05. Uma tonelada de coisas estranhas.
25 de Maio, 2006
Jacob acha a coisa toda sobre lobos uma enorme inconveniência. Ou melhor, ele achava. No começo de tudo, logo depois de sua primeira transformação, ele costumava pensar em si mesmo como uma aberração da natureza, e o bando uma grande farsa disfarçada de "irmandade".
Não que tudo tenha mudado da água para o vinho de uma hora pra outra. Ele ainda acorda alguns dias amaldiçoando a própria existência. Mas está consideravelmente melhor que alguns meses atrás.
Principalmente quando Bella não está por perto.
Ele está convencido de que a ama de todo o coração, mas algumas vezes ela pode ser bem... crítica. Como quando olha pra ele e parece enxergar apenas uma criatura, um monstro que comeu vivo o garoto que ele costumava ser.
Engraçado como Bella não parece ter a mesma percepção de monstruosidade quando se trata dos sugadores de sangue que ela tanto ama.
Jacob adoraria enfiar as garras nas entranhas de cada um deles, rasgá-los de ponta a ponta e mastigar os pedaços como pedras de gelo. Ele sabe que adoraria destruir a existência patética que é Edward Cullen, e não apenas porque Bella continua o escolhendo dia após dia, mas porque é de sua natureza, o único instinto com o qual ele não quer lutar contra.
Até mesmo a noção de imprinting lhe causa certa relutância. É algo sobre a mera ideia de ser tão dependente da existência de outra pessoa, alguém que ele nem mesmo escolheu mas que será forçado a gostar e querer mais qualquer coisa no mundo. Jacob pode dizer até mesmo que despreza um pouco essa possibilidade.
Ele ama Bella Swan, ele a escolheu e deseja estar com ela, ser amado por ela. Mas ele não teve um imprinting por ela, e por isso se odeia um pouco mais a cada dia que passa.
Ou melhor, odeia sua situação.
Se o mundo fosse justo, ele e Bella estariam juntos e felizes, se amando até o fim de seus dias. Mas o mundo não é justo, e ele é um lobisomem, e a garota que ele quer está apaixonada por um sanguessuga nojento.
Os pensamentos amargos são os únicos nos quais Jacob consegue se concentrar em momentos como esse, quando deixado sozinho no silêncio. E, céus, ele descobriu que tem bastante dessas reflexões armazenadas em seu subconsciente barulhento.
"É melhor assim", Jacob pensa "que a maior parte de sua hostilidade esteja apenas em pensamentos, porque ele não sabe do que seria capaz se realmente tivesse a oportunidade de enfiar suas garras em..."
O, facilmente reconhecível, som ensurdecedor de um motor corta a, perigosa, linha de raciocínio de Jacob. Ele pisca com força enquanto volta a si, só então percebendo a força com a qual aperta a chave de fenda em suas mãos. Largando a ferramenta na mesa à sua esquerda, ele deixa tudo o que está fazendo e corre para fora da oficina, sua mente nublada por apenas um pensamento:
Bella está aqui.
— Bella?
— Hey, Jake! — Ela acenou, desligando o motor da caminhonete.
— Bella! — Ele gritou de volta, abrindo um sorriso tão largo e brilhante quanto o sol que surgia por entre as nuvens para, raramente, agraciar a população de Forks com sua luz e calor. — Eu não acredito que está realmente aqui.
Jacob corre para a caminhonete e praticamente que arranca Bella pela porta aberta, abraçando-a enquanto os dois pulam pra cima e pra baixo feito crianças. Então ele a agarra em um abraço de urso apertado demais para deixá-la respirar e a gira em círculo.
— Não consigo... respirar! — Bella ofegou.
Ele ri e a coloca no chão.
— Bem-vinda, Bella. — Jacob disse, rindo de uma maneira que poderia aquecer o coração mais congelado. E o jeito como ele disse essas palavras fez com que ela se sentisse verdadeiramente acolhida.
Bella sente que tem sorte em tê-lo, de uma forma diferente de como se sente sobre Edward, é claro. Jacob é seu melhor amigo e nada poderia mudar o relacionamento deles.
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A alegria de Jacob em ver Bella resistiu apenas aos primeiros tópicos de sua conversa: como estavam indo, o que faziam, e o que a havia levado até ali. E então, inevitavelmente, eles tiveram que começar a falar sobre os motivos por trás de sua longa separação, e Bella observou o rosto de seu amigo endurecer até se transformar naquela máscara ácida com a qual ela já estava bem familiarizada.
— Qual é a história, afinal? — Jacob perguntou, chutando um pedaço de graveto fora do seu caminho com força demais. Ele viajou pela areia e depois se espatifou nas rochas. — Quer dizer, da última vez que nós... bem, antes de, você sabe... — Lutando para encontrar as palavras certas, Jacob respirou fundo e tentou de novo: — O que eu estou perguntando é... tudo está de volta a ser como era antes dele ir embora? Você perdoou ele por aquilo tudo?
Bella respirou fundo, resignada. Em sua concepção não havia nada para ser perdoado. Ela passou por tudo isso, entendeu as razões de Edward, e gostaria apenas de esquecer todo o resto.
— Eu queria que Sam tivesse tirado uma foto quando ele te encontrou naquela noite em Setembro. — O rosto de Jacob enrugou, a familiar amargura picando no fundo de sua boca. — Ela seria a prova A.
— Ninguém está em julgamento.
— Talvez alguém devesse estar. — Ele retrucou com sarcasmo.
— Você não o culparia por ir embora se soubesse as razões dele pra ir embora.
Jacob parou em seus rastros, girando para encarar Bella por alguns segundos que pareceram uma eternidade.
— Tudo bem. — Ele a desafiou acidamente. — Me surpreenda.
A hostilidade de Jacob não era algo com o qual Bella estivesse muito contente em lidar, mas já se tornou tão frequente que estava apenas lhe cansando. Ela sente falta de quando ele era apenas doce e gentil, incapaz de dizer algo propositalmente rude.
Mas agora, parecia que ela estava constantemente deixando-o irritado.
— Edward me deixou porque ele não achava que eu devia estar andando com vampiros. Ele achou que seria mais saudável pra mim se ele fosse embora.
Jacob engoliu à seco aquela declaração que, francamente, tinha um gosto de vinagre. Ele teve que pensar por um minuto, porque não queria dizer algo impulsivo e dar a Bella a ideia errada de que ele concorda com Edward Cullen. Ninguém nunca vai ouvi-lo dizer em voz alta que, sim, ele achou essa uma atitude correta da parte do sugador de sangue.
No entanto, Jacob ainda não se sente indigno o suficiente pra elogiar um vampiro.
— Ainda assim, ele voltou, não voltou? — Jacob murmurou com desgosto. — Que pena que ele não pode sustentar uma decisão.
— Se você se lembra, eu fui e busquei ele.
Jacob a olhou por um momento, e depois desistiu. O rosto dele relaxando, e sua voz estava mais calma quando ele falou:
— Isso é verdade. — Bella crispou os lábios em um sorriso apertado, levemente orgulhosa. — Eu nunca ouvi a história. O que aconteceu? — Ela hesitou, mordendo o lábio. — É um segredo? — A voz dele tomou um tom de zombaria. — Você não tem permissão pra me contar?
— Não. — Ela disparou. — Só que é uma história muito longa.
Jacob sorriu, arrogante.
— Eu não me importo com histórias longas. Tem ação?
Bella revirou os olhos.
— Tem um pouco de ação. — Ela admitiu.
— Não seria uma história de terror se não tivesse ação. — Jacob comentou.
— Terror! — Bella repreende. —Você pode ouvir, ou vai ficar me interrompendo com comentários rudes sobre os meus amigos?
Jacob fingiu trancar os lábios e depois jogou a chave invisível por cima do ombro.
Bella tentou não sorrir, e falhou.
— Bem, certo, só preciso pensar por onde começar.
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— Você está bem, Jake? Charlie disse que você está passando por um momento difícil... — Bella comentou inesperadamente enquanto os dois caminhavam pela praia deserta de La Push. — Isso não tá melhorando?
— Não é tão ruim. — Ele disse, mas não a olhou nos olhos.
Jacob olhou para qualquer lugar, menos pra ela, e Bella se perguntou se isso era para que ele pudesse esconder sua dor com mais facilidade.
Ela começou a tagarelar para acabar com o silêncio.
— Já faz tanto tempo desde que eu estive aqui. Eu provavelmente perdi uma tonelada de coisas. Como estão Sam e Emily? E Embry? E Quil?
— Ah, Quil. — Jacob suspirou. — Quil se juntou ao bando.
— Eu lamento. — Bella murmurou.
Para sua surpresa, Jacob bufou uma risada.
— Não diga isso a ele.
— Como assim?
— Quil não está procurando por pena. — Jacob explica. — Pelo contrário, ele está simplesmente louco de felicidade. Quil acha que isso é a coisa mais legal que já aconteceu com ele. Agora ele já sabe o que está realmente acontecendo, e está feliz por ter os amigos de volta, por ser parte "do grupo". — Jacob bufou de novo. — Eu não devia estar surpreso, eu acho. Isso é tão Quil.
Esse conceito não fez nenhum sentido para Bella. Todos os outros lobos tinham estado tão deprimidos com a ideia, que a mera noção de um deles estar contente a deixou abismada.
— Ele gosta disso?
Jacob não pôde evitar o leve encolher de seus ombros ao detectar o tom de crítica na voz de Bella, algo que já era bastante comum vindo dela quando se tratava dos lobos.
— Honestamente... a maioria gosta. — Jacob admitiu lentamente, omitindo a si mesmo propositalmente. Ele não se sentiu confortável em contar a Bella que estava quase gostando de ser um lobo. — Definitivamente têm lados bons nisso... a velocidade, a liberdade, a força... a sensação de família... Sam e eu somos os únicos que se sentem mal. E Sam já superou isso há muito tempo. Então agora eu sou o bebê chorão. — Jacob riu de si mesmo.
Bella franziu o rosto.
— Porque você e Sam são diferentes? O que aconteceu com Sam, afinal? Qual é o problema dele? — As perguntas iam escapando sem dar tempo pra uma resposta, e Jacob riu de novo.
— Essa é uma longa história.
— Eu te contei uma longa história. Além do mais, eu não estou com pressa. — Bella disse.
— Existe tanta coisa estranha sobre essa nova vida, e eu não tive tempo pra te contar nem a metade. E essa coisa com Sam, bem, eu não sei se serei capaz de explicar direito.
— Eu estou ouvindo. — Bella disse em forma de incentivo, as palavras de Jacob eriçando sua curiosidade cada vez mais.
Jacob suspirou, olhando para o horizonte com uma expressão aborrecida.
— Sam e eu sofremos muito mais com isso do que os outros, porque ele foi o primeiro e estava sozinho, e ele não tinha ninguém pra lhe explicar o que estava acontecendo. O avô de Sam morreu antes que ele tivesse nascido, e o pai dele nunca esteve por perto. Não havia niguém lá pra reconhecer os sinais. — Jacob estremeceu, pensando em como teria sido para si mesmo passar por tudo aquilo sem seu pai ou a matilha. — Na primeira vez que aconteceu, a primeira vez que ele se transformou, ele pensou que tinha enlouquecido. Ele levou duas semanas pra se acalmar o suficiente pra voltar ao normal. Isso foi antes de você vir a Forks, então você não poderia lembrar. A mãe de Sam e Leah Clearwater fizeram os guardas da floresta procurar ele, a polícia. As pessoas pensaram que ele tinha sofrido um acidente ou algo assim...
— Leah? — Bella perguntou, surpresa.
A voz de Jacob mudou, ficou mais pesada.
— É. Leah e Sam eram namorados na escola. Eles começaram a namorar quando ela ainda era caloura. Ela ficou frenética quando ele desapareceu.
—- Mas Sam e Emily...
—- Eu vou chegar lá, isso é parte da história. — Jacob disse. Ele inalou lentamente, e exalou com força. — Sam voltou, mas ele não disse a ninguém onde havia estado. Os rumores começaram a aparecer, e em grande parte não era nada de bom. — Jacob disse. — E então o velho Quil Ateara veio visitar a Sra. Uley. Sam e ele deram um aperto de mão e o velho Quil quase teve um derrame. — Jacob parou pra rir um pouco, como se ideia fosse inacreditavelmente divertida.
— Por que?
Jacob colocou a mão na de Bella, a palma dele queimando sua pele como se fosse feito de brasas.
— Sam estava com a temperatura alta. — Jacob riu de novo. — Parecia que ele tinha colocado a mão do velho Quil no fogão.
Bella afastou suas mãos, o mais casualmente que pôde para não magoar os sentimentos dele. Jacob sorriu rigidamente, sem se deixar enganar com a tentativa da garota de ser gentil.
— Então o Sr. Ateara foi até os anciões. — Jacob continuou. — Eles eram os únicos que haviam restado que ainda sabiam, ainda lembravam. O Sr. Ateara, Billy e Harry realmente haviam visto seus avôs se tranformando. Quando o velho Quil os contou, eles se encontraram com Sam secretamente e explicaram. Foi mais fácil quando ele entendeu, quando ele não estava mais sozinho. Eles sabiam que ele não seria o único a ser afetado pela volta dos Cullen... — Ele pronunciou o nome com uma acidez incosciente. — mas ninguém mais era velho o suficiente. Então Sam esperou até que o resto de nós se juntasse a ele...
— Os Cullen não tinham idéia. — Bella diss em um sussurro. — Eles não sabiam que os lobisomens ainda existiam aqui. Eles não sabiam que vir aqui faria com que vocês mudassem.
— Isso não muda o fato de que fez. — Jacob rebate o comentário, sentindo sua raiva borbulhar através da necessidade que Bella tinha em defender aquelas aberrações.
— Me lembre de não mexer com o seu lado ruim.
— Você acha que eu devia perdoá-los como você? — Ele provocou, incapaz de se conter.
— Cresça, Jacob.
— Eu queria poder. — Murmurou baixinho.
Bella o encarou, tentando entender o significado oculto por trás de suas palavras.
— O que?
Jacob riu, realmente riu dessa vez, como se a ingenuidade de Bella o divertisse.
— Uma daquelas muitas coisas estranhas que eu mencionei antes.
— Você... não pode... crescer? — Bella perguntou, parecendo repentinamente vazia. — Você o que? Não vai... envelhecer? Isso é uma piada?
— Eu gostaria que fosse.
Jacob olhou no rosto de Bella, assistindo o momento exato em que o sangue drenou de seu rosto e lágrima encheram seus olhos. Os dentes dela rangeram com o aperto de sua mandíbula.
— Bella? O que foi que eu disse?
Ela estava de pé ali, em sua frente, a mesma de cinco segundo atrás, mas parecendo mais diferente do que ele jamais viu. Suas mãos eram bolas nos meus pulsos, e seu corpo estava tremendo.
Era raiva, Bella estava com muita raiva.
Mas do quê?
— Você não vai envelhecer. — Bella rugiu por entre os dentes.
Jacob alcançou seu braço gentilmente, tentando acalmá-la.
— Bella, nenhum de nós vai. Qual é o problema?
— Eu sou a única que tem que ficar velha? Eu estou ficando mais velha a cada maldito dia! — Ela praticamente gritou, jogando as mãos pra o ar. — Droga! Que espécie de mundo é esse? Onde está a justiça?
— Pega leve, Bella.
— Cala a boca, Jacob. Só cala a boca! É tão injusto!
— Você acabou de bater o pé? Eu pensei que as garotas só faziam isso nos filmes. — Jacob zombou. Bella o fuzilou com olhos chorosos. — Não é tão ruim quanto você pensa. Sente e eu vou explicar.
— Eu vou ficar de pé.
— Tá certo. — Ele revirou os olhos. — O que você quiser. Mas escute, eu vou envelhecer... algum dia.
—- Explique. — Bella exigiu em um tom de voz que faz Jacob querer rolar os olhos outra vez.
— Quando nós pararmos de nos transformar por uma sólida quantidade de tempo, nós envelheceremos de novo. Não é fácil. — Ele balançou a cabeça, abruptamente duvidoso. — Vai levar bastante tempo para aprender esse tipo de restrição, eu acho. Sam ainda nem chegou lá. É claro que não ajuda o fato de que há um enorme grupo de vampiros por perto. Nós não podemos nem pensar em desistir enquanto a tribo precisar de protetores. Mas você não devia ficar louca por causa disso, de qualquer forma, porque eu já sou mais velho de que você, fisicamente, pelo menos.
— Do que é que você está falando?
— Olha pra mim, Bells. Você acha que eu pareço ter dezesseis?
Ela olhou, exatamente como ele pediu.
— Não exatamente, eu acho.
— Nem um pouco. Porque nós atingimos a maturidade máxima dentro de alguns meses quando o gene lobisomem é ativado. É um tremendo período de crescimento. — Ele torce o rosto em uma espécie de careta. — Fisicamente, eu provavelmente tenho vinte e cinco ou coisa parecida. Então você não precisa se preocupar em ser mais velha do que eu por pelo menos sete anos.
Bella franze o rosto, ainda olhando Jacob com uma espécie de contemplação, e então acena com a cabeça, parecendo satisfeita.
— Então, você quer ouvir sobre Sam, ou você quer gritar mais comigo por coisas que estão fora do meu controle?
Bella respira fundo.
— Desculpa. Idade é um assunto complicado pra mim.
Jacob estreita os olhos, decidindo se era melhor deixar aquele assunto de lado por enquanto. Ele não queria falar sobre as coisas realmente complicadas para Bella e arriscar ficar mais algumas semanas sem conseguir vê-la.
— Então, quando Sam entendeu o que estava acontecendo, quando ele tinha Billy e Harry e o Sr. Ateara, tudo estava meio que bem. Na maior parte, a vida dele estava, bem, não normal, mas melhor. — A expressão de Jacob endureceu, um breve indício de que algo muito doloroso estava prestes a ser dito. — Sam não podia contar a Leah. Nós não devemos contar a ninguém que não deva saber. E não era muito seguro ele estar perto dela, mas ele o fez assim mesmo, exatamente como eu fiz com você. Leah ficou furiosa por ele não contá-la o que estava acontecendo, onde ele havia estado, onde ele esteve a noite inteira, porque ele estava sempre tão exausto, mas eles estavam fazendo dar certo. Eles estavam tentando. Eles realmente se amavam.
— Ela descobriu? Foi isso que aconteceu?
Jacob balançou a cabeça.
— Não, esse não foi o problema. A prima dela, Emily Young, veio da reserva de Makah pra fazer uma visita a ela num fim de semana.
Bella engasgou.
— Emily é prima de Leah?
— Prima de segundo grau. No entanto, elas são próximas. — Eram próximas, Jacob se corrigiu mentalmente. — Elas eram como irmãs quando eram crianças.
— Isso é... horrível. Como Sam pôde...? — Bella parou, balançando minha cabeça.
— Não o julgue ainda. — Jacob pediu. — Alguém já te disse... você já ouviu falar do imprinting?
— Imprinting? — Bella repetiu a palavra estranha. — Não. O que significa?
— É uma daquelas coisas estranhas com as quais eu tenho que lidar. — Jacob suspira em desconforto. — Isso não acontece com todo mundo. Na verdade, eu acho que é uma rara excessão, não uma regra. — Ele sabe que está tagarelando, protelando para não ter que chegar na parte realmente desagradável. — Até aquele momento, Sam já havia ouvido todas as histórias, as histórias que todos nós costumávamos pensar que eram lendas. Ele ouviu sobre o imprinting, mas ele nunca sonhou que...
— O que é? — Bella instigou.
Os olhos de Jacob se fixaram em um ponto distante, longe do alcance de Bella.
— Sam amava Leah. Mas quando ele viu Emily, isso não importou mais. As vezes... nós não sabemos exatamente porque... nós encontramos as nossas parceiras assim. — Os olhos dele desviaram dos de Bella, o rosto ficando vermelho. — Eu quero dizer... as nossas almas gêmeas.
— Que jeito? Amor à primeira vista? — Bella riu silenciosamente.
Jacob não estava rindo. Os olhos dele estavam criticando a reação de Bella, que encolheu um pouco os ombros. Era a primeira vez que ela estava no lado oposto do julgamento, e não foi muito agradável.
— Isso é um pouco mais poderoso do que isso. Mais absoluto.
— Desculpa. — Ela murmurou. — Você está falando sério, não está?
— É, eu estou.
— Amor à primeira vista? Mas mais poderoso? — Sua voz soava duvidosa, e Jacob podia reconhecer isso facilmente.
— Não é fácil explicar. De qualquer forma, não importa. — Ele levantou os ombros indiferentemente, mas era óbvio que importava, sim, de alguma forma que Bella não podia entender. — Você queria saber o que aconteceu com Sam pra fazê-lo odiar os vampiros por fazer ele mudar, pra fazê-lo odiar a si mesmo. E foi isso que aconteceu. Ele partiu o coração de Leah. Ele teve que voltar atrás em todas as promessas que havia feito a ela. Todos os dias ele tem que ver a acusação nos olhos dela, e saber que ela está certa.
Ele parou de falar abruptamente, como se tivesse dito alguma coisa que não deveria. Bella, no entanto, não prestou atenção nisso, seus próprios pensamentos oscilando perigosamente em uma direção que ela costumava evitar.
Sam e Leah se amavam, e então Emily chegou e tudo mudou.
Edward e Ashlyn se amavam, e então Bella chegou e tudo mudou.
A ironia nessa semelhança trouxe um gosto azedo para a boca de Bella. Ela ainda se lembra de seu primeiro dia de aulas, o momento exato em que os Cullen entram no refeitório e ela se deparou com Edward Cullen em toda sua perfeição imortal, sua mera existência fazendo o mundo dela virar de ponta-cabeça.
E Bella se lembra dela, Ashlyn Cullen, a mão entrelaçada com a de Edward e um sorriso estonteante iluminando seu rosto.
E ali está, o pensamento que ela tem evitado desde que retornou da Flórida há cinco dias. Ashlyn Cullen, a mulher com quem Edward dividiu quatro décadas de sua imortalidade, está de volta à cidade.
— Que cara é essa, Bella? — Jacob perguntou, as sobrancelhas arqueadas. — Parece ter visto um fantasma.
Ele não está totalmente errado.
A mera lembrança de um vislumbre de Ashlyn Cullen costumava assombrar Bella e acender até mesmos suas inseguranças mais profundas. Mas agora seu fantasma é palpável, e está mais perto do alcance do que ela jamais desejou.
Bella mordeu o lábio em conflito. Aquele assunto em específico era pessoal demais, para mais de uma pessoa além dela. Mas, ao mesmo tempo, ela sentia que precisava desabafar com alguém que pudesse lhe entender.
Ela decide então começar pelo mais simples.
— Jake, você sabe que na verdade tem oito dos Cullen, certo?
Jacob pisca, parecendo fazer as contas silenciosamente em sua cabeça.
— Oito? — Ele repete, confuso.
— Edward, Alice, Jasper, Carlisle, Esme, Emmett, Rosalie e Ashlyn. — Bella enumera, enfatizando o último nome de maneira sugestiva. Ela assiste enquanto toda a postura de Jacob se revira em uma espécie de confusão quase divertida.
— Você nunca falou de nenhuma Ashlyn, ninguém nunca falou de nenhuma Ashlyn. — Jacob estremeceu, o nome lhe causando uma estranha sensação de desconforto. — Quem é Ashlyn?
— Essa é a parte complicada. — Bella murmurou. — Ela e Edward eram casados.
O queixou de Jacob despenca, seu rosto parecendo perplexo enquanto ele a encara como se tivesse crescido uma segunda cabeça em seu ombro.
— É o quê?
Bella suspirou longamente, evitando seu olhar enquanto elabora a melhor explicação que pode.
— Foi transformada quando os Cullen a salvaram de um acidente em 1936, quando ela tinha dezessete anos. Carlisle e Esme a adotaram também, como a todos os outros, mas ela e Edward só se casaram quase duas décadas depois, e ficaram juntos até pouco mais de um ano atrás. — Jacob ainda a está encarando com algo irreconhecível em sua expressão, completamente em silêncio de uma forma que faz o ar parecer cada vez mais denso e pesado. Bella bufou. — Pode parar de me olhar assim?
— Assim como?
— Jacob, eu não acabei com o relacionamento deles, tá legal? — Ela praticamente gritou, recusando-se a sentir culpa por algo que não fez. — Tudo o que eu fiz foi chegar aqui, e então eles perceberam que não deviam estar juntos, que não era certo.
— O quê? Como se você e ele fossem feitos um pro outro? — Jacob não pôde evitar a pitada de veneno em sua voz. — Ele acabou um relacionamento de quarenta anos por você e está me dizendo que não vê nenhum problema nisso? Não passa pela sua cabeça que algum dia ele pode decidir que vocês dois também não são certos um pro outro?
Certo, nesse ponto Jacob admite que está sendo muito hostil, mas ele não podia evitar, está literalmente em sua natureza antagonizar os vampiros. E, honestamente, ele sente muito mais antipatia por Edward agora do que já sentia antes, e nem sabe o porquê.
— Não, claro que não! — Bella praticamente rosnou as palavras. — Edward nunca faria isso.
— Sério? — Jacob perguntou, a voz carregada de sarcasmo. — Por que não perguntamos a essa tal de Ashlyn? Acho que ela tem uma opinião bem diferente da sua.
— Por que tá me atacando assim? — Ela sussurrou com uma respiração cortada. — Você sabe que eu nunca faria uma coisa horrível como destruir um casamento.
— Pode até ser que não. — Jacob balançou a cabeça, os olhos queimando em uma ferocidade selvagem. — Mas e quanto a ele? Ele deixou a esposa por você, ele já te deixou pra trás uma vez... será que ele é capaz de ser leal a alguma coisa, Bella?
Bella congelou, sem palavras. Isso não é o que ela esperava quando decidiu contar a ele. Jacob se aproveita da falta de reação de Bella e gira nos calcanhares, caminhando para longe com passadas rápidas que ela não seria capaz de alcançar.
— Jacob! — Ela gritou, mas mesmo que ele possa lhe ouvir a longas distâncias, não adianta mais.
Jacob não olha para trás quando se embrenha na mata e desaparece entre as árvores, o ruído de seu coração acelerado abafando o som da voz de Bella.
Longe dela, aquela massa enevoada e confusa de dissipa de seus pensamentos, e ele pode finalmente pensar, e sentir, com clareza. E ele está, outra vez, com muita raiva.
Cullen, os malditos Cullen, toda maldita vez.
Agora ele tem um novo nome, sem um rosto, para amaldiçoar em seu subconsciente. Ashlyn Cullen. Jacob não a conhece, mas só pode desejar, do fundo de seu coração, que algum dia ela volte e arraste Edward Cullen consigo pra bem longe de Bella.
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