2.1
A noite já havia tomado conta do céu quando vocês retornaram à clínica. Geto estava em um silêncio que para você soava suspeito demais, mas tentava ao máximo que aquilo não passava de algo da sua cabeça, o ambiente familiar da clínica trazia uma sensação de segurança, mas, ao mesmo tempo, uma inquietação crescente se instalava dentro de você. A tranquilidade aparente contrastava com a turbulência dos últimos dias, dos últimos meses, dos últimos anos.
Você suspirou pesadamente enquanto desfazia a pequena mala com roupas que havia levado para a viagem que haviam feito, você sentia seu peito inquieto, quase como se seu corpo inteiro gritasse que havia errado. Geto estava estranho, quando você perguntou para ele se estava tudo bem durante o percurso da estrada ele apenas riu suavemente e respondeu um:
Está, tudo bem, princesa.
Você não quis o pressionar mais, mas sabia que algo não estava certo, respirou fundo de maneira ansiosa sentindo seu coração bater de modo acelerado, desesperado, contra seu peito. Você jogou o restante das roupas sob a cama e decidiu tirar aquela história a limpo de uma vez por todas, não aguentava aquilo.
Saiu do quarto na direção do corredor praticamente vazio aquele horário tirando as poucas enfermeiras que estavam em ronda, uma brisa suave tomando conta de seu corpo, você suspirou trêmula abraçando o próprio corpo enquanto andava na direção do consultório de Geto, bateu na superfície amadeirada sem resposta, esperou um pouco antes de a abrir por fim.
A sala estava na penumbra, apenas a luz da lua se fazendo presente por entre as frestas da cortina.
— Geto?
Você chamou com a voz baixa sem respostas, estava prestes a fechar a porta e voltar para o quarto quando escutou um ruído no consultório, você piscou devagar antes de entrar de uma vez fechando a porta logo atrás de si, tentou ligar a luz sem sucesso.
Você cerrou os olhos tentando enxergar uma figura alta que estava em pé próxima a escrivaninha do homem de cabelos longos.
— Geto?
Chamou novamente, a voz mais falha dessa vez andando até a escrivaninha devagar.
— Já faz tanto tempo que não me vê que conseguiu esquecer como eu sou, (Nome)?
Uma voz conhecida e grossa se fez presente, seus pés estancaram ali mesmo, você arregalou os olhos sentindo seu sangue gelar, seus dedos rijos.
Não, aquilo era um pesadelo, só podia ser, seu cérebro gritava para que você corresse o mais rápido que pudesse mas seu corpo simplesmente não o obedecia mais naquele momento. Foi quando um vento se fez presente levantando mais as cortinas deixando que as luzes artificiais de fora adentrassem mais na sala, você chorou.
Toji estava lá, do lado da escrivaninha, com um olhar perturbador. O vidro da janela estilhaçado ao lado dele era um sinal claro de sua entrada forçada. O terror invadiu cada fibra de sua derme, você apenas queria fugir.
— (Nome)... — ele continuou, a voz dele estava rouca, cheia de uma desesperança perturbadora. — Por que você fez isso? Por que me deixou?
Sua mente gritava para fugir, mas algo em sua postura te mantinha presa. As palavras saíram antes que você pudesse as parar.
— Toji, você não devia estar aqui... Eu não... eu não posso mais fazer isso, você...
Você disse com a voz vacilante em meio ao choro assustado que insistia em tomar conta de suas palavras.
Ele deu um passo em sua direção, seus olhos escuros e perdidos fixos nos seus, ele parecia completamente desesperado ali, quase como se tentasse ao máximo que você apenas o escutasse.
— Você não entende, amor — ele disse com uma voz carregada de dor, angustiada — Eu só queria te proteger. Fiz tudo isso porque... porque eu te amo. Eu preciso de você. Não posso viver sem você.
— Proteger? — você repetiu, incrédula, um riso carregado de ódio escapando de seus lábios — Toji, você quase me destruiu. O que você chama de amor não é amor, é controle, é medo! Você tem ideia do quanto me deixava apavorada?!
Toji balançou a cabeça, tentando se aproximar novamente, a dor em seus olhos se transformando em algo mais sombrio, quase possessivo, como se ele estivesse gritando que você era dele.
— Eu sei que errei, (Nome). Mas não foi minha intenção te machucar, eu só queria que você fosse minha, só minha. Não é isso que o amor é?
Você deu um passo atrás, tentando manter a distância entre vocês, mas o homem de canelos curtos continuava avançando, determinado a não deixar você escapar.
— Isso não é amor, Toji! — você respondeu, sua voz quebrando pelo choro apavorado — Amor não é posse, não é violência. Você não pode me obrigar a ficar com você assim!
Ele tentou alcançar sua mão, mas você recuou rapidamente, o medo finalmente dominando seus sentidos, deixando seu corpo completamente alerta, mas mesmo assim você não fugiria, não até que dissesse tudo o que precisava ser dito.
— Eu sei que te machuquei, mas nós podemos consertar isso. Juntos — Toji insistiu, a desesperança e pânico em sua voz crescendo —, só me dê outra chance. Eu prometo que vou mudar, que vou ser o homem que você merece.
— Não! — você gritou à plenos pulmões por fim, a intensidade da situação empurrando você para o limite — Eu não quero e não posso voltar para isso. Para você. Eu... eu não vou sobreviver se voltar. Por favor, Toji, só me deixa ir.
A raiva começou a tomar conta dele, a frustração de sua recusa evidente em cada linha de seu rosto.
— Eu não posso te deixar ir, (Nome). Não posso. Eu já perdi tudo. Não posso perder você também!
Ele avançou mais rápido desta vez, e antes que você pudesse reagir, ele tentou agarrar você, os olhos febris e cheios de uma necessidade distorcida. Você se debateu, o pânico totalizando sua mente. Quando ele tentou beijá-la à força, a situação escalou de vez, a faca em seu cinto brilhava sob a luz fraca dos postes ao lado de fora, a ameaça cada vez mais real.
— Toji, não! — Você gritou, sua voz quebradiça pelo terror, pelo choro desesperado — Por favor, você não precisa fazer isso! Me deixa em paz!
Ele hesitou por um segundo, a dúvida piscando em seus olhos e apenas segurou seu corpo lhe abraçando com força, e você apenas congelou ali.
— I just want to be the one you love — ele sussurrou uma melodia suave que vez ou outra você lembrava dele cantarolando durante a noite enquanto tentava te colocar para dormir depois de alguma briga violenta — Eu não posso, amor, eu não posso viver sem você.
Ele sussurrou quase implorando.
Você queria gritar, mas a única coisa que escapava de seus lábios eram lamúrias baixas, fechou os olhos com força ao o que a porta se abriu de uma vez.
— Sai de perto dela!
A voz de Geto cortou o ar por fim, você olhou para o lado rapidamente, seus olhos apavorados se encontrando com os olhos raivosos de Geto.
— Geto.
Você gritou, seu corpo tomando forças por fim empurrando Toji o afastando de si enquanto corria até o homem de cabelos longos.
E então aconteceu.
Toji se moveu primeiro, seus punhos golpeando o rosto de Geto com uma força brutal. O som dos socos ressoou na sala, e você teve que abafar um grito com as mãos, o terror agarrando seu coração ao ver Geto ser jogado contra a parede e logo em seguida avançando com toda a força que possuía em cima do homem que mais parecia uma muralha.
Seu corpo tremia de medo e impotência você queria correr, gritar por ajuda, mas sabia que qualquer movimento poderia piorar a situação, suas mãos tremiam, você tentava respirar com dificuldade dado ao choro entalado na garganta, você ficou ali, paralisada, apenas conseguindo torcer para que alguém que pudesse de fato os separar chegasse logo.
Quando Toji sacou a faca, seu coração parou, o brilho da lâmina sob a luz fraca da sala era um presságio de algo terrível. Você viu o movimento dele, rápido e preciso, e antes que pudesse reagir, a faca cravou-se no estômago de Geto, você gritou em completo desespero, os olhos de Toji presos aos seus, ele estava ofegante.
Geto caiu de joelhos, a dor tomando conta de suas feições, você apenas queria correr até ele e o ajudar, mas era como se algo lhe prendesse ali. O homem de cabelos longos se apoiou na escrivaninha se levantando com dificuldade, você olhou de modo assustado para Toji, os olhos dele fixos aos seus.
Quando um som alto se fez presente.
A visão de Toji cambaleando para trás se fez presente, o homem tinha uma expressão de choque no rosto, quase como se não entendesse o que havia acabado de acontecer, nem você mesma sabia. Ele caiu de joelhos, os olhos vidrados aos seus, o corpo por fim perdendo as forças e caindo no chão, respirando com dificuldade.
Geto estava de pé, com a arma tremendo em suas mãos, o sangue ainda escorria de seu ferimento, mas a raiva e o ódio em seu olhar o impulsionavam a continuar, como se apenas aquilo conseguisse manter o homem de pé naquele momento, você viu a mudança em seus olhos, viu quando ele se aproximou de Toji, agora caído, e apontou a arma mais uma vez.
— Geto, não...
Você chamou, sentindo suas mãos tremerem em pânico mas o homem estava cegado pela raiva, pela dor, Geto não podia ouvir você, tudo o que ele via era o homem que quase destruiu tudo o que ele amava. E naquele momento, ele não pensou duas vezes. O segundo tiro perfurou o peito de Toji, e o silêncio que se seguiu foi ensurdecedor.
Você caiu de joelhos, as lágrimas finalmente escapando. A visão de Geto parado sobre o corpo de Toji, ofegante e ensanguentado, era um pesadelo. Ele havia feito isso por você, mas o custo era terrível demais para suportar.
— Geto... o que você fez...
Você sussurrou com a voz fraca, ele voltou a atenção em sua direção, largou a arma no chão, você por fim sentiu seus joelhos falharem e seu corpo cair no chão, ele andou até você cambaleando, se abaixou a sua frente segurando seu rosto com as mãos ensanguentadas, você piscou atônita.
— Eu fiz isso por você, princesa... — ele murmurou com a voz fraca, você quis chorar — Sempre por você.
Ele disse ofegante, naquele momento a única coisa que escapavam de seus lábios eram lamúrias baixas enquanto vários enfermeiros entravam desesperados no consultório de Geto. Você talvez estivesse em choque pois tudo aquilo parecia distante demais, Geto encolhido contra seu colo.
Os paramédicos chegaram rapidamente, mas junto com eles, a polícia devido aos tiros que haviam sido ouvidos, Geto foi algemado antes de ser levado, mas não sem antes trocar um olhar com você, ele curvou o corpo sobre o seu, seus lábios se encontrando uma ultima vez.
— Eu te amo, princesa.
Ele disse com a voz fraca antes de ser arrastado para fora do consultório, as lágrimas escapavam de seus olhos freneticamente, seu corpo inteiro tremia ao o que os enfermeiros ali presentes tentavam lhe acalmar colocando cobertores sobre seu corpo.
Seus lábios tremeram e você apenas sussurrou.
— Eu também te amo, Geto.
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