#OO8 ── Se você me queria morto, era só dizer

Voar em Caraxes uma distância como aquela era complicado, Daemon nunca tinha passado tanto tempo no dorso de um dragão, seu corpo doía durante o trajeto e ele sabia que se acostumaria. Tinha que segurar mais firme também, sem cela ele quase caiu duas vezes, mas sua raiva parecia segurá-lo sob o dragão. O pouso, em um pátio próximo ao fosso dos dragões, deu um solavanco que quase jogou Daemon no chão, os domadores se afastaram, não vendo o príncipe a priori, mas assustados devido ao dragão, Caraxes voava raramente até lá, não sozinho.

Quando ele pulou da cela, caindo no chão um pouco torto, os domadores se olharam em silêncio, o príncipe tirou as luvas de couro que usava, uma delas tinha sido cortada pela escava do dragão e a força com que Daemon teve que se segurar, ele grunhiu sentindo a dor ao tirar e jogar no chão a luva, havia um pequeno corte, que ele ignorou, tinha voado até lá por outros motivos. O urro de Caraxes chamou a atenção dele, se virando via o dragão se aproximar da entrada, com dois domadores em seu encalço.

── Preparem uma cela para ele. ── Daemon pediu, mantendo a mão a frente do corpo. ── Mas não coloquem ainda, a antiga está em Pedra do Dragão, mas não devo retornar até lá em breve.

── Claro alteza. ── Um terceiro domador respondeu, indo junto dos outros.

Havia uma raiva inata em Daemon quando caminhava degraus abaixo, ele precisava chegar logo na fortaleza, então usou um cavalo de um dos soldados da guarda, que o levou até os portões, aquele tempo poderia ser usado para pensar em algo, mas a cabeça do príncipe só tinha um foco, ele precisava encontrar Madlyn, precisava ver como ela estava. Os olhos de Harrold Westerling ficaram felizes ao ver Daemon, o guarda de vinte e poucos anos, ainda agradecia o fato de que Baelon desistiu da ideia de fazê-lo guarda juramentado do filho mais novo.

Daemon falou pouco, questionando Harrold sobre onde poderia encontrar Madlyn Baratheon, a esposa de seu pai, sua madrasta, aquilo ainda saía amargo em sua boca. Harrold foi na frente, encaminhando Daemon pelos corredores, o príncipe era maior que o guarda, apesar de anos e anos mais jovem, tinha pernas longas, mesmo que Harrold também fosse alto, ele teve que andar mais rápido para não ser empurrado por Daemon. Na porta do quarto de Madlyn havia um guarda, Harrold só acenou com a cabeça e ele saiu, parando ambos os guardas lado a lado, os dedos daquele que guardava Madlyn bateram duas vezes na porta, não se ouvira nada, então Daemon o empurrou para o lado, abrindo as portas ele mesmo.

Era uma das cenas mais decadentes que o príncipe via em sua vida, Madlyn sempre foi pequena demais, ao ver dele, mas era forte e cheia de vida, agora parecia cansada e amuada, com uma aparência tristonha, ele a encarou, em silêncio, quando ela o olhou de volta seus olhos tremiam, mas ela mal conseguia se mexer. O príncipe logo notou que ela arrumar um véu sob os ombros, que cobriam seus braços, os passos de Daemon chegaram logo até ela, segurando o pulso esquerdo, ali seus olhos lilás tremeram mais, havia muitos machucados, alguns roxos, já Madlyn só conseguia chorar.

Ela se aninhou a ele, ignorando as dores, abraçou Daemon com força, o que tinha, ele percebeu que ela estava mais fraca que o normal, ele tinha medo de abraçá-la de volta e machucá-la mais ainda, ele não entendia como ela, que sempre foi um sol, agora parecia apenas um pedaço do que sempre fora, perdendo toda a sua luz. Seus olhos ainda estavam nela, nos roxos que até nos ombros estavam, ela ficava trancafiada no quarto, ele sabia, não deixariam que a vissem assim, na cabeça de Daemon passavam-se tantas coisas, a principal delas era como Baelon tinha coragem.

── Quem fez isso com você? ── Daemon perguntou quebrando o silêncio. ── Quem tem te machucado?

── ... ── Ela nada falou, só conseguia chorar mais, tremendo.

── Eu vou resolver isso. ── Ele desvencilhou dela, segurando o rosto de Madlyn entre as mãos. ── Vou pedir que uma ama ou a Aemma fique com você, eu estou aqui agora, não ficará mais sozinha.

── Daemon ... ── Ela tinha uma voz embargada.

── Só espere um pouco. ── Ele depositou um beijo na testa dela, se afastando um pouco.

Os passos dele eram pesados, tinham lugares que ele poderia achar o pai, quando sobrevoava perto da encosta do fosso, nas propriedades da Colina de Rhaenys, ele viu Vhagar, significava que Baelon estava em Porto Real, dificilmente não estaria na Fortaleza Vermelha. Achar o pai, no entanto, não era fácil, ele não quis passar pedindo informações, como um pedinte, era sua casa, ele conhecia os lugares, poderia ele mesmo o encontrar.

Havia dobrado meia dúzia de corredores no andar principal, iria subir as escadas quando viu duas figuras conversando com meio sorriso, a primeira a vê-lo foi a mulher, Aemma tinha recém completado seus 15 anos, mas não parecia muito mais do que uma menina, mesmo assim ainda parecia mais mulher que Madlyn, um ano mais velha que ela. Logo o outro o viu, era Viserys, havia um misto de alívio e apreensão nos olhos do irmão.

── Deuses, então é verdade o que disseram, você voltou. ── Viserys o olhou de cima a baixo, sujo, com roupas de montaria. ── Você veio no Caraxes? Ficou louco?

── Aemma, olha para mim. ── Daemon colocou as mãos no ombro da cunhada, a que sangrava sujou parcialmente o vestido azul claro dela. ── Vá até o quarto da Madlyn, fique com ela, o sir. Harrold está lá na porta, não deixem ninguém entrar e não saia de perto dela até que e volte.

── Daemon eu ... ── Ela tentou falar, olhando para o marido que só concordou positivamente, Madlyn precisava mesmo de uma companhia. ── Ok ...

── Quero que a partir de hoje você seja a sombra dela, dia e noite. ── Os olhos dele ainda estavam em Aemma, mesmo que tivesse tirado as mãos dela. ── Não a deixe sozinha.

── Eu acabei de ter um bebê e ...

── Não importa, as amas vão cuidar da Rhaenyra. ── Ele a respondeu, Daemon olhou Viserys que chegava a abrir a boca. ── Não fala e você Aemma, vai.

Daemon observou Aemma se afastar em silêncio, até que não a visse mais, os olhos dele foram então em Viserys, com a cabeça baixa e apertando os olhos, o mais velho sabia que aquilo era problema no exato momento em que o irmão se aproximou da forma em que estava. Daemon sabia que não tinha tempo para os chiliques de Viserys ou o que ele fosse falar, então 

── Você não pode tratar a minha esposa assim. ── Viserys tentou se impor. ── Ela não é sua garota de favores e nem eu.

── A Madlyn está precisando dela. ── Daemon vociferou. ── Precisou de vocês dois o tempo todo e nenhum estava disponível para ajudá-la, para protegê-la. Você viu como ela está? Os machucados?

── Ela tem se isolado, a Aemma tentou estar com ela por várias vezes, mas não conseguiu e não foi pelo parto. ── Viserys insistiu. ── Eu sei que o casamento te pegou de surpresa, nos pegou também, o rei está irredutível sobre isso, nosso pai também tentou.

── Tentou mesmo ou só fingiu que tentou?

── Ele tentou de verdade. ── Viserys levou as mãos aos ombros do irmão. ── Lorde Boremund foi afastado da sua posição no pequeno conselho e ...

── Viserys ... ── Daemon o interrompeu.

── Não, você vai me ouvir. ── Viserys rebateu por cima, juntando a coragem e recolhendo as mãos. ── Não é como se nos não ...

── Cala a boca um segundo e me escuta. ── Daemon vociferou ao irmão mais velho. ── Nosso pai está machucando a Madlyn, eu vi os braços dela, quando a Aemma chegar àquele quarto ela também vai ver.

── Por isso ela ... ── A voz do mais velho falhou, unindo as sobrancelhas preocupado. ── Oh Mads...

── Se isso está acontecendo, coisas piores também estão. ── Nos olhos do mais novo só se desenhava a raiva.

── Daemon, eu sinto muito. ── Viserys tentou tocá-lo, mas Daemon se desvencilhou. ── Por eu e a Aemma não termos visto isso, não termos protegido a Madlyn.

Os olhos lilás de Daemon censuram Viserys por alguns segundos, até que ele apenas passe pelo irmão sem falar nada, não havia o que se desculpar que mudasse a situação, a garota Baratheon já estava machucada, a raiva de Daemon poderia cegá-lo em certo nível, mas não a ponto de culpar a cunhada e o irmão por coisas que eles não tinham feito, não eram só os dois que deveriam tê-la protegido, Baelon não deveria tê-la machucado para inicídio de conversa.

Daemon não tinha medo de muitas coisas, a vida e as perdas durante ela tinha endurecido o príncipe, a coragem que precisou ter para domar um dragão, para voar até lá e para proteger a garota que amava, se ele tivesse que enfrentar o próprio pai, naquele rompante ele enfrentaria. Encontrou Baelon na sala do pequeno conselho, o qual ele fazia parte como Mão do Rei, mas Jaehaerys não estava lá, nem Alyssane, o príncipe estranhou ver o filho, que ficou parado em silêncio, olhando ele das portas abertas, então Baelon entendeu que era sério e os outros se retiraram, ficando apenas pai e filho.

── Você voltou. ── Baelon sorriu de canto. ── Apesar de não responder minhas cartas, fiquei sabendo de seus avanços com Caraxes, quando o vi sobrevoar a cidade temi que ele estivesse sozinho, temi mais ainda que você estivesse no dorso dele.

── Porque você fez isso? ── Daemon ignorou tudo que ele falara. ── Porque você se casou com a única pessoa que eu amei?

── Filho ... ── Baelon sabia que aquela conversa aconteceria um dia ou outro. ── O rei, ele ...

── Eu não sou seu filho. ── Ele rebateu por cima. ── Você a machucou, porque fez isso com ela?

── Eu mal toquei nela nos dias após o casamento. ── Baelon tentou se aproximar dele, mas viu o filho pousar a mão sob a espada em sua cintura e parou. ── Não é uma situação que eu goste de estar.

── Você vai pagar por isso. ── O mais jovem saca a espada e aponta ao pai desarmado.

── Daemon ... ── Baelon abaixa os braços, ele sabe que Daemon está nervoso e se vê obrigado a assumir o papel de pai e não apenas de homem. ── Eu juro pela Alyssa que ...

── NÃO! ── Daemon balança a espada. ── Não ouse jurar pela memória da minha mãe.

── Eu não machuquei a Madlyn. ── Baelon insistiu, dando passos a frente.  ── Eu vi os machucados, eu pedi aos meistres para cuidarem dela, ela tem feito isso em si e afastado todos, até a Aemma e as amas, você pode perguntar a ela.

── Se você estiver mentindo.── Ele ameaça, avançando e tocando a ponta da espada no peito do pai. ── Você vai pagar por isso, é com que saiba. Anule o casamento, eu me casarei com ela e assumirei qualquer vergonha que isso possa causar a ela.

── Isso não é possível. ── O semblante de Baelon muda para um tom melancólico. ── O casamento já foi consumado na noite de núpcias, eu não queria, mas o rei colocou espiadores para garantir que tinha acontecido.

Havia um nojo notável na expressão de Daemon quando ele abaixou a espada, encarando o pai enquanto guardava a arma e se afastando, ele tinha tanto receio de pensar em Madlyn passando por isso, justo com ele, não que se fosse outro ficasse menos tragável, seria aceitável matar qualquer um e tomá-la como esposa, mas era Baelon, seu pai e o herdeiro do trono, isso complicaria as coisas muito mais, nos céus também não seria uma opção, visto que Vhagar era muito maior que Caraxes, ambos pereceriam. Daemon então escolheu o silêncio, deixando Baelon sozinho na sala do Pequeno Conselho.

A mente do príncipe mais jovem ainda rebatia e seu estômago parecia doer com a situação, ele precisava ver Madlyn, então só andou apressado pelos corredores, sabia decorado cada parte do castelo, já que durante a infância e parte da juventude desbravar isso com o irmão era uma das suas atividades favoritas, até que Viserys ficasse diplomata e chato demais para se divertir. Quando ele para na porta de seu quarto, com a porta entre aberta, a primeira pessoa que vê é Aemma, amparando alguém em seu colo e depois vê Madlyn.

Daemon quase engole seco por vê-la tão trêmula e com corpo miúdo, a garota que ama, uma força, um sol, tão machucada ali, se o que Baelon disse fosse verdade, ela estava fazendo isso consigo, o que era bem pior. Daemon encosta a espada na porta e acena com a cabeça para que a cunhada os deixe a sós, a Arryn apenas concorda com a cabeça em silêncio, separando-se de Madlyn que finalmente o vê ali, se aproximando dela.

Não era preciso falar nada, ela apenas se aninhou aos braços dele, chorando, assim que ele estava perto o suficiente, o apertando com a força que tinha, o que para Daemon ainda era pouco, ela estava tão fraca, pensava em como seria se ela tivesse que gestar alguma coisa naquele estado, mais do que culpar Baelon ou Viserys ou Aemma, ele culpava a si mesmo por não ter estado lá com ela quando ela mais precisou.

── Me desculpa por não ter estado aqui para te proteger. ── Ele beijou o topo da cabeça da Baratheon. ── Eu não vou te perder de vista mais, Mads, nunca mais.

Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top