𝐂𝐀𝐏𝐈́𝐓𝐔𝐋𝐎 8

CAPÍTULO 8


18 anos antes

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Recebemos o comunicado três dias atrás. Ele dizia o local, o nosso dever, horários e tudo o que precisávamos saber. É nossa primeira missão onde não somos vistos como só crianças de uniforme. Até porque eu nem sou mais criança.

Crianças, as roupas de vocês estão em seus quartos. Vocês têm 1 hora para se arrumarem e estarem prontos nos carros — Grace diz. A única maneira que gosto de ser referida como criança é pela mamãe, ela diz com carinho. — Andem, vão se atrasar.

Nós subimos as escadas com toda pressa, eu em especial, tropecei em vários degraus de tanta ansiedade. Assim que abro a porta do meu quarto, encontro um vestido esticado na cama, ao lado de sapatos e itens para o cabelo.

Eu nem me lembro qual foi a última vez que usei uma roupa normal. Geralmente acontece em eventos de premiação de Reginald, ou um trabalho especial da Umbrella Academy. Fora isso, vivemos um ciclo infinito de uniforme, pijama e traje de treinamento. Todos iguais aos meus irmãos, e isso acaba com a nossa vaidade.

Às vezes eu só quero me sentir bonita com algo diferente. Saber quais modelos de roupas ficariam legais em mim. Estou animada por essa missão exclusivamente por isso.

Eu coloco o vestido, dourado e na altura dos meus joelhos. Diante do espelho, fico observando meu reflexo de todos os ângulos. Eu gostei tanto. Estou me sentindo bonita de verdade, e não só aceitável, como acontece com o uniforme. Eu calço as sandálias, que também não estou acostumada a usar, e acho que ficaram boas com o vestido.

— Amber? Tô entrando, tomara que não esteja se trocando — A voz de Cinco aparece junto com a porta abrindo. Ele está com uma camiseta verde clara e uma calça jeans. Nunca o vi assim. Desse jeito, ele parece qualquer moleque que eu possa encontrar na rua, e até sua personalidade aparenta ser diferente.

— O que foi? — digo a ele, juntando meu cabelo num rabo de cavalo como dizia no meu recado da missão.

— Desde quando você tem peitos? — ele me olha de cima a baixo, fixando sua atenção em meu peitoral. Não vou explicar que seria difícil para ele notar minha minúscula mudança já que passamos todos os dias com blazer e colete que me escondem.

— Não sei. Desde quando você repara? — falo, nervosa, passando o laço no meu cabelo. Da última vez que ele fez algo parecido eu dei um tapa na cara dele. — Eu juro que quando minhas mãos estiverem livres eu vou te esganar…

— Foi mal. Foi mal. Desculpa. O Ben pediu para perguntar se você não quer trocar de lugar com Klaus.

— Como assim? — Eu pergunto. Cinco está se jogando na minha cama, vejo pelo reflexo do espelho.

— Vamos em dois carros. E você sabe, vamos ser divididos em números e em ordem. No nosso carro vai eu, Ben, Viktor e você. Ben está pedindo para trocar.

— Eu não vou trocar. Já recebi muitas broncas essa semana — eu falo, mesmo contendo a vontade de passar o caminho inteiro com Allison. É uma troca justa para ambas as partes, mas não quero receber outro castigo.

— Certeza?

— Absoluta.

— Tá bom, vou dizer a ele — Cinco se levanta, chegando ao meu lado no espelho, seus olhos acompanhando o meu vestido. — Ficou bom em você, Amber. Tá… bonita.

Eu prendo o sorriso, mas não devolvo o elogio. Senão Cinco passará os próximos dez anos me lembrando disso.

— Vestiu com a etiqueta? Você é tão burro — eu levo as minhas mãos até a nuca dele, tentando arrancar o papel e a fita. Não vou mentir que torci para a camiseta dele rasgar, mas infelizmente não foi o que aconteceu.

— Valeu. Vou te esperar lá embaixo.

Ele se teletransporta. Depois de alguns ajustes, eu estou pronta, então desço as escadas para encontrar os outros.

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A missão parece simples. Vamos ter que ir a um grande parque da cidade que atrai muitos turistas. Porém, um assassino em série está atuando lá neste momento. O sujeito em questão envia cartas para a polícia se vangloriando por continuar cometendo os crimes sem nunca ser pego.

Reginald tem contatos na polícia e, segundo análises comportamentais do assassino, ele deverá fazer sua próxima vítima no fim desta tarde. Este homem mata crianças desacompanhadas de adultos, e sai sem deixar rastros. Este virou seu perfil de vítima. Nada mais genial que colocar oito crianças superpoderosas no mesmo ambiente que esse assassino.

Nós chegamos no parque, o sol quase se pondo. Precisamos encontrar nossas posições rápido, antes que toda a missão seja um fracasso por conta do atraso.

— Pessoal, eu e Allison vamos ficar deste lado. Para uma visão melhor, vocês podem ir para o outro lado do lago — Luther anuncia.

— Quer dizer que vocês vão ser a isca? — pergunta Diego, um sorriso de canto. Todos nós somos o perfil de vítima do assassino, mas tenho que confessar que a observação de Diego foi válida.

— Claro que não. Isso é estratégia! Andem. Façam duplas para se espalhar — Luther diz. Ainda não sei porque o papai insiste em colocar ele como líder.

Ben e Klaus já são uma dupla por natureza, os dois começaram a andar pelas árvores e se distanciaram do nosso grupo. Algo recorrente, estamos acostumados. Eu caminho pela grama, olhando cada ponto de saída para tê-los marcados na minha mente, não quero ficar sem ter por onde correr, se for preciso. Também fico de olho em todos os homens parecidos com o cara do retrato-falado. Barba robusta e parcialmente branca, óculos redondos e boca pequena.

— Vocês vão ficar me seguindo? — olho para trás, vendo Cinco, Diego e Viktor numa fila reta.

— Tem um assassino aqui, Amber. Eu vou te seguir para onde for — Cinco declara. Não achei que tê-lo no meu pé hoje seria um dos meus problemas. — Diego e Viktor podem formar a dupla de vocês no lado oeste.

— Eu não vou ficar com o Viktor. Ele não tem poderes, nem sei para quê veio.

— O papai que mandou — Viktor se defende. É a primeira missão dele, provavelmente a única, mas ainda assim Diego não facilita.

— Se está falando sobre utilidade, também não sei para o quê você veio, Diego — eu respondo. Ele ameaça tirar sua faca do bolso, só para me assustar, mas Cinco intervém:

— Tá maluco? Solta isso, cacete.

Lentamente, Diego coloca sua lâmina no lugar.

— Beleza, vamos ficar todos juntos, já está escurecendo.

Nós conseguimos encontrar um banco de madeira vazio, que coubesse a todos. Do outro lado do lago, bem pequenininhos, estão Luther e Allison, e estão tão longe que não dá para saber o que estão fazendo. Se fôssemos quatro duplas, a área que íamos cobrir para vigiar seria muito maior, mas dois dos nossos integrantes estão mata a fora, e outros dois deles não suportam ficar juntos.

O céu já está completamente escuro. Nós sabemos que há policiais à paisana aqui, mas mal conseguimos distingui-los de pessoas comuns. Está ficando frio. Não fazia parte do meu figurino um casaco quentinho, já para os meninos, aparentemente faz sim. Eles se cobrem e eu cruzo meus braços para me esquentar.

— Isso é tão injusto. Vocês não tem outro casaco? — eu pergunto, observando os meninos enfileirados ao meu lado no banco. Todos os três balançam a cabeça para mim, dizendo que não, e deixando claro que não vão ceder o deles. — Beleza, são só dez graus.

— Vocês estão vendo alguma coisa? — pergunta Diego. Nós respondemos em coral, negando.

— Ele vem hoje mesmo? Quem garante? — Viktor questiona.

Estou começando a ter as mesmas perguntas. E se o assassino só fez isso para despistar a investigação? Quem que vai confiar nas palavras desse cara? 

A dupla Luther&Allison tem uma lanterna, assim como Klaus e Ben, e nosso quarteto tem duas lanternas. A função delas era avisar a nossa equipe que encontramos o suspeito. Até agora, não vimos nenhuma luz da direção de Luther&Allison.

— Eu quero ir para casa.

— Tá, Viktor, e quem não quer? — Diego responde com grosseria. — Continua procurando.

— Eu tô procurando!

— Por que você não volta pro carro, hein? Não vai fazer diferença — o carinha das facas continua implicando, ignorando que gaguejou metade da frase.

— Você acabou de pedir para eu procurar.

— Calem a boca vocês dois! — Cinco exclama mais alto, a paciência no limite. Em seguida, eu sinto seu braço passar por cima do meu ombro, apertando ele do outro lado. Pelo menos a mão dele está me esquentando — Tá com frio?

A pergunta é desnecessária já que eu estou na extremidade do banco e o sentido do vento vem ao meu encontro perfeitamente. Caramba, é só ver como minha pele está gelada. Só não respondo com a minha maior dose de sarcasmo porque vejo luzes piscando do outro lado do lago.

— Tá vendo aquilo? — eu aponto discretamente.

— Estou…

— Eles encontraram?

Cinco não responde, porém nosso quarteto busca com os olhos em toda face masculina as características do assassino. Bem, se parece bastante com o cara que está vindo na nossa direção.

Cinco

— Amber, se segura em mim. Não me solta — diz ele, a voz serena e baixa. — Pessoal, precisamos fingir que vamos entrar na floresta.

— Tudo bem — Diego e Viktor respondem, as vozes tremendo, deixando de lado as brigas.

Nos levantamos e caminhamos para a direita, lado oposto do suspeito que olhou fixamente para nós. Eu sinto algo apertar minha mão, como se fosse fazer meus ossos quebrarem, mas é só a mão de Cinco. Eu aperto de volta, o máximo que posso, porque, vou admitir, estou com medo.

Com apenas dois passos para dentro da floresta, Cinco já lança uma ordem:

— Vocês dois precisam se juntar aos outros e encontrar um policial. Digam que encontramos um suspeito.

— E que está nos seguindo — eu completo.

— Espera aí, eu sou o Número 2, então eu que dou as ordens aqui — Diego se manifesta.

— Tudo bem, capitão, então o que você sugere? — eu dou um passo em sua direção.

— Eh… Que vocês fiquem aqui enquanto eu e o Viktor vamos encontrar um policial — responde ele, como se fosse o plano mais genial. Foi exatamente o que Cinco mandou.

— Filho da mãe…

— Vamos, Viktor!

Os dois saem com passos apressados, sem correr para não chamar atenção. Eu e Cinco continuamos de mãos dadas, ele dando leves apertos e eu controlando minha impulsividade de olhar para trás a cada três segundos.

— Ei, crianças! — uma voz grave nos chama. Cinco cochicha para eu não responder, sequer reagir. Porém o homem não para. — Ei!

Pode ser que ignorá-lo cause nossa morte precoce, por isso Cinco virou-se para trás e fingiu nunca ter suspeitado desse cara na vida.

— Sim?

— Onde estão os pais de vocês? — o homem esboça preocupação, aparentemente falsa, e coloca suas mãos no bolso.

— Eh… viemos com os pais dela. Onde eles estão, gatinha? — Cinco assume uma voz tranquila. Não achei que fosse possível, mas ele apertou ainda mais a minha mão.

— Meus pais…? Eles estão aqui no parque. Na barraca de batatinhas — eu improviso, e ainda não sei dizer se ficou bom.

— Vocês não deviam sair sozinhos. Eles sabem para onde estão indo?

O tom de ameaça na voz dele é suspeito.

— Na verdade, não. Saímos escondido — Cinco responde. Eu sei que é para alimentar o instinto assassino do suspeito, mas quero perguntar se Cinco está querendo nos matar.

— É perigoso, não acham?

— Sabemos nos defender — eu assumo. Será que nossos irmãos já ganharam tempo suficiente? Ainda precisamos ficar cara-a-cara com esse homem? — Vamos?

Dou alguns passos, puxando a mão de Cinco. Ele fica encarando o homem por vários segundos, sem sair do lugar. Apesar de termos nossos poderes para nos safar dessa situação, não somos tão experientes em missões de disfarce.

— Você me conhece, moleque? — O cara começa a dar passos lentos para trás, sua mão indo junto. Talvez tenha algo preso no seu traseiro que nós não vamos gostar de conhecer.

— É, eu acho que já vi um retrato-falad…

— Para trás! Os dois! — O homem saca uma arma, apontando para nós.

— Seu boca aberta! — Eu cochicho para Cinco.

— Veja pelo lado bom. Pegamos ele, Amber.

— Vocês vão fazer o que eu mandar, estão ouvindo? — o cara aproxima seu dedo do gatilho. Pela primeira vez em muitos minutos, meu sangue volta a circular na minha mão, porque Cinco soltou ela.

Ele se teletransporta e agarra a mão do homem, torcendo seu braço e tirando a arma de seus dedos com facilidade. Algo arriscado, já que aquele homem é muito, mas muito mais alto que Cinco. Ele reaparece do meu lado, apontando a arma de fogo contra o nosso suspeito.

— Você tá muito enganado se pensa que eu não sei usar essa arma — Cinco diz, irritado. Ele não sabe usar a arma. O homem levanta seus braços em rendimento, ainda confuso sobre como sua arma sumiu de sua mão.

Não demora muito para ele olhar essa cena e começar a rir.

— Eu agora sou refém de duas crianças?

É um trabalho em equipe, não vamos desvalorizar o esforço de Luther&Allison que só ligaram a lanterna.

Eu ativo meus poderes, caminhando para trás do homem e dando um chute em suas costas. Com esse susto, ele se vira para trás, encontrando apenas folhas secas farfalhando e mexendo no chão sozinhas. Fico de frente para ele, atingindo sua região íntima com toda força que meu chute conseguiu.

Ele leva as mãos ao local, se contorcendo na mesma hora que lanternas de polícias iluminam nosso canto da floresta. Eu ainda dou outros chutes enquanto posso. Volto para ficar ao lado de Cinco, sem meus poderes.

— Sempre quis fazer isso — digo animada, dando pulinhos como se tivesse acabado de ganhar gibis novos.

— Você é cruel.

— E ele matou onze pessoas.

— Abaixem as armas! — grita uma voz feminina, lanternas bem nos nossos olhos.

Cinco joga a arma no chão e pisa em cima. Os policiais à paisana chegam mais perto, levantando o homem do chão e prendendo seus braços nas costas com abraçadeiras. Assistimos com um sorriso disfarçado os oficiais levarem ele para longe.

— Essa arma é dele? — pergunta um dos policiais.

— Sim.

— Certo. Bom trabalho. Vão para casa agora, crianças.

Nós acenamos para eles, depois de receber agradecimentos de cada policial. Um deles foi designado a nos acompanhar até o carro, por segurança. Atravessando seu braço sobre meu ombro, Cinco nos guia para fora da floresta. A adrenalina começa a baixar em meu corpo, e agora eu posso sentir o ar me congelar. Não sei se Cinco percebeu minha pele arrepiar, mas ele tira o seu casaco e o coloca por cima de mim, sem fazer contato visual.

— Certeza? — pergunto, hesitando em segurar.

— Não estou com frio — ele dá de ombros. — Só estou garantindo que não congele meus planos para o futuro.

— Parece que até os babaquinhas que nem você têm um código de honra. — Comento, sentindo o calor físico do casaco envolver-me.

Cinco revira os olhos, mas não consegue esconder um pequeno sorriso.

— Não me interprete mal. Não quero que você pegue um resfriado e prejudique nossa competição.

— Só temos treino juntos no final do ano.

— É bom prevenir.

Voltamos para casa sã e salvos, e pela missão bem concluída, vamos ganhar mais pontos nesta semana. Talvez até quinze minutos a mais de jogos no próximo sábado. Eu e Cinco também ganhamos cinco estrelas por manter o suspeito vivo e encurralado até a chegada da polícia.





⦿ 2.567 palavras

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Cinco bem assim na frente do assassino:

não sei se amo mais eles adultos ou crianças 😭

beijos curupiras regionais 💛

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