CAPÍTULO III

TODOROKI

Por algum motivo, apesar de tê-la visto uma única vez, algo em minha mente parecia me alertar à dias acerca de sua presença.

Durante as patrulhas, no fim do expediente, voltando para a casa, durante as coletivas de imprensa... Porém, foi preciso estar em serviço para que ela resolvesse aparecer. Depois de perseguir aquela sombra do local do crime até os túneis do centro da cidade, corri entre os trilhos do metrô, sem saber que meus pesadelos iriam ultrapassar minhas noites de sono.

Eu perdi as sombras dela quando chamas azuis começaram a iluminar a escuridão daqueles túneis. Dançando entre os dedos de uma mão completamente queimada, quanto mais as chamas iluminavam o ambiente e revelavam olhos azuis como o mar furioso em minha direção, mais as memórias retornavam com toda sua fúria.

"Quem diria, não é mesmo? O prodígio do Endeavor decepcionando tanto o papai."

Meu sangue congelou.

Apesar de não ter tido problemas com a missão anterior, parecia que meu corpo tinha lutado mil batalhas. O ar não era mais capaz de entrar em meus pulmões e apesar das mãos trêmulas, eu não conseguia me mover. Não conseguia usar meu poder. Não conseguia fazer nada.

- Touya... - sussurrei sentindo minha mente mergulhar em vertigem vendo meu irmão mais velho diante de mim.

"Terceiro lugar no Ranking de Heróis? Hum, não acho que isso seja suficiente. Ele vai te levar para a sala de treinamento assim. Ainda vai vomitar no chão como um bebê, Shoto? Vai fazer a nossa mãe tentar te proteger daquele homem mais uma vez?"

"Não pode ser...", pensei comigo mesmo.

"Quem podia imaginar? Terminou de arrancar a minha vida, a única coisa que restou, e ainda assim não conseguiu suprir as expectativas que ele tinha."

"Como poderia estar aqui?! Eu... eu vi você morrer diante de toda nossa família..."

"Como tem coragem de viver depois de tudo?! Deve ter sido bem melhor sem mim no seu caminho, não é mesmo Todoroki?!"

"Não... eu não queria... eu queria ter te salvado... eu juro.. "

"ME RESPONDE, SHOTO!"

- TOUYA! - as palavras rasgaram pela minha garganta vindo à tona de uma só vez.

A visão à minha frente começou a tremeluzir até que sua verdadeira forma surgiu misturada entre as sombras e iluminada em seu lado esquerdo por uma luz que se aproximava cada vez mais, porém não conseguia desviar meu olhar. As fendas dentro dos olhos verdes brilhantes e ferozes me perfuravam profundamente, mechas de um cabelo esverdeado quase negros caiam sobre seu rosto, que estava escondido por uma máscara que cobria metade dele.

Com arrepios percorrendo minha espinha, meu peito apertava cada vez mais com as batidas descontroladas do meu coração. Podia jurar que algo molhou meu rosto momentos antes.

Ela não disse uma palavra sequer, apenas inclinou a cabeça de modo curioso.

Não tive tempo o suficiente para sair daquele estado para questioná-la, não antes de perceber o trem em alta velocidade vindo em nossa direção.


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- Até quando vai ficar por aqui? - perguntei.

- Cala a boca, bastardo.

Bakugou nunca me pareceu o tipo de pessoa que perdia tempo. Desde a época do colégio ele sempre estava preso aos treinos ou às aulas se empenhando para melhorar seu desempenho, mas desde o momento em que se tornou o Herói Número Um do país, algo no olhar dele parecia ter mudado. Sentado a minha frente na cadeira do meu escritório, Bakugou parecia relaxado com o uniforme e as mãos postas atrás da cabeça. Depois de alguns gritos para que eu terminasse logo o relatório da última missão, ele se cansou de andar inquieto pela sala e acabou ali.

Ele era o único que sabia. Fui obrigado a contar depois dos gritos que ele me deu quando me arrancou dos trilhos à força para impedir a colisão com os trilhos.

Talvez tenha sido melhor assim. Meus amigos tinham uma certa tendência a se envolver quando algum de nós estivesse com problemas, mas não conseguia explicar, por algum motivo havia uma parte minha que sabia que nada de bom poderia acontecer se eles lutassem.

Não contra alguém capaz de fazer seus piores pesadelos se tornarem reais.

Bakugou entendeu. Disse que a luta era minha responsabilidade.

- Ei, meio a meio! - Bakugou exclamou chamando minha atenção - Não se incomoda de trabalhar com a assistente?

- O que tem contra ela? Só ficou reclamando até agora.

Bakugou resmungou algo incompreensível, apertando os olhos entre os dedos antes de bufar irritado. Sua paciência não andava lá essas coisas, como se algum dia ele tivesse tido, mas para minha surpresa ele manteve a voz neutra enquanto cruzava os braços.

- Nada em particular, mas ela fala demais quando não deve.

Mesmo estando com a assistente da Kira por pouco tempo, Lilith ainda não havia atingido a capacidade dos meus colegas de turma quando se tratava de falar, Ashido e Kaminari principalmente.

- Ei bastardo, não vou me meter nos seus assuntos, mas é melhor saber que merda vai fazer - Bakugou disse semicerrando os olhos - E não cause problemas pra bruxa.

- Não se preocupe com isso, eu não vou. Mas sabe, Midoriya disse que não devia chamar sua noiva de "bruxa".

- AQUELE NERD MALDITO! - gritou alto o suficiente para assustar a agência inteira - Quem ele pensa que é?!

Terminando de vez com o relatório, Bakugou nem sequer me deu a chance de me levantar para pegar os papéis na impressora, se adiantando com isso. Sua carranca se aprofundou enquanto corria os olhos pelas palavras, batendo a ponta de uma de suas botas de modo frenético no chão. Kira odiava quando o trabalho o deixava ansioso de uma forma capaz de fazê-lo ficar quieto e as últimas semanas estavam sendo cada vez mais estressantes.

Eu precisava encontrar aquela mulher capaz de trazer meu irmão de volta e impedi-la de machucar meus amigos. Por isso, depois de tentar todos os meis que tinha acesso como Pro Hero, acabei tendo que abrir mão daquele segredo sobre nosso encontro conturbado para pedir ajuda.

- Vai ir ver a Kira na Divisão de Inteligência? - perguntei chamando sua atenção.

Bakugou ficou tenso na sala, quase prestes a explodir os papéis em suas mãos. Não entendia o porquê daquilo, já que não era segredo para ninguém que ele aproveitava qualquer oportunidade que tinha para ir ao local de trabalho dela.

- Cale a boca, bastardo!

- Se isso for um sim, pode pedi-la para aumentar as minhas zonas de ataque nas próximas missões? Também quero aumentar as buscas depois do trabalho principal.

- Tsc. Peça você mesmo, ela adora te bajular - respondeu irritado, fazendo com que meus ombros se encolhessem no lugar.

- É a primeira vez que peço algo assim, mas não achei que a Kira confiasse em outra pessoa pra esse tipo de trabalho - comentei.

- Tirando o Aoyama e o telepata idiota que andam com ela, a assistente é a única que é capaz de tanta merda quanto eles.

- O que quer dizer? - perguntei confuso.

- Lerdo do caralho! - resmungou revirando os olhos antes de se dirigir à porta do escritório - Vai entender quando as dores de cabeça começarem. Vê se não me liga quando precisar limpar a bagunça.

Bakugou bateu a porta com tudo atrás de si, pois velhos hábitos nunca desapareceram. Depois de terminar com meus próprios relatórios do dia, me recostei na cadeira com um suspiro cansado, minhas pálpebras lutando para ficarem abertos, enquanto minha mente repassava cada detalhe daqueles estranhos encontros com a assistente da minha antiga colega.

- Lilith, não é? - sussurrei deixando meus olhos se fecharem - Não pensei que ia te encontrar outra vez...


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LILITH

Eu tenho uma irmã mais nova.

Seu nome é Iwa, mais conhecida entre o submundo com seu título de honra adquirido após seus crimes de alto nível.

Medusa, Senhora das Serpentes.

E ela é a maior vadia de todas.

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