Ciúmes
Capítulo trinta e um
Maven
Eu gargalhava alto enquanto inclinava minha cabeça para trás, deixando Davina cada vez mais furiosa.
— Inacreditável — falei ao meio do riso.
— Você está achando engraçado? — Davina terminava de escovar os dentes ao meu lado — Mesmo?
— Olha só você! — continuei gargalhando ao olhar a diferença de altura entre nós dois — Você tem o que? Um metro e sessenta?
— Sim — A mulher respondeu bufando me fazendo rir mais ainda.
— Do tamanho de um rato! Devo te chamar de pequeno camundongo?
— Eu vou contar até três e você vai sair daqui correndo antes que alguma coisa nesse banheiro voe na a sua cabeça. Um.
Continuei gargalhando.
— Você não pode estar falando sério.
— Me teste, Maven. Dois — Ela não estava brincando.
Meus risos cessaram. Antes que ela começasse a falar "três" eu já tinha disparado pelo corredor. Minhas pernas compridas por conta dos meus um e oitenta de altura faziam um ótimo trabalho.
— Pinscher a solta! — Gritei pelos corredores e todos pareciam confusos. — Pinscher a solta!
Era possível ouvir Davina gritar o quanto me odeia pelos corredores mesmo a distância. Alguns dos guardas gritaram comigo também.
Cheguei até o quarto de Naomi e entrei antes que ela pudesse pensar em abrir a porta. A mulher de cabelos curtos e escuros me encarava confusa, suas expressões faciais mostravam a típica preocupação com a qual eu já havia me familiarizado. Naomi me analisou de cima a baixo e seus lábios se repuxaram para o canto.
— Quem você irritou dessa vez? — Naomi já não parecia mais preocupada e sim curiosa.
— Davina.
Os lábios da minha melhor amiga formaram uma linha fina para conter a gargalhada. Ótimo! Naomi acha que isso é algum tipo de piada? Davina poderia me castrar como vingança.
— Espera aí. Você cortou o cabelo?
— Cortei — ela deu de ombros — Ficou ruim?
— Está ótimo. Por que cortou?
— Quis mudar um pouco — a encarei — Também acho que esse tamanho vai servir quando tivermos que lutar.
— Lutar?
— Contra o meu pai.
Do lado de fora do corredor era possível escutar a Davina gritando com os guardas.
— Maven, Maven, Maven — Naomi estalou a língua em reprovação — Você não aprende? Tanto talento com as outras mulheres e mesmo assim ainda consegue tirar a paciência da menina. Me surpreende muito você não ter levado um murro na cara.
— Eu iria levar um. Sim. Mas não iria ser o punho dela, iria ser alguma coisa que estava na pia. Certeza que ela iria arremessar o porta escova de dentes, que por sinal é de vidro — Naomi mordeu o lábio inferior para conter a gargalhada — Isso mesmo, ache graça. Duvido que você vá achar engraçado chorar na minha cova, tenho certeza que Davina está cavando um buraco agora mesmo.
— Pare de ser um crianção bobo. Ela não teria coragem de fazer isso.
— Não subestime uma cientista maluca. E irritada.
Naomi não conseguiu conter a risada e o som de sua gargalhada correu até meus ouvidos.
— Irritada? — Ela arqueou as sobrancelhas e pegou um livro que estava na mesa ao lado da cama — Tem tantos jeitos de explicar essa irritação — Naomi folheava as páginas do livro sem ler nenhuma palavra — Já se beijaram? — De repente minhas bochechas começaram a queimar. Fiquei em silêncion — Acho que não, se não todos da comunidade já estariam sabendo, mas como você não fala comigo sobre isso desde a fazenda... Pensei que ela fosse só um lance, igual as outras.
— Ela não é como as outras — Naomi sorriu.
— É claro que não. Davina é tão inteligente quanto bonita, tem um sorriso contagiante, é intensa com o sente e ela é forte. Em todos os sentidos — Sentei na beirada da cama contente por estar conversando sobre Davina com Naomi.
– Eu vou esperar ela decidir o que quer — Comecei a cutucar os dedos e Naomi chutou minha mão. Sempre tão carinhosa. Pelo menos parei de cutucar. – Acha que ela vai me escolher, não acha?
— Vai ser o que tiver de ser. Mas sim, eu acho.
— Credo!
— O que?
— Estamos aqui tem um mês e ficamos confortáveis demais para conversar sobre amores. Se eu demorar mais Davina irá me matar por não estar trabalhando — Dei um beijo na cabeça de Naomi antes de ir até a porta.
— Maven! Se você não se casar com ela, eu caso — Assenti e fui até o laboratório, escoltado por um guarda depois de causar um tumulto, onde eu esperava encontrar uma Davina mais calma.
Dei uma volta pelos corredores durante uns dez minutos tentando evitar entrar no laboratório. Davina é um pouco temperamental. Entrei na sala fria e Davina estava analisando algumas amostras das quais ela havia falado sobre hoje de manhã. Em cima do balcão haviam folhas espalhadas e um desenho da sala cheio de anotações.
— O que é isso? — perguntei curioso esperando ela me fuzilar com o olhar.
— Jace disse que O Salvador convenceu o arquiteto e engenheiro que vivem aqui para fazer alguns ajustes na sala. Ele queria marcar uma reunião comigo — Davina ainda estava concentrada nas amostras.
– O pai da Naomi?
— Não. Jace — Davina se afastou do microscópio e fez uma breve anotação em uma folha — É óbvio que eu recusei a reunião e ele disse que tudo bem, mas eu tenho que apresentar o projeto para ele até amanhã se não eu vou ter que ir na reunião. Estou ferrada! Ah não ser que eu fique a noite inteira acordada planejando isso. Sabe, estão me chamando de pinscher raivoso por aí. — Ela parou de observar as amostras e me fuzilou com o olhar — Por acaso tem alguma ideia de onde esse apelido surgiu? — Davina abriu um sorriso diferente, um sorriso que eu nunca tinha visto nela. Um sorriso perigoso — E então?
Engoli em seco.
— É uma história engraçada... É. Eu... — Um sorriso diabólico se formou nos lábios de Davina.
— Gosta de dormir comigo, Maven? — Davina girou a cadeira para ficar de frente para mim e cruzou as pernas de uma forma absurdamente sexy.
Ela se levantou da cadeira e veio até mim devagar.
— Você não sabe o quanto.
— Bem... — Davina me puxou pela blusa para mais perto e sorriu. O sorriso perigoso. Me curvei para meu rosto ficar mais próximo do dela e ela se aproximou de minha orelha — Se mais alguém me chamar de pinscher raivoso... — Ela sussurrou em meu ouvido direito e foi em direção ao esquerdo — Vai dormir no chão do banheiro.
Davina começou a rir do meu estado antes de voltar a observar as amostras. Então ela acha o meu desespero engraçado? Pequena, idiota e incrível.
Saí do laboratório para beber água. Dei algumas voltas pelo corredor procurando por algum rosto amigo e não achei ninguém. Porcaria de horários e afazeres que colocaram para separar a gente. Estava observando as pessoas na Ala Oeste e uma menina de cabelos castanhos claros acenou e veio até mim. Ela tinha um nariz arrebitado, cintura definida e sardas por toda a extensão do seu rosto.
Já estava me preparando mentalmente para explicar para ela que embora eu seja bonito e gostoso, meu coração pertence a outra. Na verdade foi exatamente isso que eu disse e ela gargalhou com escárnio.
— Não é por isso que eu estou falando com você — Continuou gargalhando — Não gosto de garotos. — Ela finalmente parou de rir e estendeu a mão até mim para um cumprimento formal — Sou Hannah.
— Maven — Apertei a mão dela.
— Então... Soube que é o parceiro de Davina. Vou ajudar o arquiteto a planejar a obra no laboratório.
— Isso é legal.
As bochechas de Hannah coraram quando ela falou sobre Davina.
— Ela namora alguém?
— Não — Sorri — Ela está disponível.
— Não olhe agora, mas ela está vindo para cá.
Eu olhei para Davina.
Oh merda. Ela estava me olha do como se fosse me matar.
— Já estou avisando, se ela me agredir ou qualquer coisa do tipo eu vou sair correndo daqui — Hannah riu como se fosse alguma piada.
Sou um homem morto. Um belo e lindo homem morto.
— Esqueceu de mim? — Davina me olhava com a sobrancelha arqueada e queixo erguido, não pela minha altura, mas sim pelo desafio.
– Jamais.
— Oi, eu sou a Hannah.
— Oi, Hannah. – Nem parecia que ela estava quase perfurando a minha alma com o olhar momentos atrás — Meu nome é Davina. Agora trabalho no laboratório.
— Sim! Eu sei. H-ãm... Você é meio que conhecida aqui.
— Sou?
— Sim — Hannah corou — Disseram que você é inteligente, mas esqueceram de mencionar que também é linda.
Davina sorriu com o elogio.
— Você também é — Davina disse amigavelmente. Duvido que ela tenha se tocado que estava sendo cortejada — Nos vemos outra hora? Preciso conversar a sós com Maven.
— Claro, Davina. Tchau, Maven — Hannah assentiu e nos deu licença.
Davina começou a caminhar na minha frente e eu comecei a segui-la.
— Estou caminhando até o meu túmulo? — perguntei para Davina, que sequer se deu o trabalho de parar de andar.
— Não tive tempo para preparar seu túmulo ainda. Eu estava trabalhando ao invés de estar flertando com garotas — Davina vociferou ainda caminhando. Precisei morder o lábio para não rir.
— Ciúmes? — Perguntei sabendo que a carapuça iria servir. Davina parou. Ela abriu e fechou a boca várias vezes tentando dizer alguma coisa.
— De você? Não.
— Então estava com ciúmes da Hannah?
— Não.
A esperança dela ter sentimentos por mim reacendeu no meu peito.
— Então estava com ciúmes de mim.
— Olhe bem para minha cara, Maven. Eu pareço estar com ciúmes? — Ela fez de tudo para parecer indiferente.
— Sim, parece.
Ela se aproximou de mim como uma leoa faminta.
— Olhe, estou analisando amostras de infectados na esperança de tentar isolar a merda do vírus e eu preciso de ajuda. Então se prefere ficar cortejando cada menina que passa, posso procurar outro ajudante. Um que pelo menos foque na merda do trabalho, ou que pelo menos faça alguma merda para ajudar na pesquisa para tentar acabar com essa merda de desastre de mundo — Ela parou perto de mim, mas logo deu um passo para trás se afastando.
Muitos "merda" de uma vez só.
Dessa vez eu que me aproximei e ela foi recuando, chegando cada vez mais perto da parede do corredor. Ela não pode pensar em me substituir.
— Sabia que eu só cortejo você desde que te conheci? — Diminui o tom da minha voz — E você sabe que não pode me substituir, não sabe? Não vai conseguir achar alguém para me substituir simplesmente porque não quer. Olhe ao seu redor, Davina. Muitos aqui devem saber mais de Ciência do que eu. Então eu te pergunto: Por que me escolheu? — Davina bateu as costas na parede e tomou um pequeno susto.
— Posso substituir você a hora que eu quiser.
— Então não fique tão incomodada por eu ter conversado com Hannah — Sussurei em seu ouvido para que ninguém mais pudesse ouvir. Davina tinha um cheiro extremamente doce, apesar de não usar perfume. Um cheiro só dela — Admita que está com ciúmes. É só dizer que então eu volto para o laboratório para te ajudar.
— Eu te odeio.
Me segurei para não beijar seu pescoço.
— Ok! Estou com ciúmes! Agora pare com essa merda antes que eu te atire em uma lixeira e coloque fogo — Me afastei de Davina e sorri — Vamos para a merda do laboratório.
[...]
Ficamos algumas horas analisando a amostra, mas não resultou em nada. Davina jogou o tecido do infectado na lixeira de ferro e acendeu um fósforo.
Ela disse que era melhor queimar a carne para não correr o risco de contaminar alguém. Ela contou que um dos doutores no laboratório antigo tinha se contaminado assim.
Voltamos para o quarto e Davina não disse mais nada.
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