#18
Ushijima Wakatoshi não era alguém do convívio de Hana, na verdade, nunca foi. Ele era um garoto o qual ela estudava as técnicas e assistia aos jogos para montar estratégias decentes para o seu time, mas ter uma conversa com ele? Não, isso era demais para duas pessoas que sempre foram introvertidas e que não se adaptavam bem à prática de ser gentil ou de puxar assunto.
Lembrava-se brevemente de duas situações em que esteve com ele, a primeira, quando se trombaram no ginásio em que ocorria as partidas dos nacionais, onde o garoto perguntou se o irmão dela estaria interessado em entrar para academia Shiratorizawa, e a segunda, quando Ushijima ofereceu pagar o suco de Hana em uma das máquinas de bebidas do ginásio, a nota dela havia emperrado dentro da máquina e o garoto queria agilizar o processo.
Foram situações comuns, sem história para contar e que muito provável não iriam ser lembradas caso não estivesse no carro dele neste exato momento queimando de vergonha, não queria pensar em Suna, mas não conseguiria esquecer os detalhes tão específicos que fez questão de dar sobre a festa do dia anterior, inclusive, o fato dela ter roubado o copo de bebida daquele que agora dirigia o carro.
— Eu gostaria de me desculpar pela noite anterior. — Hana mexeu no próprio vestido, desconfortável com a situação, mas apta a pelo menos tentar não ser uma completa esquisita no carro de um conhecido — Sabe, por ter roubado sua bebida. Não foi nada legal da minha parte.
— Você estava alterada, não tinha intenção de fazer mal... Seria estranho se eu me importasse com esse tipo de coisa - ele respondeu sem desviar o olhar da rua escura, a voz dele era grossa e grave e lenta, tinha um dicção boa e realmente fazia jus a aparência de sério. — Quer que eu desligue o ar? Você parece estar com frio.
— Não, não! - Hana mexeu as mão em discordância — Está ótimo, obrigada.
O silêncio de ambos era como um tratado de paz, onde os dois lados conciliavam para ficar quietos e não se forçarem a conversar para quebrar o clima, e sinceramente, o silêncio que ele a oferecia trouxe uma casta sensação de conforto. Ela não o conhecia, mas tinha noção de que apreciava a quietude, isso o transformava automaticamente em uma pessoa legal para Hana, que vivia rodeada de pessoas barulhentas que não conheciam o conceito básico de espaço pessoal.
Apoiou o cotovelo do batente da janela fechada, observando as casas passarem uma atrás da outra, optou por olhá-las até embruxar seus olhos com a falta de piscadas, a concentração era o refúgio daquela garota que tinha o coração pesado.
Ela quis arranjar um pretexto para se afastar de Suna e ela conseguiu, um que infelizmente doeu mais do que o esperado. Hana já se envolveu casualmente com um desconhecido e já se apaixonou por um amigo, mas nunca havia provado a sensação de se envolver com alguém e ter que afastar na noite seguinte pelo bem de outra pessoa que não seja ela.
Ela desde o início soube que Mayumi era apaixonada pelo melhor amigo. Desde a primeira vez que a garota abriu a boca para falar do maldito garoto o qual ela não conhecia até ontem.
Hana viu a maneira que Mayumi olhava para Suna durante a conversa, viu como Suna, a muralha indestrutível, ceder e ficar nervoso na presença dela. E o pior de tudo é que Hana havia escutado a garota falar do melhor amigo por dias, a maneira apaixonada que explicava o quanto ele era incrível, como sorria enquanto contava as memórias dos dois, em como se debulhou em lágrimas ao contar que o havia machucado profundamente... Hana queria que os dois se entendessem até descobrir quem era a outra pessoa.
E com cada descrição que Mayumi dera, de como o amigo era espetacular, dedicado e alegre, carinhoso e em como ele amava a família, Hana percebeu que nunca chegou a conhecer uma porcentagem minúscula de quem Suna realmente era. Ela relembrava das histórias dos dois e não conseguia pensar se um dia seria capaz de ser para ele o que um dia Mayumi foi.
A sensação de afastar-se de alguém por não ser o suficiente era dolorosa e maçante. Ainda mais quando estava disposta a tentar, a abrir mão de pelo menos um pouco de seu orgulho para permitir que Suna adentrasse em seu coração.
Mas não poderia ser tão egoísta a ponto de atrapalhar a oportunidade de Mayumi ser feliz longe do namorado instável. Com alguém a altura dela.
— Você está bem? - Ushijima parou o carro, pelo visto, já tinham chegado no campus — Ah... Você está chorando?
Hana se esvaiu dos pensamentos tensos, voltando a realidade assustada com as bochechas molhadas. Seu coração doía por um motivo imbecil, ela não gostava de Suna, nunca fez questão da presença dele...
Ou era isso que dizia a si mesma para evitar enganar-se de novo com esse maldito sentimento.
— Oh, céus... - Hana soltou uma risada amarga tocando nas próprias lágrimas — Isto é ridículo! — Ela tentava parar mas não conseguia continuava a escorrer e seus músculos começaram a tensionar pela ansiedade.
— Eu te assustei? - Hana parou de súbito, encarando o garoto de expressão indescritível, o tom de sua voz demonstrava preocupação e culpa — Geralmente faço isso com as pessoas. Não foi minha intenção, eu só queria ajudar...
— Não, não, pelo amor de Deus, não! - Hana secou as lágrimas com o dorso da mão, encarando o garoto com compreensão na face, tentando dar a ele um curto sorriso reconfortante — Você não me assusta, você é uma pessoa gentil, Ushijima. Eu só estou com problemas demais e o álcool ainda está no sangue - Ela solta uma risada curta para tentar amenizá-lo. — Eu agradeço pela carona, você pode ter me salvado, sabia?
Hana estava agindo fora da curva, por que sentia-se na obrigação de ser gentil com ele? Por que não queria vê-lo triste? Por Deus, Hana estava enlouquecendo ou finalmente começou a ter empatia por estranhos?
— Eu preciso ir agora, mas eu agradeço pela ajuda. - Hana se inclinou na direção de Ushijima depositando um leve selar em um sua bochecha como agradecimento — Se eu puder retribuir - Hana pegou sua bolsa começando a procurar um pedaço de papel e a caneta que sempre carregava consigo. Rapidamente anotou com dificuldade seu próprio número, pediria para ele colocar o próprio número no celular dela mas a mesma o havia esquecido na maldita fraternidade — Só me ligar, tudo bem?
Ushijima pegou o papel, encarando-o com uma expressão indecifrável, mas logo levou seu olhar a Hana e deu a ela um sorriso quase imperceptível, mas ela soube interpretar aquilo. Sempre teve facilidade em lidar com pessoas que possuíam dificuldades em se expressar, ela as entendia como ninguém.
Saiu do carro finalmente podendo respirar ar fresco, o odor agradável e natural das gardênias invadiam seu nariz ao caminhar pela grama do campus. Segurava os saltos em uma mão enquanto a outra dava conta de secar as malditas lágrimas que ainda insistiam em cair uma atrás da outra.
Se sentia patética e fraca, nunca havia chorado na frente de outra pessoa, suas lágrimas eram sua fraqueza e não tinha desprezo maior por si mesma quando cogitava a possibilidade de desabar em frente a alguém. E era humilhante o fato de que era por Suna que não conseguia parar de chorar, Hana queria gritar, queria gastar toda a sua maldita voz para ver se conseguia voltar a realidade, se tocar de que não era uma adolescente, que aquele infeliz não era o último homem do mundo e muito menos o homem que merecia estar ao lado dela.
A lua era testemunha do prolixo das lágrimas de uma garota que um tempo atrás não cogitava a mera possibilidade de se apaixonar por alguém, que acreditava que o ato e as consequências da paixão deveriam ter sido abandonados juntos a Tsukishima e ao ensino médio, enterrados no passado e esquecidos com o decorrer do futuro.
Mas ela se apaixonou de novo, por alguém que mal conhece, que a encantou com provocações e que tem uma habilidade incompreensível de entendê-la como ninguém. Um garoto de olhos avelã, contornados por um aro dourado que a guiava com olhar inimaginável e surreal, de sorriso bonito e com um talento espetacular para fotos havia conquistado e quebrado o coração dela no momento em que a encarou naquele maldito primeiro dia.
[***]
Ele deveria ter ido atrás dela?
Suna segurava o celular de Hana, deitado em sua cama segurando o aparelho, olhando para ele fixamente pensando em como olhar para ela quando fosse devolver.
Percebeu que não tinha senha para entrar no aparelho, não tinha papel de parede e não havia nenhuma mensagem ou aplicativos além dos comuns que já vinham no celular e outros para estudos, ele ousou desbloquear porque tinha noção do que iria encontrar.
Quase nada. Apenas dois contatos estavam salvos, o do pai dela e o de Mayumi, não tinha o número de mais ninguém, nem o de Kuroo ou Kenma, eram só aqueles dois que Hana julgou como os únicos importantes o suficiente para salvar.
Desligou o telefone jogando-o para o lado do colchão, sentindo-se culpado por ter invadido a privacidade dela, talvez pedisse para um dos amigos dela entregar pela manhã.
Suna se perdeu olhando atentamente para o teto pensando no quão burro e imbecil ele era, por que ele ficou calado quando ela fez aquela pergunta? Por que ele não foi atrás dela sendo que tudo o que ele quer é ela?
Suna tinha mania de não agir e se condenar depois. Tinha medo.
Medo de agir errado porque seu relacionamento com Hana era instável e perigoso demais, ele andava sobre navalhas sempre com medo de machucá-la ou assustá-la, de confundi-la ainda mais com falsas intenções. E no final, foi exatamente o que ele fez e ela, como esperado, reagiu como sempre.
Ou talvez só significasse algo para ele, Hana não parecia sentir nada além de atração, não tinha admiração e muito menos paixão da parte dela, mas era diferente com a Mayumi, Hana realmente gostava dela. A garota o jogou de escanteio no primeiro sinal de que a loira pudesse sair machucada, ela foi tratada com máxima importância para alguém que mal demonstrava emoções.
Mayumi não merecia esse tipo de atenção, principalmente de Hana, a loira era instável, brincava com todos a sua volta e olha que essa é a visão de Suna sem contar com a própria experiência. Ela era uma boa pessoa mas o seu maior defeito é ser confusa demais, não que ele não fosse, mas a sua confusão nunca machucou ninguém e ele sempre trabalhava para mudar as pontes de incoerências em sua vida, mas Mayumi não, ela as abraçava e convivia junto às suas inconstâncias, se apegava aos vícios e ignorava todos os problemas e consequências que suas imprudências causavam a todos.
E a pergunta que não quer calar, que retumba em canto canto de sua cabeça era se ele sentia algo por Mayumi.
Admiração.
Talvez esse fosse o sentimento que guiava todos os outros, Suna admirava Mayumi no seu trabalho, no jeito de ser, na força por aguentar tudo o que passou com um sorriso no rosto. Mas era isso, o desejo já havia esfriado a tempos, sentiu-se triste quando percebeu que era uma segunda opção mas ele superou rápido, por entender a amiga e a situação dela e por mais que não houvesse um pedido de desculpas da parte de ambos, Suna não a culpava e não tinha raiva, só queria um tempo longe dela para poder pensar melhor.
Ainda que tivesse um leve rancor por ela ter sido uma estúpida com ele em vários sentidos, Suna se importava com Mayu mas agora ele só queria que a garota sumisse. A confusão dela atrapalhou alguém que ele realmente queria.
Não teve palavra ou ato que Mayumi disse ou fez que doeu mais do que ouvir Hana dizendo que não sentia nada por ele e que não se importava.
Merda, ele tinha ciência disso desde o início, sabia que não podia se apegar a ela. Hana nunca foi confusa com ele, sempre foi direta e não conturbou suas intenções. O erro foi da parte dele, por ter insistido em algo que não vingaria e ter se perdido nela, deixado se levar pelo olhar mórbido e lindo e personalidade intrigante.
Hana o conquistou sem fazer o mínimo esforço, sempre o atraiu feito um imã e quando se colidiram foi letal, pois agora não conseguia ficar longe dela.
Mas podia doer o quanto fosse, Suna não perturbará a paz dela, sabe que Hana não tem muita paciência e muito menos tempo para lidar com mais um problema.
Deixaria ela em paz e livre. Talvez assim ela pudesse encontrar alguém que desse-a paz e estabilidade, não o contrário.
— Hana, você está aí? - a voz da garota loira invadiu o quarto, deixando como rastro uma dor de cabeça insana no garoto — Onde está ela? - Mayumi o encarou com desconfiança, acendendo a luz do quarto.
— Foi embora. Já deve estar no campus a essa hora. - respondeu Inexpressivo, bloqueando com o braço a luz amarelada que agredia seus olhos — E você pode ir fazendo o mesmo.
— Já que você está aqui... Queria conversar.
— Mas eu não tô muito afim de falar com você, por favor, vá embora. - as palavras não soaram rudes ou desdenhosas, simplesmente saíram como um suspiro cansado.
— Por que tem tanta raiva? Eu não quero que você me aceite de volta, nem como amiga e nem como outra coisa. - apoiou-se no batente da porta, séria como nunca esteve antes — Só não quero que isso acabe com uma interrogação, se for para ser assim, prefiro colocar um ponto final de uma vez.
Suna se levantou, um pouco turvo por conta da rapidez mas se manteve de pé, fitando-a feito um gato à espreita, desconfiado e atento a cada movimento da garota.
— Não estou raiva, muito menos quero que nossa amizade tenha um fim mas eu preciso de um tempo longe de você - Suna cruzou os braços e Mayumi quase se perdeu nos músculos sendo ressaltados pelo aperto — Sei que pode soar rude e egoísta mas eu não me importo de qualquer maneira.
Ele se assustou com a semelhança que seu tom de voz teve com o que Hana geralmente usava contra ele.
— Sua confusão me afeta, me deixa mal e acima de tudo me irrita. Você ser indecisa e inconsequente é o seu pior defeito porque começou afetar não só eu, e sim, outras pessoas.
— Do que você está falando? - Confusão era sua máscara principal e Suna estava farto dela nunca entender.
— A meses ficou claro que você não sente nada por mim e de repente começa a agir como se magicamente tivesse se apaixonado por mim e-
— Mas eu gosto de você! - Mayu adentrou no quarto fechando a porta para que nenhuma das pessoas do andar de baixo pudessem escutar — Eu sei que eu errei e que agi feito uma desgraçada uma porrada de vezes, mas é você quem eu quero de verdade e por mais que eu esteja disposta a abrir mão disso eu quero que acredite em mim... Pela primeira estou convicta do que eu digo.
Suna estreitou os olhos, os lábios se transformando numa linha fina e tremeluzente. Raiva. Era isso que seu olhar transmitia.
— Você sente o mesmo por mim? - a voz dela o atingiam feito facas lançadas ao ar.
Não era conflito que o deixava irritado, era o fato de que esperou anos para ouvir essas palavras de Mayumi, imaginando como seria incrível ser recíproco, mas a única coisa que conseguia pensar agora era em como queria que fosse Hana a dizer essas palavras.
— Não. - não foi hesitante desta vez, foi firme e não perdeu a compostura e muito menos vacilou diante dela — Não mais.
— Posso perguntar o que te fez mudar? - Mayumi tinha os olhos marejados. Ela não estava esperando ser rejeitada pelo visto.
— Foi outra pessoa. Eu tenho - Suna tossiu para disfarçar o erro — Eu tinha… Outra pessoa.
Suna nunca partiu o coração de ninguém, mas aquela foi a primeira vez que viu algo parecido. Mayumi não chegava a chorar, se segurava com todas as suas forças para não desabar na frente dele, seu coração apertava e tudo o que queria era que não fosse verdade, queria que o tempo em que Suna era como uma sombra em seu encalço e que só sua companhia bastava para deixar ele feliz.
Mas já não era mais assim. Ele se contentava com a presença de outra.
— O que ela tem de especial? O que fez você mudar depois de anos junto a mim? - a loira não estava nervosa ou com raiva da garota, só tinha dúvidas, o que há de tão errado nela? — O que ela tem de diferente?
Ela estava com inveja, porque Mayumi perdeu Suna em questão de semanas para alguém que não precisou de anos juntos para criar laços.
Soltou uma risada anasalada descruzando os braços indo até a porta abrindo-a com cuidado, um convite educado para ela se retirar.
— Nunca comparei vocês duas. O que ela tem é dela, é único e nunca precisou ser equiparada a você para me fazer sentir algo, até porque ela não me mudou, ela só entrou na minha vida e foi o suficiente - Suna deu espaço para ela sair — Você é hipócrita, disse que estaria disposta a abrir mão desse sentimento ridículo que diz ter por mim, mas você está aí, questionando algo que nem mesmo eu tenho controle. Mayumi, nós não escolhemos por quem nos apaixonamos.
Foi a primeira vez que admitiu em alto e em bom som, sem esconder o que sentia e mesmo sabendo que os dois já estavam condenados ao fracasso ele não poupou voz, não escondeu e não hesitou.
Mas queria se enterrar na cama neste exato momento e esconder esse sentimento irritante para sempre. Do que adiantava admitir para Mayumi sendo que Hana não escutaria.
Foi doloroso antes saber que Mayumi não o correspondia mas nada comparável a uma quebra de conexão tão intensa quanto a que tinha com Hana.
— Tudo bem. - Mayumi estava chorando e uma pitada de culpa cutucou o coração de Suna — Desculpa por tudo o que eu causei e eu espero que um dia nós possamos nos reconciliar como melhores amigos outra vez.
E assim ela se foi escada abaixo, sem o desdém e sem raiva, apenas foi embora deixando-o sozinho preso a alguém que já estava a oceanos de distância.
Se dirigisse por quinze minutos poderia encontrá-la. Dentro do quarto no campus, quieta e reclusa nos estudos, poderia estar frente a frente, mas ainda sim seria uma eternidade de distância entre os dois.
Não era uma simples coisa qualquer que os separavam, era uma amizade, o orgulho, o ego, o desdém e acima de tudo a paixão, tão forte e incontrolável. Suna e Hana se afastam um do outro todas as vezes em que se encontram pois todos os sentimentos chocam-se em um baque estrondoso.
N/A: Suna fez duas gostosas chorarem no mesmo capítulo, prendam este homem imediatamente!!
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