𝐂𝐀𝐏𝐈́𝐓𝐔𝐋𝐎 36
CAPÍTULO 36
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Eu termino de dar o último ponto e corto a linha. Cinco está calmo porque roubei o remédio para dor mais forte da farmácia, mesmo ele negando. Depois que limpei seu abdômen, vi que havia quatro cortes que precisavam de pontos. Os outros se curariam sozinhos.
Talvez as tentativas falhas de perfurar a barriga dele doam tanto quantos as que tiveram sucesso, isso é notável pela quantidade de hematomas que ele tem. Cinco disse que conseguiria tomar banho sozinho, mesmo eu duvidando, e ele conseguiu manter seu orgulho por três minutos, pois logo precisou da minha ajuda para alcançar o shampoo.
Meu estado também não era dos melhores. Cinco, com palavras ofensivas contra a minha aparência, me puxou para debaixo do chuveiro com ele. Eu tirei minhas roupas sujas e observei o sangue alheio descer pelo meu corpo junto a água quente. Não sei quantos banhos vou precisar até tirar esse cheiro de mim, mas estou melhor que a um minuto atrás.
Nós voltamos para o nosso quarto com toalhas branquinhas. Vestir uma roupa limpa e dormir por doze horas nessa cama é quase um sonho que estou prestes a realizar. Ajudo Cinco a vestir sua roupa pois, segundo ele, não consegue esticar os braços sem que a pele de sua barriga estique também. O mesmo homem que passou horas com estilhaços de bala na barriga e não disse a ninguém para não comprometer a missão.
— Traz água pra mim? — ele pede. Eu sei que no fundo há uma diversão em poder me submeter a esses serviços.
Eu vou até a cômoda, do outro lado do quarto, e encho um copo d'água da jarra. Entrego para ele que não bebe nem a metade, comprovando então a minha tese.
— Eu nem tava com sede.
— Eu sei.
Eu me sento do meu lado na cama, apagando o abajur e colocando o edredom macio sobre mim. Antes de me aconchegar eu confiro se Cinco está em uma boa posição e se vou precisar ajudá-lo em algo. Ele parece bem despreocupado.
— Eu te admirei hoje, sabia? — ele diz, a voz um pouco mais baixa. — Você conseguiu completar a missão sem mim e ainda me trouxe vivo. Sem contar quando você matou a Gestora, caramba, nem te reconheci, mas foi lindo.
— Você faria o mesmo.
— Eu faria melhor. Mas você também foi boa. Quatro estrelas.
— Eu perdi uma estrela para o seu ego?
— Aceita a sua nota.
— Também te dou quatro estrelas. Se estivesse atento não tinha pontos na barriga agora.
Ele balança a cabeça, se rendendo. Pelo visto, se Cinco me avaliasse durante as tarefas da infância, eu só teria nota baixa porque ele não aceita ficar em segundo lugar.
Deixamos a discussão de lado. Cinco levanta o seu braço e o coloca ao redor de mim, me trazendo para perto de seu peito enquanto beija a minha cabeça. Eu não me lembro de mais nada depois disso porque meus olhos estavam pesados demais.
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Ainda não encontramos nossos irmãos. A prioridade era manter o sangue de Cinco dentro do seu corpo e descansar por muitas horas. Sendo assim, na tarde do dia seguinte, quando acordamos, procuramos os dois patetas para descobrirmos se eles haviam cumprido a simples tarefa de trazerem a sobrinha em segurança.
A resposta veio no momento que abri a porta do quarto deles.
— TIA!
Claire corre em minha direção e pula, não me deixando outra alternativa a não ser subi-la até o meu colo, apertando-a com um abraço.
— Tudo bem, pequena? Seus tios se comportaram?
— O tio Klaus fez bagunça no quarto.
— Não, não, não. A gente fez um desfile de moda e a senhorita não guardou as roupas depois — Klaus corrige, se levantando da cama indignado.
Coloco Claire de volta no chão para eu abraçar Klaus. É inusitado para nós dois, mas depois de tudo o que passamos, é reconfortante que todos estejam bem. Diego estava quieto na sua cama o tempo todo, jogando sua faca para cima e nos observando.
— Eu não vou te abraçar — afirmo.
Diego lança sua faca, com o seu poder fazendo que o objeto afiado passe ao lado da minha cabeça. Ele se levanta da cama e aperta seus braços ao redor de mim, por poucos segundos, e se afasta dando tapinhas no meu ombro.
— Que bom que voltou, maninha. Estávamos preocupados. Já faz mais de uma semana.
Uma semana? Aquela maleta tem a ver com essa diferente perspectiva de tempo?
— Eu também voltei — Cinco eleva sua voz, ainda apoiado na porta.
— Foda-se.
— Ele tá com essa cara de bunda porque a namoradinha dele não aparece tem uns dias — Klaus sussurra para mim.
— Sério? — sussurro de volta, surpresa, e então me vem a péssima ideia de provocar Diego. — A Lila te deu um pé na bunda?
— Ela quase não sobreviveu quando o meu irmão atirou nela. — Diego diz, enfatizando as palavras com ressentimento, encarando Cinco. Ele rebate igual.
— Eu atirei para salvar a minha namorada.
— Ela não quer voltar porque pensa que toda minha família é inimiga
— Ela trabalha para mim agora. Se ela quiser voltar, então que seja. Mas se ela chegar perto da Amber, eu termino o serviço.
Eu revezo o meu olhar de um para o outro. Quando a ameaça de Cinco termina de fazer efeito no ar, Diego se sente à vontade para perguntar:
— Trabalha pra você?
— É, agora eu sou o diretor. A linha do tempo finalmente está segura.
A feição de Diego se torna mais feliz, talvez planejando como irá reconquistar sua namorada esquisita. De repente, o telefone fixo na mesa de cabeceira começa a tocar. Diego atente, murmurando alguns sons que nós tentamos decifrar por curiosidade.
— Sim. Hum. Aham… Na recepção? Estou indo! — E dessa forma, o carinha das facas voa em direção a porta, tropeçando em tudo pelo caminho.
Por algum motivo, Cinco decide ir atrás, e então eu também vou. Klaus coloca Claire sentada em seu ombro e corre logo atrás de mim. Se é alguma declaração da sua namoradinha ou seu antigo empregador querendo amassar a cara de Diego, vai ser legal assistir de qualquer jeito.
Descemos a escadaria à todo vapor, formando uma fila atrás de Diego para descobrirmos o motivo da sua pressa. Ele se debruça no balcão, perguntando de olhos arregalados para o recepcionista onde está a linha de telefone que o espera. O homem interrompe seus carinhos no Pug deitado no balcão para apontar o telefone fora do gancho, na parede próxima ao buffet.
Nós corremos para lá e me dou conta de que talvez o assunto que Diego recebeu pelo telefone seja mais sério que uma declaração. Com urgência, meu irmão coloca o telefone no ouvido:
— Alô? — Ele diz. Um breve momento se passa, e os olhos de Diego começam a brilhar em lágrimas, piscando involuntariamente. — Eu não acredito…
Diego aperta o canto interno de seus olhos, abaixando a cabeça, escondendo a sua emoção.
— Seu idiota sortudo! — Diego levanta o olhar, dessa vez com um sorriso no rosto. — Sim, pode voltar, estamos todos aqui. Eles estão bem aqui na minha frente.
Essas pessoas em questão estão todas confusas e encarando Diego em busca de respostas. Tenho medo de não ser o que estou pensando. Depois de murmurar alguma coisas, Diego coloca a mão na entrada de som do telefone e direciona a sua visão para mim.
— Amber, o loirinho quer falar com você.
Eu arregalo os olhos na mesma hora. Senti como se meu coração fosse sair pela boca, e umas cócegas atrás dos olhos que insistem em me fazer chorar de emoção. Eu imediatamente tomei o telefone da mão de Diego.
— Oi? — Eu digo, ainda incerta. A voz que escuto do outro lado é incontestável: é Luther. Eu poderia soluçar e derramar lágrimas agora.
— E aí, maninha?
— Eu não acredito! — Levo minha mão à boca, surpresa.
— Como estão aí? Vou passar na sua casa pra tomar um café.
Dou uma risada, com a ficha caindo aos poucos.
— Esquece, eu estou no hotel agora — eu falo, descontraída, secando meus olhos — Vou te atualizar de tudo quando você voltar.
— Ai, caramba, é tanta coisa assim?
— É. Muita coisa — Eu olho para Cinco, abrindo uma brecha na ligação, mas ele parece não querer dizer nada. — Como está Allison?
— Está bem. Estamos ótimos, Amber. Saímos do hospital agora pouco… — Luther faz uma pausa, dizendo algo do outro lado da linha que não foi direcionado à mim. — Allison está perguntando como a Claire está.
— Tá ótima. Ela está aqui com a gente. Diga que eu que estou cuidando pra ela não se preocupar. E diga que eu também sinto a falta dela.
— Pode deixar — Luther diz, e então sua voz fica mais baixa enquanto ele se afasta do telefone. — Amber, vou ter que desligar agora. Vamos voltar o quanto antes.
— Tudo bem. Se cuidem.
Eu coloco o telefone no gancho e solto uma risada de alívio, sentindo as lágrimas irem e virem. Eu vou até Cinco e seguro o rosto dele com as duas mãos.
— Eles estão vivos!
— Que bom — ele diz, indiferente, mas pelo menos se deu o trabalho de sorrir um pouco.
— Klaus, liga pro Viktor e diz para ele vir. Fala que os dois estão vivos e bem — eu mando. Klaus coloca Claire no chão e vai até outro telefone para discar uma sequência de números.
Eu respiro fundo. Tudo está em seu lugar de novo. Não há assassinos furiosos atrás de nós, não há um apocalipse iminente. Só uma página em branco para recomeçarmos nossas vidas com mais união.
Eu coloco minhas mãos no quadril assistindo Claire puxar a barra do blazer de Cinco, chamando-o para ir até o buffet com ela. Cinco revira os olhos, mas aceita, seguindo a criança que aponta para todas as sobremesas disponíveis.
— Vem cá, a Allison sabe desse seu caso com o Cinco? — Diego diz baixinho, me dando uma cotovelada e cruzando os braços em seguida.
— Não. Por favor, não faça nenhuma gracinha. Deixa que eu conto.
— Vai ser a traição do século! Não contou nem naquela época que eram melhores amigas?
— Ia ser pior que contar agora — minhas sobrancelhas saltam. Eu já sabia da relação de Allison com Luther, mas não sei se ela entenderia a minha com Cinco.
Dou tapinhas no ombro de Diego e sigo em direção de Cinco e Claire. Ele pode estar neste momento ensinando como ela pode assassinar seus ursinhos de pelúcia. Eu chego perto e acaricio a cabeça dela, perplexa com a quantidade de doce que há no prato dela e que Cinco permitiu.
— Tia, tia, tia! O tio quer saber qual é a sua pedr… — Claire começa a falar, empolgada, mas Cinco interrompe.
— Claire, você esqueceu a gelatina. Pega uma pra completar seu prato.
A criança pula da cadeira para pegar mais um doce, e se vê em dúvida para escolher um sabor.
— O que ela ia dizer?
— Nada importante. Vem cá — Cinco apoia sua mão em minha cintura e me puxa para perto, até estarmos colados. Ele se inclina para baixo e me dá um beijo, acompanhando vários selinhos que me fazem desistir de saber o que Claire tinha para falar.
Ela volta com todos os sabores, por não conseguir escolher um, e se senta na cadeira para continuar sua refeição. Um lado de mim pensa em tirar esse prato dela por conhecer as regras que Allison criou para a filha, e o outro lado de mim só quer que ela tenha um dia diferente comendo tudo o que ela quiser.
— Amber Hargreeves? — uma voz masculina diz atrás de mim. Eu me viro, respondendo:
— Sim?
— Me acompanhe até o balcão, por gentileza.
Eu olho para Cinco e então sigo o funcionário por onde ele vai. Cinco não saiu do meu lado mesmo quando a opção era deixar a sobrinha sozinha. Assim que chego ao balcão de check-out encontro um rosto muito familiar. E um tanto indesejado. O rosto que eu encontrei por muito tempo quando eu acordava.
— A Srta. Hargreeves está com o pagamento atrasado. Duas semanas. O último e único pagamento feito foi a primeira reserva que fez, correto? — Ethan diz, um tom de voz forçado para parecer formal, totalmente diferente de seu terno mal passado. Há um sorriso cínico por trás dessa seriedade teatral.
Duas semanas. Para mim foi menos da metade. Poucos dias que pareciam anos lutando para que todos estejam vivos e que minha família esteja salva. Mas a preocupação da vez é se eu paguei a porcaria do hotel dele. Estou de volta à vida real e às burocracias.
— Correto.
— Certo. Então a multa será aplicada conforme os termos e condições do hotel. A Srta. também está convidada a se retirar do quarto 207 para a locação de outro cliente.
Cinco solta uma única risada com sarcasmo ao meu lado. Pela forma que seus olhos fuzilam Ethan, e como a sua respiração parece descontrolada, Cinco reconheceu o cara que encontrou nos meus porta-retratos.
— Não fode. Outro cliente? Este hotel é desértico! Não vamos sair do nosso quarto. — Cinco impõe, batendo a mão sobre o balcão. A conversa de fato estava tranquila e profissional… até ele se alterar.
— Senhor…?
— Tivemos uma emergência, entendeu? Você não pode nos expulsar daqui só porque não consegue nem olhar nos olhos dela — Cinco fala, um tom mais alto, que ecoa no espaço que estamos. Talvez ele esteja levando para o pessoal, mas não interferir, está sendo muito bom assistir.
Não acho que eu seja a razão deste conflito, Ethan não me mandaria embora. Ele iria adorar me ver todos os dias aqui porque sabe que não tenho outro lugar para ir, e presumir que o apartamento vagabundo que deixou para mim teria caído aos pedaços. Iria amaciar seu ego por achar que estou miserável com a minha vida. Seria engraçado, porque eu nunca estive tão feliz.
— Este não é o motivo, senhor. Como foi dito anteriormente, a extração é pela violação das normas. — Ethan continua com sua voz debochada.
— Então quanto ficou? — Cinco coloca sua mão no bolso, e por um instante tive receio de ele tirar uma pistola e não a sua carteira.
— A multa é uma porcentagem com juros a cada dia de atraso, sem contar o pacote que a srta. Hargreeves assinou… Vou simplificar a conta pro senhor, fica 1.894 dólares. — Ethan diz, passando sua caneta pelo papel enquanto finge que lê. Cinco poderia estrangulá-lo apenas por presumir que é superior a ele em matemática.
Cinco abre a sua carteira e tira um valor maior que o que eu preciso pagar.
— Aqui. Se vamos ter que sair do 207, quero um pacote de três semanas para o quarto 208.
Ethan bufa, revirando os olhos e juntando todos os papéis numa pilha só.
— Isso não será necessário. A srta. pode continuar no mesmo quarto… — ele explica, mas não entendo o restante porque Cinco se aproxima para cochichar em meu ouvido:
— Eu sabia. É pessoal.
— Não é, meu bem. — Respondo de volta.
— Agora o Sr…?
— Hargreeves.
— Hargreeves também? — Ethan se impressiona, deixando escapar. Por um momento, curioso o bastante para arriscar perguntar se Cinco é da minha família ou se me casei novamente. — Bem, o sr. Hargreeves pode assinar aqui, por favor.
Cinco dá um rápido sorriso cínico, pegando a caneta para escrever no local indicado no papel.
— Fica com o troco.
Eu aperto meus lábios, escondendo minha risada como um soluço. Não entendo porque essa rivalidade é necessária. Cinco só está arrumando dor de cabeça.
— Obrigado, boa estadia para vocês. — Ethan diz, com um tom profissional, apenas para depois dizer baixo com um sorriso irônico: — Passar bem, Amber.
Eu e Cinco já estávamos indo embora, e neste momento ele parou e encarou o homem atrás do balcão. Precisei puxar o seu braço e repreendê-lo para podermos ir embora. Subindo as escadas para o nosso quarto, eu penso em agradecê-lo por pagar a dívida, mas a sua energia é outra. É quase certo assumir que ele quer brigar.
— Por que não me falou que ele trabalha aqui, Amber? Porra!
— É no setor financeiro, ele não fala com clientes do hotel.
— Mas falou com você!
— É, isso não era pra acontecer.
— É pessoal, eu disse. Ele quer te intimidar. — Cinco abre a porta do quarto, me deixando entrar primeiro. — Se esse cara aparecer de novo, eu jur…
— Ele não vai.
— É melhor mesmo — ele envolve seus braços em minha cintura, nos aproximando. — Não vamos passar tanto tempo aqui. Garanto que saímos antes dessas três semanas acabarem.
⦿ 2.734 palavras
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af esse meme tinha que ser do capítulo anterior
bjs filhotinhos 💛
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