01. Ghost of you

O sol da manhã escaldava minha pele, mesmo sob a sombra parcial do dojô ao ar livre. O suor escorria pela lateral do meu rosto, pingando no chão de madeira polida enquanto eu mantinha minha postura firme, sem medo de enfrentar qualquer desafio que me fosse imposto. Cada músculo do meu corpo gritava, mas a voz da Sensei Kim sobrepunha qualquer som interno.

Mais precisão, Hanna! Menos corpo mole! Um golpe ruim é um convite à derrota!

Seu tom cortante fazia minha espinha se enrijecer. Não havia espaço para erros. Não no Cobra Kai. Do outro lado, Kreese, com seu olhar de aço e postura intimidadora, comandava os alunos com sua voz rouca e poderosa.

— Sem compaixão! Imagine que essas tábuas são seus inimigos mais odiados! Eles estão aqui para te destruir, e você os destrói primeiro!

Minha respiração acelerava, meu coração martelava no peito. Eu estava diante de uma pilha de tábuas, a mais alta delas posicionada acima da minha cabeça, como um desafio inatingível, e eu só conseguia enxergar a imagem de meu pai. Acabe com isso, eu dizia a mim mesma. O dojo estava em silêncio absoluto, exceto pelos gritos de nossos senseis e o som abafado de golpes ao fundo.

Eu reposicionei meus pés, ajustando minha guarda. O mundo ao meu redor parecia se estreitar. Não havia nada além do alvo à minha frente. Respirei fundo, senti o chão sob meus pés e girei. Meu corpo inteiro se movia como uma engrenagem sincronizada, cada músculo alinhado, cada pensamento focado. Meu pé atingiu a tábua mais alta com um som seco e brutal.

CRACK!

O pedaço de madeira se partiu ao meio, caindo no chão em um estrondo satisfatório. Um silêncio breve tomou conta do local, antes que a voz de Kreese explodisse.

— É ISSO QUE EU QUERO VER!

De longe, eu sabia que Sensei Kim estava me observando com seus olhos críticos, procurando qualquer falha que pudesse ser corrigida. Minha respiração estava pesada, mas meus ombros se ergueram com orgulho. Eu sabia que tinha feito certo. Então eu olhei de relance para Kwon, meu irmão mais novo, que estava encostado em uma das colunas do dojô, observando tudo em silêncio. Ele era como uma sombra, sempre ali, mas nunca interferindo. Havia um brilho em seus olhos, um orgulho silencioso que ele raramente expressava em palavras. Isso significava mais para mim do que qualquer elogio gritante de Kreese ou Kim.

Eu era, além de Tory, a única garota do dojô. Mas isso nunca foi uma fraqueza, pelo contrário, era o que me impulsionava. Cada treino, cada golpe, cada gota de suor era uma declaração de força. Eu precisava provar que não estava ali por acaso, que não era apenas um nome, mas um guerreira, disposta a derrubar qualquer obstáculo.

E o Sekai Taikai estava cada vez mais próximo. O torneio mais importante do mundo. Era o que todos nós no Cobra Kai nos preparávamos para enfrentar. Uma batalha que não era apenas no tatame, mas dentro de cada um de nós. A pressão era esmagadora, mas era algo com o qual eu estava acostumada. Meu pai havia me preparado para isso desde que eu podia andar.

Ele não era um homem carinhoso, nem mesmo justo. Para ele, eu era um projeto, uma arma a ser moldada e aprimorada. Desde pequena, fui comparada a lutadores mais experientes, às suas expectativas impossíveis. Cada dia era uma batalha para alcançar o inalcançável. "Você não pode errar, Hanna," ele dizia, "porque no momento em que errar, alguém melhor que você vai tomar o que é seu."

Eu odiava essa frase, mas carregava ela comigo como um mantra, quase sem querer. Toda a minha vida tinha sido construída para esse momento, para mostrar ao mundo, e a ele, que eu era mais do que suficiente.

Meus punhos já estavam machucados, a pele das minhas mãos áspera e marcada, mas eu não me importava. Cada cicatriz, cada calo era um símbolo do quanto eu tinha me esforçado para chegar até aqui. Tory, minha única aliada verdadeira no dojô, sempre dizia que éramos mais duras que os outros porque precisávamos ser. Não havia espaço para fraquezas, e, no Cobra Kai, qualquer sinal de hesitação era tratado como traição.

Respirei fundo, observando o dojo ao meu redor. Cada aluno treinava com uma intensidade feroz, mas havia algo diferente nos meus movimentos. Algo que eu sabia que meu pai também via. Eu não era apenas uma máquina, como ele queria. Eu tinha algo mais. Algo que ele nunca entenderia, alma. Enquanto me preparava para o próximo exercício, com o grito de Kreese ecoando novamente no ar, eu olhei para Kwon. Ele apenas assentiu levemente, e naquele pequeno gesto, senti que tinha feito o suficiente por hoje, afinal, ele era a liderança dentre os alunos aqui, e apesar de ser apenas um pirralho ao meu olhar, ainda tinha de ter sua aprovação dentro do dojô, porque aqui não somos meramente irmãos, e sim, companheiros de um mesmo propósito.

Eu sei que amanhã seria mais difícil, já que enfim deixaríamos a Coréia e partir para terras estrangeiras, Barcelona. Seria o próximo passo para enfrentar não só os outros no Sekai Taikai, mas também os fantasmas do meu passado. E eu estava mais do que pronta para isso.

Kreese avançou para o centro do dojô, suas botas ecoando no chão de madeira. Sua voz firme cortou o ar como um comando de batalha.

— Hanna! Yoon! Pro tatame. Agora.

Não precisei de mais do que isso. Minha respiração ainda estava acelerada do último exercício, mas eu me movi rapidamente, posicionando-me no centro do dojô sem hesitação, eum círculo feito de pedras que ficava dentre a mata aberta do local. Meu oponente, Yoon, já estava lá, ajustando as faixas das luvas e lançando olhares confiantes na minha direção. Ele era alto, pelo menos um palmo ou dois acima de mim, e seus ombros largos deixavam claro que ele tinha vantagem em força bruta.

Mas aquilo não me intimidava. Pelo contrário, era exatamente o tipo de desafio que me fazia querer lutar ainda mais.

— Sem hesitação, sem misericórdia! — Rugiu Kreese. — Quero ver o que vocês vão fazer com seus adversários no Sekai Taikai!

Yoon abriu a luta com um ataque direto, lançando um cruzado de direita que por pouco não me acertou. Eu me abaixei a tempo, sentindo o deslocamento de ar próximo ao rosto, e respondi com um chute frontal no meio do peito dele. O golpe o fez recuar alguns passos, mas ele se recuperou rápido, um sorriso debochado se formando em seus lábios.

— Isso é tudo que você tem, Hanna? — Provocou ele, avançando novamente.

Desta vez, ele foi mais agressivo, combinando socos e chutes que me colocaram na defensiva. Eu consegui bloquear a maioria, mas não todos. Um gancho acertou minha costela, tirando o ar dos meus pulmões, e um chute lateral me fez cambalear para trás. A dor irradiava, e por um momento, quase senti minha determinação vacilar.

Não. Não agora. Não aqui.

No entanto, com a dor, veio a raiva. Raiva por cada golpe recebido, por cada palavra de dúvida que já ouvi. Raiva do meu pai, da pressão constante, da necessidade de provar que eu era boa o suficiente. Eu canalizei tudo isso, como Kreese sempre ensinava, transformando aquela emoção em força. E quando Yoon avançou novamente, eu estava pronta.

Desviei de seu soco com uma agilidade calculada, girando meu corpo e aplicando um chute giratório que acertou o lado de sua cabeça. Ele vacilou, mas não caiu. Aproveitei o momento e continuei com uma sequência rápida, um jab para distraí-lo, seguido por um gancho no abdômen que fez o ar escapar de seus pulmões.

— Vamos, Hanna! — Gritou Kreese. — Acabe com ele!

Yoon tentou se recompor, mas eu já estava no controle. Dei um passo à frente e apliquei um chute ascendente que o fez cambalear. Ele tropeçou, mas ainda estava de pé. Não por muito tempo. Kreese ergueu uma mão, o olhar frio como o aço. Era o sinal. Ele queria que eu terminasse o serviço.

Logo, sem hesitar, girei meu corpo mais uma vez, lançando um chute giratório perfeito que acertou o lado do rosto de Yoon. O impacto foi como um trovão, e ele caiu no chão com um baque pesado, completamente nocauteado.

Minha respiração estava pesada, e meu corpo queimava, mas não era de exaustão. Era a satisfação de vencer. Levantei o olhar e encontrei Kreese, que me encarava com aprovação. Ele acenou levemente, quase imperceptível, mas eu entendi o recado, "Bom trabalho".

Depois, meus olhos encontraram os de Kwon. Ele estava encostado na coluna, observando com a mesma expressão impassível de sempre. Mas eu sabia o que ele estava pensando. Um sorriso provocativo se formou no meu rosto, e o olhar que lancei a ele dizia tudo: Você é o próximo. Kwon não disse nada, apenas sorriu de volta, com um misto de contentamento e desafio nos olhos. Ele começou a bater palmas lentamente, um gesto que soava quase como um reconhecimento, mas com um toque de sarcasmo que só ele poderia dar.

— Controle, Hanna, — Disse a voz afiada de Sensei Kim, quebrando o momento. — Não se deixe consumir pela emoção. Isso é fraqueza.

Antes que eu pudesse responder, Kreese interveio.

— Não! Isso é exatamente o que ela precisa. Essa garra é o que vai fazer a diferença no Sekai Taikai. Continue assim, Hanna.

Olhei para ele, e sua aprovação me deu uma sensação estranha. Algo entre orgulho e um peso ainda maior sobre os ombros.

E com isso, o treino terminou logo depois, e todos nós começamos a sair do dojô. O silêncio entre os alunos era carregado de expectativa. O Sekai Taikai era mais do que apenas um torneio, era uma chance de provar quem éramos. Amanhã, partiríamos para Barcelona. E com tal triunfo, a verdadeira batalha começaria. Enquanto caminhava para fora, senti o peso do olhar de Kwon sobre mim novamente. Não precisei olhar para saber que ele estava sorrindo. Que venha o Sekai Taikai, pensei. Eu estava pronta, estava pronta para massacrar qualquer adversário para obter a glória da vitória.


Obra autoral ©

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