13. Dê-me sua mão, eu prometo segurar.





        Jules coloca uma xícara na frente de Bucky, café preto e sem açúcar, exatamente como ele descreveu com a voz cheia de incerteza, ainda descobrindo as coisas de que realmente gosta. Ele aceitou a xícara, mas apenas a segurou com a mão direita, a outra, sua prótese de metal, foi mantida sobre a própria perna, longe do alcance. Jules escolheu fingir não perceber isso, enquanto deslizava para a cadeira no lado oposto da ilha de mármore, na frente do homem, mas mantendo aquele um metro cuidadoso de distância entre seus corpos.

Ela sabe o suficiente sobre soldados traumatizados para entender que alguns limites precisam ser respeitados, e o espaço pessoal é definitivamente um deles. Um outro, e esse já se tornou bastante óbvio nos poucos minutos em que se reuniram, é a escassez de diálogos.

Bucky não fala muito, na verdade quase nada. Sua presença muito quieta parece quase inexistente, e foi Jules quem preencheu o silêncio desde que o encontro no apartamento, praticamente divagando sobre suas razões para ter ido atrás dele, e como eles precisavam sair de lá para um lugar mais seguro.

Ela tem quase certeza de que Bucky só estava chocado demais para dizer qualquer coisa sobre toda aquela estranha situação. Ele sacudiu a cabeça, pegou uma mochila sob as tábuas no chão, e a seguiu porta à fora sem nem questionar.

Jules estava pronta para uma argumentação calorosa, talvez até mesmo um pouco de persuasão, mas nada disso foi necessário.

Com frequência, ela se pegou olhando sobre o ombro, com medo de que o estivesse sobrecarregando com tudo aquilo, apenas para descobrir que James lhe encarava de volta, genuinamente atento a cada um de seus passos e palavras. Embora não houvesse um diálogo verbal, Jules rapidamente percebeu um padrão em suas expressões.

Havia um vinco entre suas sobrancelhas cada vez que ele se mostrava confuso sobre algo que ela havia dito; seus lábios se apertavam quando ele questionava silenciosamente; sua cabeça inclinava levemente para a direita quando ele parecia concordar com suas palavras. Julieta não precisava de uma única palavra para entender o que ele estava pensando. Funcionou assim.

Bucky nem mesmo pareceu muito surpreso quando Kurt surgiu no beco para buscá-los, quase como se aquela nem fosse a coisa mais atípica que ele já presenciou. Para seu crédito, ele estava levando aquela situação com uma tranquilidade surpreendente.

Ajudou que, assim que chegaram ao Instituto, todos estivessem em aula, então não havia ninguém nos corredores à caminho da cozinha. Jules imaginou que ele preferiria lidar com o menor número de pessoas possíveis no momento, então ela dispensou Kurt com um aceno de cabeça.

Jules cruza as pernas, puxando os joelhos contra o peito e segurando entre as mãos sua própria caneca. Café com leite morno e canela. Enquanto engole sua própria bebida quente, ela percebe a forma como Bucky inala o cheiro do café, franzindo as sobrancelhas em concentração antes de beber devagar.

Jules ri baixinho, atraindo o olhar dele que rapidamente se transforma em um brilho culpado.

Eu...

— Envenenamento não é exatamente o método que eu escolheria se decidisse matar alguém. — Ela o interrompe em um tom de diversão, e o olhar de James é como o de um cervo pego pelos faróis.

— Desculpe. — Ele enrubesce, e Jules está genuinamente surpresa. Esse homem enorme e ameaçador está ruborizando com uma piada dela, e não é nada além de adorável.

— Você está sendo cauteloso. — Ela diz tranquilamente. — Não precisa se desculpar por isso.

Bucky franze as sobrancelhas, apertando os lábios de maneira tensa, parecendo refletir com pensamentos barulhentos. Ele parece querer dizer algo, mas sem saber exatamente como o fazer.

— Não quero ser cauteloso com você. — Ele diz lentamente, sua voz rouca soando meio tensa, pouco acostumado a falar tão abertamente. — Mas não consigo evitar algumas coisas.

— Por causa da Hydra. — Jules afirma relutantemente, a voz silenciosa como a de quem conta um segredo. Em resposta, Bucky desvia o olhar, incapaz de sustentar o intenso calor dos olhos castanhos da mulher em sua frente. — Não precisa se desculpar. — Ela repete com convicção. — Pelo menos não comigo.

E suas palavras tem a reação esperada quando o rosto de Bucky se volta em sua direção, seus olhos se encontrando por um breve momento fugaz que faz sua pele se arrepiar, antes que ele deixe seu olhar cair para a xícara novamente.

— Você sabe sobre a Hydra. — Ele sussurra.

— Eu sei.

— Quanto?

— Não tenho certeza. — Ela responde, dedilhando a borda de sua xícara, uma expressão pensativa revirando seu rosto. — Às vezes parece que sei até demais, mas sempre tem algo novo surgindo de todo canto quando menos estou esperando.

Bucky aprecia sua honestidade crua, e a forma como ela não estava pisando em ovos ao seu redor como se ele não pudesse lidar com um pouco de pressão. Era um contraste gritante com a forma como ela o olhava, como se realmente fosse precioso demais para ser real.

— Eu vi você. — Bucky diz depois de um tempo bastante longo de silêncio mútuo. Jules franziu as sobrancelhas, sustentando o olhar enquanto esperava que ele formulasse uma explicação. — Quando visitei o Museu, você estava lá com seu irmão.

O rosto de Jules se iluminou com a compreensão, e ela murmurou um "oh", percebendo que Bucky tem mais a dizer e esperando até que ele faça. Não seria ela a interromper o que parecia ser um raro impulso de verbalização.

— Tudo o que vi de Bucky Barnes aparecia em memórias que eu não sabia se eram ou não reais. — Ele conta, tão baixo que mal pode ser algo além de um sussurro rouco. — Comecei a procurar tudo o que podia na internet, livros de história em bibliotecas públicas, e no Museu. — Quando James olha para baixo, parte de seu cabelo cai na frente do rosto, e Julieta contém o impulso de afastar a mecha com os dedos. Ela dedilha sua xícara para manter suas mãos ocupadas, e o escuta pacientemente. — Naquela época, eu não sabia distinguir quais das minhas memórias estavam incompletas, ou quais tinham sido deturpadas pela Hydra. Ainda não sei direito. — Ele confessa, mantendo seu olhar baixo, a voz meio quebrada no final de cada frase. — Alguns dias, é difícil separar quem eu sou como Bucky, e quem é o Soldado Invernal.

Jules pisca, meio atordoada com a quantidade de palavras ditas por ele em um espaço de tempo tão curto. Ela ainda está decidindo se o mais chocante foi seu desabafo, ou todas as emoções que Bucky despejou naquele pequeno discurso. É um progresso que ela aceita facilmente, cuidando para manter sua expressão o mais neutra possível.

Não levou mais que alguns segundos até que ela dissesse:

— Quem disse que precisa? — Bucky pisca, seus olhos finalmente encontrando os de Julieta de novo, suas sobrancelhas se apertam. — Se é tão complicado tentar separá-los, se te causa tanto transtorno, você pode parar de tentar encaixá-los em caixinhas. — Se possível, James pareceu ainda mais confuso.

— Não sei se entendi. — Ele confessa, meio hesitante.

Jules estalou a língua, uma ideia surgindo em sua mente para tornar sua explicação mais... ilustrada.

— Já sei. — Saltando de sua cadeira para o chão, ela caminhou até o armário, abrindo uma gaveta e enchendo sua mão com talheres de todos os tipos e tamanhos, antes de saltitar de volta para seu lugar e espalhar todos os objetos na bancada. James apenas observou cada passo seu, ainda mais perdido a cada segundo. — Essa é a parte de você que sente medo. — Ela segura um garfo prateado, antes de colocá-lo de volta na frente de James. — Essa é a parte de você que acorda de manhã e não sente nenhuma vontade de ser agradável com seres humanos. — Ergue uma faca de cabo preto fosco, colocando-a logo ao lado do garfo. — Essa é a parte de você que gosta de chocolate. — Sorridente, ela mostra uma colher de sobremesa, não perdendo a diversão contida que iluminou o rosto de Bucky por um momento. — Essa aqui gosta de jogos, mas não é um bom perdedor. — Mostrando uma concha de feijão, ela a posiciona junto das outras. — Essas outras, todas elas, são alguma coisa. Agora, se você divide todas elas entre as coisas do Bucky, e as coisas do Soldado, você está dizendo que existem partes suas que a Hydra colocou aí.

— Eles colocaram algo aqui...

— Eles tentaram tirar algo daí. — Jules corrigiu gentilmente, usando suas mãos para organizar, sem nenhum padrão real, os talheres na frente do homem. — Tentaram apagar quem era James Buchanan Barnes. Mas isso não aconteceu. — Ela o olha novamente, sorrindo com carinho incontido. — Todas as suas partes ainda estão aí, as partes antes de 1944, e as que ganhou nos últimos 72 anos. Você não é um ou outro. Bucky nunca deixou de existir, e o Soldado Invernal não é uma persona dividindo espaço. — Ela pegou uma colher de sopa, prateada e simples, não muito diferente do restante. — Ele é só esse pedaço, uma parte como as outras. E colocando aqui... — Jules deslizou o metal no mármore, apenas posicionando-o entre os outros, e sorriu humildemente para o olhar fixo que James tinha nos talheres. — Ele não é nada mais especial que todas as suas outras partes.

Aquela expressão, no entanto, o brilho que James tinha quando ergueu o rosto em sua direção mais uma vez, foi a primeira que Julieta não soube reconhecer imediatamente. Seu rosto parecia iluminado com algum tipo de compreensão, o reconhecimento de algo que ele não havia visto antes, e os cantos de seus lábios se contorceram em um sorriso.

Um meio sorriso.

Mas ainda um sorriso de verdade, um que fez seus olhos se encherem de alguma emoção que o fez parecer ainda mais bonito. E Jules sorriu de volta, sentindo seu coração tropeçar um pouco, uma ou duas batidas.

Ela teve a assustadora realização de que James Barnes já estava irreversivelmente aterrado em seu coração.


✦ . ・゚ .


        Barnes não é um cozinheiro habilidoso, em suas próprias palavras, mas ele é bom em toda a parte do preparo. Então Jules lhe entrega uma tábua de corte e uma faca afiada, empurrando-o para a pia e o instruindo a cortar e descascar tudo o que usariam pra fazer o almoço. A próxima coisa que ela sabe é que a cena toda se tornou uma coisa muito doméstica, perturbadoramente normal.

Depois de seu primeiro diálogo aberto e honesto, a tensão entre eles queimou como uma pilha de fósforos, reduzida a nada além de cinzas. Jules deixou seu nervosismo se dissipar em respirações lentas e sorrisos calmos, esperando que fosse o suficiente para deixar Bucky mais adepto a realmente conversar.

E pelos longos minutos em que eles apenas circularam ao redor da cozinha, trabalhando juntos em preparar uma refeição, por mais louco que fosse apenas pensar sobre isso, alguns assuntos fluíram naturalmente. Em sua maioria, era apenas Jules compartilhando sua história, respondendo a qualquer pergunta que Barnes tivesse, por mais longas e complexas que algumas explicações pudessem ser.

— Por que estudou gastronomia? — Ele questionou, alto o suficiente para soar acima de um sussurro. Jules olha sobre o ombro, apenas para encontrar Barnes concentrado em cortar os tomates em cubos simétricos.

Parando de mexer o molho bechamel, Julieta reflete sobre todas as melhores maneiras de responder à essa pergunta. Ela gosta de cozinhar porque seu pai também gostava, e essa é a história resumida. No entanto, essa é a resposta que ela rejeita, porque não parece certo deixar Bucky com explicações vagas e meias verdades.

Jules quer preencher aquele silêncio entre eles o máximo que puder, com todos os detalhes que se lembrar, e enquanto Bucky estiver disposto a lhe ouvir. Se tudo o que ele precisa é de sua honestidade, ela entregaria de bom grado.

— Quando meu pai voltou do Afeganistão, sua terapeuta recomendou que ele tivesse um hobbie. — Ela começa a contar, mexendo lentamente a colher de silicone no fundo da panela. — Ele descobriu que gostava muito de cozinhar e, mesmo quando eu era criança, era uma das coisas que mais fazíamos juntos. — O sorriso de Jules é puramente nostálgico quando ela joga um pouco de sal na mistura. — Eu não tive tempo suficiente com ele para aprender muitas coisas... — Ela desliga o fogo e alcança uma colher de sobremesa, pegando um pouco de molho antes de caminhar na direção de Barnes. — mas eu sei que escolhi gastronomia porque queria passar o resto da minha vida fazendo algo que me lembrasse alguém que eu amei muito.

James para tudo o que está fazendo, sua atenção inteiramente voltada para a mulher em sua frente, e a colher que ela lhe oferece. Separando os lábios, ele deixa que Julieta deslize a colher em sua boca, e se concentra no sabor do molho se espalhando em sua língua. É bom, muito bom, e ele não se lembra de um dia ter comido algo tão bom. Por isso ele decide perdoar a si mesmo pela óbvia expressão atordoada em seu rosto, e pelo grunhido de completa satisfação que emite.

Julieta ri, é claro, tão doce e surpresa quanto possível, e puxa a colher de volta suavemente. James não resiste em lançar a língua nos lábios para pegar qualquer resquício de molho que tenha restado.

— O segredo é noz-moscada. — Ela diz em forma de sussurro, como quem compartilha um segredo.

— Isso é incrível. — Ele diz rapidamente, e o rosto de Jules se iluminou com o elogio, rápido demais para ser casual. Instigado com sua reação, Bucky completou: — Acho que nunca provei nada tão bom antes. É como um pedacinho do céu. — A expressão no rosto de Jules era ainda mais saborosa que o próprio molho, obviamente extasiada com sua aprovação.

Céus, ele acha que poderia passar horas elogiando Julieta, se isso significava continuar vendo seu olhar derretido e o sorriso brilhante. James está completamente ciente do poder que essa mulher tem sobre ele, e é meio reconfortante para ele descobrir que também pode causar nela esse tipo de reação. Equilibra um pouco as coisas.

— Termine isso, Barnes. — Ela gesticula, apontando o trabalho de James em cortar os legumes, se afastando tão depressa que ele quase perdeu a forma como seu rosto havia corado ardentemente. — Bajular o chef não te leva a lugar nenhum. — James pode ver o perfil de seu rosto quando ela diz isso, e está satisfeito com o sorriso divertido que repuxa seus lábios.

Sim, senhora. — Ele está francamente surpreso consigo mesmo agora, e com a forma como sua voz soa descontraída, mas não consegue se impedir de sorrir da maneira mais cínica possível quando Julieta o encara com o mais chocado dos olhares.

Não importa o que qualquer um deles tenha idealizado sobre o outro, a realidade estava de mostrando ser muito melhor.






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