03. The deadly tournament

O dojô estava quase vazio, e o silêncio era quebrado apenas pelo som dos meus passos ecoando no chão de madeira enquanto eu recolhia as almofadas de proteção e guardava os equipamentos. Meu corpo doía do treino intenso, mas a dor já era uma velha conhecida, quase confortável, como uma lembrança constante de que eu estava melhorando. Com o Sekai Taikai se aproximando, não havia espaço para fraqueza.

Eu estava dobrando o último kimono quando ouvi os passos familiares. Kwon. Minha peste de irmão mais novo. Ele parou na porta, encostando-se com aquele sorriso meio irritante que ele usava quando queria me provocar.

— Você está quase lá, sabe? — Ele disse, casualmente, enquanto cruzava os braços. — Quase me superando. Se não fosse por uma coisinha...

Eu ergui o olhar, já sentindo a irritação subir antes mesmo de ouvir o que ele ia dizer.

— Você ainda hesita. — Completou, com uma entonação irônica, como se estivesse me ensinando algo que eu já não soubesse.

Respirei fundo, tentando me acalmar. Kwon sabia exatamente em qual ferida tocar para causar um incômodo em mim. Ele sempre fez isso.

— Hesitação, é? — Retruquei, sem olhar diretamente para ele. — E você, Kwon? Como chama aquela sua queda por subestimar todo mundo, mesmo sabendo que um dia isso vai te derrubar?

Ele riu, mas havia algo nos olhos dele que dizia que eu tinha tocado num ponto sensível.

— Eu subestimo quem merece. Você sabe disso. — Ele deu um passo à frente, ficando mais perto. — E não adianta ficar na defensiva. Estou dizendo isso para o seu bem, Hanna. Se você parasse de hesitar, poderia até tentar roubar meu posto.

— Roubar? — Minha voz saiu mais alta do que eu esperava. Larguei o kimono e encarei ele, cruzando os braços. — Eu não preciso roubar nada, Kwon. Eu posso tomar seu lugar de melhor aluno quando quiser. Só estou esperando o momento certo.

— Ah, é mesmo?" Ele arqueou uma sobrancelha, claramente se divertindo. — E quando seria esse momento mágico?"

— Depois do Sekai Taikai, — Retruquei, um sorriso desafiador surgindo em meu rosto. — Não quero tirar os holofotes de você antes disso. Sei como você adora toda essa atenção.

Ele bufou, mas não respondeu de imediato. Por um instante, o ar ficou tenso entre nós, e eu sabia o que estava vindo. Sempre acabávamos assim, competindo, provocando, como se fosse impossível simplesmente existirmos como irmãos normais.

— É engraçado, sabe — Ele disse, quebrando o silêncio, sua voz mais séria agora. —, o quanto nos esforçamos para provar quem é melhor. Não parece que... Isso é tudo que o papai sempre quis de nós?

Minha expressão endureceu. Ele não precisava trazer nosso pai para essa conversa. Era como uma ferida aberta, que nada parecia possível para curar. 

— Ele nos moldou para sermos fortes — Respondi, com um tom defensivo. — Ele nos ensinou a nunca aceitar menos do que o melhor. Se isso significa que estamos competindo o tempo todo, então que seja. É assim que nos tornamos monstros no tatame, não?

Kwon soltou uma risada seca.

— Monstros, é? Você realmente acredita nisso, Hanna? Que ser forte significa ser um monstro? Papai não nos treinou para sermos fortes. Ele nos treinou para sermos como ele. Obcecados. Sempre procurando algo para superar, até mesmo um ao outro.

Fiquei em silêncio por um momento, as palavras dele pesando em minha mente.

— E qual é o problema com isso? É assim que vencemos. É assim que mostramos ao mundo do que somos feitos. Ou você vai me dizer que preferia que ele fosse diferente? Que não nos pressionasse tanto?

— Talvez — Ele respondeu, surpreendendo-me com a honestidade em sua voz. — Talvez eu preferisse que ele não fizesse parecer que o amor dele depende de sermos os melhores. Porque, se formos honestos, é isso que parece, não é? Que ele só nos enxerga quando estamos no topo.

Aquela última frase atingiu algo dentro de mim que eu tentava ignorar há muito tempo. Engoli em seco, tentando disfarçar o aperto no peito.

— E você acha que vai mudar alguma coisa ficar reclamando disso agora? É tarde demais, Kwon. Somos o que somos. E no Sekai Taikai, eu vou provar que sou melhor. Não para ele, mas para mim.

Kwon balançou a cabeça, um sorriso triste nos lábios.

— Você pode dizer isso quantas vezes quiser, Hanna. Mas eu sei que, no fundo, ainda está tentando provar algo para ele. Assim como eu. A diferença é que eu já aceitei isso. Você, por outro lado, ainda acha que pode ser livre disso.

Fiquei parada, o encarando, sem saber como responder. Ele estava errado. Tinha que estar errado. Eu lutava porque queria, porque amava o karatê, porque precisava ser a melhor. Não era por meu pai. Não era por aprovação. Era?

Antes que pudesse formular uma resposta, Kwon deu de ombros e começou a se afastar.

— Boa sorte no Sekai Taikai, irmãzinha — Ele disse por cima do ombro. — Espero que, quando perder, não hesite em levantar novamente.

As palavras dele ficaram ecoando em minha mente muito depois de ele ter saído. Me sentei no chão, os punhos cerrados, sentindo uma mistura de raiva e confusão. Ele não entendia nada. Ou talvez entendesse mais do que eu gostaria de admitir.

⋆౨˚ ˖

O ronco do motor do ônibus era o único som constante, misturado com o burburinho baixo das conversas tensas e o chiado de respirações controladas. A tensão estava no ar, quase palpável, enquanto nos aproximávamos do destino. O Sekai Taikai. O torneio que definiria tudo. Para o Cobra Kai, não era apenas uma competição, era a chance de provarmos que éramos imparáveis, que o nome Cobra Kai era sinônimo de domínio absoluto.

Estava sentada próxima ao corredor, o olhar fixo na janela enquanto as paisagens passavam como um borrão. Kwon, apesar das discussões corriqueiras, estava ao meu lado, recostado e aparentemente relaxado, mas eu o conhecia muito bem. Havia uma rigidez nos seus ombros que traía sua fachada tranquila. Nenhum de nós estava realmente calmo. Não havia espaço para isso.

Sensei Kim se levantou do banco da frente, com a postura impecável e o olhar afiado. Quando ela caminhava pelo corredor, o silêncio tomava conta. Cada passo seu parecia ecoar dentro de nossas cabeças, como um lembrete de quem éramos e do que se esperava de nós.

— Vocês estão prestes a pisar no maior palco do karatê — Começou ela, a voz cortante como uma lâmina. — Este não é um torneio qualquer. Isso não é para fracos. Não para os que hesitam, nem para os que perdem o foco.

Ela parou ao lado de Tory, que estava sentada alguns bancos à frente, de braços cruzados e com uma expressão de desafio.

— Tory Nichols. — Sensei Kim inclinou-se ligeiramente, analisando-a. — Você é forte. Mas força sem controle não significa nada. Está pronta para mostrar que pode destruir sem ser destruída?

Tory levantou o queixo, o olhar firme.

— Sim, sensei.

Kim sorriu levemente, mas não de forma encorajadora. Era um sorriso que dizia que ela esperava muito mais do que apenas palavras. Continuando, ela parou ao lado de Yoon, que estava sentado mais ao fundo. Ele estava com o olhar fixo à frente, os punhos cerrados sobre os joelhos.

— Yoon — Disse ela, em um tom que parecia mais pesado. — Você já sofreu nos treinos. Já sentiu a dor. Mas quero saber se está disposto a sentir mais, muito mais, se isso significar vitória. O Sekai Taikai exige tudo. Você está preparado para dar isso?

Yoon assentiu com firmeza, mas não disse nada. O silêncio dele era quase mais convincente do que palavras. Kim o observou por um momento antes de seguir para a frente do ônibus, mas não houve alívio.

Então Kreese se levantou. Sua presença era como um trovão no meio de uma tempestade. Onde Kim era afiada e metódica, Kreese era pura força bruta, cheio de ódio que ele parecia ansioso para canalizar em nós.

— Ouçam bem — Ele começou, a voz grave e carregada de intensidade. — Não estamos indo para o Sekai Taikai para apenas competir. Isso não é sobre medalhas ou aplausos. Isso é sobre destruir. Aniquilar. Quero que cada um de vocês entre naquele tatame com um objetivo claro, esmagar tudo e todos que estiverem no caminho. Sem misericórdia. Sem hesitação.

Ele olhou para cada um de nós, parando brevemente no meu olhar antes de seguir.

— Vocês são o Cobra Kai. Nós não lutamos apenas para vencer. Nós lutamos para dominar. Se algum de vocês acha que não pode lidar com isso, não ouse voltar ao dojo. Porque fraqueza... Fraqueza não tem lugar entre nós.

— Sim, Sensei! — Gritamos em uníssono, mas até mesmo minha voz tremeu um pouco. Não por medo, mas pela pressão esmagadora que ele fazia questão de deixar clara.

Olhei para Kwon ao meu lado. Ele me lançou aquele sorriso sarcástico que eu conhecia tão bem, como se dissesse: É isso que você queria, não é? E talvez fosse. Ou talvez eu estivesse começando a perceber que, no Cobra Kai, o único caminho para frente era através da dor, e do caos que ela carregava.

O ônibus estacionou em frente ao enorme ginásio, uma estrutura imponente que parecia chamar atenção até de quem não sabia o que estava acontecendo ali. O Sekai Taikai. O maior torneio de karatê do mundo. Pessoas de todos os cantos estavam reunidas, representando os melhores do melhor. Quando descemos, o ar parecia carregado, não só com a umidade da manhã, mas com a tensão quase palpável do ambiente.

Kwon desceu na minha frente, soltando aquele riso debochado típico dele.

— Não vai tropeçar na própria sombra antes de entrar, Hanna. Seria um péssimo começo.

Revirei os olhos, mas um sorriso breve escapou.

— Se tropeçar fosse um problema, você não teria saído do ônibus, Kwon.

Ele riu, balançando a cabeça enquanto ajustava o casaco com o logo do Cobra Kai.

— Vamos ver se sua boca vai ser tão rápida quanto seus socos no tatame, irmãzinha.

— Ah, você vai ver. Só espero que os outros não te façam parecer patético antes de eu poder te superar — Devolvi, aproveitando a chance de provocar de volta. Era sempre assim entre nós, uma dança de farpas e provocações. Apesar de tudo, havia uma base de respeito ali, mesmo que às vezes fosse difícil de perceber.

Enquanto o restante da equipe seguia para descarregar os equipamentos, me juntei a Yoon, que já estava parado ao lado, analisando o lugar. Ele estava focado, os olhos correndo pelos outros competidores que começavam a se reunir. Diferente de Kwon, Yoon era calado, mas isso nunca significava fraqueza. Na verdade, sua determinação silenciosa muitas vezes era mais intimidadora do que qualquer palavra que pudesse dizer.

— Pronta para carregar metade da equipe, Hanna? — Ele me lançou um olhar de lado, um leve sorriso puxando o canto de sua boca.

— Se for metade, é porque você vai carregar a outra — Respondi, ajustando meu próprio casaco e seguindo ao lado dele. — Só espero que o resto consiga acompanhar.

Caminhamos em direção ao interior do ginásio, onde os tatames brilhantes estavam sendo preparados. O cheiro de tatame novo e o som de passos ressoavam no ambiente enquanto as equipes se organizavam. Yoon e eu fomos designados para representar a equipe ao lado dos capitães no primeiro contato com os organizadores. Não éramos líderes formais, mas Kim e Kreese deixaram claro que éramos pilares da equipe. Se falhássemos, todo o time sentiria.

— Você consegue sentir? — Murmurei, enquanto cruzávamos o corredor em direção ao local principal.

Yoon ergueu uma sobrancelha.

— Sentir o quê?

— A pressão. O peso disso tudo. É como se cada passo fosse mais difícil que o último.

Ele soltou um suspiro baixo, mas deu de ombros.

— Pressão faz parte. Se você a ignora, é consumida. Se a usa, ela te molda.

— Palavras sábias, mestre Yoon — Brinquei, tentando aliviar um pouco do nervosismo crescente.

Ele me lançou um olhar divertido, mas logo sua expressão voltou ao normal.

— Você já sabe quem são nossos maiores obstáculos, certo?

— Os do Miyagi-Do. — Só de dizer o nome, meus punhos se fecharam automaticamente. — Eles são tudo o que precisamos destruir. Se quisermos dominar isso aqui, eles têm que ser os primeiros a cair.

Yoon assentiu.

— Sensei Kim e Kreese também acham isso. Eles têm o equilíbrio e a disciplina que são perigosos. Mas eles não têm o que nós temos.

— E o que seria isso? — Perguntei, mais para confirmar do que por curiosidade.

Ele parou por um momento, olhando para o tatame à frente, que parecia brilhar sob as luzes frias do ginásio.

— A fome. A necessidade de vencer a qualquer custo. Eles jogam limpo. Nós não temos esse luxo. E é por isso que vamos vencer.

Olhei para ele, sentindo o peso daquelas palavras. Ele estava certo. O Cobra Kai não tinha espaço para hesitação ou moralidade. Era vencer ou nada. Cada cicatriz, cada dor, cada treino insano, tudo nos preparou para este momento.

Quando finalmente pisamos no tatame para nos apresentarmos, o ar parecia mais pesado. Cada movimento que eu fazia era consciente, cada respiração medida. A multidão ao redor era um borrão. Os outros competidores eram apenas sombras. Mas, em algum lugar lá fora, os lutadores do Miyagi-Do estavam esperando, e eu sabia que eles sentiam o mesmo que nós.

Mas isso não importava. Eles não eram o Cobra Kai. E no Sekai Taikai, isso faria toda a diferença.

Obra autoral ©

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