𝑩𝑬𝑴-𝑽𝑰𝑵𝑫𝑶𝑺 𝑨 𝑴𝒀𝑺𝑻𝑰𝑪 𝑭𝑨𝑳𝑳𝑺

CAPÍTULO UM | bem vindos à mytic falls

O mundo lá fora era vasto, uma paleta de cores que Agnes só havia visto em fotografias e através das janelas do hospital. Tudo parecia mais intenso, mais vibrante, mais vivo. Ela olhava pela janela do carro com olhos que refletiam o céu azul e as árvores verdes. Suas mãos finas, cobertas por uma camada de pele translúcida, estavam apoiadas no vidro, como se quisesse tocar a paisagem, capturar cada detalhe daquela nova realidade. Era a primeira vez, em muito tempo, que ela se sentia realmente livre, respirando um ar diferente do hospital.

O vento fazia os fios rosa chiclete de sua peruca balançarem de um jeito divertido, e Agnes sorria com o tipo de felicidade que só quem passou uma vida inteira lutando para estar ali poderia ter. Adam, seu pai, dirigia em silêncio, mas de vez em quando lançava um olhar preocupado pelo retrovisor. Ele sabia o quanto aquela viagem significava para ela, e, ao mesmo tempo, sentia o peso de cada quilômetro, sabendo que qualquer erro, qualquer descuido, poderia ser fatal.

— Não olhe tanto para as árvores, Algodão-doce — disse Adam, fingindo um tom de brincadeira. —  Não quero que fique enjoada de novo.

Agnes revirou os olhos, mas com um sorriso nos lábios. Ele sempre a chamava de Algodão-doce quando ela usava a peruca rosa. Na verdade, desde pequena, quando começou a usar as perucas coloridas, seu pai adorava brincar com os apelidos, tentando arrancar algum sorriso dela nos dias mais difíceis. E foram muitos.

Agnes havia sido diagnosticada com leucemia aos três anos de idade, uma idade em que as lembranças são vagas para muitos. Mas ela se lembrava de tudo. Dos rostos de médicos e enfermeiros, dos sorrisos falsos que tentavam esconder a gravidade da situação. Do rosto do seu pai, pálido e assustado, mas determinado. E do rosto da mãe, que cada vez mais parecia exausta, até que um dia parou de aparecer. Sua mãe não aguentara — a doença dela era demais para Melissa. Um dia, sumiu, e tudo que restou foram alguns cartões de aniversário e Natal, entregues com atraso e assinado com um "Com carinho, mamãe", que parecia um lembrete distante do que fora uma família.

Ela sabia que Adam não perdoava Melissa por ter partido. Para ele, aquilo era abandono, um corte sem volta. Mas Agnes, de algum jeito, não a culpava. “Nem todo mundo é forte, papai”, costumava dizer, com uma maturidade quase absurda para a sua idade. Para ela, Melissa tinha sido uma figura breve, quase uma estranha. Seu pai, por outro lado, era seu mundo. Ele ficava ao seu lado em todas as sessões de quimioterapia, em todas as vezes em que a dor parecia insuportável e o corpo fraco demais para continuar. Ele que fazia promessas de dias melhores, quando até mesmo os médicos pareciam descrentes.

E agora estavam ali, juntos. Esse dia era uma promessa cumprida, um presente raro.

— Você sabe, pai, acho que você realmente precisa de um novo repertório — Agnes disse, rindo enquanto Adam cantarolava uma velha música de rock. Ele a ignorou, mas ela pôde ver o sorriso se formando.

— Eu não preciso de um novo repertório. Essa é música boa de verdade, Algodão — respondeu ele, finalmente, enquanto acelerava um pouco o carro, o olhar dividido entre a estrada e o retrovisor, de onde olhava para ela com um misto de preocupação e ternura.

Agnes voltou os olhos para a estrada à frente, e uma alegria genuína transbordou em sua voz.

— Estou tão animada para a escola! — exclamou, com um sorriso que parecia iluminar o carro.

Houve um silêncio por um momento. Adam respirou fundo, desviando o olhar. Para ele, aquela era a parte mais difícil. Eles haviam feito um acordo, quase uma promessa: se ela estivesse bem, com os exames em ordem, poderia estudar em uma escola normal, como qualquer outra adolescente. O problema é que para ele ainda era difícil ver a filha como uma adolescente qualquer. Ele a via ainda como a menina pequena, de olhos grandes e brilhantes, que lutava todos os dias para sobreviver. Mas ele sabia que não podia decepcioná-la.

— Você prometeu, pai — disse Agnes, em um tom suave, quase um sussurro.

Adam olhou para Stella, sentada ao lado dele, buscando apoio. Stella era mais do que uma médica para Agnes; era uma amiga e, muitas vezes, uma ponte entre pai e filha. Ela observou Adam e, com um sorriso leve, disse em um tom carinhoso:

— Lo prometiste, Adam.

Adam suspirou. Ele sabia que estava em desvantagem. Os olhos azuis de Agnes, firmes e esperançosos, pareciam esperar uma resposta, e ele não podia dizer não. Não a ela.

— Tudo bem. Mas vamos com calma — respondeu ele, finalmente.

Agnes bateu palmas, radiante. Sua risada encheu o carro, e ela imediatamente se virou para Stella, perguntando sobre a escola, sobre os alunos, os professores. Stella, com um sorriso gentil, respondeu a todas as perguntas, enquanto Adam apenas observava as duas, tentando esconder o sorriso.

Para ele, aquele momento era um sonho — vê-la feliz, cheia de vida, era tudo o que ele sempre quis. Mesmo que o futuro fosse incerto, mesmo que ele soubesse que aquela alegria poderia ser interrompida a qualquer momento, ele não se permitia pensar nisso agora. Ele apenas queria aproveitar o instante, como Agnes, que parecia saber exatamente o valor de cada segundo.

Quando finalmente viram a placa anunciando a cidade, Adam soltou o ar, percebendo o quanto estava tenso. Eles tinham chegado ao lugar onde tudo começaria de novo. E, por um ano, Mystic Falls seria o lar de Agnes, seu refúgio, seu lugar para viver.

Para Agnes, era mais do que um lugar. Era um milagre.

(...)

Mystic Falls parecia saída de um livro antigo, com suas ruas ladeadas de árvores, fachadas envelhecidas pelo tempo e uma atmosfera quase palpável de mistério. Enquanto o carro avançava devagar pelo centro da cidade, Agnes mantinha o corpo levemente inclinado para fora da janela, os olhos brilhando de fascínio. Ela estava absorvendo cada detalhe — as construções, o movimento tranquilo, o calor do sol atravessando a copa das árvores e banhando as calçadas com uma luz morna.

— Sabe que, em outros lugares, essa cidade pareceria entediante? — Adam comentou do banco do motorista, lançando um olhar meio divertido para Stella, que estava sentada ao seu lado. — Já que tivemos de sair de onde estávamos, poderíamos estar em um lugar… maior.

Stella, a médica de Agnes, lançou um olhar paciente para Adam e depois se voltou para Agnes, que estava maravilhada com o cenário.

— Eu achei bem charmosa, — disse ela, tentando suavizar o tom de Adam. — E tem exatamente o que precisamos, não é, Agnes?

Agnes, sem desviar os olhos da janela, sorriu.

— Eu li sobre Mystic Falls na biblioteca do hospital, uma vez, — disse ela, com os olhos brilhando. — Achei tão fascinante. Os fundadores, as lendas… é como se essa cidade fosse viva. Um pouco assustadora, talvez, mas viva.

Adam suspirou, mas o brilho nos olhos de Agnes era inegável, e ele sabia que aqueles momentos eram preciosos. Stella também notou, e enquanto observava Agnes absorver cada detalhe ao redor, sentiu uma pontada de ternura — e de responsabilidade. Mesmo que a relação entre elas fosse de médica e paciente, ela não conseguia evitar o desejo de proteger Agnes, uma jovem com tanto brilho e esperança.

O carro avançava devagar, e pessoas nas ruas olhavam com curiosidade para o veículo. Não era comum ver gente de fora; visitantes geralmente só apareciam em épocas de festivais. Esses eventos eram conhecidos por suas histórias e tradições antigas, atraindo turistas fascinados pelas lendas locais. Fora desses períodos, a cidade parecia um porto seguro e sereno, onde nada de extraordinário jamais acontecia — ou, pelo menos, assim pensavam os moradores.

Ao dobrar uma esquina, finalmente chegaram ao destino: uma casa imponente, de estilo antigo, com colunas brancas e uma varanda espaçosa, pintada em um tom suave de lavanda que contrastava lindamente com as outras casas da vizinhança, geralmente em tons neutros. As janelas eram grandes, quase majestosas, e deixavam a luz do final da tarde entrar, fazendo o interior brilhar.

— Nossa… — murmurou Agnes, saindo do carro antes mesmo que Adam desligasse o motor, seus passos leves e animados enquanto se aproximava da varanda. — É ainda mais bonito do que eu sonhei.

Adam a observava, uma expressão de alívio e carinho misturados, enquanto Stella saía do carro com um sorriso de compreensão. A casa, espaçosa e acolhedora, parecia oferecer exatamente o que Agnes precisava: um lar onde poderia se sentir segura, mas ainda assim livre para explorar o mundo ao seu redor.

— Papai, será que meu quarto tem vista para a rua? — Agnes perguntou, empolgada, olhando para Adam com um sorriso que iluminava seu rosto.

Adam sorriu, puxando-a para um abraço e beijando-a na testa.

— Espero que sim, Algodão, — disse ele. — Se essa casa puder te fazer feliz, então valeu a pena.

O olhar de Agnes logo foi atraído pela casa ao lado, onde um rapaz estava sentado na varanda, com fones de ouvido e algo nas mãos que soltava uma fumaça fina. Ela franziu o cenho, intrigada.

— O que ele está fazendo? — perguntou Agnes, curiosa, inclinando a cabeça.

Adam e Stella trocaram um olhar breve. Adam estreitou os olhos, reconhecendo o cheiro no ar.

— Nada que você vá fazer um dia, Algodão-doce, — respondeu ele, rápido e firme.

Enquanto isso, uma mulher jovem saiu da casa ao lado, com um olhar irritado no rosto. Ela marchou até o rapaz e, com um movimento rápido, arrancou os fones de ouvido das mãos dele.

— Jeremy! — gritou ela, claramente exasperada. — Além de matar aula, agora vai ficar… fumando isso aqui na frente de casa?

Jeremy levantou o olhar com um ar desafiador e rolou os olhos, respondendo com uma indiferença típica de adolescente.

— Não seja careta, Tia Jenna, — murmurou ele, se levantando e, sem mais palavras, bateu a porta ao entrar.

Stella observou a cena com um sorriso contido, mas Adam estava visivelmente desconfortável. A mulher, que agora parecia ligeiramente constrangida, virou-se para eles e, com um sorriso forçado, acenou.

— Ah… adolescentes, né? — disse ela, tentando manter o tom leve. — Vocês têm uma… devem entender.

Adam ajeitou a postura, a expressão rígida.

— Ela não é… daquele jeito, — respondeu ele, direto, quase protetor.

Jenna abriu um sorriso um tanto hesitante, claramente tentando quebrar o gelo.

— Bem, sorte a de vocês, então. E… sejam bem-vindos a Mystic Falls, — completou ela, antes de desaparecer pela porta, deixando os três em um breve silêncio.

Agnes, que havia observado tudo com uma mistura de fascínio e curiosidade, soltou uma risada leve.

— Eu gostei dela, — comentou, um brilho travesso nos olhos.

Stella sorriu, cruzando os braços e olhando de Agnes para Adam.

— É claro que gostou, — respondeu Stella, com um tom afetuoso. — Você sempre vê o lado bom de todo mundo.

Adam suspirou e olhou para a filha.

— Bem, se quer mesmo explorar o lugar, acho que agora é um bom momento. Mas com calma, Algodão-doce. Nada de exagerar.

Agnes assentiu, com o rosto iluminado de alegria e o coração batendo acelerado. Olhou para a casa, para a rua à sua frente e sentiu, pela primeira vez em muito tempo, que aquele lugar poderia realmente ser um lar.

(...)

A casa era tudo o que Agnes sempre havia sonhado, um lar de verdade. Pela primeira vez, não era um quarto de hospital ou uma sala de espera silenciosa. Era uma casa cheia de detalhes e de calor, um lugar só dela e de seu pai — e de Stella, que era quase família. Adam, Stella e Agnes sabiam que cada canto daquele lugar simbolizava algo muito maior do que paredes e móveis; era a conquista de um sonho.

Ao cruzarem a porta, Agnes se virou, girando pelo corredor como se quisesse absorver tudo de uma vez. Seu sorriso era tão radiante quanto a luz que entrava pelas janelas. Cada passo, cada toque nos móveis parecia um abraço. E, com Stella ao seu lado, sua ânsia era quase infantil.

— Vamos ver cada pedacinho! — Agnes exclamou, os olhos brilhando de alegria.

Stella deu uma risada suave e lhe lançou um olhar de cumplicidade.

— Nem precisa pedir, essa casa é nossa para explorar — Stella respondeu, ajustando o óculos sobre o nariz e dando uma piscadinha.

Foram direto para a cozinha, um espaço arejado e moderno, mas com toques acolhedores que pareciam dar boas-vindas. Agnes abriu gavetas e armários, explorando como uma criança, e Stella a acompanhava com a mesma animação. Agnes sempre gostava de brincar que Stella era "uma adulta disfarçada de criança" — algo que, de fato, sempre fazia com que as duas se aproximassem ainda mais. Nos dias difíceis do hospital, Stella sempre arranjava uma forma de fazer Agnes rir, fossem piadas bobas ou um jogo improvisado.

Naquele instante, as duas mexiam em cada detalhe com o entusiasmo de quem vê algo novo e fascinante.

— Eu aposto que você escolheu esses potes de vidro só pra enfeitar, mas vou usá-los todos, — Agnes disse, sorrindo para Stella enquanto abria um armário cheio de utensílios cuidadosamente dispostos.

— Ah, mas é claro que vamos usar, — Stella respondeu com um sorriso maroto. — Eu já vi umas receitas que vamos tentar juntas.

Então, quando Agnes abriu a geladeira e viu tudo bem abastecido — frutas, sucos, iogurtes, até os lanches favoritos dela — ficou visivelmente surpresa.

Adam, encostado no balcão, deu de ombros, tentando disfarçar a felicidade.

— Pedi para a corretora, — ele explicou casualmente, mas seu sorriso revelava o quanto queria que aquele lar fosse especial para ela.

— Você pensou em tudo, papai! — Agnes disse, jogando os braços ao redor dele em um abraço apertado.

A sala de estar conectava-se com a cozinha, com uma grande ilha que dividia os dois espaços, no estilo americano clássico. Havia um sofá espaçoso, perfeito para uma noite de filmes, e a lareira esperava para ser acesa em noites de frio. A estante de livros chamava atenção, repleta de histórias prontas para serem lidas, uma coisa que Agnes sempre amou, especialmente nos dias longos de tratamento.

— Vamos para o andar de cima? — sugeriu Stella, quase pulando de empolgação.

Para Agnes, aquele convite era como um sonho. Ela subiu as escadas quase pulando, com Stella ao lado, rindo. Ao longo dos anos, Stella não era apenas sua médica, mas uma confidente, quase uma irmã mais velha. Era a Stella quem sempre estava ao seu lado nas sessões de quimioterapia, segurando sua mão e falando sobre a vida lá fora, sobre todas as aventuras que ainda viveriam juntas.

No andar de cima, o corredor era iluminado pela luz natural que entrava pela grande janela, lançando uma sensação de tranquilidade em cada canto. As portas dos quartos se alinhavam ao longo do corredor, e Stella foi a primeira a abrir uma delas, revelando o quarto que seria o seu.

Era simples e acolhedor, em tons de oliva e creme, e tinha uma cama grande com almofadas coloridas que Stella já parecia imaginar enchendo de livros e papéis.

— Vai ser meu cantinho para cuidar de vocês, — ela disse, piscando para Agnes, que sorriu em resposta.

Logo passaram para o quarto de Adam, com paredes cinzas e detalhes de madeira. Era um quarto robusto e elegante, perfeito para ele, e Agnes aprovou com um aceno de cabeça.

Finalmente, Adam, visivelmente animado, gesticulou para a última porta.

— Agora, é a sua vez, Algodão.

O coração de Agnes batia rápido quando ela girou a maçaneta e abriu a porta. Ao entrar, soltou um suspiro, maravilhada.

— Nossa... — disse suavemente, com os olhos se enchendo de lágrimas.

O quarto era lindo, como um reflexo de sua própria personalidade alegre e sonhadora. As paredes em tons pastéis, os detalhes em rosa e azul suave, e, acima de tudo, um delicado arco-íris pintado no teto, como se estivesse sempre brilhando sobre ela. Era como se cada detalhe tivesse sido feito para ela. Nas prateleiras ao lado da cama, uma coleção de livros esperava para ser lida, e, espalhados pelo quarto, havia dezenas de ursos de pelúcia.

Eram mais do que apenas brinquedos; cada ursinho contava uma história, cada um presenteado por enfermeiros e médicos após suas sessões de quimioterapia. Ao longo dos anos, Agnes e Stella colecionaram cada ursinho, muitos deles assinados com palavras de incentivo. O carinho dos profissionais de saúde por ela era tanto que, no hospital, sempre havia alguém para garantir que um ursinho a esperava ao final de cada tratamento. Adam fez questão de trazer cada um para o novo quarto, e agora, vendo todos reunidos, era como se estivesse cercada por uma família de amor e cuidado.

— Você trouxe todos eles… — Agnes murmurou, lágrimas de felicidade escorrendo pelo rosto enquanto acariciava um ursinho de pelúcia azul, um dos seus primeiros.

Ela pulou na cama, se afundando nos ursinhos com uma risada borbulhante, sentindo-se como se estivesse em um sonho.

Adam, parado à porta com Stella ao lado, a observava com um sorriso emocionado. Ver Agnes tão feliz, tão plena em um lugar só seu, o fazia sentir que cada esforço, cada momento difícil, tinha valido a pena.

— Gostou, Algodão? — ele perguntou com a voz embargada de emoção.

Agnes levantou o rosto da cama, os olhos brilhando de alegria.

— Eu adorei, papai! Obrigada… de verdade.

Com outra risada doce, ela voltou a se afundar nos ursinhos, abraçando-os como se estivesse abraçando cada uma das pessoas que a apoiaram ao longo dos anos.

Adam e Stella trocaram um olhar silencioso, mas cheio de compreensão e gratidão. Era impossível não se emocionar com a felicidade genuína de Agnes. Ela era a prova viva de força e resiliência, e agora, cercada por carinho, cada pedaço daquele novo lar parecia dizer que, finalmente, ela estava em casa.

(...) O céu estava em seu momento de transição mágica, como se as cores do fim de tarde fossem pintadas à mão. As nuvens ganhavam nuances douradas e rosadas, e as sombras das árvores nas ruas de Mystic Falls se estendiam, cobrindo o chão com um véu escuro que parecia prenunciar o mistério da noite. A cidade, que durante o dia tinha um ar tranquilo e acolhedor, agora ganhava tons mais profundos e misteriosos, escondendo histórias e segredos que nem todos conheciam.

No entanto, na casa recém-ocupada de Agnes, a atmosfera era completamente diferente. A alegria borbulhava no ar, escapando das janelas abertas e chamando a atenção dos vizinhos e das poucas pessoas que passavam pela rua, que lançavam olhares curiosos na direção das luzes e das risadas que vinham de dentro. O som suave de blues preenchia o ambiente, misturando-se ao delicioso aroma de comida caseira. Aquele era o primeiro verdadeiro lar de Agnes. Depois de anos em hospitais e clínicas, o sonho dela de ter uma casa de verdade, com um quarto só para ela e uma banheira de verdade, finalmente tinha se tornado realidade.

Na cozinha, Adam estava concentrado na preparação do jantar. Ele mexia o molho com cuidado, colocando amor e cuidado em cada detalhe. Ele não era um cozinheiro profissional, mas fazia o melhor para transformar o jantar em uma experiência que Agnes lembraria. Por vezes, ele parava e olhava para a sala ao lado, onde Stella dançava de olhos fechados ao ritmo da música. Havia uma serenidade nela que ele raramente via nos dias de trabalho e que agora, fora do hospital, parecia ganhar espaço.

Stella era muito mais do que a médica de Agnes; ela era a amiga mais leal e dedicada que ele tinha, alguém em quem ele podia se apoiar nas noites difíceis, durante os dias em que tudo parecia escuro demais. Desde que Agnes ficou doente, eles se aproximaram de uma maneira que ele nunca imaginara, como se fossem uma família unida pelo amor e pela missão de fazer Agnes sorrir.

— Está me espionando, Adam? — Stella perguntou de repente, com um sorriso travesso, embora seus olhos ainda estivessem fechados.

Ele riu, surpreso pela percepção dela.

— Você parece... mais leve hoje, — ele respondeu, voltando a mexer o molho, tentando disfarçar a sinceridade em sua voz.

Stella finalmente abriu os olhos, lançando um olhar brincalhão para ele, mas com uma calma genuína que mostrava que ela, de fato, estava em paz naquele momento.

— Estou me sentindo assim, — disse ela, permitindo-se um sorriso. Era raro ela se abrir daquela forma, e Adam apreciava esses pequenos momentos em que ela abaixava a guarda e permitia que ele visse o lado dela que não era sempre a médica competente e incansável. Havia uma beleza genuína naquela jovem médica prodígio, alguém que, apesar de ser tão nova, já carregava tanto no coração.

Adam se lembrava da primeira vez que a viu no hospital, com aqueles olhos grandes e castanhos, que lembravam os de um cervo, carregando determinação e doçura em medidas iguais. Stella aparecera como um anjo na vida de Agnes, trazendo consigo um amor genuíno e uma esperança que ele não sabia que ainda poderia existir. Ele ficava tocado ao vê-las juntas, rindo e conversando, como mãe e filha.

A relação de Stella e Agnes era única e bela, algo que ele sempre sonhara que Agnes pudesse ter com a própria mãe. Mas Melissa, a ex-esposa, não era capaz de estar presente. Adam sempre tentava afastar esses pensamentos negativos sobre Melissa, mas, de vez em quando, eles voltavam. Naquela noite, porém, ele se sentia grato por Stella e pelo carinho que ela tinha por Agnes, que era como uma filha para ela.

Antes que pudesse se deixar levar por essas lembranças difíceis, o som da gargalhada de Agnes ecoou pelo andar de cima, e tanto ele quanto Stella sorriram ao ouvir a risada pura e livre da garota.

Poucos instantes depois, Agnes apareceu no topo da escada, usando um pijama de Hello Kitty que, em qualquer outra pessoa, pareceria bobo, mas nela era encantador. No cabelo, uma peruca azul vibrante, que dava um toque travesso ao seu visual e destacava seu sorriso radiante.

— Eu tenho uma banheira! — ela exclamou com uma felicidade quase infantil, descendo as escadas correndo. — Eu nunca tive uma banheira!

Stella riu e estendeu os braços para ela, acenando para que se aproximasse.

— Venha aqui, cariño, deixe-me fazer uma trança.

Agnes assentiu, correndo para perto dela com um sorriso empolgado, mas Adam não pôde evitar um leve estremecimento ao ver a filha descendo as escadas com tanta energia.

— Devagar, Algodão! — ele disse, o coração disparando ao pensar nos riscos, mesmo que ela parecesse tão cheia de vida naquele momento.

Ele sabia que o câncer estava sob controle por enquanto, que os últimos exames tinham sido animadores. Mas, depois de tantas desilusões e momentos de angústia, era difícil não se preocupar. Adam desejava poder mantê-la segura para sempre, protegida de tudo. Mas ele sabia que precisava deixá-la ser uma criança, mesmo com todas as incertezas.

Agnes sentou-se no chão ao lado de Stella, que estava no sofá, e permitiu que ela começasse a trançar seu cabelo azul com paciência e carinho. Havia algo profundamente maternal na maneira como Stella a olhava e cuidava dela, algo que Agnes parecia perceber e corresponder, com a confiança e o amor incondicional que só uma criança pode ter.

— Mudou a cor? — Stella comentou com um sorriso, passando os dedos com delicadeza nas mechas azuis.

— Amanhã é meu primeiro dia na escola, — Agnes disse, sua voz vibrando de emoção. — Queria causar uma boa impressão! Azul é uma boa ideia?

Stella riu, o carinho claro em sua voz.

— Azul fica lindo em você, cariño. Na verdade, todo o arco-íris fica.

Agnes sorriu, se sentindo querida e especial. Ela adorava quando Stella a chamava de "cariño" com aquele sotaque suave. Era uma palavra que trazia consigo um aconchego que ela nunca tinha sentido antes, um tipo de amor que aquecia o coração e a fazia se sentir segura.

Enquanto Stella continuava a trançar o cabelo de Agnes, as duas continuaram conversando sobre o colégio, as aulas e as novas amizades que ela esperava fazer. Adam, ao lado delas, ia e voltava entre a cozinha e a sala, ajustando o molho, preparando a mesa e observando as duas com um carinho silencioso. Ele sabia que estava diante de um momento raro e precioso.

Quando ele estava prestes a servir o jantar, o som da campainha soou pela casa, quebrando o clima acolhedor e deixando um pequeno suspense no ar.

Agnes e Adam trocaram um olhar de surpresa, e Stella ergueu as sobrancelhas, igualmente curiosa.

— Quem será? — Adam murmurou, secando as mãos rapidamente e caminhando em direção à porta.

Aquela noite estava tão tranquila, envolta em amor e risos, que a campainha inesperada parecia o prelúdio de algo novo.

Mas seria algo ruim?

Sim, eu trouxe o primeiro capítulo, demorou mais ele saiu. E bem grande, aproveitem bastante, se gostou, não esqueça de votar e comentar, até o próximo.

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