico de sua mãe. Ned, notando o silêncio repentino, olhou para ela com curiosidade.
── Você tá bem? ── ele perguntou, franzindo a testa.
A repórter falava com urgência sobre a notícia inesperada, que com certeza traria audiência para o canal. Por mais que muitos ainda odiassem os heróis antigos, era difícil resistir a um desastre. Pelo canto do olho, Violeta viu quando a câmera do noticiário deu um zoom em uma cena gravada, mostrando uma silhueta ao longe, Violeta sequer conseguia diferenciar muitos detalhes, principalmente por não estar olhando diretamente para a tela, mas havia um traço inconfundível — um feixe de tom vermelho vibrante saía dos olhos do homem.
As últimas imagens que tinham de Olho Laser, foi o que a repórter disse.
── Sim... tô, eu só... Deixa pra lá. ── Violeta murmurou a última parte, voltando a olhar apenas para as folhas e jogando seu cabelo para cobrir o lado de seu rosto. Ainda assim, não conseguia focar nas palavras que estava lendo, e não conseguia escrever nenhuma. Como assim, seu tio estava desaparecido? Violeta segurou sua respiração quando percebeu seu coração batendo rápido enquanto tentava pensar o que fazer, mas finalmente decidiu que ligaria para sua mãe. ── Eu preciso ir no banheiro...
Entendendo o tom hesitante de Violeta, Ned deu um sorriso simpático ao lembrar que não havia mostrado o apartamento para Violeta. ── É a segunda porta na esquerda. ── Ele apontou ao se levantar da mesa o suficiente para colocar o rosto na direção do pequeno corredor ao lado da sala de estar.
Violeta acenou com a cabeça, um agradecimento baixo saindo de seus lábios. Ou pelo menos ela achava que tinha conseguido falar, porque não se surpreenderia se estivesse sem voz. Levantou da mesa no mesmo instante e seguiu para a direção que Ned havia apontado, e era como se a sala estivesse começando a girar.
Um barulho alto surgiu em suas costas, a clara surpresa de Ned, que pareceu finalmente prestar atenção na televisão. ── Cara, o Olho Laser sumiu! Cadê o Peter? ── Violeta ouviu a voz de Ned ficando mais distante enquanto andava pelo corredor, seus passos falhando ao alcançar a porta do banheiro. Com rapidez, abriu a porta e entrou no cômodo, virando a fechadura sem hesitar.
Suas mãos tremeram ao alcançar o bolso de suas calças, e a mente ansiosa de Violeta começou a pensar em várias possibilidades. Alguém descobriu a identidade de seu tio, e decidiu fazer justiça com as próprias mãos? Mas seu tio tinha olhos laser, então era impossível de acontecer, a não ser que tivesse sido pego desprevenido. As possibilidades não conseguiam parar de surgir, mesmo quando encontrou o contato de sua mãe e colocou o celular na orelha após iniciar uma ligação.
A chamada foi para a caixa postal no mesmo instante, dizendo que a linha estava ocupada. Violeta respirou fundo, desligando e procurando o contato do telefone de sua casa. Violeta fechou os olhos para se acalmar.
Não podiam simplesmente ir até a polícia, sem ter prova de que seu tio ─ Lucas Truax, não o Olho Laser ─ tinha sumido. Precisavam descobrir se seu tio realmente tinha sumido, e se sim, como os noticiários sabiam que sua versão heroica tinha sumido. Assim como todos os heróis antigos que Violeta conhecia por causa de seus pais, seu tio havia parado com as atividades assim que "você-sabe-o-que-aconteceu", então como sabiam que ele tinha sumido, se teoricamente ele, assim como todos os outros, já havia sumido há anos?
── Vi? ── A voz de Flecha soou do outro lado do telefone, e Violeta abriu os olhos pela surpresa. Ela não esperava por isso. Era para seu pai ter levado Flecha para o treino, então por que ele estava em casa?
── Flecha? Cadê a mamãe? ── Violeta perguntou, tentando manter a voz calma por causa de seu irmão. Flecha era o mais próximo de tio Lucas, era seu padrinho. Fazia apenas quatro meses desde a última vez em que tinham se reunido com seu tio e sua família ─ que consistia apenas de uma gata tricolor, porque seu tio gostava de dizer que era um bachelor ─, e Flecha ainda falava desse dia.
── Ela tá no quarto dela. ── A voz de seu irmão fazia Violeta ter certeza de que Flecha estava fazendo biquinho, e ela quase suspirou de alívio. Seu irmão tinha momentos raros de carência, e era o único momento em que fazia bico, porque dizia que era criancice demais ─ isso porque ele tinha dez anos. ── Falou que tinha que resolver umas coisas aí, sei lá.
── Tá bom, valeu. ── Violeta murmurou, ainda aliviada por Flecha não parecer saber de nada. Só dessa vez, Violeta agradeceu a existência dos desenhos dos Vingadores. ── Você não ia correr hoje?
── É, mas o papai também sumiu. ── Flecha ainda estava soando como uma criança mimada, um tom raro para seu irmão, mas pelo menos isso significava que ele ficaria assistindo seu desenho de conforto e tomando achocolatado. ── Disse que tinha que trabalhar, de novo. ── Mais um sábado disso? Violeta pensou sozinha, sentindo seu corpo dividido entre o desespero por causa da situação de seu tio ─ da qual ela ainda não tinha certeza de nada ─ e a raiva pelo que quer que seu pai estava fazendo.
Violeta sempre foi grudada com seu pai quando era criança, mas se afastou quando começou a ficar mais velha. Ainda assim, sabia que ele não estava se comportando com ele mesmo nas últimas semanas. E tinha certeza de que ele devia estar traindo sua mãe. Fala sério, trabalho todos os sábados nas últimas semanas, chegando tarde todas as sextas, e ligações secretas que faziam ele até mesmo sair da sala todas as vezes? Violeta já ouviu seu pai dizendo sobre o novo chefe, dizendo que ele era um mal amado ─ entre outras coisas ─, mas isso tudo estava muito esquisito.
Sua intuição estava certa disso.
── Semana que vem eu te levo, Flecha. ── Violeta prometeu, e o agradecimento feliz de Flecha foi como um raio de sol que esquentou seu coração, e como uma flechada. Se as coisas sobre seu tio estivessem certas, Violeta não sabia como Flecha ficaria. Antes de desligar, Violeta perguntou sobre Zezé, já que sua mãe aparentemente estava trancada no quarto, e prometeu a Flecha que não demoraria muito para voltar pra casa.
Nova Iorque, Apartamentos Ridgewood
apartamento 12 – sala de estar
(Terra-616)
Violeta só saiu do banheiro dez minutos depois que entrou, ainda tentando contatar sua mãe. Felizmente, ela atendeu, mas sua voz não estava nada boa. Aparentemente, sua mãe havia conseguido falar com o chefe do tio de Violeta, e ele confirmou que Lucas não aparecia no trabalho há alguns dias. Junto de uma ligação para o porteiro, souberam que fazia mais de uma semana que seu tio não voltava para casa ─ havia deixado a gata com uma vizinha, que ainda estava cuidando.
Mais estranho ainda, o porteiro disse que seu tio Lucas havia dito que estava saindo em uma viagem a trabalho. Isso foi negado pelo chefe dele, e foi o suficiente para a mãe de Violeta conseguir contatar a polícia. Sua mãe disse para Violeta não se preocupar e continuar o trabalho, que deixaria Zezé e Flecha com a vizinha da frente até o seu pai ─ ou ela ─ chegarem, e que passaria a tarde na estação de polícia. Flecha ainda não sabia de nada, mas sua mãe disse que a vizinha deixaria os dois assistindo os desenhos que Flecha gostava, então não assistiriam o jornal, pelo menos.
Violeta molhou o rosto antes de sair do banheiro, tentando melhorar sua aparência. Não sabia como fazer o trabalho agora, mas sabia que seria pior para sua mãe se todos estivessem tão preocupados quanto ela. Um defeito de Helena Pêra era querer carregar as preocupações da família sozinha, mas isso fazia apenas com que Violeta tivesse que aprender a esconder. Ficaria o dia inteiro se fosse fazer sua mãe achar que ela estava distraindo sua mente, mas na realidade estaria apenas fingindo.
── Oi, Violeta! ── Violeta ouviu uma voz animada vindo da sala assim que pisou no final do corredor.
Em vez de Ned, agora era Peter quem estava sentado na mesa. Violeta olhou ao redor, confusa pela ausência do "dono" da casa. ── Ah, oi. ── Violeta falou, andando até a cadeira em que estava sentada antes, e por acaso era ao lado da cadeira em que Peter havia se sentado. ── Cadê o Ned?
── Ah, isso... ── Peter deu um sorriso sem graça, levantando a mão para coçar a parte de trás do seu pescoço. ── Ele disse que precisava fazer alguma coisa. Acho que ele tá um pouco chateado.
── Ah... ── Violeta repetiu, se sentindo estanha no meio dessa situação. Já tinha percebido a chateação de Ned com Peter nos últimos dias, desde que foram até a casa de Peter começar o trabalho. Aparentemente, além de aparecer tarde nos outros dias, Peter também estava chegando atrasado para montar o LEGO de Star Wars que Ned mostrou para Violeta aquele dia. Ela não estava acostumada a ficar no meio de melhores amigos brigando, mesmo que não fosse exatamente uma briga.
── Você também tá chateada, né? ── Peter perguntou depois de alguns segundos, provavelmente interpretando o silêncio de Violeta de maneira errada. Violeta rapidamente negou com a cabeça, se sentindo ainda mais estranha ao ser colocada no holofote, de certa maneira. ── Desculpa mesmo. Eu não costumo me atrasar assim, mas- Tem tanta coisa acontecendo, que... é difícil não- Eu juro, não foi intencional! É que... trânsito, sabe? E... o metrô, eu acho que tava em... manutenção ou, sei lá, e, e depois tinha, tipo, uma senhora com muitas sacolas e-
Peter começou a falar antes que Violeta pudesse abrir a boca, parecendo se embolar nas palavras. ── Eu não... ── Violeta começou a falar baixo, mas Peter continuou.
── Eu sei que a gente não se conhece faz muito tempo, mas pode reclamar. Eu sei que tá sendo difícil trabalhar comigo, e não é-é por mal. Eu sei que vocês tão trabalhando muito e eu tô... é, meio que... tipo, me atrasando e- Desculpa, eu v-vou melhorar! Na próxima vez, eu vou chegar uma hora adiant-
Meu deus, como alguém consegue falar tanto?
── Não é você! ── Violeta exclamou, falando alto pela primeira vez desde que conheceu Peter, e isso fez ele parar de falar. O garoto olhou para ela, abrindo e fechando a boca várias vezes como se quisesse falar algo, mas não sabia o quê, ou como. Violeta sentiu seu rosto esquentar, e inclinou a cabeça levemente para fazer seu cabelo cair para a frente mais uma vez. ── O seu atraso é inconveniente, principalmente pro Ned, mas não é você. ── Violeta voltou a falar, dessa vez mais baixo, se recusando a olhar para Peter.
── Ah... quer dizer, espera, o que tá te chateando, então? Tipo, eu achei que... desculpa, não precisa me contar! Ou precisa? Quer dizer, pode contar, se você quiser. Ou- Ah, desculpa, eu tô, é... tagarelando, né? ── Ele esfregou a nuca mais uma vez, aparentemente tentando controlar a ansiedade. Violeta sentia o olhar dele fixado nela, como se buscasse algum sinal para saber o que dizer ou se deveria continuar falando.
── Eu só... ── Violeta sentiu sua mente dividida. O peso das coisas que estavam sendo jogadas em seu colo estava acabando com Violeta, mas ela não conhecia Peter.
Além disso, Violeta nunca se abria com ninguém. A única pessoa de quem realmente se considerava próxima era Flecha, seu irmão de dez anos, e Violeta nunca despejaria coisas nele. Ela era a mais velha, e seu trabalho era proteger Flecha ─ a todo o custo. Tirando ele, sobrava apenas duas pessoas: sua madrinha, era bem óbvio a essa altura o motivo de Violeta não conseguir falar com ela sobre o que estava acontecendo em sua vida; e sua tia ─ de consideração ─ Karen Fields, que, por sua vez, não estava aqui. Literalmente, mas essa era uma história para outra hora.
Violeta abriu sua boca para negar a ajuda, mas seus olhos se encontraram com os de Peter quando ela levantou o rosto sem pensar. Ela não conhecia Peter, mas era incrível como os olhos dele pareciam dizer um mundo de coisas. Dentre elas, Violeta conseguia sentir que a ajuda era genuína, e sua garganta se fechou. ── Eu... eu acho que meu pai tá traindo a minha mãe? ── Violeta estava tão confusa sobre como isso devia funcionar que seu desabafo acabou soando como uma pergunta por causa da incerteza.
Apesar de seu tio estar agora ocupando um ranking maior nas preocupações de Violeta, ela não sabia como contar isso para alguém que não conhecia. Quem chegava dizendo "Ah, oi! O céu tá lindo hoje. Inclusive, sabia que meu tio provavelmente desapareceu? Loucura, né?" para os outros?
Peter piscou algumas vezes, tentando assimilar o que tinha acabado de ouvir. ── Eu... Sinto muito, Vi. ── O apelido saiu naturalmente, e Violeta olhou para baixo ao ver as sobrancelhas de Peter franzirem com algo muito parecido com pena. Ou era assim que ela interpretou, pelo menos. ── Como... Por que você acha isso?
── Não sei. ── Ela encostou suas costas na cadeira, olhando para suas mãos em seu colo. ── Ele só... tá esquisito, e, sei lá. É mais uma sensação. ── Violeta murmurou a última parte, porque sabia o quão esquisito isso poderia soar para outras pessoas. ── Eu... queria ter certeza, pela minha mãe, mas... Não sei. ── Violeta suspirou, levantando o olhar mais uma vez para Peter.
Ela estava buscando uma reação negativa, ou mais pena. Não foi isso que encontrou.
Peter estava em silêncio, olhando para ela como se uma ideia estivesse se formando. Ele tomou fôlego, parecendo hesitar antes de falar. ── E se... e se a gente investigasse isso? ── Ele sugeriu, um brilho de determinação nos olhos substituindo a hesitação quase completamente.
Violeta levantou as sobrancelhas. ── Você quer... espionar meu pai? ── A pergunta saiu mais dura do que ela queria, e Peter pareceu murchar por um segundo, voltando a ficar nervoso. Violeta não sabia o que tirar disso. Era claro que Peter gostava de ajudar os outros, tinha percebido isso dias após começar a frequentar a escola, mas não esperava por essa.
── Não! Quer dizer, sim? Ou, quer dizer... só se... se você quiser! Eu só pensei que... se isso tá te incomodando, e, tipo, eu sei que não é da minha conta, mas eu quero ajudar, sabe? Eu não queria soar, tipo, rude ou algo assim... ── Ele voltou a tagarelar, e Violeta se perguntou se essa era a maneira dele de lidar com a ansiedade.
Por mais absurda que a ideia pudesse parecer, Violeta já havia cogitado isso antes. Ela não queria fazer isso, porque seria como assumir que seu pai estivesse fazendo alguma coisa, mas ao mesmo tempo ela não conseguia deixar de pensar que alguma coisa errada estava acontecendo. Violeta não percebeu o tempo em que ficou em silêncio cogitando a ideia, mas Peter parecia ter ficado mais ansioso. ── Eu... Pode ser. A gente pode fazer isso.
"A gente" saiu estranho para Violeta, ainda mais nesse contexto. Não estava acostumada com isso, e se sentiu estranha ao ver o sorriso se formando no rosto de Peter. Ele parecia estar aliviado pela reação de Violeta, mas o que deixou a garota se sentindo estranha foi o quão bom era aquilo.
Nova Iorque, Edifício Aurora
corredor do sexto andar
(Terra-616)
Violeta havia voltado para a casa pouco tempo após a conversa que teve com Peter. Eles continuaram o trabalho, o silêncio ocasionalmente quebrado por comentários de Peter, até Ned voltar do quarto e dizer que precisava ir até a casa da avó com sua mãe. Violeta sabia que ele estava mentindo, e Peter pareceu perceber, porque murchou na hora. Ainda assim, ela não se meteu e apenas se despediu dos dois garotos.
Sua mão se levantou para bater na porta do apartamento 615, que ficava diretamente à frente do apartamento da família Pêra. Seus irmãos ainda estavam com a vizinha, porque seu pai havia chegado do trabalho ao mesmo tempo que Violeta voltou da casa de Ned. A subida até o sexto andar foi desconfortável para Violeta, que achava não conhecer seu pai mais, e ela não disse nada até parar na frente do apartamento da vizinha. Imaginou que seu pai entendeu, porque ouviu a porta do 616 fechando.
Por mais que Violeta tivesse as suspeitas, sua mãe iria chegar em casa em qualquer momento e sabia o quanto seus pais se amavam ─ mais um motivo para não entender por que seu pai estava fazendo isso. Antes que pudesse pensar mais, a porta da sua vizinha foi aberta. ── Violeta! Veio buscar seus irmãos? ── Elizabeth, sua vizinha, sorriu para ela.
A mulher estava na casa dos trinta anos ─ Violeta soube porque sua mãe ficou sabendo em uma das reuniões que tinham no prédio ─ e tinha uma aparência marcante. Os cabelos castanhos escuros tinham recebido um corte bob que parecia sempre impecável, e os olhos azuis eram penetrantes o suficiente para Violeta se sentir estudada a cada passo que dava. ── Vim sim. ── Violeta falou em um tom baixo, acenando com a cabeça.
── Quer entrar? Ainda preciso limpar, ter um irmão adolescente é difícil o suficiente e ainda vem com sujeira de graça. ── A mulher brincou, e Violeta deu um pequeno sorriso educado ao negar com a cabeça. ── Eu vou só pegar o Zezé. ── Ela sorriu mais uma vez, voltando a entrar na casa, mas mantendo a porta aberta.
── Oi, Vi! ── Seu irmão mais novo apareceu, literalmente, correndo do seu lado. Violeta sequer teve tempo de repreender Flecha antes de ouvir a porta do apartamento 616 batendo mais uma vez, por mais que a velocidade não fosse tão mais rápida do que a de um garoto normal de dez anos.
── Fala pra sua mãe que eles foram dois anjinhos. ── Elizabeth falou ao voltar com Zezé, entregando o bebê no colo da irmã mais velha. Flecha? Um anjo? Violeta pensou com deboche, mas manteve a expressão neutra, agradecendo a mulher pela ajuda. ── Relaxa. Sempre que precisarem, pode deixar eles aqui. Não dão trabalho nenhum. ── A mulher dispensou com um gesto de mão, o sorriso ainda cobrindo o rosto.
Violeta deu um último sorriso educado antes de se virar e ir para o apartamento de sua família. Não se preocupou em trancar a porta, colocando sua chave na pequena vasilha no armário ao lado da porta, e fechou a porta com os pés. Violeta levou Zezé até o seu castelo de caixas, que ainda decorava a sala de estar da família Pêra, e observou com um sorriso o seu irmão caçula batendo palmas com um sorriso ao ver suas caixas mais uma vez.
Deu um último beijo na testa de seu irmão antes de seguir até o seu quarto. Mas, ao passar pela porta do escritório do seu pai, uma luz chamou sua atenção. O celular de trabalho dele estava em cima da mesa, a tela acesa com uma notificação piscando, quase como se estivesse chamando por Violeta. O eco da sua conversa com Peter tocou em sua cabeça, e Violeta decidiu entrar no escritório depois de olhar para os lados.
Seu pai provavelmente estava tomando um banho, e deixou a porta aberta na pressa.
Violeta pegou o celular, observando a tela de notificações que mostrava uma notificação do aplicativo de mensagens com conteúdo oculto. Ela hesitou por um momento, mordendo seu lábio inferior. Desde pequena, ela sabia a senha da família ─ a mesma senha que seu pai usava para tudo. 165181, ela digitou. Mas ao confirmar a senha, a tela mudou, e um alerta apareceu:
Senha incorreta.
Um frio na barriga fez Violeta engolir em seco. Seu pai nunca tinha mudado a senha, e ela sentiu a ansiedade crescendo mais uma vez. Iria descobrir o que estava acontecendo, que se danem as consequências.
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