ㅤㅤ.˚ 𝗖 - 𝟬𝟭. 𝗀𝗈𝗈𝖽𝖻𝗒𝖾, 𝗆𝖾𝗍𝗋𝗈𝗏𝗂𝗅𝗅𝖾

01. adeus, metroville

Metroville, Instituto Metroville.
sala 209
(Terra-616)

── Srta. Pêra? ── Uma voz conhecida pela garota a chamou, e ao olhar para a porta de sua sala teve a confirmação de que era o diretor de sua escola. ── Preciso que venha comigo e traga suas coisas.

Violeta franziu as sobrancelhas ao ouvir a frase dita por seu diretor, mas não o contestou de nenhuma forma. Tudo que a garota fez foi juntar seus materiais em sua mochila e se levantar, jogando todo seu cabelo liso para a frente e torcendo para que ele estivesse escondendo sua feição avermelhada. Envergonhada demais com a atenção totalmente focada em si e com o fato de saber que seria motivo de fofoca.

A família Pêra se mudou para uma pequena cidade dos Estados Unidos após o incidente, mais conhecido como "você-sabe-o-quê", nas instalações e a "fuga" dos super-heróis. A cidade chamada Metroville havia se tornado o lar da família durante diversos anos, mas também tinha seu lado ruim.

Um deles, de acordo com Flecha, que raramente focava no lado negativo das coisas, era o fato dos irmãos Pêra terem de estudar na mesma escola desde o início de sua vida escola. Claro que ele estava exagerando um pouco, afinal havia uma pré-escola. Entretanto, o verdadeiro problema era todos saberem tudo sobre todos. Violeta sentia que privacidade não era algo que existia ali e sabia que falariam sobre sua ida até a sala do diretor, já que aquilo nunca havia acontecido.

Ela odiava receber toda a atenção.

Não era tímida, afinal não tinha problemas em conversar com as pessoas. Era apenas quieta e bastante reservada, e sempre foi uma pessoa que gosta de ter controle sobre esses momentos. Quando isso não acontecia, ela sentia seu poder coçando por toda a sua pele para forçar Violeta a se esconder.

A garota estava ficando ansiosa com a situação, e o chamado do seu poder começou a acordar. Violeta se virou para o diretor enquanto andavam e perguntou: ── O que está acontecendo, Sr. Walker?

Seus passos ecoavam pelo corredor vazio, já que todos os alunos estavam em sala. Estranhamente, aquilo sempre tranquilizava Violeta. Justamente por não gostar de atenção, e não se incomodar facilmente com invasão de seu espaço ─ desde que não fosse proposital e constante ─, ela adorava espaços cheios. Era mais difícil de ser notada.

── Apenas um incidente com seu irmão, Srta. Pêra. ── Ele deu um sorriso simpático, mantendo a formalidade e exalando profissionalismo a cada passo. A resposta não a surpreendeu, Flecha sempre se metia em problemas, mas nunca envolveram Violeta. ── Sua mãe virá buscá-lo e os levará para a casa após discutirmos em meu escritório. ── Violeta assentiu, mordendo os lábios enquanto tentava diminuir a ansiedade.

A caminhada até o escritório do diretor continuou tão silenciosa que Violeta tinha certeza de que podia ouvir os batimentos rápidos de seu coração. Ela sabia que não durou mais de sete minutos, mas para Violeta pareceu durar horas. Era incrível como o tempo passava devagar quando estava ansiosa e desconfortável.

Os dois passaram por uma porta aberta, entrando em um cômodo pequeno ocupado por uma bancada com um computador, atrás dela havia uma mulher ─ já mais velha ─ com um par de óculos e uma blusa branca com babados em volta. ── A Sra. Pêra já chegou, diretor. ── A senhora falou, sua voz bastante animada.

Florence era a secretária mais velha e mais feliz que poderia existir. Apesar de ser a única que Violeta conhecia, ela com certeza apostaria dinheiro nisso se tivesse puxado os hábitos... peculiares de seu tio Lúcio.

── Obrigado, Florence. ── O homem sorriu, fazendo a mulher se sentar novamente em sua cadeira e sorrir satisfeita. Ao passar na frente da mesinha, Violeta viu que a mulher estava fazendo crochê. ── Por aqui, Srta. Pêra. ── Seu diretor seguiu na direção de uma porta fechada no canto, com uma pequena placa com a palavra "Direção".

Violeta entrou após o seu diretor, murmurando um agradecimento por ele ter segurado a porta. Esse era o Sr. Walker, sempre educado.

O pensamento não durou muito, porque o rosto de Violeta corou fortemente ao ouvir sua mãe sussurrando, pela expressão em seu rosto, broncas para o filho mais novo. Ela tinha certeza de que só não estava gritando por estarem em ambiente escolar.

Assim que Violeta entrou, sua mãe e irmão olharam em sua direção e a mulher se ajeitou na cadeira. Tudo bem, é pra fingir que eu não vi nada, Violeta pensou ao ver a postura de sua mãe mudar com a presença do diretor. Violeta havia aprendido que sua mãe odiava repreender seus filhos em público, e a garota ficava feliz por isso.

Violeta se esforçava para fazer as coisas certas como uma maneira de agradecer sua mãe por ser assim. Flecha, por outro lado, continuava sendo sapeca sempre que podia, e não ligava em ser repreendido em público. Na verdade, ele gostava da atenção e até mesmo fazia poses.

Seu irmão mais novo era impossível, mas era encantador o suficiente para fazer sua família ignorar esse pequeno detalhe.

Surpreendentemente, dona Helena pareceu estar confusa por Violeta estar ali ─ ela imagina que tinham avisado isso quando chamaram ela para ir até a escola. A garota conseguiu perceber isso no olhar de sua mãe, mesmo que a mulher estivesse disfarçando. Após alguns anos, sua mãe se tornava bem fácil de ler.

O diretor seguiu para sua cadeira com o mesmo semblante simpático de sempre. Ele parecia alheio à movimentação e aos sussurros anteriores, ou talvez estivesse apenas sendo educado. ── Obrigado por vir, Helena. ── Sorriu para sua antiga colega de classe, e Violeta viu o afeto verdadeiro.

Por um pequeno segundo, ela sentiu vontade de entender como era ter um amigo.

── Pode se sentar aqui, Srta. ── O diretor chamou a atenção de Violeta. Levantando seu olhar, que ela não percebeu ter abaixado, viu que ele apontava para uma cadeira vazia ao lado de Flecha.

Violeta apenas acenou com a cabeça e andou rapidamente até sua cadeira. Assim que se sentou, ela deslizou seu corpo para se abaixar um pouco na cadeira, por causa da vergonha e desconforto de estar ali. ── Creio que Florence não lhe disse o motivo exato de termos a chamado aqui, Helena. ── A mulher concordou, olhando rápido para seus filhos.

Uma batida na porta interrompeu a próxima fala do diretor, que se desculpou e pediu que a pessoa entrasse. Violeta virou para a porta e viu seu antigo professor de matemática entrando na sala com um olhar irritado, mas ela identificou uma ponta de satisfação cruzando o olhar. Estranho, mas não tanto quando se tratava dele.

Bernardo, ou Sr. Kropp, era um homem já na casa de seus quarenta anos, praticamente careca. Ele era o tipo de professor que parecia estar sempre preparando uma prova surpresa ou trabalhos impossíveis. E ele sempre estava.

── O professor Bernardo insistiu que seu filho colocou objetos... ── "Tachinhas!", o citado exclamou. Os ombros de Violeta se levantaram com o susto que tomou pela voz aguda vindo de trás dela. ── ... tachinhas em sua cadeira e disse que possui uma gravação do momento em que Flecha o fez.

Violeta olhou na direção de seu irmão, que continuava a se manter impassível. Aquilo teria enganado qualquer um, se não fosse o rubor em suas orelhas. Era um sinal que Violeta aprendeu a procurar em seu irmão para saber se ele estava ansioso.

Enquanto o diretor falava, o professor ajeitava uma fita na pequena televisão que havia na sala do diretor. Violeta sequer viu ele passar por trás dela, ocupada demais analisando seu irmão mais novo. ── Vou passar. ── O homem falou. Sua voz estava carregada de satisfação enquanto ele apagava as luzes antes de andar novamente até a televisão e iniciar o vídeo.

Violeta ainda se sentia ansiosa, não entendendo o motivo de sua presença e com medo de seu irmão ter entregado algo que não devia. Ela passou a apertar os dedos em sua mão enquanto tentava desacelerar sua respiração e seus batimentos. Estava com tanto medo de descobrirem a verdade sobre sua família que focou no som do botão sendo apertado, com o professor repassando a gravação várias vezes.

Tudo que ela diferenciar depois foi a voz de seu irmão, e seu diretor falando logo depois.

── Violeta? ── Sua mãe perguntou, fazendo a garota se sobressair na cadeira. ── O diretor falou com você, filha. ── Violeta voltou seu olhar para o diretor, voltando a se envergonhar por não ter percebido o momento em que falaram com ela. Flecha, por outro lado, estava quase irritado por ter que estar ali.

Ninguém estava gritando, sua mãe não tinha arrastado ela e Flecha pela porta, e seu professor antigo havia saído da sala. O que quer que tinha acontecido naqueles minutos em que Violeta estava quase morrendo de ansiedade, não revelou nada sobre sua família.

── Desculpe. ── Violeta perguntou envergonhada, mexendo um pouco o rosto para que o cabelo escondesse parte dele. ── O que o senhor disse?

O diretor apenas deu um sorriso tranquilo quando a garota pediu desculpas, sem se importar em repetir novamente o que havia dito. ── Eu estava contando para sua mãe sobre como você levou nosso time do decatlo à vitória no último torneio.

A garota apenas murmurou um "ah", sem saber o que falar. Violeta não ousaria dizer que foi o motivo da vitória, mesmo que fosse uma das alunas mais inteligentes. Ela definitivamente não se sentia no seu eu mais confortável ao receber toda a atenção depois daquele torneio.

Nem havia sido um torneio de verdade, afinal era apenas uma competição que acontecia anualmente contra uma das outras pequenas cidades de Illinois. Metroville quase sempre ganhava, e Violeta não sabia o motivo de tanto estardalhaço dessa vez.

Não era novidade.

── Bom, era apenas isso. ── O diretor sorriu e se levantou, fazendo com que os Pêra se levantassem em seguida. Ele esticou uma das mãos para cumprimentar Helena. ── Muito obrigado, Helena.

A mulher deu um sorriso de volta para o diretor, e antigo colega, e apertou sua mão. ── Desculpe pela confusão. ── Ela falou, mas o diretor apenas respondeu com um gesto educado. ── Dêem tchau pra ele, crianças.

── Tchau, Sr. Walker. ── Seus filhos falaram ao mesmo tempo, saindo da sala atrás da mãe logo em seguida.

Quando os três pararam no corredor da escola, Violeta se virou para sua mãe. ── Mãe, por que eu também vou embora? ── Ela parou para olhar a mulher, percebendo a maneira como sua mãe não parava de apertar a alça da bolsa que carregava ao seu lado. Um dos sinais de sua ansiedade, e sua mãe quase nunca ficava assim.

Nova Iorque, Edifício Aurora.
terraço
(Terra-616)

Violeta fechou os olhos e se deitou de costas no chão.

As luzes intensas que faziam parte de Nova Iorque piscavam, criando padrões borrados visíveis pelas pálpebras fechadas da garota. Havia passado boas semanas desde o dia em que sua família se mudou para a cidade, e um pouco mais desde o dia em que sua mãe a buscou na escola junto de seu irmão.

Violeta não sentia saudades de Metroville.

Deus, ela se sentia aliviada por ter ido embora daquele lugar. Violeta não podia dizer que Nova Iorque fazia parte de algum sonho pessoal, mas pelo menos agora ela podia ver seus tios facilmente. Na verdade, conhecendo sua mãe do jeito que conhecia, era bem provável que o tio Lúcio e a tia Mel ─ que viviam próximo ao Queens ─ continuassem indo até sua casa para jantar toda semana.

Era o que estavam fazendo desde que a família Pêra se mudou.

O outro lado positivo era sua madrinha. Ela vivia em uma área mais afastada, mas com menos de uma hora de carro Violeta conseguiria visitá-la. Quando moravam em Metroville tudo com que conseguia contar eram algumas ligações, raramente chamadas de vídeo. Sua madrinha era muito ocupada, mas Violeta não se incomodava. Ela esperava ser tão sucedida quanto a mulher que tanto admirava.

Apesar desses dois pontos importantes, o melhor na visão de Violeta era a invisibilidade. Não os seus poderes, mas a maneira como conseguia se misturar na multidão de pessoas da cidade grande e simplesmente se camuflar ali. Era libertador saber que ninguém se importava com ela quando estava andando nas ruas.

Nenhuma pessoa em Nova Iorque estava preocupado com qualquer coisa além de si, totalmente diferente de Metroville. Quando andava nas ruas da sua cidade natal, ela sentia as encaradas vinda de todas as pessoas em todos os lugares da rua. Era impressionante considerando a pequena população da sua antiga cidade.

Viver em uma cidade pequena tinha sido seu pesadelo.

Nova Iorque, mesmo com todos os barulhos do trânsito incansável e das pessoas que ela sabia que estavam passando pela avenida movimentada na frente do prédio, fazia ela se sentir sozinha. E Violeta gostava de se sentir assim.

Ela respirou fundo uma vez, sentindo o ar enchendo seus pulmões aos poucos. Enquanto respirava, tentou inspirar aquele sentimento de liberdade e deixar ele preencher o seu corpo. O ar de Nova Iorque era terrível, mas ela ainda sorriu. Não durou muito, já que poucos segundos depois o seu celular tocou, e ela sabia que o tempo havia acabado.

Violeta levantou e pegou o celular em mãos, desligando o alarme. Eram seis e meia da noite. Isso queria dizer que ela tinha meia hora para tomar um banho antes do jantar em família que era uma tradição dos Pêra. Era melhor não se atrasar, ou Flecha arranjaria um motivo para ficar vinte minutos no banheiro apenas para irritá-la.

Ela suspirou, tomando coragem de abandonar aquele sentimento bom.

Após guardar seu celular, Violeta andou em direção a porta que levava até a escada do prédio. Com passos relativamente rápidos, ela desceu por dois andares até chegar no corredor do sexto andar, onde ficava o novo apartamento de sua família.

O corredor estava vazio, como costumava ficar naquela hora. A maioria dos outros moradores chegava bem tarde, mas saíam bem cedo. Uma das coisas que ela percebeu era o quão ferrada era a agenda de sono das pessoas de Nova Iorque. Ela entendia muito bem como era, e se identificava.

Violeta abriu a porta do apartamento 616, que tinha um tapete de boas-vindas destancando-o de todos os outros. Nenhum outro apartamento sequer tinha um tapete na frente. Ela já tinha percebido que os cidadãos da cidade grande não eram tão receptivos.

A garota abriu a porta sem se preocupar em usar a chave, sabendo que estaria destrancada porque seu pai tinha acabado de chegar. Eles só trancavam a porta quando estavam todos dormindo ou quando não tinha algum adulto, o que raramente acontecia. Helena, a mãe de Violeta tinha decidido pouco antes da garota nascer que ficaria em casa para cuidar dos filhos enquanto Roberto trabalhava.

O clima do apartamento era diferente do resto do prédio, e da cidade. Era menos libertador, mas não era sufocante como a cidade pequena em que costumava morar. Era aconchegante, um lar; ela sabia que nunca estaria sozinha ali porque sempre teria sua familia.

O corredor curto que levava até a sala de estar estava com as paredes cobertas de fotos de família. Helena havia organizado tudo no mesmo dia em que se mudaram. O museu da família Pêra, era como ela chamava.

Violeta andou até o fim do corredor, parando na frente de uma das fotos que mais gostava. Era uma foto de seus pais junto de seu tio Lúcio e outros amigos que ela não tinha chegado a conhecer. Todos eles eram adolescentes na foto, apenas um pouco mais velhos do que ela.

Quem não sabia a história, acharia que era um grupo de amigos que tinha acabado de se formar na ensino médio, com os olhares sonhadores e as posturas implacáveis, mas Violeta sabia a verdade. Era uma foto tirada pouco tempo depois dos experimentos, que tornaram seus pais e os amigos deles quem eles eram, terem tido o sucesso extremo que o governo esperava.

Claro que toda a felicidade acabou um pouco depois, quando você-sabe-o-quê aconteceu ─ Violeta não sabia, na verdade. Era a única história que todos, até mesmo o seu tio Lúcio, se recusavam a contar.

── Flecha, para de correr com o Zezé! ── Ela ouviu sua mãe gritando, tirando sua atenção da foto.

A televisão da sala, o lugar onde o pequeno corredor levava, estava ligada em um desenho dos Vingadores. A garota revirou os olhos sabendo que, como sempre, Flecha era quem tinha escolhido. Nem mesmo Zezé mostrava tanto interesse por esse desenho. Ou pelos Vingadores.

── Ele gosta! ── Flecha reclamou, parando de correr ao redor da sala.

Ele não estava correndo tão rápido, mesmo que ainda estivesse correndo mais rápido do que as crianças da sua idade. Era velocidade o suficiente para divertir Zezé, que ficava tão feliz com o vento no rosto quanto um cachorro na janela de um carro.

Flecha se sentou na poltrona, colocando o bebê sentado no seu colo de frente pra ele, e começando a fazer caretas. Violeta deu um sorriso pequeno. Ela também amava Zezé, é claro, mas Flecha sempre foi quem demonstrou o maior carinho pelo mais novo membro da família. Ele sempre quis ser um irmão mais velho, e finalmente teve a chance.

A garota se aproximou dos dois, dando um beijo no topo da cabeça de Zezé e bagunçando os fios loiros de Flecha.

── Para, chata! ── Flecha reclamou, fazendo Violeta dar um olhar divertido.

Violeta não planejava contar ao irmão, mas ele era a pessoa mais importante para ela. Ela ainda lembrava do momento em que descobriu que seria uma irmã mais velha, que nunca ficaria sozinha. Com seus quase cinco anos de idade, ela se lembrava de quando chorou ao receber um ursinho vestido com uma camisa com a palavra "irmãzona".

Mesmo que amasse implicar com seu irmão, dessa vez ela deixou pra lá. Tudo que Violeta fez naquele momento foi seguir em direção ao corredor na esquerda, que levava até os quatro quartos do apartamento e até o banheiro. Era melhor tomar seu banho logo.

── Filha, não demora no banho porque seu pai só tá terminando algumas coisas no escritório dele. ── Sua mãe falou quando a garota passou na frente da cozinha. Violeta soltou um barulho de confirmação, seguindo até seu próprio quarto.

O quarto da filha mais velha da família Pêra tinha três paredes brancas, somente a parede ao lado de sua cama, no lado direito, era diferente ─ essa parede tinha sido pintada de roxo, sua cor favorita. A cama era um pouco maior que uma cama de solteiro comum, forrada por um lençol branco e uma coberta com estampas de jornais antigos.

A parede onde a cabeceira da cama estava encostada era onde ficava a janela do quarto, mas também a escrivaninha de Violeta. Os cadernos e livros que seus pais compraram para sua escola nova estavam empilhados junto de seus outros materiais e seu laptop. Duas fotos de família eram vistas emolduradas ao lado de sua luminária.

A primeira foto que tiraram em casa quando Zezé nasceu e a segunda era uma foto do último jantar em família completo que tiveram, antes mesmo de Zezé nascer.

Na parede esquerda ficava o seu guarda-roupa, originalmente de quatro portas. Com a ajuda de seu pai, Violeta havia tirado as duas portas da esquerda e pregado prateleiras, transformando metade do móvel em uma estante onde ela colocou seus outros livros. Além disso, pequenos quadros de artes dos seus personagens favoritos estavam espalhados pelo quarto.

Violeta seguiu até a parte direita do guarda-roupa, pegando uma muda de roupas qualquer para trocar após o banho e um pijama para antes de dormir. Ela deixou o pijama na cama, pegando sua toalha ─ que estava pendurada em um gancho que seu pai pregou atrás de sua porta ─ e saindo do quarto.

Nova Iorque, Edifício Aurora.
sala de jantar - apartamento 616
(Terra-616)

── Como foi a escola hoje, filha?

Violeta levantou a cabeça assim que recebeu uma cotovelada de Flecha. Ela resmungou pelo incômodo que surgiu no lado do seu corpo ─ Flecha não era forte, mas era rápido e isso era o suficiente para causar dor.

Ela olhou para o seu pai assim que viu seu irmão balançando a cabeça na direção dele, percebendo que a pergunta foi dirigida a ela.

── Bem. Eu acho. ── Ela sussurrou a última parte, voltando a focar no seu prato.

Violeta não sabia se seu pai tinha comprado aquela resposta, tinha quase certeza que não. Se não tivesse olhando pra baixo, teria percebido que estava certa. Seus pais trocaram um olhar preocupado, mas não forçaram ela a falar.

Não era como se Violeta odiasse a nova escola, mas ainda estava se acostumando. Ela estava no time de decatlo, uma familiaridade confortável, e sua grade obrigatória era agradável. As aulas intensivas eram mais ricas de informações, com professores formados em melhores faculdades. Além disso, para a surpresa de Violeta, o interesse dos outros alunos pela novata durou apenas um dia.

Para sua sorte, antes que seus pais pudessem pensar em dizer algo, o celular de Beto apitou com uma notificação. Violeta levantou o olhar a ponto de ver seu pai checar a tela por apenas um segundo antes de se levantar.

── O Gelado chegou. Eu tenho que ir, querida. ── Ele falou, se referindo ao amigo pelo nome de herói, algo que fazia apenas quando estavam em família. Seu pai deu um selinho em Helena, e depois contornou a mesa para dar um beijo na testa de seus filhos mais novos.

── Boliche de novo, Beto? ── Helena perguntou com uma careta, mas havia um quê de humor em seu tom. Desde que se mudaram, seu pai e seu tio saíam várias vezes por semana para jogarem boliche. De acordo com eles, sentiam saudades de uma competição saudável entre amigos.

Beto, que já estava indo até a sala, só soltou uma risada. ── Amanhã é sábado! Volto em poucas horas.

E ele voltaria, é claro, como sempre. Então Violeta apenas voltou a olhar para o seu prato e comer, ouvindo sua mãe falar sobre a associação de mães do prédio da qual começou a fazer parte. Era quase difícil focar, porque tinha algo que incomodava Violeta bem no fundo da sua alma. Algo que incomodava as duas mulheres Pêra sentadas na mesa.

Elas ainda não sabiam, mas era por causa de Beto, que estava mentindo sobre onde estava indo várias vezes na semana. Porém, era como a mãe de Violeta sempre dizia: mesmo que demore, as mentiras são descobertas.

E elas sempre têm consequências.

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