𝐂𝐀𝐏𝐈́𝐓𝐔𝐋𝐎 2
CAPÍTULO 2
18 anos antes
◎
Pontualidade é o meu forte, devo admitir. Algo que eu não teria reparado se nosso próprio pai não influenciasse essa competição. Além de estarmos contra o crime, estamos contra nós mesmos em certas ocasiões.
Essa é terceira estrela que ganho nessa semana.
— Um minuto e treze segundos! — Reginald grita para todos os meus irmãos ausentes o seu tempo de atraso.
Luther é o único que está aqui, também esperando nossos irmãos, mas para conseguir chegar a tempo, ele veio sem os sapatos. Agora está colocando-os com a maior rapidez que consegue.
— Se fosse uma bomba relógio o prédio já estaria em chamas! — Reginald exclama outra vez, adorando pontuar a incompetência da equipe — Vocês têm muito o que aprender com o tempo. Ele pode ser o seu maior inimigo, então corra contra ele!
Vemos Allison caminhar pelo corredor, descendo as escadas depressa e no final dela ajeitando suas meias na panturrilha. Exaurido com a demora, Reginald vai pessoalmente apressar os últimos irmãos.
— Psiu! Amber! — uma vozinha irritante cochicha para mim. O loirinho sabe que eu odeio cochicho da parte dele, mas ainda continua me chamando assim sem a menor necessidade — Você fez as lições de francês?
— Fiz, Luther — respondo, incomodada, já que não é a primeira vez que ele me pede cola. Deve estar na casa da centena. Eu tentei fingir orgulho por ter feito as lições, mas não é bem o meu mérito. Foi Cinco quem me ajudou. — Onde você estava na hora do dever?
Luther não me deve satisfações, só que eu não ia perder essa oportunidade com Allison aqui. Acho que todos nossos irmãos desconfiam do que rola entre eles, mas ninguém nunca falou em voz alta. Somente troca de olhares quando Luther e Allison misteriosamente deixam o ambiente seguido um do outro.
Reginald volta com todos os atrasados, e fomos praticamente empurrados para dentro da Van para chegarmos ao banco antes dos assaltantes deixarem o lugar.
— Se atrasou hoje. Eu ganhei a estrela — dou uma cotovelada em Cinco do meu lado. Seu teletransporte lhe dá muita vantagem quando há um tempo cronometrado, e Cinco sempre levava a estrela. Comecei a competir com ele apenas por diversão.
— Não enche a porcaria do meu saco — ele resmunga, olhando para a janela.
— O Cinco falou palavrão! — Ben suspira, de surpresa. Ele nunca gostou muito dessas palavras.
— O que aconteceu? Escorregou no banho? Perdeu o par das meias? — Eu sigo tirando a paciência dele. No fundo estou mesmo curiosa do porquê a pessoa mais pontual que eu conheço se atrasou hoje.
— Número Oito, você traria grande paz a todos nós se fechasse a sua boca.
Cinco não tira os olhos da janela em nenhum momento. Eu me afasto um pouco, voltando para o meu espaço pessoal sem invadir o dele. Não gosto quando ele me chama assim. Ele só faz isso quando quer me atacar pessoalmente, me colocando esse rótulo ridículo que sabe que eu odeio.
Tudo bem que ele gosta de ser chamado por esse número, mas fazer isso comigo é pura maldade. E ele sabe.
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A Van estaciona nos fundos do banco e precisamos correr para cumprir nosso papel a tempo. Cinco consegue teleportar todos nós para dentro do banco, onde já conseguimos identificar um grupo de reféns e os assaltantes. Todos os reféns estão com as mãos presas e fitas na boca, provavelmente inutilizar todos eles dessa forma nos fez ganhar tempo.
— Já sabem o que fazer, não é? — Luther pergunta, enquanto nós nos esgueiramos pelas colunas enormes do banco, procurando nossa posição de ataque.
— Dar um susto nos bandidos e libertar os reféns — Diego responde, ajeitando sua máscara nos olhos.
— É, é uma interpretação fraca, mas vale. Vamos lá!
Luther corre para cima de um dos assaltantes, dando socos em seu rosto e o jogando para cima com a maior facilidade. O homem adulto atravessou a janela de vidro graças a super-força do loirinho. Do outro lado, Allison está fazendo um dos bandidos atirar no pé do seu comparsa usando seu superpoder.
— Armas são para os fracos. Homens de verdade usam facas — Diego exclama para todos ouvirem, logo depois lançando suas lâminas contra um bandido. Interessante sua observação, já que Diego sequer tem pêlos no rosto.
Quando só sobra um assaltante, e a maioria dos nossos irmãos estão de frente para ele, Cinco e eu sabemos que é nossa hora. Eu dou um passo para ir ao meu destino, mas ele segura meu braço antes.
— Toma cuidado. Você viu aquelas armas, não faça como da última vez.
— Relaxa. Eles não vão me ver.
Cinco libera meu braço e eu ativo meus poderes, caminhando de encontro ao balcão de atendimento, onde um marmanjo está em cima dele, apontando sua arma para meus irmãos. Eu subo por cima do balcão com cuidado, já que mesmo invisível eu ainda tenho peso e faço barulhos.
Luther está na frente dos reféns, protegendo eles. Eu dou toques em seu ombro, algo padrão para meus irmãos saberem que sou eu, e então Luther me deixa passar para desamarrar as mãos dos reféns. Muitos deles estão confusos, apavorados com a situação e tentando entender como suas mãos estão sendo desamarradas sozinhas.
— Vai fazer o quê? — Cinco diz para o assaltantes, de pernas cruzadas sobre o balcão. Segundos depois, tiros. Muitos deles. Eu olho depressa para o balcão, sem me dar conta que Cinco é bem mais rápido do que as balas.
Eu termino de desamarrar o último refém, voltando a minha forma natural. Luther guia as pessoas para fora do banco em segurança, e aqui no balcão de atendimento, tentamos convencer Ben a usar seus poderes.
— Tem mais deles lá dentro do cofre, Ben — Diego diz, querendo influenciar o irmão a matar o restante dos bandidos com seus tentáculos assustadores.
Ben, por obrigação, abre a porta do cofre e entra. Basta alguns segundos para ouvirmos sons amedrontadores e sangue para todo lado nos vidros. Corpos arremessados contra as paredes fazendo-as tremerem. De fato, assustador. Nosso pequeno Ben reaparece coberto de sangue, de uma forma que mal conseguimos encontrar sua pele por baixo de tanto líquido vermelho.
— Dá pra gente ir pra casa? — pede ele.
Bom, aparentemente, missão concluída.
Antes de aparecermos na rua, corri para o banheiro buscar papéis para o Ben. Vamos ter câmeras nas nossas caras e não quero que o vejam assim. Eu seco a maioria do sangue que restou em seu rosto, enquanto ele lava suas mãos na pia.
Por algum motivo, Cinco está aqui, mas não está auxiliando em nada. Está simplesmente de braços cruzados observando nós dois.
— Podia ajudar, né? — eu falo, já que Ben está desconfortável com tanto sangue e ser visto assim não é legal.
— Tô vendo que você não precisa de ajuda.
— Tá tudo bem, Amber. Eu já estou mais limpo. Podemos ir — Ben força um sorriso, largando os papéis e saindo do banheiro.
Eu cruzo os braços, imitando a posição de Cinco, talvez esperando por uma explicação.
— Tá olhando o quê?
— O que você tem? — eu pergunto, estressada. Há um tempo que Cinco anda meio estranho.
— Eu não tenho nada.
— Ah, mas tem sim.
— Não tenho, cacete.
— Você não fica com essa cara feia por tanto tempo. Tem alguma coisa.
— Vamos pra casa, eles estão esperando — Cinco desconversa, se teletransportando.
Eu detesto quando ele vai embora assim.
Nós saímos do banco em uma fileira e paramos para os jornalistas tirarem suas fotos. Há pessoas gritando e nos parabenizando, cartazes com guarda-chuvas e um coração ao lado, enquanto os repórteres enchem nosso pai com perguntas.
Nossa rotina de estudos; nossas famílias que nos venderam; entre outras coisas que Reginald adora responder. Ele enfim nos apresenta para o mundo como a Umbrella Academy.
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Eu terminei de colocar o meu pijama e ativei os meus poderes. Ainda não deu o toque de recolher, mas quero fazer silêncio para não descobrirem que sou eu. Ando na ponta dos pés, a caminho do quarto de Cinco, e realmente fiz o mínimo de barulho audível ao passar pela porta. Só que Cinco é um alienígena maluco de outro mundo com ouvidos biônicos.
— Eu sei que você tá aí.
— Droga.
Desativo meus poderes, podendo me concentrar no que ele está fazendo. Está com um caderno em sua mão e uma caneta veloz na outra.
— O que está fazendo? — me sento na cama dele, do seu lado, tentando ler. Minha pergunta foi descartada por ele.
— O que você quer?
— A lição de matemática.
— De novo?
— É pra amanhã, Cinco, me ajuda.
Ele bufa, se levantando da cama para buscar seu caderno de matemática. Não é minha área favorita, e como ajudo ele com geografia, acho a troca justa.
— Aqui.
— Valeu — dou um sorrisinho. Não me lembro se alguma vez eu pedi algo a Cinco que ele não fez.
Eu avalio as respostas marcadas por ele, totalmente diferentes da minha. Confio cegamente nas respostas dele para não precisar de uma calculadora. Cinco é uma calculadora ambulante. Eu fecho o caderno, pretendendo levá-lo para o meu quarto e terminar as lições lá.
— Ah, credo, você tá com aquela cara de novo — eu comento baixinho. Cinco ultimamente adotou uma nova expressão: a que junta suas sobrancelhas até quase ficarem coladas, um olhar distante e pensativo. Fora que ele fica fazendo bico.
— Se eu te contar, você me deixa em paz?
— Depende.
— Tá legal. Eu tô estudando bastante para fazer uma viagem no tempo.
Eu encaro ele por alguns segundos. Sem querer, acabo rindo. Não sei se é piada, ou se ele está falando isso para eu deixá-lo em paz. Cinco é totalmente capaz de uma loucura dessas.
— É sério, Amber.
— Como assim? Viajar no tempo? Reginald disse que ainda é cedo.
— Eu estou pronto. Você vê meus saltos no espaço, estão perfeitos. Por que não posso fazer um pulo no tempo?
— Porque é arriscado, mula.
— Não acho que seja.
— Quer ser o mais novo enquanto todos nós estaremos mais velhos? — eu implico, atingindo seu ego.
— Bem, eu vou ver a tecnologia avançar com mais rapidez.
— Ótimo motivo para viajar no tempo. Aposto que os neandertais adorariam assistir televisão.
— Caramba, eu quero ter essa experiência, Amber — ele se altera, batendo no caderno de anotações em sua mão — Ou preciso da sua permissão?
— Precisa. E saiba que eu não te dei.
Não sei se é egoísta querer que ele fique, e me escondo no argumento de que é perigoso. Mas, eu de verdade quero que ele fique. De todos os adotados aqui, é com ele que eu tenho mais afinidade. Ele entende a maioria das coisas que conto, e que são confusas até para mim.
— Você pode ir comigo — ele diz, hesitante.
— Não sei…
— Vamos fugir daqui, Amber.
— Fugir? — eu repito, indignada.
Ele está oficialmente maluco. É de vontade unânime sair dessa casa, mas faltam poucos anos para irmos embora. Sem contar que não quero deixar os outros para trás. É como se eu tivesse traindo eles, deixando-os à própria sorte com Reginald. Ben precisa de nós. Klaus precisa de nós. Não posso ir embora.
— Esquece. Você não está pronta — Cinco guarda seu caderno com rascunhos de equações.
— Espero muito que desista — eu chego perto para apoiar minha mão sobre seu ombro. Cinco fica rígido quando sente meus dedos, e eu faço uma leve massagem antes de ir embora — Obrigada pela lição. Boa noite.
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