capítulo cinco
AO ABRIR OS OLHOS FICOU GRATA POR ESTAR SEMPRE NUBLADO EM FORKS, porque até aquela luz difusa a incomoda. Com um gemido abafado, ela se levanta para ir ao banheiro. Ela agradece ao universo por não estar ocupada porque realmente não tem forças para enfrentar Bella ou, pior, Charlie.
Enquanto deixa a água quente aliviar a dor latejante em sua cabeça, pensa em tudo o que aconteceu na noite passada.
Cheiras bem.
Você vai me punir, Chefe Swan?
As palavras preenchem sua mente e ela começa a se perguntar se é possível se afogar no chuveiro, porque neste momento ela prefere isso a ter que descer para encarar Charlie.
Não será por falta de vontade, menina insolente.
Seu reflexo no espelho parcialmente nublado pela neblina lhe confere um olhar crítico. Ela diz a si mesma que o calafrio que a percorre vem do contraste entre estar no chuveiro e depois sair. Não tem nada a ver com a lembrança do tom de voz de Charlie, com a sensação de seus dedos fortes e um tanto ásperos em seu queixo.
Em absoluto.
- Você não vai beber de novo. - ela ordena seu próprio reflexo, apontando para si mesma com a escova de dente. Nunca mais.
Quando ela se sente um pouco mais humana, ela desce, se animando. Ela não vai se desculpar por sair para festas, ela não é uma criança. Mas chegar bêbada em uma casa que não é sua está fora do lugar. Sim, apenas diga isso. Fácil.
Ela tem um discurso preparado para quando chegar à cozinha, onde apenas Bella está tomando café da manhã. Sua prima lhe dá um sorrisinho que semanas atrás teria sido uma grande conquista.
-Uma noite divertida? - ela pergunta enquanto Arizona se serve de um café preto. O líquido amargo desce por sua garganta, despertando seu cérebro de ressaca.
- Nunca beba coquetéis rosa. - responde, sentando-se em uma das cadeiras antes de roubar uma torrada do prato da prima, que revira os olhos. - Eu te acordei ontem à noite?
Bella encolhe os ombros.
- Eu tenho sono leve.
- Desculpe, não planejei falar tão alto. - ela se desculpa enquanto mordisca uma torrada. Agora se sente mal por perturbar o sono de Bella, suas olheiras o lembrando que ela tem que conseguir tudo o que puder.
Sua prima descarta o pedido de desculpas com um aceno de mão.
- É bom ter um pouco de vida em casa...Acho que mergulhei Charlie em um estado de preocupação mais profundo do que o normal. - ela toma um gole de seu próprio café antes de dizer casualmente. - Sua chegada é uma boa distração para ele.
- Ele não parecia muito feliz ontem. - Arizona responde quase num sussurro, em sua mente a lembrança dos olhos escuros de Charlie brilhando de raiva.
- Quando você chegar em casa, ele terá desaparecido. - Bella garante a ela. - Ele teve que ir à delegacia para uma ligação urgente.
- Seu trabalho é sempre assim? Tem que estar sempre disponível? - não perguntou isso como uma crítica, apenas por mera curiosidade. Ela quer saber mais sobre sua vida.
A adolescente acena pensativamente.
- Charlie adora seu trabalho, mesmo quando fica difícil. Faz parte dele.
- Deve ser incrível saber o seu lugar na vida e ser feliz com isso. - Arizona pensa em voz alta, ganhando um sorriso simpático de sua prima.
- Sim, o resto de nós tem que remar contra a corrente.
- Nós também não fazemos isso tão mal.
A risada de Bella é um tanto baixa e desafinada, como se já fizesse muito tempo que um som como esse não saía de sua garganta, mas ela finalmente sentiu.
- Não, não fazemos mal. - ela admite antes de ambas começarem a pegar as coisas do café da manhã.
Quando Bella sai para a escola se despedindo com um sorriso e Ari fica sozinha em casa, ela pensa na prima, na mudança de atitude que teve nas últimas semanas. Ela sabe que a principal ajuda foi de Jacob, mas sente que, talvez, apenas talvez, a sua presença ali seja útil, afinal.
★
Arizona olha para o buquê de margaridas que segura enquanto caminha. Depois de várias horas chatas em casa e de uma conversa com Lucy sobre sua noite de sucesso - pelo menos ela ficou ontem à noite - ela decidiu dar um passeio. Ela não esperava encontrar uma floricultura, era pequena e tinha poucas flores, mas não pôde deixar de comprar as flores que eram melhores naquele momento: margaridas.
Não que essa seja a sua flor preferida mas ela prefere-a às típicas rosas. Ela se inclina para cheirá-los e um sorriso curva seus lábios para cima automaticamente.
O sorriso permanece em seu rosto até ela entrar em casa. Mas se apaga quando vê Charlie sentado à mesa da cozinha, com uma lata de cerveja na mão e o olhar perdido na paisagem vista pela janela.
- Ei. - cumprimenta-o, deixando delicadamente as flores sobre a mesa.
Charlie pisca como se não a tivesse ouvido chegar e limpa a garganta, direcionando o olhar para ela.
- Ei.
O silêncio se estende entre eles e Ari suspira antes de se sentar em uma das cadeiras livres. Seus olhos azuis percorrem o rosto do homem, seu rosto sério e seu olhar triste. A raiva da noite passada parece ter evaporado, mas Arizona prefere isso a esse estado de derrota.
-Uma decisão difícil? - ela pergunta baixinho.
Ele balança a cabeça antes de tomar um gole de cerveja.
- Um acidente de carro. Geralmente há alguns quando o tempo piora. - como para confirmar suas palavras, a garoa lá fora que mal incomodava Ari em sua caminhada se transforma em uma chuva mais forte. - Um garoto de vinte anos. Não sobreviveu. Eu tive que contar aos pais dele.
- Meu Deus... - Arizona murmura e antes que ela possa pensar no que está fazendo, ela pousa a mão na dele. Suas mãos se juntaram sobre a mesa. - Sinto muito, Charlie.
O aceno do delegado demonstra uma gratidão mais profunda, assim como o fato de ele não retirar a mão do contato com a da jovem. Só um pouco. Só isso. Com isso conseguirá sobreviver ao dia.
- Eu também o sinto. Por causa de ontem à noite.
- Charlie...
- Você tem o direito de sair quando quiser e se divertir. Você é jovem e só existe uma vida. - Ele move a mão para retirá-la de baixo da dela, seus olhos de repente não olham mais para ela, mas ficam fixos em algum ponto indeterminado por cima do ombro dela. - Perdi um pouco a paciência, me desculpe por isso.
- Você tinha o direito de ficar com raiva, esta casa é sua. - o tom de Ari é suave, mas confiante. - Da próxima vez que eu sair para uma festa vou passar a noite na casa da Lucy. - enruga o nariz enquanto um pequeno sorriso ocupa seus lábios. - E garanto que nunca mais beberei coquetéis rosa.
Isso faz Charlie sorrir, apenas um gesto simples, mas que apaga parte das sombras que nublam seu olhar.
- Sabe? Você é boa em encorajar as pessoas. Você deveria abrir um consultório na cidade.
Isso faz Arizona rir, nem por todo o ouro do mundo ela abriria seu próprio consultório. Mas admitir isso em voz alta seria aceitar que desperdiçou milhares de dólares em estúdios que não deseja usar.
- Duvido que alguém desta cidade queira ir
Charlie faz um barulho agradável com a garganta.
- Aqui as tensões são aliviadas pela caça ou pesca.
O olhar claro torna-se curioso e o delegado ousa olhar para ela novamente.
- Qual é o seu método?
- Pescaria. Eu adoro pescar. - o suspiro que escapa de seus lábios é pesado, quase melancólico - Mas com todas essas coisas sobre Bella... eu não vou há meses.
- Você deve. Bella está muito melhor agora.
Uma ruga ocupa o espaço entre as sobrancelhas do homem.
- Não sei, não quero deixá-la sozinha, eu... não tenho sido um pai muito presente e quero corrigir isso.
Arizona sente um calor aquecer seu peito ao ver a sinceridade em suas palavras, a verdadeira preocupação com seu papel como pai. Está olhando para um homem que realmente deseja fazer as coisas certas.
- Você também tem que ter seu próprio espaço. Vá passar um fim de semana com Billy. Eu vou ficar aqui.
- Tem certeza?
Arizona balança a cabeça positivamente.
- Você não precisa defender o forte sozinho, Charlie. Estou aqui para ajudar.
O sorriso que o delegado lhe dá o faz sorrir da mesma forma. De repente Charlie olha para as flores ainda sobre a mesa e levanta as sobrancelhas.
- Você comprou flores? - ele pergunta curioso.
Arizona sente o rubor se espalhar por seu rosto. Sua paixão por flores é pouco conhecida e ela certamente não contou ao homem. Não é que ela tenha vergonha, isso seria ridículo, ela só não costuma se abrir muito com ninguém.
- Eu as vi na floricultura e gostei delas. Pensei em colocá-las aqui para adicionar um pouco de cor. Tirando aquele amarelo horrível. - com um gesto aponta para os armários naquele tom desbotado que lembra mostarda.
Charlie não consegue evitar de rir.
- Renée pintou toda a cozinha antes de sair. Ela disse que isso o lembrava do sol que nunca visto aqui. - ele bufa, tomando um gole de sua cerveja. Seus olhos vagando pelos móveis. - Nunca ousei pintá-los novamente.
- Oh.
É tudo o que Arizona pode dizer enquanto sente um aperto no coração. Talvez Charlie ainda ame sua ex-mulher? É por isso que você não remove o último vestígio da presença dele na casa?
E se sim? Não é da sua conta, ela se repreende silenciosamente.
- Vou colocá-las no meu quarto. - ela diz enquanto encara as margaridas. Pequeno e sem importância, esmagado por uma vida inteira de memórias entre aquelas paredes.
- Não. - o homem responde rapidamente. - Vai ficar bem aqui, vai dar vida.
Antes que Ari possa dizer mais alguma coisa, Charlie larga a lata de cerveja e pega o buquê de flores. Ela circula pela cozinha, abrindo gavetas e móveis até encontrar uma jarra de vidro adequada para encher de água e colocar as flores dentro, bem ao lado da janela.
Ele olha para a garota com um sorriso pequeno e inseguro.
- Você estão bem aqui?
Arizona não pode deixar de sentir uma certa excitação ao ver suas flores ali, então ela apenas balança a cabeça, um sorriso iluminando todo o seu rosto.
- Elas são perfeitas, Charlie.
Ele acena com a cabeça e o olhar de conhecimento que eles compartilham vai muito além de qualquer palavra que possam dizer.
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