13 - cry baby







Episódio treze,
cry baby













No carro do Topper, ao contrário do que a Mackenzell achava, Rafe cheirava mais uma carreta de pó em cima do que seria o airbag do carro novo de Topper.  Coçando o nariz para tirar os restos de pó que ficaram sobre o rosto dele, Rafe disse:

— Você tá melhor sem ela, cara, confia em mim, eu moro com essa vadia.

Topper, que dirigia, tentando ser um pouco racional, respondeu — Rafe, não chama sua irmã de vadia, cara, qual é?

— Eu chamo ela do que eu quiser, tá? — disse Rafe, totalmente chapado.

No banco de trás, Kelce, depois de beber um gole da cerveja, passou a latinha para frente, colocando na mão do Topper. — Vai, cara, bebe tudo.

Os três estavam completamente bêbados e descontrolados.

— Preciso vê-la, cara, nós não estamos bem.— Topper afirmou, querendo chorar. Sua voz era embargada, refletindo a amargura que sentia.

— Calma aí, cara. — Kelce disse do banco de trás, debochando dele, enquanto Rafe ainda tentava cheirar os restos de pó em cima do airbag.

— Cala a boca, cara, isso é uma péssima ideia. — disse Rafe, sentindo o efeito da droga. — Só fica aqui e bebe com a gente, tá legal?

— É, se você for lá agora, é muito provável que você chore na frente dela. — continuou Kelce, dando uma batidinha no ombro do Thopper.

— Eu não vou virar um bebê, não. — Thopper retrucou.

— Vai sim. — Rafe o provocou — Vai ter muita chance de você virar a porra de um bebê chorão.

— Exatamente, cara. — Kelce concordou com Rafe.

— Não, eu não vou virar um bebê, eu não vou chorar — insistiu Topper, falando mole.

— Olha pra mim. — Rafe disse, fungando e coçando o nariz, completamente chapado — Eu podia estar indo pra minha casa pra tentar conciliar com a Mackenzell que está lá dormindo bem gostosa do ladinho da Sarah. E eu vou fazer isso? Não vou, porque eu não sou a porra de um bundão.

— Que ideia merda, hein? — Kelce comentou, totalmente bêbado.

Enquanto eles entravam pelo jardim e estacionavam em frente a Tannyhill, Topper saiu do carro, tropicando e completamente bêbado.

— Vai logo antes que você perca o colhão, vai! — gritaram os dois, meio que encorajando-o a entrar na casa do Rafe. — Seja rápido, tá? — Rafe disse, cansado daquilo.

Thopper tropeçou, se segurando no carro antes de respirar fundo e começar a andar em direção à entrada da casa.

— A gente vai te deixar aqui. Não demora! — gritou Rafe da janela do passageiro, uma última vez, enquanto via Thopper entrando na sua casa.






A Kombi já estava ali, estacionada em um canto de Hawks Lake, com as portas traseiras abertas. Do lado de fora, os pés de JJ balançavam preguiçosamente para fora do carro, como se estivesse à espera de algo grandioso ou de alguém específico. Ao lado dele, Pope estava sentado, com os braços cruzados e uma expressão pensativa no rosto. Eles pareciam imersos em sua própria bolha, mas assim que o carro de Mackenzell parou, o ambiente verde ao redor ficou pesado, quase sufocante, como se a floresta ao redor estivesse assistindo a tudo com curiosidade.

Mackenzell se arrependeu no exato momento em que viu JJ ali, tão relaxado, balançando as pernas para fora da Kombi. Uma sensação de angústia subiu por sua garganta, e ela apertou o volante com mais força do que deveria. A noite fazia aquele lugar parecer muito mais sinistro do que durante o dia — as árvores se erguiam altas e o mato crescia sem fim ao redor delas. Tudo parecia uma grande armadilha verde.

— Merda... — Mackenzell sussurrou para si mesma, sentindo o arrependimento pulsar em sua mente.

Sarah olhou para ela, notando o desconforto da amiga, mas sem dizer nada. Assim que estacionaram o carro em um canto aleatório daquela área florestal, Sarah saiu primeiro, batendo a porta com firmeza. Mackenzell hesitou um segundo a mais antes de sair também, trancando o carro como se quisesse se proteger de algo. As duas ficaram ali, por um instante, contemplando o ambiente.

— Tem certeza disso? — Mackenzell perguntou de novo, com os dedos trêmulos apertando a planta cadastral da casa. A tensão estava nítida em seu rosto, os olhos fixos na Kombi, como se esperasse algo sair errado a qualquer momento.

Sarah virou-se para ela, respirando fundo. — Tenho... — disse com um tom que misturava firmeza e hesitação. Ela então balançou a cabeça, como se afastasse qualquer incerteza. — Não, claro que tenho. — Ela forçou um sorriso, tentando transmitir confiança. — Vai dar tudo certo, Mack.

Mackenzell assentiu devagar, tentando acreditar nisso. Sabia que, apesar da fachada tranquila de Sarah, ela também estava nervosa, mas, mais uma vez, ela confiava na amiga.

As duas começaram a caminhar em direção à Kombi, o som dos galhos e folhas secas estalando sob os pés preenchendo o silêncio tenso ao redor. Quando chegaram na frente da Kombi aberta, os Pogues, ainda despreocupados, ergueram o olhar. JJ foi o primeiro a notá-las, seu sorriso logo desaparecendo ao reconhecer Mackenzell. Pope, ao lado, só as olhou de relance, mas seus olhos transmitiam uma mistura de surpresa e julgamento.

Mackenzell conseguia ver nos olhos deles o que realmente pensavam dela — a expressão de desgosto clara no rosto de JJ. Ele não fazia esforço para disfarçar o choque ou o desconforto.

— Oi! — Sarah disse, tentando soar tranquila e relaxada ao dar de cara com os Pogues.

— Puta merda, você veio. — Pope disse, ignorando sem querer o cumprimento de Sarah, focando diretamente em Mackenzell, que segurava a planta cadastral como se fosse um bebê.

— Merda, essa é a planta? — Kiara perguntou, curiosa, inclinando-se para frente no assento e erguendo a mão como se quisesse tocá-la. No mesmo instante, Mackenzell deu um passo para trás, instintivamente recuando. Aquilo era dela. Kiara jamais tocaria naquilo.

O clima ficou pesado, e o silêncio pairou no ar. Ninguém sabia mais o que dizer. O que Mackenzell poderia dizer? "Desculpa por termos sido vadias e te excluído no começo do ensino médio, mesmo depois de você ter me acolhido como uma de vocês?" Isso parecia grande demais para Mackenzell processar. Algo digno de um título de álbum da Lana Del Rey.

— Bom... — Sarah disse, batendo palmas uma vez, tentando romper a tensão entre Mackenzell e Kiara, que se encaravam com uma intensidade mortífera. — Tá meio escuro por aqui... — Ela olhou ao redor. — Sabem me dizer por onde ir? Pra que eu encontre, vocês sabem, o John B. — A voz de Sarah era suave, quase gentil.

— Ligue a lanterna do celular, ele tá te esperando no píer. — Pope respondeu, apontando para a estrutura de madeira que se estendia sobre a água, onde costumavam fazer festas clandestinas.

— Certo. — Sarah sorriu, então lançou um olhar significativo para Mackenzell, pedindo a planta.

— O quê? Não. — Mackenzell respondeu, recuando incerta, mas também arrependida.

— Inacreditável. — JJ murmurou, revirando os olhos, enquanto Kiara bufava e Pope colocava a mão no rosto, incrédulo.

— Desculpe, eu tô incomodando? — Mackenzell respondeu, seu tom Kook explicitamente irritado. — Talvez seja porque não são vocês que estão arriscando as bundas aqui! — Ela acrescentou, sua raiva evidente, fazendo JJ rir abertamente de sua cara.

— Eu prometo, volto já. — Sarah disse com um sorriso doce, e Mackenzell finalmente cedeu, entregando a planta para a amiga antes de bufar, mimada.

— Espera! — Mackenzell disse, batendo o pé, o salto branco afundando na lama. — Você vai me deixar aqui com eles? — Ela sussurrou para Sarah, embora sua voz fosse perfeitamente audível.

— Ela sabe que conseguimos ouvir, né? — Pope perguntou, levantando uma sobrancelha, enquanto JJ completou:

— Conseguimos te ouvir, princesa. — Ele disse, tragando mais um pouco do baseado que compartilhava com Pope.

— Eu volto logo. — Sarah respondeu, achando graça da situação, antes de tocar o nariz da amiga e se afastar na direção do píer, com a lanterna do celular acesa no máximo.

Segundos depois, Mackenzell ajeitou sua minissaia jeans, puxando-a um pouco para baixo, antes de se encostar timidamente na lateral suja e gasta da Kombi, claramente desconfortável.

O silêncio que se seguiu era insuportável. Era como se ninguém ali soubesse o que dizer, ou simplesmente não quisesse falar nada.

— Tem lugar aqui dentro, sabe. — Pope quebrou o silêncio com um sorriso torto, tentando ser gentil, enquanto Kiara revirava os olhos, insatisfeita.

— Eu tô bem. — Mackenzell respondeu, levantando as mãos em rendição, o que fez sua blusa subir um pouco, revelando parte de seu umbigo e barriga.

Ela estava exausta e desconfortável. Ficar em pé estava se tornando um verdadeiro fardo.

— Anda logo. — Kiara disse, tirando a bolsa do assento improvisado no fundo da Kombi. — Tem lugar aqui.

Relutante, Mackenzell entrou na Kombi com um sorriso forçado. Passou uma perna, depois a outra, por cima do corpo de JJ, que estava meio jogado no chão. Ele desviou o olhar rapidamente quando percebeu que poderia ver por baixo de sua saia. Finalmente, ela se sentou ao lado de Kiara, segurando sua bolsinha de ombro no colo.

Era estranho estar ali de novo, mas de certa forma reconfortante. A Kombi ainda tinha as mesmas marcas no chão, o mesmo cheiro de maconha e suor, misturado com o perfume frutado de Kiara. Todos estavam em silêncio, enquanto JJ e Pope compartilhavam o baseado.

O olhar de Mackenzell vagava pela Kombi, cheia de lembranças. Boas lembranças, de um tempo que não voltaria mais. Mas ela também procurava algo específico — uma marca nas paredes que parecia ter desaparecido.

— Quer? — JJ estendeu o baseado na direção de Kiara, que balançou a cabeça em recusa. O cheiro de maconha lembrava Mackenzell de Rafe.

Não de um jeito ruim, só era estranho.

No mesmo instante, ela tocou o próprio queixo, torcendo para que o curativo ainda estivesse ali. Estava, por sorte, mas sabia que seu rosto estava marcado.

Kiara conseguia ver o hematoma sob o olho direito de Mackenzell por causa da luz amarelada da Kombi. Ela notou, mas não comentou nada.

— Você quer? — Mackenzell perguntou, olhando para Kiara com um sorriso amigável, quebrando o silêncio que reinava entre elas. Ela oferecia seu cigarro eletrônico cor de rosa, dando uma tragada antes de estendê-lo para Kiara.

— O que foi? — Mackenzell perguntou, confusa, ao ver Kiara rir alto, e os outros dois garotos acompanharem o riso timidamente.

— Isso é tão fodidamente Kook. — Kiara respondeu, balançando a cabeça em negação.

— Tudo bem. — Mackenzell disse, levando o pod de volta à boca, ignorando as risadas.

— Não, eu quero. — Kiara disse, e Mackenzell sorriu antes de estender novamente o cigarro para ela. Kiara aceitou de bom grado e deu uma tragada. Mackenzell pôde sentir o cheiro doce de cereja quando Kiara soltou a fumaça pelas narinas. — Obrigada.





Topper saiu da casa de Rafe com passos firmes e pesados, cada pisada mais forte que a anterior, como se o chão fosse o culpado por sua frustração. Ele estava furioso, os braços balançando ao lado do corpo com agressividade enquanto atravessava o jardim escuro e mal iluminado. Do lado de fora, Rafe e Kelce estavam no carro, ambos ainda curtindo a festa privada, com as janelas abertas, enquanto bebiam e cheiravam.

— Ei, olha quem tá vindo aí — Kelce riu, inclinando-se para fora da janela, claramente animado, como se a raiva de Topper fosse algum tipo de entretenimento. Ele deu um tapa brincalhão no ombro de Rafe. — Lá vem o nosso herói!

Rafe, relaxado no banco do carona, mexeu-se preguiçosamente, virando a cabeça para observar o amigo. Ele ergueu uma sobrancelha, o sorriso malicioso nos lábios enquanto bebia mais um gole. — Que foi agora, Top? Fez as pazes, princesa?

Mas, ao ver a expressão de puro ódio de Topper, o sorriso de Rafe se desfez. Ele se endireitou no banco, os olhos semicerrados, tentando entender o que tinha dado tão errado.

Topper chegou ao carro, bufando, os olhos ardendo de raiva. — Ela não tava lá, porra! — Ele gritou, as palavras saindo cortantes, o hálito cheirando a álcool enquanto batia com força no teto do carro.

— Que?  — Kelce franziu a testa, confuso, abrindo a porta para sair do carro, ainda rindo como se fosse piada.

Rafe também franziu o cenho, irritado agora. — Como assim?  — Ele perguntou, a voz cheia de tensão.

— Nenhuma das duas! — Topper rosnou, jogando as mãos para o alto, frustrado. — Eu entrei, fui direto pro quarto dela, achando que ia resolver as coisas, sabe? Falar com ela, pedir desculpa... — Ele balançou a cabeça, a expressão de nojo surgindo no rosto bêbado e triste — Mas a única que tava lá era a Wheezie!

Kelce, agora mais sério, franziu ainda mais a testa, tentando processar. — Wheezie?

— Ela tava claramente encobrindo as duas. — Topper gritou, passando as mãos pelo cabelo bagunçado, o álcool evidente em cada movimento descontrolado.

Rafe, que estava quieto até então, soltou um palavrão entre os dentes. — Como assim ela não tava lá? — Ele repetiu, a desconfiança começando a crescer em seu peito. — Mackenzell me disse que ia dormir lá na casa da Sarah.

— Bem, ela mentiu pra você! — Topper cuspiu as palavras com veneno.

Rafe ficou em silêncio por um segundo, a raiva subindo lentamente dentro dele. A ideia de que Mackenzell tinha mentido, de que ela não estava onde disse que estaria, começou a corroer seu interior. Ele cerrou os punhos e olhou para Topper com os olhos semicerrados, tentando manter o controle.

— Eu sei onde ela tá, fiz a Wheezie abrir a boca. — Topper disse de repente, com uma convicção bêbada.

Sem esperar por uma resposta, ele deu a volta no carro, abriu a porta do motorista e se jogou no banco, ligando o motor com um rugido. Rafe, agora completamente tenso, entrou no carro do lado do motorista, olhando para Topper com uma mistura de desconfiança e raiva reprimida.

— Então, onde elas estão? — Rafe perguntou, a voz baixa e ameaçadora.

Topper não respondeu de imediato. Ele apenas pisou fundo no acelerador, o carro rugindo enquanto partiam em alta velocidade pela estrada molhada pela garoa, em direção ao que ele acreditava ser o paradeiro de Mackenzell.

Rafe, agora mais irritado do que nunca, olhou pela janela, tentando entender o que diabos estava acontecendo. Se Mackenzell e Sarah não estavam onde deveriam estar... E, pior, por que tinham mentido.

— Hawk's Lake.






Depois de um tempo, Kiara e Pope estavam sentados nos bancos da frente da Kombi. Pope tinha os pés apoiados no painel, e os dois discutiam animadamente sobre a existência de um baralho de UNO escondido por John B em algum lugar do carro. A conversa parecia ser apenas mais uma distração enquanto esperavam, e Kiara insistia que John B tinha certeza de que deixara o baralho por ali.

Mackenzell estava descalça, os saltos jogados de lado, e seus pés latejavam de cansaço. Ela também estava exausta, física e mentalmente. No entanto, preferia passar mais vinte minutos na Kombi, esperando por Sarah e John B, do que ficar no próprio carro, sozinha. O céu ameaçava desabar, e ela sabia que uma tempestade estava a caminho. Ela podia se culpar por não ter olhado a previsão do tempo, mas, naquela noite, não tinha sequer planejado sair de casa.

Suspirando, ela encolheu o corpo, puxando os joelhos contra o peito, sentada de frente para a porta aberta da Kombi. O som distante dos trovões aumentava sua ansiedade, e, internamente, ela implorava para que Sarah voltasse logo. A última coisa que queria era implorar para JJ fechar a porta e trancá-los ali dentro antes que começasse a chorar. Ela odiava se sentir frágil, vulnerável... como uma criança.

Tentando se distrair, Mackenzell começou a vasculhar a Kombi. Tirou os saltos do caminho e começou a procurar algo no banco e atrás da cabeça de JJ, que estava distraído com um cubo mágico, claramente ignorando-a de propósito.

— Não adianta procurar, eu apaguei. — JJ disse sem olhar para ela, movendo a cabeça levemente para o lado.

— O quê? — Mackenzell perguntou, surpreendida, sendo arrancada dos próprios pensamentos.

JJ levantou a cabeça e apontou para a porta da Kombi, tirando a almofada que cobria parte dela. Lá, um arranhado de canivete era visível. Ele havia removido as iniciais toscas que os dois haviam entalhado juntos no ano anterior.

— Uma pena, era bonito — Mackenzell comentou, levantando-se do lugar onde estava e sentando-se ao lado de JJ, esquecendo-se completamente da chuva iminente.

Ela se referia ao desenho que JJ havia feito: uma sereia que a representava, seguida de um "JJ + ELL" gravado de forma discreta, escondido atrás da porta da Kombi, visível apenas quando ela estava aberta.

— Não era não. — JJ disse com um sorriso discreto, franzindo o cenho para segurar o riso.

Mackenzell riu, o som suave escapando de seus lábios, mas o riso foi interrompido por um trovão que ecoou no céu. Ela puxou as pernas para dentro da Kombi, encolhendo-se enquanto a chuva começava a cair, molhando a grama ao redor deles. Sua postura tensa e a expressão assustada não passaram despercebidas pelos outros.

JJ hesitou por um momento, observando-a. — Ainda tem medo da chuva? — Ele perguntou, tentando ser casual, mas o tom de preocupação era evidente.

— Não é a chuva. — Mackenzell respondeu, tentando soar indiferente enquanto abraçava os joelhos com força. — É só... a água. Me assusta, às vezes.

As memórias de Mason, seu irmão mais velho, tentando afogá-la quando tinham oito anos vinham à tona sempre que via muita água. O medo a dominava, o pânico silencioso de ser sufocada novamente. Quando ela ia à praia, não conseguia deixar de pensar na morte de sua mãe, afogada no mar. Era um ciclo de lembranças que a perseguiam, mesmo que ela tentasse racionalizar dizendo a si mesma que não era uma fobia. Ela tomava remédios para controlar o TOC, mas ainda assim, a ansiedade estava sempre ali, à espreita.

— Irônico, pra quem vive em Outer Banks — Pope comentou, tentando brincar, mas Kiara o cutucou, sussurrando um "cala a boca" por achar que ele havia sido insensível.

Mackenzell, no entanto, apenas sorriu para ele, concordando. — É, meio irônico mesmo.

— Mas você salvou o John B na praia — Kiara disse, hesitante, como se quisesse entender a contradição.

— Ele ia se afogar. — Mackenzell deu de ombros, como se fosse óbvio. Talvez, naquela vez, sua mente não tivesse tido tempo de processar o medo. Às vezes, em situações extremas, ela conseguia agir sem pensar. Quando nadava com Sarah ou estava em um barco com Rafe, o medo parecia distante. Era como se, nesses momentos, nem Mason, nem seu pai, nem a água pudessem alcançá-la.

— Vamos jogar — Kiara disse, tentando mudar de assunto, pegando o baralho de UNO das mãos de Pope para aliviar a tensão. Mas, antes que pudesse começar, Pope fez um sinal para que todos ficassem em silêncio.

— Ouviram isso? — ele perguntou, olhando para o nada.

Todos ficaram quietos, tensos, até que ouviram o grito de Sarah ao longe, chamando por ajuda.

— Merda! — Kiara exclamou, preocupada. Os três pularam para fora da Kombi, prontos para correr em direção ao som. Mas Mackenzell permaneceu no lugar, seus pés travados. Ela simplesmente não conseguia se mover, o medo a paralisando, prendendo-a ali enquanto seus amigos corriam para ajudar.

A tensão dentro da Kombi parecia palpável quando os gritos de Sarah cortaram o ar. O som penetrante de desespero fez com que o ambiente, já pesado pela iminência da chuva, se tornasse ainda mais sufocante. Pope, Kiara e JJ saltaram para fora da Kombi com pressa, movidos pela urgência da situação, enquanto a chuva começava a engrossar, criando poças ao redor deles. O barulho de seus passos abafados pela lama ecoava na cabeça de Mackenzell, mas, mesmo assim, ela não se mexia.

Os gritos de Sarah pareciam mais distantes a cada segundo, e Mackenzell tentou, mas seus pés simplesmente não obedeciam. Suas mãos apertavam com força o tecido de sua saia, como se aquilo fosse impedir que a torrente de emoções a tomasse de vez. Era a água. Ela sempre paralisava.

A chuva batia cada vez mais forte na lataria da Kombi, e os trovões ecoavam no céu, enquanto o medo se enraizava mais fundo dentro dela. "Respira, Kenzell", ela sussurrou para si mesma, o peito subindo e descendo em um ritmo descompassado. Não era a Sarah que estava gritando agora. Era Mason, era sua mãe, era tudo aquilo que a água representava, misturando-se em sua mente e congelando qualquer tentativa de movimento.

"Eu preciso... eu preciso sair daqui", ela tentou convencer a si mesma, mas cada vez que fechava os olhos, a sensação de ser puxada para o fundo, de perder o controle, voltava com força total.

Do lado de fora, a voz de JJ cortou a chuva por um momento. "Kenzell!" Ele gritou, a voz dele soando longe e urgente, mas mesmo assim ela não conseguia responder.

O pânico estava consumindo-a por completo, e enquanto o grito desesperado de Sarah ecoava mais uma vez pela escuridão, Kenzell finalmente sucumbiu ao medo, encolhendo-se no banco e abraçando suas pernas com força. Ela precisava sair dali, mas, ao mesmo tempo, não podia.

A água... sempre a água.

JJ permaneceu ali, encharcado pela chuva, enquanto Mackenzell tentava processar o que ele dissera. O contraste entre eles era evidente: ele, todo molhado e exposto à tempestade, e ela, resguardada dentro da Kombi, se sentindo mais segura, embora ainda vulnerável. Ele parecia determinado a ficar com ela, independente de tudo. O silêncio entre eles era carregado, como se as palavras não fossem suficientes para traduzir o que realmente sentiam.

— Sinto muito pelo seu rosto — JJ quebrou o silêncio, sua voz baixa, mas carregada de arrependimento pelo que Rafe fizera com ela.

Mackenzell piscou, ainda digerindo as palavras dele. — Sinto muito pelo que eu disse no banheiro. Não foi sério. — Ela soltou, observando ele sorrir contra a chuva, a água escorrendo pelos traços finos e bronzeados dele. O riso de JJ era quase imperceptível, mas ela captou. — O que foi?

— Que tal um "me desculpe por te colocar na cadeia?" — ele sugeriu, rindo de leve, os olhos claros brilhando de forma sarcástica.

Ela revirou os olhos, adotando uma postura despreocupada. — Não afunde um barco, não vá pra cadeia — ela rebateu, empinando o nariz como se a solução fosse simples. — Ou melhor, afunde. Só não seja pego. — A frase saiu automática, como um eco das lições de seu pai, algo que ele sempre repetia e que acabara grudando em sua mente.

JJ deu um leve sorriso, enfiando a cabeça dentro da Kombi, fazendo com que gotas de água da chuva respingassem nela. Mackenzell podia sentir a água fria contra seu rosto, sua blusa e suas coxas. — Não fui eu, Ell. — Ele disse sério, o tom mais grave agora. — Levei a culpa pela sua irmã e pelo Pope.

Ela mordeu o lábio, inclinando a cabeça. — Bobinho — disse, mas seu tom estava mais suave. — Não devia se sacrificar por ninguém. Olha o que você ganhou em troca. — Mackenzell falou, tentando manter o ar distante e superior, desviando o olhar como se realmente não ligasse. Mas, no fundo, havia um desconforto evidente.

JJ balançou a cabeça, sem acreditar. — Você é péssima nisso, sabia? — ele comentou.

— Nisso o quê? — Ela perguntou curiosa, seus olhos buscando os dele, tentando entender.

— Em ser uma vadia. — Ele disse direto, com um meio sorriso, seus braços exibindo os músculos enquanto se encostava no topo da Kombi.

Mackenzell piscou, surpresa, e depois riu, jogando o cabelo de lado. — Eu sou. É parte de ser uma Kook, não é? — respondeu, ainda provocativa.

— Não, você não é. — JJ deu de ombros, sem tirar os olhos dela. — E essa é a pior parte. — Ele disse com sinceridade, deixando claro que enxergava mais do que o papel que ela se forçava a interpretar.

O momento entre eles foi interrompido quando os dois ouviram Pope gritar desesperadamente. — JJ, chama ajuda! — a voz dele cortou o ar, trazendo ambos de volta à realidade.

O coração de Mackenzell acelerou ao ouvir o nome de John B. — Topper o empurrou de lá de cima! — o grito ecoou.

Sem pensar duas vezes, Kenzell tirou o celular do bolso e o entregou para JJ. Suas mãos estavam trêmulas, mas ela sabia que precisava ser útil. JJ pegou o celular dela, os dedos molhados pela chuva dificultando o manuseio, mas ele conseguiu discar o número de emergência. O olhar dele não se desviou de Mackenzell por um segundo, nem mesmo enquanto a água escorria por seu rosto.






De manhã, Mackenzell estava descalça, sentindo o chão gelado sob seus pés enquanto andava pelo corredor da casa. Ao virar a esquina, ela avistou Ambrie espiando por trás da porta do escritório do pai delas. Quando Mackenzell a viu, Ambrie recuou rapidamente para se esconder atrás da porta.

— O que você está olhando? — Mackenzell perguntou, franzindo o cenho enquanto se aproximava.

Ambrie colocou o dedo na boca, fazendo um "shhh", e puxou Mackenzell para perto de si, tentando mantê-la quieta.

— Você é uma idiota — Mackenzell sussurrou, dando um tapa de leve no braço da irmã.

Ambrie soltou um "ai!" alto demais, exagerando na reação, o que fez Mackenzell revirar os olhos.

— Shhh! — Ambrie repetiu, olhando nervosa para a porta. — Porque eu sou idiota?

— Porque eles estão matando a nossa fazenda por um motivo idiota — Ambrie sussurrou de volta.

Mackenzell cruzou os braços, semicerrando os olhos. — Como você sabe disso?

— Talvez pelo simples fato de que toda a ilha já saiba que o John B foi jogado pra fora do píer ontem — Ambrie respondeu, puxando Mackenzell mais perto da porta. — Inclusive, o papai está ao telefone com o Ward Cameron agora.

Ambrie pressionou a orelha contra a porta, e Mackenzell fez o mesmo, intrigada. Ela ouviu a voz do pai do outro lado, mas as palavras estavam confusas.

— Como você sabe que eles sabem sobre o mapa? — Mackenzell perguntou em um sussurro.

— Porque a Sarah tentou pegar o mapa do Tannyhill ontem, mas o Ward não deixou — Ambrie explicou, seu rosto tenso.

Mackenzell ficou ainda mais confusa, inclinando-se para ouvir melhor. Dentro do escritório, o pai delas disse algo que ela não conseguiu decifrar completamente, mas a menção de "não sei o que fazer" a deixou desconfortável.

— Tudo bem, eu confio em você. Cuide disso. — A voz do Ward Cameron ecoou antes de a ligação ser encerrada.

De repente, a porta do escritório se abriu com força, e Mackenzell, que estava espiando, quase caiu para dentro. Ela se segurou de qualquer jeito na maçaneta, desequilibrada, mas logo tentou disfarçar com um sorriso despreocupado.

— Bom dia, papai — disse, tentando manter o tom leve.

— Bom dia, querida. Precisamos conversar.  — ele respondeu, sério.

Mackenzell deu de ombros, agindo como se não fosse nada demais, sorrindo despreocupada, enquanto Ambrie ficou tensa. Para Mackenzell, não importava o que o pai dissesse ou fizesse. Ela ainda seria sua garotinha favorita.

Ela entrou no escritório sorrindo, sem dar muita importância, enquanto Ambrie, com um olhar preocupado, voltou silenciosamente pelo corredor.

Mackenzell entrou no escritório com um sorriso leve nos lábios, observando enquanto o pai, já de pé, se movia em direção à sua mesa, pronto para confrontá-la. Ela se jogou casualmente no sofá, como se nada de importante estivesse acontecendo.

— Acho que você sabe por que estamos aqui — disse ele, estreitando os olhos enquanto a encarava de forma avaliadora.

Ela deu de ombros, mantendo a fachada despreocupada. — Não sei... Por que estamos aqui?

— Mexendo nas minhas coisas ontem à noite, querida — a voz dele saiu firme, carregada de reprovação.

Mackenzell arregalou os olhos, fingindo surpresa. — O mapa...

— Não — ele respondeu, com o olhar desconfiado. — Estou falando da planta cadastral de Wavehill. Não sabia que você tinha interesse por isso.

Mackenzell respirou fundo, tentando se recompor. — Não, não é que eu me interesse...

— Não se interessa? — ele a interrompeu, erguendo a sobrancelha. Ele a pegara na mentira despreparada. — Quero dizer, você se interessa ou não?

— Eu gosto da história, papai — ela retrucou, um tanto hesitante.

— Mas sempre que sua mãe cantava aquelas cantigas antigas ou falávamos sobre a história da nossa família, você não dava a mínima — ele rebateu, a desafiando com o olhar.

Mackenzell revirou os olhos, quase irritada por estar sendo questionada dessa forma. — Tudo bem... É que a Sarah me pediu um favor, então eu emprestei a planta para ela.

— Emprestou? — o tom do pai ficou mais duro. — Você sabe que eu não permito que mexam nas minhas coisas, Kenzell.

— Eu sei, papai, mas é que...

Antes que ela pudesse terminar, ele bateu a mão com força na mesa entre eles, fazendo o som ecoar pela sala. — Se eu mando você não mexer, você não mexe!

— Eu... eu sei. Me desculpa — Mackenzell engoliu em seco, sentindo o peso da irritação dele.

Ficando assustada.

O pai suspirou, ajustando a respiração. — Olha, meu amor... Se você quisesse emprestado, podia ter me pedido.

Ela permaneceu em silêncio, ainda abalada pela reação brusca dele.

— Agora, preciso que você traga de volta. Essa planta é necessária no nosso acervo. Eu confio na Sarah, mas não podemos deixar que algo assim fique vagando pelo Cut.

Mackenzell ficou tensa com a menção ao Cut.

— Como você...

— O Ward. — ele respondeu casualmente, ajeitando a manga da camisa social. — Ele está dando abrigo temporário ao garoto Routledge. Você sabe, depois do que aconteceu.

— É, foi terrível... — Mackenzell murmurou, tentando manter o tom leve, ao se lembrar dos gritos de Sarah na noite anterior.

— Você estava lá? — O pai perguntou, o olhar ficando mais penetrante, como se ele soubesse que qualquer resposta errada poderia desatar sua ira novamente.

— Não... — ela mentiu, olhando diretamente nos olhos dele. — Voltamos para casa depois do Solstício. Ela saiu logo depois que eu emprestei a planta... o mapa.

Ela gaguejou levemente, estava muito nervosa.

— Entendi — ele respondeu, passando a mão na boca antes de soltar um suspiro de alívio. — Que bom. Que bom mesmo.

Ele deu alguns passos em direção a ela, tocando seu ombro de forma quase paternal.

— Porque você sabe, Mackenzell. Pessoas como nós não se envolvem com pessoas como John B.

— Claro — ela respondeu, piscando para ele, forçando um sorriso. Por dentro, cada palavra que ele dizia parecia corroer sua alma. Esse tinha sido o motivo pelo qual ela tinha saído da cidade no primeiro momento. Seu envolvimento com os Pogues.

Meses tinham se passado sem que ela estivesse no radar da raiva do pai. Ou de Mason. Ela sabia que não podia estragar tudo agora.

— Me desculpa, de verdade, pai — Mackenzell disse, lançando-lhe um olhar suplicante, como um filhote abandonado.

O semblante do pai mudou de repente, quando ela se levantou. Ele suavizou a expressão, abraçando-a com firmeza e beijando sua cabeça.

— Tudo bem, querida — ele disse, agora com um tom muito mais suave. — Só me prometa que, se precisar de alguma coisa, vai me pedir. Nada de mexer no meu escritório.

— Eu prometo — ela mentiu de novo, com um sorriso falso, disfarçando o turbilhão que rodava dentro dela.

Depois daquele momento, o escritório de Reece Kook passara o dia trancado.

Mackenzell saiu do escritório e fechou a porta atrás de si, o som ecoando pelo corredor silencioso. Ela ficou parada por alguns segundos, os olhos fixos em nada específico, como se ainda estivesse processando tudo. O pai dela tinha ficado irritado, claro, mas tão furioso daquele jeito? Ela não esperava. A reação dele a deixou desnorteada.

Enquanto ela permanecia ali, perdida em seus pensamentos, uma voz familiar cortou o silêncio.

— Eu te avisei. — Ambrie estava encostada no batente da porta do quarto, os braços cruzados, um olhar de superioridade estampado no rosto.

Mackenzell virou para a irmã, piscando para sair do torpor. — O quê?

— Eu te disse que ele ia ficar bravo. Só vê se devolve esse mapa logo e para de ferrar com a gente.

Mackenzell estreitou os olhos, a irritação crescendo junto com a confusão. — Como assim, ferrar com a gente?

— Eu tô me esforçando, tá? Já parei de falar com o Pope e fiz o que precisava. Não ferre com tudo.

— Do que você tá falando?

Ambrie respondeu com um suspiro cansado. — Dos Pogues, Kenzell.

— Então é por isso que você tá assim? O papai mandou você se afastar deles?

Ambrie assentiu, o olhar se tornando mais sombrio.

— E por que você obedeceria? — Mackenzell perguntou, desconfiada. — Você adora eles.

— Eu só... — Ambrie hesitou. Ela queria contar, queria explicar que não queria voltar para o internato, não queria passar os fins de semana com Mason, nem deixar Outer Banks para trás. — Eu só não quero voltar para o internato.

Mackenzell percebeu a tensão na irmã e, finalmente, deixou um pouco da irritação de lado. — Entendi... Se eu te disser uma coisa, você promete não contar pra ninguém?

Ambrie a encarou com desconfiança, mas acabou assentindo.

Mackenzell soltou o ar devagar. — Eu tô com a planta.

Ambrie piscou, surpresa. — E por que não devolveu?

— Porque... — A lembrança da noite anterior invadiu a mente dela. Como tinha sido bom, mesmo que ela jamais admitisse. — Não sei.

— Você não sabe? — Ambrie descruzou os braços e deu um passo em direção à irmã mais velha, que desviou o olhar e começou a andar para o próprio quarto no fim do corredor.

— Eu só... — Mackenzell murmurou enquanto abria a porta do quarto e pegava o tubo que guardava a planta. Ao sair, deu de cara com Ambrie, que a encarava com expectativa e tensão.

Mackenzell segurava a planta entre os dedos, o aperto forte, os pensamentos um turbilhão. — Eu sei o que você fez pelo Pope. — A voz dela saiu firme, surpreendendo até a si mesma. — E eu te encobri. Eu fiz você não ir pra cadeia, então me agradeça e me encubra dessa vez.

Ambrie arregalou os olhos. — Então foi você que... — Ela parou, referindo-se ao incidente com JJ na cadeia.

— Eu fiz o que pude. Contei pro papai, e ele resolveu — Mackenzell respondeu, afrouxando o aperto ao redor do tubo e deixando que as palavras fluíssem com mais facilidade do que esperava. — Eu sei o quanto você gosta disso, o quanto gosta dessa vida com os Pogues. Então trate de ir atrás do Pope e se desculpar.

Ambrie ficou paralisada por um momento, processando o que a irmã acabara de dizer, com suas mãos na direção dela a entregando o mapa da planta cadastral — Devolva isso, que ele vai te explicar.

— O quê? Eu não posso. — Ela ergueu as mãos em negação. — O papai...

— Quem liga pra essa regra idiota? Só ligue pra ele, Ambrie. — ela disse tentando ser gentil, mas sabia que sua voz saia mais carrasca do que deveria, sempre parecia mandona.

— Claro, disse a garota que está com o Rafe Cameron só pro papai ter mais contratos.— ela disse dando passos pra trás recuando, com raiva nos olhos. — Não seja hipócrita, Kenzell.

— É sério? — Mackenzell riu em escárnio — Se acha que eu sou esse tipo de pessoa, faz sentido o Pope não querer mais falar com você!

— Vai se ferrar! Você não sabe de nada.— Ambrie disse, dando meia volta — Só devolva a porcaria do mapa!

— Não! — Mackenzell disse cruzando os braços, ao ver a irmã descendo as escadas irritada. — E você não vai dizer nada. Me deve uma.

Ela estava intrigada com o que tinha ouvido atrás da porta e não deixaria aquilo quieto daquele jeito.











O clima no restaurante dos pais da Kiara estava tenso, mas havia um ar de familiaridade entre os Pogues, como se estivessem acostumados a lidar com problemas juntos. Sentados ao redor da mesa no canto, Kiara tamborilava os dedos no tampo de madeira, enquanto John B inclinava-se para frente, impaciente. JJ girava uma garrafa de vidro vazia entre as mãos, e Pope observava a conversa em silêncio, até que um comentário cortante de Kiara quebrou o silêncio.

— Então, você realmente acha que tá tudo bem ficar morando na casa dela agora? — Kiara disparou, a irritação clara na voz.

John B revirou os olhos e cruzou os braços. — Qual é, Kie. Ela me ajudou quando eu precisava. Eu não tinha mais ninguém. Ou era isso ou o conselho tutelar.

— Não é sobre isso, John B — Kiara insistiu, a voz subindo um pouco mais. — Eu não vou fingir que é normal. E eu não vou conviver com aquela garota.

JJ riu baixinho, mexendo no boné que usava. — Relaxa, Kie. Parece até que você tá com ciúmes.

Kiara estreitou os olhos para JJ, bufando. — Vai a merda.

— Claro que não. — John B sorriu, cético, enquanto Kiara cruzava os braços com força.

— Isso é sobre o ouro, ok? — Kiara rebateu, firme. — Não vou dividir nada com a Sarah Cameron.

JJ deu mais uma risada, dessa vez menos contida, inclinando-se na direção de John B. — É, cara... Ela te pegou de jeito.

John B ia responder, mas um som suave interrompeu a conversa. Todos na mesa olharam na direção do vidro da entrada do restaurante.

Do lado de fora, Mackenzell estava ali, batendo de leve no vidro e sorrindo timidamente. Ela fez um gesto pequeno com a mão, como quem tenta amenizar o desconforto de ser observada.

— Só pode ser sacanagem. — John B passou a mão pelo rosto, claramente exasperado.

— Mais uma Kook pra conta. — Kiara murmurou, revirando os olhos e se recostando na cadeira, cruzando os braços com frustração.

A porta de vidro deslizou com um rangido leve, e Kiara parou na entrada, surpreendida com quem estava do lado de fora.

— O que você tá fazendo aqui? — Kiara perguntou, cruzando os braços e examinando Mackenzell dos pés à cabeça. Diferente do outro dia, ela não vestia nada extravagante. Usava um top azul sem mangas e um short jeans curto. Nos pés, um par de tênis da Nike que provavelmente custava mais do que a moto que JJ tentava consertar no ferro-velho.

Mackenzell deu um sorrisinho, o tipo de sorriso que parece gentil, mas é afiado como uma lâmina.

— Com certeza não atravessei a ilha pra saber se vocês estão bem. — Ela disse, sarcástica, mas com um brilho divertido nos olhos.

— Tá, sério... O que você quer? — John B interveio, o olhar desconfiado. Ele ajeitou o braço com uma tala, herança da queda brutal que Topper lhe causara.

Mackenzell ergueu uma sobrancelha, ainda sorrindo.
— Eu trouxe algo que pode interessar vocês. — Ela balançou os ombros, casualmente. — A planta.

— Certo... E o que você quer em troca? — JJ perguntou direto, sem paciência para joguinhos.

Ela revirou os olhos, cruzando os braços na altura da cintura.
— Nada. — respondeu, sem hesitação. — Só quero participar.

JJ riu de um jeito seco e irônico.
— Você não vai participar.

Ela arqueou as sobrancelhas, claramente ofendida.
— Ah, então tá bom. — Mackenzell deu meia-volta para sair. — Se não querem minha ajuda, boa sorte com o ouro.

Antes que ela alcançasse a porta, John B deu dois passos rápidos e segurou seu braço.
— Espera! Como você sabe do ouro?

Mackenzell girou lentamente para encará-lo, como se ele fosse estúpido por perguntar.
— Porque tá no mapa. — Disse com um dar de ombros, como se fosse óbvio. — E eu sei ler o mapa. Mas, se isso não importa pra vocês, beleza, eu vou embora.

— Não. — Pope falou rápido, se adiantando antes que ela saísse. — Isso importa.

Com um sorriso satisfeito, Mackenzell caminhou até a mesa e abriu o pergaminho antigo, empurrando as coisas que estavam sobre a madeira para os lados. Depois, bateu as mãos umas nas outras, como se limpasse alguma sujeira invisível.

— Só pra deixar claro: se a gente encontrar alguma coisa, você não leva nada. — Kiara disse, a voz carregada de hostilidade.

Mackenzell riu baixinho, inclinando a cabeça de lado.
— Querida, eu tenho cara de quem precisa de dinheiro? — Ela zombou, e JJ sorriu ao vê-la desfilar a arrogância de sempre. Ele se aproximou por trás dela, curioso com o mapa. A proximidade era desconfortável, e Mackenzell sentiu a tensão no ar. Era quase certo que John B já sabia o que tinha acontecido entre ela e JJ.

— Então, o que você realmente quer? — JJ perguntou, baixinho, a voz rouca.

Mackenzell hesitou por um segundo, como se confessar aquilo fosse custar caro.
— A Ambrie gosta de vocês, tá legal? — Ela admitiu, a voz mais baixa. — E meu pai criou uma regra idiota: ela não pode mais andar com vocês depois daquele lance com o barco do Topper.

Pope bufou, lembrando-se de como Ambrie o tratara no solstício.
— Agora tudo faz mais sentido.

— E eu também não devia estar aqui. Mas quem se importa? — Mackenzell deu de ombros, como se quebrar as regras não fosse grande coisa para ela. — Só quero que vocês deem mais uma chance pra Ambrie. Ela é legal, sério. Diferente de mim.

Ela engoliu em seco, sentindo um nó na garganta. Ambrie provavelmente a mataria se soubesse que estava ali pedindo por ela, mas Mackenzell acreditava que era o certo a fazer.

— E se não precisam de mim... — Ela começou a dizer, mas John B a cortou.

— Precisamos. — Ele afirmou com firmeza.

— O quê? — Kiara protestou.

— Precisamos, Kie. — John B repetiu, com seriedade. Ele olhou para a amiga como se quisesse que só ela o entendesse. Mackenzell se recostou casualmente na cadeira, e JJ deu alguns passos para trás, desconfortável. — Precisamos dela e da Sarah. Os privilégios delas podem ajudar. Sem ofensas.

Mackenzell apenas deu de ombros.
— Sem problema.

Kiara suspirou, rendida.
— Certo, tanto faz.

Mackenzell se inclinou sobre o mapa e passou a mão por ele.
— Meu pai sempre falava dessa porcaria de ouro como se fosse lenda. — Ela apontou para um local no mapa. — Mas minha mãe... Ela era obcecada.

John B assentiu, tentando ser gentil.
— Eu lembro dela. — Ele disse baixinho. — Ela conhecia meu pai. Acho que uma vez ela vendeu um barco antigo pra ele.

Mackenzell piscou, surpresa com a revelação.

— Quem fez esse mapa devia estar drogado. — JJ resmungou, inclinando-se sobre a mesa.

— A costa mudou. — Pope explicou, sem desviar os olhos do papel.

Mackenzell sorriu, satisfeita.
— Exato. É por isso que temos que encontrar marcos que não mudaram. — Ela apontou para um símbolo no mapa. — Forte Battery Jasper. Estive lá mais cedo. Se isso aqui é a Parcela Nove, então estamos ao noroeste de...

— Isso é depois de Tannyhill. — JJ observou, confuso.

— Wavehill era a ilha toda. Foi dividida com o tempo. — John B explicou, passando a mão pelos cabelos.

— Exatamente. — Mackenzell sorriu com os olhos brilhando.

— E como podemos confiar que é isso mesmo? — Kiara perguntou, desconfiada.

— Bom, não podemos. — Mackenzell deu de ombros. — Mas, se a obsessão da minha mãe estiver certa, é realmente lá. Tinha até uma música sobre essa palhaçada toda, por isso a Sarah me pediu ajuda pra começo de conversa, ela se lembrava também.

Ela puxou algo do bolso e jogou sobre a mesa. Todos encararam a pequena bússola. Era idêntica à do pai de John B — a mesma que ele havia entregado à xerife Peterkin.

— Espera... Onde você conseguiu isso? — Kiara perguntou, sem tirar os olhos da bússola antes de olhar rapidamente para John B desconfiada.

— Essa velharia? Tava lá em casa. — Mackenzell deu de ombros, como se não fosse grande coisa. — A gente não mexe muito nas coisas da minha mãe, mas lá no forte não tinha sinal... Tive que ir de tênis. — reclamou, como se esse detalhe fosse o mais relevante da conversa.

John B pegou a bússola da mesa, os olhos arregalados.
— É a bússola do meu pai.

Mackenzell riu alto, como se aquilo fosse absurdo.
— Não é! — disse, quase zombando. — É só uma bússola velha.

— É a mesma que eu dei pra Peterkin. — John B insistiu, segurando-a firme.

Mackenzell pegou a bússola de volta, sacudindo-a como se fosse um brinquedo.
— Tava toda empoeirada! Achei que nem fosse funcionar... Ei!

Ela exclamou quando John B rapidamente a tomou das suas mãos e começou a tentar abrir a parte traseira.

— Não quebra isso, John B! — Mackenzell protestou, tentando puxar de volta.

Com um clique suave, John B finalmente abriu o fundo da bússola. Ele examinou o interior, esperando encontrar algo significativo — mas só havia um número "9" cravado no fundo.

— Não é a do meu pai. — John B admitiu, com um toque de frustração na voz.

Mackenzell pegou a bússola de volta, visivelmente aliviada. Não queria mais problemas com o pai. — Eu falei que não era! — disse, tentando encaixar novamente a tampa traseira.

— Não faz sentido serem idênticas. — JJ comentou, inquieto, os braços cruzados.

— Claro que faz. — Pope rebateu, sempre lógico. — Duas pessoas podem comprar o mesmo tipo de bússola cara.

— Ainda assim... Isso é estranho pra caramba. — John B murmurou, observando Mackenzell. — Mas por que o número nove? — Ele apontou para o símbolo cravado no fundo.

Mackenzell hesitou por um momento, desviando o olhar. Pela primeira vez, ela parecia vulnerável.
— Era o número favorito dela. — disse, a voz baixa.

— Era? — JJ perguntou suavemente, tentando não ser invasivo.

Mackenzell respirou fundo, como se estivesse enfrentando uma barreira emocional que evitava há muito tempo.
— Era. — confirmou, quase com relutância. — Faz quase um ano desde que ela morreu.

O ambiente ficou pesado por um instante. Ninguém sabia que a mãe de Mackenzell, uma bilionária, havia falecido — o que tornava tudo ainda mais bizarro.

— Sinto muito. — John B disse, se aproximando e pousando uma mão de leve no ombro dela. — Quando?

— Foi pouco depois que eu fui embora. — Mackenzell respondeu, esboçando um sorriso torto, mais para esconder o incômodo do que por qualquer alegria.

John B e JJ trocaram um olhar significativo. Algo naquilo parecia errado. Não só o fato de ninguém saber da morte de uma mulher tão influente, mas também a estranha semelhança entre a mãe de Mackenzell e o pai de John B — ambos desaparecidos em circunstâncias nebulosas, deixando um rastro de segredos e pistas incompletas.



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7559 palavras




Eu sei q algumas coisas tem lacunas e outras ainda estão meio confusas, inclusive a divisão de capítulos, mas prometo ajeitar isso o quanto antes, pra serem dez capítulos certinhos.

Mas prefiro continuar escrevendo e editar tudo dps doq fazer como fiz em Strengthen de revisar td e enrolar pra desenvolver a história dps. Prefiro postar mais capítulos doq editar os q já existem.

Oq acharam na estética nova? Eu amei. Ja ja vou editar a dos capítulos!

Enfim comentem mt.
Bj bj
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