SOMBRAS
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HAWKS
- Meu pai era um assassino. Satisfeita agora?
Quando fiz minha promessa a minha veterana Lady Nagant de que seria responsável por sua pupila ou pra ser exato, quando ela resolveu tirar a vida de seu supervisor para ir direto pra prisão de segurança máxima Tartarus, não imaginava que ia ter tanta dor de cabeça.
Akira estava preocupada, mas suas péssimas habilidades sociais não a ajudavam a entender por completo os momentos em que deveria ou não falar.
Naquela noite, pelo comando da polícia e da Divisão de Inteligência, a nova organização em que eu e minha pupila estávamos vinculados, nos designou para uma missão de urgência para capturar um grupo mediano de novos contrabandistas que haviam chegado ao país. Com a queda do All For One, cada vez mais novas organizações surgiram tentando chegar ao topo do submundo, então deveríamos impedir aquilo. Os estrangeiros haviam se hospedado em um hotel ao leste de Musutafu para efetuar uma troca de altas cargas de drogas. Os policiais se disfarçaram pelo dia ao redor do quarteirão, se posicionando nos pontos estratégicos esperando pelos compradores e após confirmarem o esquema, Kira e eu nos adiantamos com a invasão principal.
Acompanhando a telecinética de mais alto grau já registrada, enfiei minhas mãos no bolso da jaqueta assobiando tranquilamente enquanto caminhava atrás dela, que arremessava e chutava aqueles homens com toda a tranquilidade possível. Quando invadimos o salão de jogos do hotel, aí sim a diversão começou.
Porém, minha pupila inquieta precisava continuar a me importunar.
- Não fique nessa por tanto tempo você também - falei sentindo o olhar dela preso em mim apesar de estar ocupada quebrando a coluna de um cara contra a mesa de sinuca - Todo mundo já faz o favor de ficar me lembrando disso.
- De qualquer forma, obrigada por responder. Minha mãe também era uma assassina e foi a melhor do ramo se quer saber. Aposto que era melhor que seu pai.
Revirando os olhos para a minha pupila, suspirei cansado de suas perguntas insistentes sobre mim. Errei feio em nunca ensiná-la a parar de se gabar da péssima situação em que nossas famílias nos colocaram.
Acontece que apesar de conhecê-la desde os oito anos e ter assumido sua tutela poucos anos depois, Akira e eu nunca havíamos conversado bem sobre quem éramos de verdade. Porém, depois dos últimos acontecimentos com a Guerra Paranormal, a garota estava mais emotiva do que nunca e bem tentada a ficar grudada em mim. Parte de tudo foi minha culpa por tê-la deixado sozinha e no escuro por tanto tempo enquanto me ocupava em ser um traidor infiltrado na Liga dos Vilões.
- Sério, não sei por que insisto em responder suas perguntas, Kira. Não saía por aí dizendo essas coisas como se fosse... - disse sentindo minha voz sumir a cada palavra.
- Algo bom? - ela me interrompeu - Não é, mas que culpa eu tenho nas escolhas dos meus pais? Não é o mesmo pra você?
- É diferente - sussurrei.
- Ainda não entendo você, Keigo.
Nunca negando aquele fato, Akira adorava lutar, era visível em seus olhos a concentração em cada movimento do inimigo, entretanto, ela estava apenas adiantando a derrota daqueles homens para me manter inteiro.
As minhas asas ainda não haviam voltado a crescer. Nunca demorou tanto, mas foram tão danificadas pelas chamas azuis que nem puderam me dar certeza se voltariam. As sessões de curas não estavam sendo o bastante, só poderia continuar acreditando que elas voltariam. Já estava me cansando.
Para impedir mais algumas das infrações da Akira no trabalho, acabei ficando como responsável por supervisionar seu trabalho, mas eu não era o único que conseguia lutar e manter uma conversa irritante.
- Eu matei o All For One - a garota disse jogando as armas para longe do alcance deles - Você matou o Twice.
- Já não conversamos sobre isso? - perguntei cerrando os punhos depois de derrubar mais um daqueles capangas no chão, com mais força do que o necessário - O que mais tem pra falar?
- Não. Eu ainda não entendi o que quero.
- Atrás de você! - exclamei quando um olhar predador brilhou em sua direção, mas ela rapidamente o jogou ao seus pés com sua individualidade, pressionando o rosto dele com a sola de uma das botas.
- Você não reage, mas eu sei o que está pensando - ela disse cerrando os punhos - Quer nos encarar como assassinos? É um fato, não há outra verdade. Se vai ser assim, aceite e conviva com isso até morrer, mas não acredite que os erros do seus pais são de alguma forma culpa sua.
Meus olhos percorreram o salão de jogos em se preparando para o próximo capanga, mas Akira fez o favor de partir para cima dele amassando seu nariz com um dos chutes dela. Enquanto ele caía, minha atenção se fixou na parede do canto encarando meu fantasma particular com aquele olhar mortal que Twice carregava, seu silêncio cheio de acusações daquele dia. Fechando meu olhos por um breve instante, tentei me concentrei em manter a respiração estável.
- Você tem ficado durona demais, maninha.
- Alguém tem que ser a adulta entre nós. Olha, sei que não gosta quando digo isso, mas Twice iria causar um estrago sem precedentes. E falando como alguém que perdeu muita coisa, posso dizer que as pessoas desse país não deviam terminar sem nada como, bem, nós. Se é que me entende.
"Eu sei sim, Kira..."
- Ele era uma pessoa desse país também - disse desviando o olhar de uma vez daquele fantasma. Um grito atrás de mim voltou a me trazer a realidade. Akira havia paralisado por completo outro capanga que tentou avançar pra cima de mim, sua mão estava estendida envolvendo-o na aura vermelha de sua telecinese.
- Pare de se distrair - ela disse com a voz dura - Você é meu veterano, não devia me deixar te superar tão fácil.
- É você quem devia baixar a bola, maninha. Ainda te dou uma surra nos treinamentos como sempre.
- Cale a boca, Keigo! - exclamou envergonhada.
Depois de um tempo, a maioria daqueles homens já estava no chão e logo a polícia iria adentrar o hotel, mas ainda precisamos finalizar os insistentes. Assim como eles, Akira continuou com suas divagações.
- Queria ter um pouco mais dessa sua compaixão, mas minha tia me acharia mais fraca do que já pensa que sou.
- Pare de se preocupar com a opinião daquela lá. Alguém fraco nunca teria vencido tantas lutas quanto você.
- Olha só quem fala. Você é um idiota do caralho, Keigo. Ficou lutando com a porra de uma espada contra o maior vilão que esse país já teve. E o pior é que ainda conseguiu fazer a proeza de sair vivo!
- E você matou ele. Então, quem é o mais louco entre nós?
Quase terminando com seus alvos, Akira resmungou quando dois dos engravatados acabaram escapando das últimas salas que precisávamos limpar.
- Olha só Kira, estão querendo meter o pé. Vai pegá-los agora ou vai deixar pra mim?
- Dê alguns segundos de vantagem. A expressão de fracassados quando são derrubados é meio satisfatória.
- Pare de ser malvada com os coitadinhos. Precisamos deles conscientes pelo menos para o interrogatório.
- Não prometo nada, Keigo.
Deixando ela para terminar com aquele lugar, corri rapidamente entre os corredores atrás deles, tendo que saltar pelos corpos inconscientes jogados pelos cantos deixados pela garota quando invadimos. Pela falta das minhas penas, acabei os alcançando somente na entrada do hotel, mas eles nem sequer se afastaram demais dali.
Para minha surpresa, mechas rosadas de cabelo entraram no meu campo de visão.
Reconhecendo rapidamente a dona daquele cabelo, avancei para tentar impedir que eles a usassem como refém. De cabeça baixa, ela andava pesadamente com um uniforme que não reconhecia, apertando fortemente as alças da bolsa em seu ombro. Minha voz não a alcançou, pelo contrário, pareceu que o mundo parou quando aquelas duras palavras saíram de seus lábios antes que os criminosos a atingissem.
- Saíam da minha frente.
"Mova-se..."
Não sei quando meu corpo parou.
"O quê...?"
"Que merda é essa?!"
A única coisa que sei é que mesmo com minha mente gritando para que me movesse, para impedir que eles a machucassem, não consegui avançar. Meus pés não saiam do lugar e meus sentidos pareciam terem sido sugados completamente em sua direção. Cada um daqueles homens se desviou de seu caminho. Sem sequer diminuírem a velocidade, enquanto um bateu com a cabeça no poste de luz, o outro acertou o prédio ao lado da rua, ambos caindo no chão de forma desordenada.
Houve muitos momentos em que meus sentidos se aguçaram, principalmente pelo fator da individualidade, mas nunca senti nada como aquilo antes.
Ser o mais rápido, nunca baixar a guarda, a Comissão de Segurança já havia deixado bem claro qual era meu dever, mas ali, depois de enfrentar uma guerra, destruir de vez uma vida e acabar com tudo ao meu alcance, meu sangue gelou nas veias com a sombra obscura que emanava dela.
Aquela mulher continuou andando pesadamente como se nenhum de nós estivesse ali, sem nem mesmo desviar o olhar em nossa direção.
Quando retomei a consciência, o que pareceu uma eternidade em minha mente, percebi que meu corpo finalmente estava voltando ao meu controle. Já os dois fugitivos apenas continuaram no chão. Ouvindo passos se aproximarem atrás de mim, soltei o ar dos pulmões que nem mesmo percebi que estava segurando.
- Kira, me diz que foi sua telecinese... - sussurrei me virando para encarar seus olhos acinzentados vidrados em mim e seus ombros encolhidos enquanto segurava minha jaqueta. Aquela garota havia lutado com meio mundo, como ela também poderia ter paralisado daquela forma?
- Keigo... isso não veio de mim.
Não podia deixar a garota sem supervisão e nem sequer abandonar aqueles criminosos ali, além disso, aquela mulher ainda era só uma civil que não tinha nenhuma relação com o fato daqueles homens estarem apagados no chão, até que eu pudesse provar o contrário.
"Por quê...? Ela é só nossa vizinha temporária. Kira já verificou seus antecedentes e não há motivos para se preocupar... não é?"
Porém, meus sentidos ainda estavam gritando no fundo da minha mente para que eu levantasse a guarda contra ela.
"Yuna Aikyo, né? Vou me lembrar disso mais tarde", pensei comigo mesmo.
Desviando o olhar para atrás da minha pupila, percebi que já não havia sinais dela na rua, mas pelo caminho ela deveria estar indo em direção ao metrô que ficava a algumas quadras dali. Voltando minha atenção para Kira, seus olhos foram tomados de vermelho pela individualidade e giravam pelo lugar em busca do que estava nos ameaçando, apesar de não haver. Não podia deixá-la continuar confusa assim, então logo me recompus e estendi a mão para bagunçar seu cabelo.
- Relaxa aí vai. Temos que terminar isso aqui logo antes que sua tia surte.
Apesar de ainda estar com os ombros tensos, deixei que minha pupila de lado, enquanto verificava os pulsos daqueles dois idiotas caídos no chão, que graças aquela estranha, acabaram inconscientes jogados de qualquer maneira no chão. Cutucando as cabeças de cada um, pude ver o sangue escorrendo de suas testas devido as pancadas violentas.
- Kira, quando foi a última vez que sentiu uma presença tão forte? - perguntei suspirando cansado e apertando os olhos entre os dedos.
- Quando tinha um assassino tentando quebrar minha traqueia, Keigo.
Engolindo em seco, observei minha pupila continuar olhando para a rua fixamente, uma expressão inelegível quanto às suas emoções, mas claramente tentando entender que tipo de poder era aquele.
"Quem é essa mulher?"
~♡~
Querida avó,
Tem sido solitário aqui.
Não tem nenhuma novidade na família, se quer saber. Todos continuam entediantes e hipócritas como sempre foram. Meu pai quer que eu volte pra casa. Tem me ligado constantemente para falar sobre isso. Aparentemente, deve estar sentindo falta de alguém para humilhar. E minha mãe continua sem dar sinais de vida como sempre e não vou me dar ao trabalho de pesquisar o nome dela na internet pra saber se ainda está viva. Ela escolheu outra vida como você já me disse inúmeras vezes.
Eu não sei se quero ir para casa.
Na verdade, tenho certeza de que não quero voltar, só que também não quero causar mais problemas. Sei que sou adulta e já tenho idade pra cuidar do meu próprio nariz, mas não gosto disso. Sem você, perdi o único ombro em que poderia descansar.
Sinto que vou cair.
Faz sentido pra você?
Eu volto do trabalho todos os dias com fome, mas não quero cozinhar. Não sou boa nisso. E quando me deito, minha cabeça gira. Não estou sentindo minha individualidade muito bem, ela parece estar cada vez mais distante do meu controle e ao mesmo tempo transbordando dentro de mim. Sinto que estou prestes a ter cada vez mais problemas por causa dela.
Parece que estou desaparecendo dentro de mim mesma... Faz sentido pra você, vovó?
Tem sido solitário dormir no seu quarto, então vou continuar dormindo na sala enrolada em sua coberta vermelha.
Não quero chegar a sentir novamente aquela coisa estranha no peito que senti
quando o vovô se foi.
Vocês me deixaram sozinha.
Vovó, tem sido muito solitário aqui.
Isso dói.
Não sei o que fazer...
~♡~
☆(N/A): Apenas para explicações, Akira é minha protagonista da Fic "The Stars and Me" do nosso querido Bakugou e prefiri interligar o mesmo universo para essa história. Bem, espero que tenham aproveitado a leitura, quero trabalhar com os efeitos do arco da guerra de Boku no Hero porque sinto que tem muito sentimentos que merecem ser trabalhados aqui, principalmente
quanto a culpa do Hawks.
Enfim, sem spoilers, até a próxima :)
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