𝐓𝐇𝐄 𝐎𝐓𝐇𝐄𝐑 𝐖𝐎𝐌𝐀𝐍
5 anos atrás, 1915.
— Pai... Será que podemos dar uma pausa?
A pequena frase saiu com muita dificuldade de sua boca. Você estava exausta, começou a treinar desde o primeiro assobio de um bem-te-vi, e, visto que agora olhava para o horizonte e via o sol dando resquícios de que iria se pôr a alguns instantes, você deduziu que já estava ali a horas.
O gosto amargo de sangue já dava sinais em sua boca, junto com a sequidão e leves rachaduras começando a se formar nos lábios. Suas pernas já quase não paravam mais em pé, tremiam tanto que se manter com os pés firmes no chão estavam se tornando uma tarefa árdua. Sentia o coração palpitar tão rápido pelo peito que jurava que ele poderia simplesmente saltar pela sua boca a qualquer instante.
Você não estava aguentando mais.
— Pausa? Você por acaso ficou louca? - você viu o mais velho se aproximar, e tratou de ajeitar a postura, o que fez com dificuldade por conta das dores musculares presentes em seu corpo — Kunoichis não param, [Nome]. Se fosse num campo de batalha, você provavelmente estaria morta - ele respirou fundo — Hmph, o pai Hinatsuru me falou que a filha dele é a melhor da classe, e que até mesmo já foi convocada para uma missão de nível C. Você poderia ser como ela, [Nome], quem sabe aí eu poderia pensar nessa sua.... pausa.
Sentiu os olhos arderem diante das falas duras do pai, e não demorou muito tempo para que apenas uma lágrima solitária escorresse pela sua face. Não sabia o porquê daquilo doer tanto ainda.
Segurou firmemente a kunai que estava em uma das mãos e com a outra livre, limpou o rastro molhado que havia em seu rosto, respirando fundo para que toda a ardência nos olhos fossem embora dali o mais rápido possível. Olhou para uma árvore, mais precisamente no alvo vermelho centralizado, que se encontrava a poucos metros de distância. Revezava o olhar entre a kunai e o alvo, até que uma ideia surgiu em sua mente.
Por quê não lançá-la?
O seguinte pensamento pairou por uns breves segundos, até ter a atenção levada para a voz de sua mãe, que exclamava da porta chamando você e seu pai para jantar. Observou a figura masculina te encarando firmemente, como se esperasse você fazer o que iria antes de ser chamada.
Por um pequeno momento, um sentimento amargo surgiu dentro de você, não estava entendendo o que estava acontecendo até olhar para seu pai. Era como se um estalo tivesse ecoado dentro de si e fizesse você cair na real. Poxa, você estava exausta, com o corpo dolorido em todos os lugares possíveis e ainda tinha que aturar as comparações vindo de seu pai?
"Hm, sorte dele que eu quero me tornar uma kunoichi. Se fosse o contrário..." sorriu pequeno quando essa frase veio à mente.
Apertou o cabo da kunai na mão e suspirou. Deu uma última olhada para a imagem vermelha no tronco, e mirando com apenas um olho, ajeitou o que tinha que ajeitar na postura e se preparou para calar a boca de seu pai com classe. Poderia muito bem apelar usando sua primeira forma na respiração do fogo, mas decidiu se controlar.
Tudo aconteceu num piscar de olhos. Foi simplesmente um lançamento perfeito. A precisão, força e velocidade foram milimetricamente calculadas para que a kunai fosse diretamente, num traçado reto, de encontro com o pequeno alvo vermelho. Até mesmo uma faísca pode ser avistada vindo do ponto mais afiado da lâmina.
Seu pai assistiu o lançamento atentamente, prestando o máximo de atenção em cada movimento feito por você, sem gestos ou falas, apenas ficou parado te observando. Claro que para ele poderia ter sido melhor, já que para ele, você cometeu uma série de erros - e que devem ser da cabeça dele, provavelmente.
Assim que entraram, você foi sorridente para Yasu, sua irmã mais velha, contar sobre a sua mais nova conquista. Pode parecer coisa pequena, mas para você, com quinze anos de idade, ter feito um lançamento tão limpo e ainda sem usar nenhuma respiração, com certeza era algo enorme.
— Fico feliz por isso, [Nome] - disse num tom de ternura — Contou para a mãe?
— Ah Yasu, ela ficou conversando com o pai... Quando estivermos sentados à mesa, eu falo - sorriu pequeno.
— Está certo, então. Agora vá se lavar para comer!
Você não perdeu tempo e foi direto para a casa de banho. Se despiu e se banhou rapidamente, sentindo as costas pegarem fogo quando entravam em contato com a água por conta dos cortes recém feitos. Saiu do ofurô e se secou, vestindo roupas limpas e se perfumando levemente.
Quando chegou à cozinha, avistou todos sentados e você fez o mesmo quando mais perto.
— Mãe, a senhora nem sabe... Fiz um lançamento perfeito hoje! E nem precisei usar a primeira forma.
— Sério?! Isso é ótimo, minha filha. Você será uma kunoichi e tanto!
Um afago gostoso surgiu em sua cabeça vindo de sua mãe. Era um gesto bobo, mas por um minúsculo instante, parecia existir apenas você e ela, aproveitando a companhia uma da outra, com ela sanando suas mágoas de modo que apenas a mais velha saberia.
Mas tudo o que é bom, dura pouco.
— Você acha mesmo que ela será uma kunoichi e tanto? - a voz de seu pai se fez presente — Essa menina está perdida, é uma preguiçosa que não quer nada com a vida. Passamos horas treinando e não obtenho nenhum resultado com ela! - bebericou um pouco do chá — [Nome] só me dá nos nervos, será uma péssima ninja e com certeza, trará vergonha à família Rengoku.
— Querido...
— Agora não! - disse alterado, quase jogando os hashis no meio da mesa — Você sabia, Ume, que a Hinatsuru já está sendo convocada para missão de nível C? Agora me pergunte se a nossa filha foi chamada para alguma? Hm? Não!
Por um instante, o silêncio se estabeleceu no local. Você desejou que esse silêncio permanecesse até o dia seguinte, não aguentava mais escutar uma mísera palavra sequer vinda de seu pai. Os discursos eram proclamados todos os dias, de formas diferentes e com nomes diferentes.
Sem dar um aviso prévio, você levantou abruptamente da mesa e foi direto para o quarto. Fechou a porta e barrou ela com um baú qualquer que havia, e para fazer mais peso, deixou que seu corpo pesar até entrar em contato com o chão, encostando as costas na superfície amadeirada do baú.
Deixou a cabeça apoiada nos antebraços, que estavam sendo segurados pelos joelhos, escondeu o rosto e se permitiu chorar, colocar para fora o que queria desde mais cedo. As lágrimas escorriam carregadas de ódio, tristeza, culpa e angústia. Era uma incógnita o porquê dele fazer isso, você realmente não entendia. Não via ele tratando Yasu assim, ou pelo menos não se lembrava. Uma série de perguntas vagavam pela sua mente, perguntas que, talvez, não poderiam ser respondidas.
Por que ele não é igual aos outros pais?
Ele age somente assim comigo?
Será se a culpa é minha?
Por que ele insiste em me comparar tanto às outras meninas?
Comparar...
Comparações eram praticamente - e infelizmente - muito comuns em seu dia a dia. Frases do tipo "filha de tal pessoa já está num ranking a mais que o seu" ou "se esforce para ser a melhor" e entre várias outras, eram ditas como uma espécie de motivação, ou pelo menos era isso que seu pai pensava que seria.
E de fato ele não estava tão errado.
Serviu como motivação, por mais pequena que fosse, era o suficiente para lhe fazer correr ainda mais para conquistar as pequenas vitórias que ocorriam em seu dia a dia. Porém, ela também vinha carregada de auto-cobranças. As marcas em suas costas simbolizavam cada falha, cada derrota que você obtinha. Para cada uma delas, um corte era feito por você mesma em suas costas. Uns mais superficiais e outros mais profundos.
Era doloroso, mas serviam como uma válvula de escape para não ter que surtar com seu pai, já que problemas com raiva também eram quase rotineiros em casa. O auto castigo vinha como uma forma de controlar sua raiva pelo mais velho. Além de ser seu pai, ele também é um ex-hashira, tomava o máximo de cuidado que podia para ele não achar que você o desrespeitou ou algo do tipo, visto que o abuso de poder vindo dele era algo muito, mas muito comum de ser visto e ouvido.
Você estava farta disso. Das humilhações, comparações e abusos psicológicos que seu pai fazia. Era muita coisa para ser digerida e você infelizmente sabia como resolver isso, iria ser algo penoso, mas necessário, ao seu ver. Seria um ponto final.
Pegou somente o que era fundamental para ti, algumas mudas de roupas e claro, sua belíssima katana de cabo avermelhado e de fio extremamente afiado, que deu um leve feixe de fogo quando em contato com suas mãos. Sentiu um leve arrepio correr pelo braço, como se a katana em mãos quisesse dizer que você estava fazendo a coisa certa.
Antes de sair pela janela,escreveu um bilhete. Não colocou nada demais, apenas disse que iria ficar bem. Acrescentou que um dia poderia voltar, mas não por ora, estava cansada demais de certas coisas e seria melhor para todos assim. Dobrou a cartilha e a deixou em cima da penteadeira. Por fim, deixou algo a mais para sua mãe e Yasu, não seria justo com elas, e mereciam uma explicação plausível.
"Mãe e Yasu,
Peço desculpas por ter saído de maneira tão rebelde. Vocês, que me deram tanto amor na qual eu sou tão grata, não mereciam algo assim.
Mas eu estou farta das falas injustas de meu pai. É muito para mim e... bem, nas falas dele mesmo, eu sou fraca e tola para saber lidar com ele.
Pode ser que eu volte num futuro distante, ou pode ser que eu fique por lá. Pensei em ficar Distrito do Entretenimento, com certeza acharei algo para mim por lá. Quem sabe até um amor, hm? Tanto a senhora, quanto Yasu brincam falando que preciso de alguém... Vai que, né?
Eu amo vocês, não se esqueçam disso.
— [Nome]."
5 anos depois, 1920.
Mais uma noite havia chegado, e junto dela, o desgaste físico. Sentia falta dos tempos de kunoichi, eram brincadeira de criança perto das missões que um tsuguko tem de realizar. Nunca iria imaginar que teria um cargo tão importante na sociedade de exterminadores de onis, mas se está nele, significa que faz seu trabalho muito bem feito.
Estranhou o fato de que ele não estava em casa. Procurou em suas memórias algum momento onde ele citou que teria sido escalado para alguma missão, mas não achou nada. Refrescou a mente e lembrou de um certo instante onde mostrava você e Sanemi discutiram feio na hora da janta. Ele saiu emburrado depois disso e desde então, não retornou.
Não se importou com isso, acontecia toda hora e no final, ele sempre acabava voltando.
Retornou sua atenção para o que ia fazer e seguiu até um cômodo específico da casa para guardar os armamentos. Deixou lá as kunais, shurikens e claro, sua katana, que tinha um lugar específico para guardá-la.
Em seguida foi direto para o banheiro, onde preparou o ofurô com água quente e algumas flores de camomila, ficou lá por um bom tempo, até a água começar a esfriar. Saiu da pequena banheira e antes de se vestir, passou um unguento feito Shinobu nas feridas que estavam abertas pelo corpo. Tinha uma curiosidade muito grande em saber como a Kocho conseguia produzir um remédio que tinha um efeito tão eficaz. Enrolou uma faixa por cima do medicamento e por fim se vestiu.
Vozes familiares vinham da parte de trás da casa, se tratando de Sanemi e alguma serviçal de Ubuyashiki. Pelo tom de voz do platinado, ele parecia irritado, provavelmente havia passado por um dia ruim e acabou descontando na primeira pessoa que viu pela frente.
Pensou em ir apartar Sanemi, mas mudou de ideia quando o viu vindo em direção a residência. Entrou batendo os pés, os passos largos e fortes dados pelo platinado ecoavam no chão de madeira, mostrando a braveza que ele sentia naquele momento. Sem nem olhar para sua cara, o Shinazugawa seguiu para a cozinha, e você não perdeu tempo para ir atrás.
— Não tem nada pra comer? - o platinado falou, enquanto procurava algo para comer nas panelas.
— Tô bem, Sanemi. Obrigada por perguntar - você disse com um tom de sarcasmo — E não, não tem nada pra comer pois eu cheguei de missão faz pouco tempo e não deixei nada pronto antes de sair.
— Que desleixo, puta que pariu. A minha ex teria feito algo. E agora, o que eu vou comer?
Começou.
Pensou em rebater o comentário desagradável do Shinazugawa, mas você estava tão cansada que não queria ter de gastar energia com o platinado agora.
— Achei que você iria comer lá no Distrito... Mas se quiser, posso preparar algo - falou torcendo para que ele recusasse.
— Pff, agora não precisa, né. Vou dormir de barriga vazia - se sentou à mesa, esfregando as mãos no rosto.
Você sentiu suas mãos esquentarem. Isso era um sinal de que estava começando a se estressar. Para que algo pior não acontecesse, você respirou fundo, contando mentalmente até 3 e esperou que seus nervos acalmassem. Não queria mesmo começar outra discussão com Sanemi.
— Então tá bom, Sanemi... Eu vou deitar agora.
Se virou na direção oposta do platinado e andou para que alcançasse as escadas. Alguns resmungos foram escutados por você vindo dele, e agradeceu por ter sido apenas isso. Estranhou o fato de que ele não soltou nenhum comentário, vai ver ele, assim como você, estava muito esgotado para entrar em desavenças.
Deitada no grande acolchoado que havia em seu quarto, você tentava dormir, virava de um lado para o outro, mudava as posições diversas vezes mas não conseguia pregar os olhos, e tudo por causa de uma pequena frase.
"A minha ex teria feito algo"
Outro dia, outra comparação. Não era a primeira vez que o platinado dizia algo relacionado a ex-namorada.
Aparência, vestimentas, cuidados com a casa, tudo. Ele conseguia sempre achar algum defeito em você para que uma analogia fosse feita entre você e a ex. Principalmente quando se tratava de aparência.
Em algum momento juntos, Sanemi mencionou que a garota que namora há alguns anos atrás não era ninja, muito pelo contrário. Vinha de uma família rica, dona de um varejo de jóias caríssimas, coisa familiar, logo, sua figura teria de ser a mais impecável possível.
O platinado comentou também o fato de que a jovem moça era muito atenciosa. O Shinazugawa era recebido com uma banheira quente, as melhores comidas da região e também, roupas dos tecidos mais finos existentes.
Tinha tudo para dar certo. A não ser pelo fato de que o comportamento de Sanemi não era o dos melhores. E continua não sendo.
Sanemi é o tipo de pessoa controladora, quer tudo do jeito dele e apenas isso. Nada mais importa, se não a opinião dele. E óbvio, ninguém aceita isso, principalmente num relacionamento onde os dois lados tem que colaborar um com o outro para que tudo flua da melhor forma possível.
Antes mesmo de virar tsugoku, você já havia ouvido falar de Sanemi e sua fama, afinal, ele é um hashira, e é algo primordial que, além da sociedade comum, a associação caçadora de oni conheça os hashiras de ponta a ponta.
Seu primeiro contato com Sanemi foi através de Shinobu, hashira dos insetos. Se conheceram logo quando você chegou à cidade, e mesmo sendo mais nova que você, a Kocho fez questão de te ajudar com basicamente tudo que você sabe hoje.
A garota dos cabelos morenos e pontas arroxeadas a levou até a casa de Kagaya Ubuyashiki, onde todos os hashiras ficam reunidos. Se lembrava como ontem do dia, embora não estivessem todos lá, você foi conhecer o lugar.
Um flashback atingiu sua memória quando lhe mostrou o momento em que você e Sanemi se viram pela primeira vez. Lembrava-se até do pequeno susto que teve quando viu o platinado, a aparência grosseira, as cicatrizes e cabelo espetado te surpreenderam, mas havia o achado lindo.
Já Sanemi, não esboçou nada, apenas olhou fixamente para você, entretanto, o platinado sentiu um frio na barriga o atingir. Até chegou a estranhar isso, já que a última vez que sentira algo assim foi a alguns anos atrás. E o que contribuiu mais para que esse frio na barriga se aflorasse, era o fato de que você era uma ninja, e Sanemi adorou isso.
Antes de começarem a "namorar" - como se o que acontecia entre vocês fosse algo seríssimo - passaram por algumas missões juntos, por ordens diretas de Ubuyashik, e se aproximaram. Foi com muita dificuldade que ambos acabaram contando de seus passados um para o outro, ou seja, ele sabia das suas maiores fraquezas, medos e claro, da relação conturbada que mantinha com o pai, assim como você sabia do caos que foi a vida dele antes de alavancar como um exterminador de oni.
Uma repulsa se formava dentro de você toda vez que lembrava disso. Se achava uma tola por ter confiado nele a ponto de achar que ele iria cuidar de você, zelar para que esses traumas fossem curados e que nunca mais te atormentasse.
Que mentira.
Sanemi era idêntico ao seu pai.
Ousava em te comparar com outras, insistia em fazer você se tornar algo que você nunca seria, queria te moldar de acordo com a vontade dele somente, sem se importar se aquilo te afetaria ou não.
Seu peito apertava cada vez mais que você pensava nisso. Procurava onde foi que tinha errado, o que teria acontecido para voltar a ter uma pessoa em sua vida que tentou evitar por tanto tempo.
Você não havia fugido de seu pai para encontrar alguém igual a ele, não mesmo.
Estava tão cansada de chorar todas as noites por não ter ninguém ao seu lado, que nem se preocupou em achar alguém que te valorizasse, não se esforçou em procurar uma pessoa que te amasse verdadeiramente, e agora, chora porque a pessoa que "está" com você, insiste em te comparar com alguém do passado, a outra mulher que passou pela vida dele.
Estava esgotada disso, de sentir mágoa, arrependimento, raiva e principalmente, de sentir que apenas um dos lados estava se esforçando para que desse certo. Mais uma vez, teria de tomar uma decisão dolorosa, porém, muito necessária para que você não se machucasse mais.
O pior de tudo, era que você amava Sanemi. Já perdeu a conta de quantas vezes você foi dormir chorando pois sabia que não conseguia manter o amor dele - se quer que pelo menos uma vez ele sentiu isso.
Você iria colocar um fundo na relação conturbada e tóxica que mantinha com Sanemi.
[. . .]
Mais um dia se finaliza igual aos outros. Você já havia se lavado, guardado os armamentos e agora, esperava o Shinaguzawa chegar. Estava nervosa, de fato. Sabia que o platinado tinha um temperamento bem colérico e que não gostaria da notícia onde você queria "terminar" com ele.
Suas unhas faziam barulho quando em contato com a mesa de madeira, sua perna tremia de nervoso e combinava com a respiração pesada e carregada que você trazia no momento. O motivo maior do nervosismo era o fato de que você teria de se manter firme até o último segundo, não queria vacilar na expressão e nem no modo de falar.
Seus pensamentos foram interrompidos quando escutou a capa da espada do platinado batendo contra o shoji da cozinha. Novamente, ele entrou quieto, indo direto para as panelas.
— Não sei porque as serviçais do Mestre Ubuyashiki ficam aqui se não fazem nada, e pra piorar, você também não faz m-
— Sanemi, nós precisamos conversar... - interrompeu ele, um ótimo jeito de iniciar uma conversa.
— Não viu que eu estava falando?
— Nós precisamos conversar - repetiu, porém, de modo mais firme. Sanemi ficou quieto, te encarando com o olhar frio — Eu andei pensando sobre uma determinada coisa e cheguei a conclusão de que quero terminar "isso" que temos.
Você terminou de falar e a risada falsa do Shinazugawa ecoou alto pelo cômodo. Não compreendeu a atitude tosca do platinado, e isso estava começando a te incomodar.
— Ficou louca? Como assim você quer terminar?
— Isso mesmo que ouviu, Sanemi. Eu cansei de você e das atitudes tóxicas que mantém comigo.
— Tá sob efeito de entorpecente? - o tom agora era elevado — Você namora um hashira e quer terminar?!
— Primeiro, nós não namoramos, você nem se deu o trabalho de ter feito um pedido decente ou algo do tipo. Apenas se apossou de mim e na sua cabeça, isso significa um namoro. E segundo, você está na minha casa, aqui você não é um hashira.
A essa altura, você não estava mais sentada.
— Eu tô cansada de você, Sanemi, tô muito cansada. Desde que estamos juntos ou sei lá que porra nós temos, você só abriu a boca pra falar merda de mim, me comparar a quem já não está mais na sua vida, caçoou das minhas cicatrizes e ainda teve a coragem de olhar para mim e dizer que eu devo me arrumar mais.
— Deixe de ser dramática. Tudo o que eu fiz por amor.
— Amor?! - agora foi você quem riu — Você nem sabe o que é amar! - se aproximou dele, mas ainda sim, manteve uma certa distância — Lembra de quando eu te falei que meu pai me comparava muito às outras meninas quando eu era mais nova? E que as minhas costas são marcas de erros que eu cometi? Saiba que uma das maiores cicatrizes que eu tenho aqui foi em homenagem a você! Olha que legal - disse sarcástica.
Você levantou sua vestimenta e mostrou a cicatriz para ele e havia sido feita com a sua katana. O corte foi feito de baixo para cima, com a ponta da espada em direção ao seu cóccix e o cabo estava quase apoiado em sua nuca, não precisou de muita força para que o corte fosse feito, visto que o fio da lâmina era bem afiado. Apenas uma leve força foi feita enquanto você trazia a katana de volta para si.
— Sabe o por que disso? Porque você, Sanemi Shinazugawa, foi um erro para mim. E o pior é que eu te amo, por mais que as brigas e tudo mais de ruim sejam constantes, eu te amo. E te amar dói, dói e pra caralho, por que eu sei que todo esse tempo juntos, o meu amor não significou nada pra você.
— Se me amasse de verdade, não estaria terminando comigo, [Nome].
— Dai-me paciência... Como você tem coragem de falar um negócio desses?
— E eu falei algo de errado?!
Você achava impressionante o fato de que mesmo depois de escutar tudo o que você falou, Sanemi ainda continuava relutante e apresentava um comportamento um tanto quanto infantil. Não esperava por isso.
— Você é uma louca, e só fiquei com você por compaixão. Ninguém iria querer ficar uma ninja problemática e doida da cabeça.
— Sanemi, a única pessoa problemática e doida da cabeça aqui é você! Vê se enxerga, cara, até parece que não tá querendo aceitar o que eu falo.
— Eu quero que saiba que não passei por situações assim com a minha ex. Você deveria ser igual a ela, vai ver isso não estaria acontecendo.
— Sabe porquê ela te largou? Porque você é um cara possessivo e raivoso. Vai ver que nem ela te aguentava, e assim como disse pra mim, ela também deve ter ficado com você por pena.
A expressão do platinado mudou repentinamente e num piscar de olhos, ele já estava com a mão erguida partindo para cima de você. Graças ao seu reflexo rápido, sua mão alcançou a dele e impediu que ele te batesse.
— Sabe que se encostar um dedo em mim, seu posto de hashira vai evaporar igual carne de demônio no sol, né? - ele abaixou a mão com raiva — Sai daqui, Sanemi.
— Eu não vou sair daqui.
— Eu disse para você sair daqui! - gritou, afastando o platinado com o fogo que irradiava sua pele.
— Isso ainda não acabou.
— Ah mas é claro que acabou. E trate de não pisar aqui.
Sanemi saiu do cômodo espumando de ódio. Se certificou de ver ele passar pelo canteiro antes de baixar a guarda, quando o viu, sua chama esfriou pouco a pouco.
Caminhou quase gloriosamente em direção ao seu quarto. Sentia uma espécie de auto-orgulho internamente, e se manteve firme até o último instante.
Ver a cabeleira platinada indo embora te trouxe um alívio enorme, nem conseguia mensurar sobre. Simplesmente a outra mulher na qual escutou por tanto tempo, estava indo com ele.
Mas uma parte sua estava triste.
A frase "as palavras tem poder" nunca fez tanto sentido para você como está fazendo agora. O que Sanemi havia dito, sobre ter ficado com você por pena, pois sabia que ninguém iria querer alguém como você, ficava em loop em sua mente. Sabia que ele falaria algo ruim, mas não estava esperando por isso.
Para você, o platinado estava certo.
Quem iria querer uma mulher que não tem tempo nem para cuidar dela mesma, quem dirá cuidar de uma família? Sempre escolherão mulheres vaidosas, que são de causar inveja entre as mulheres por conta da beleza extraordinária.
Você amava sua vida de exterminadora e as conquistas que conseguiu com ela, mas pensava no modo em que ela te deixou, começando ainda criança. A obsessão de seu pai em te tornar a melhor em tudo, sem se importar em como você ficava, te deixando marcas de um passado abusivo, um terror psicológico difícil de descrever.
E em seguida, veio Sanemi, para continuar o que seu pai começou. As mesmas falas, as mesmas atitudes e o mesmo abuso de poder, características presentes nos dois, porém um era pior.
Você estava tão traumatizada que acabou desistindo do amor. Pode ser apenas uma decisão repentina, visto que acabou de sair de um "relacionamento" abusivo, mas por ora, não se via com alguém novamente nem num futuro próximo.
E por incrível que pareça, você sentiu que falhou com a sua mãe e com Yasu... Não conseguiu achar um amor, ou melhor, não conseguiu manter um amor.
As outras mulheres têm tempo para se cuidar. Fazer as unhas, arrumar o cabelo, vestir as melhores roupas e jóias e claro, não pode faltar o perfume caríssimo para dar um toque a mais no visual.
As outras mulheres enfeitam a casa e esperam os maridos sentadas à mesa, como rainhas em seu devido trono. Estar ao lado delas é uma grande mudança na rotina chata e costumeira.
Já você, a outra mulher, sempre vai chorar até dormir.
Nunca terá um amor para manter.
E com o passar dos anos, vai viver sozinha.
Oi gente! Como vocês estão?
Cara, eu simplesmente amei escrever essa one, de verdade. Ainda mais porque ela é a minha primeira obra com a rebelião. <3
Confesso que, por mais que eu tenha amado escrever, foi beeem difícil pra mim desenvolver ela. Quis fazer algo no mundo canônico de Demon Slayer e foi algo bem "pane no sistema" não poder colocar alguns fatores dos dias de hoje, e também como não conhecia essa música da Lana, me deixou um pouco fora da zona de conforto. Mas enfim, reagi e bati meu recorde de palavras e dias escrevendo (demorei bem menos tempo do que o normal, irraa)
O que vocês acharam? Me mandem feedbacks! São muito importantes pra mim e com eles, posso melhorar a cada dia!
Ah, e não se esqueçam de irem ler as obras dos outros perfis da rebelião (deixei os users no cap de INTRO).
Queria deixar um PS aqui que, não sei se notaram, mas as 3 últimas estrofes foram meio que uma adaptação da tradução de The Other Woman :)
É isso, galera!
Um beijão 💖
— Mile, xoxo.
Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top