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Votem e comentem!
Ivy Belle nunca se sentira tão exausta. A sala de espelhos, com o chão de madeira polido e barras de apoio envernizadas, era ao mesmo tempo um santuário e uma prisão. Aquele lugar representava seu sonho, mas também o peso que ela carregava no peito todos os dias, cada vez mais difícil de suportar. No silêncio do estúdio, com a luz dourada do fim de tarde entrando pelas janelas altas, ela sentia que seu mundo estava parado e ao mesmo tempo em constante movimento. Seus pensamentos giravam em torno da perfeição, da cobrança e da exaustão, formando uma dança própria em sua mente.
A aula de balé avançava, e o som da música clássica enchia o ambiente. Ivy tentava se concentrar apenas nas notas que guiavam seus movimentos, esquecendo tudo ao redor. Ela sabia que, para uma bailarina, cada movimento era uma expressão de arte, mas para ela, cada movimento parecia uma prova, um teste constante de sua capacidade e força. O reflexo de Madame Léon, sua professora, se movia pelas paredes espelhadas como uma presença vigilante e rígida, observando cada detalhe com olhos atentos e críticos.
— Plié, relevé, jeté... Mais firme, Ivy — A voz de Madame Léon ecoava pelo estúdio, e Ivy sentia como se as palavras dela fossem quase uma sentença, algo que precisasse desesperadamente cumprir. Aquela disciplina severa era o que, em muitos momentos, mantinha sua dança precisa, mas também a deixava cada vez mais ansiosa.
Ao seu redor, as outras meninas da aula seguiam os passos com diferentes níveis de esforço e precisão, algumas se preocupando menos com a perfeição do que Ivy. As risadas e sussurros delas durante os intervalos pareciam distantes, enquanto Ivy se isolava em seus próprios pensamentos, mal conseguindo perceber os colegas. Para ela, não existia pausa. Cada segundo de repouso era um lembrete de que poderia estar praticando mais, corrigindo algo, aperfeiçoando algum detalhe.
Seus pés doíam dentro das sapatilhas desgastadas, um lembrete constante dos sacrifícios que o balé exigia. O couro estava amolecido pelo uso, e ela conseguia sentir o chão a cada passo, cada salto e aterrissagem. Ainda assim, ignorava a dor, habituada a colocá-la em segundo plano. Sabia que uma bailarina de verdade deveria ser capaz de dançar através do desconforto, como se aquilo fosse apenas uma leve perturbação.
Conforme o relógio se aproximava do final da aula, Ivy sentiu a pressão se intensificar. Cada movimento parecia mais pesado, mais difícil, e sua respiração se acelerava. Quando Madame Léon finalmente deu o sinal de término, Ivy deslizou para um canto do estúdio e respirou fundo, tentando acalmar a mente e o corpo. Seu coração batia rápido, e o cansaço se espalhava por cada músculo. Ela sabia que deveria se orgulhar do esforço, mas, no fundo, sentia-se tomada por uma insatisfação que não conseguia controlar. Sentia-se exausta e frustrada, como se estivesse em uma luta silenciosa contra algo que nem ela mesma compreendia.
Ao seu redor, as outras dançarinas conversavam e riam, algumas ajeitando os cabelos e trocando sapatos, enquanto outras compartilhavam as experiências da aula. Ivy, no entanto, sentia-se distante. A ansiedade se alojava em seu peito, apertando como se houvesse uma mão invisível controlando sua respiração. Ela odiava aquele sentimento de incapacidade e vulnerabilidade que surgia com mais frequência do que gostaria de admitir.
Enquanto Ivy tentava recuperar o controle, percebeu que alguém a observava pela porta. Ela levantou o olhar e viu Mason, o irmão mais novo de Brooke, encostado no batente com as mãos nos bolsos e um sorriso despreocupado no rosto. Ele parecia deslocado, mas ao mesmo tempo curioso, como se o ambiente do estúdio o intrigasse.
—Desculpe, não quis te assustar!— ele disse ao perceber o olhar de Ivy. —Eu só vim buscar minha irmã. A propósito, você dança incrivelmente bem.
Ivy se sentiu um pouco exposta, mas tentou sorrir. —Obrigada, Mason.— Era estranho receber um elogio de alguém que não fazia parte daquele mundo do balé.
Enquanto ela respondia, Mason olhava em volta, observando cada detalhe do estúdio com interesse genuíno. Era evidente que ele não estava acostumado com aquele ambiente, mas parecia fascinado pela disciplina e intensidade que os ensaios exigiam. Ivy pôde notar o quanto ele era diferente dela e das outras pessoas ali. Havia uma leveza na forma como ele se movia e olhava ao redor, um contraste que chamou sua atenção.
—Eu não entendo nada de balé,— Mason confessou, rindo um pouco de si mesmo, —mas deve ser bem difícil. Parece que vocês treinam como... atletas olímpicas ou algo assim.
Brooke, que já havia guardado seus pertences, riu ao ouvir o comentário do irmão. — E é mesmo. Madame Léon não alivia pra ninguém, nem para a Ivy. —Ela olhou para Ivy e completou: Às vezes fico me perguntando como você consegue aguentar. Eu mesma já teria surtado.
Ivy sorriu de leve, ainda se recuperando do cansaço da aula. “Às vezes eu me pergunto isso também,” admitiu, sem saber exatamente o porquê de estar sendo tão honesta.
O olhar de Mason ficou sério por um momento, como se ele realmente estivesse tentando compreender o peso que ela carregava. “Você não pode dar um tempo de vez em quando? Parece que, pra você, o balé é uma coisa muito... intensa.”
Ela hesitou, sem saber exatamente o que responder. —É... complicado,— murmurou, olhando para os próprios pés. —A dança é tudo o que eu sempre quis fazer, mas, ao mesmo tempo, parece que quanto mais eu me esforço, menos consigo ser boa o suficiente.—
Mason a observou com atenção, e Ivy sentiu que ele não estava apenas escutando suas palavras, mas realmente tentando entender o que ela sentia. —Eu sou desajeitado demais pra saber como é isso,— disse ele com um sorriso leve. —Mas, no teatro, quando eu erro, tento levar na brincadeira. Já cheguei a esquecer uma fala inteira no palco. Fiquei tão nervoso que acabei rindo de mim mesmo, e a plateia acabou rindo junto. Deu tudo certo no final.
O comentário fez Ivy sorrir de verdade pela primeira vez naquele dia. A leveza com que Mason encarava as coisas era completamente diferente da forma como ela abordava sua dança, mas havia algo de inspirador na forma como ele via os erros como algo natural.
—Deve ser bom poder rir dos próprios erros,— Ivy comentou, com uma pontada de inveja na voz. —No balé, qualquer erro parece... imenso.
— Talvez seja só porque você está dentro disso, né? Quem assiste de fora acha tudo tão bonito, tão leve... talvez seja mais do que o suficiente.— Mason deu de ombros, como se estivesse compartilhando uma verdade simples.
Brooke, que já estava pronta para ir embora, deu um leve empurrão no irmão, sem querer interromper a conversa, mas com pressa de sair do estúdio. —Vamos, Mason! Você já monopolizou a Ivy o suficiente.
Mason se levantou, estendendo a mão para Ivy. Ela hesitou, mas aceitou, sentindo a firmeza e a gentileza do gesto dele. Havia algo revigorante em falar com alguém de fora daquele mundo de balé, alguém que não a olhava com o peso das expectativas, mas com uma curiosidade genuína e despreocupada.
—Vejo você por aí, Ivy,— ele disse, com um sorriso caloroso. “Se precisar de alguém para lembrar você de como é rir de tudo isso, me chama.”
Ivy assentiu, surpresa pelo quanto aquelas palavras a reconfortaram.
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1222 palavras
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