03 | Lamento

"É como desejar a
chuva quando estou perdido
no meio do deserto."

——————

Jacob

"ESTÁ OUVINDO ELE?" pergunto à Leah, ela me manda um sinal positivo em resposta então me ponho a correr em sua direção. A floresta passa por mim como flashes, tudo cheirava a terra úmida e musgo, o vento era bem forte. Em questão de segundos estou correndo ao lado do lobo cinza rumo ao que parecia ser atrás de um dos rios da reserva.

"Droga, droga" o sinal chega a minha mente, era Seth. Leah solta um uivo agonizante e eu a acompanho, Seth sentia dor, muita dor.

"Não se mexa" ela ordena e nesse mesmo segundo perdemos ele.

"Droga Leah."

"Na forma humana é mais fácil acha-lo" se explica e aumenta a velocidade, sabendo que era mais rápida que eu.

O cheiro de Seth era bem característico, por conta do cabelo grande ele sempre cheirava ao xampu de limão que usava. Foi fácil encontra-lo. Me enfio em uma das moitas enquanto Leah vai para o outro lado e um arrepio percorre a minha coluna quando volto a minha forma humana.

Faço careta quando meus pés descalços alcançam o chão molhado mas não me demoro a desamarrar o jeans do meu tornozelo esquerdo e vesti-lo. Quando saio do mato Leah está parada me esperando, usava o mesmo vestido branco com o qual veio só que agora ele estava com pequenas manchas de barro.

Andamos meio minuto até acharmos ele.

Seth estava enfiado atrás de uma árvore na beira do lago, não vestia nada, provavelmente tudo foi destruído quando ele se transformou no ar tentando escapar da gente. A cabeça estava abaixada por entre suas pernas, suas mãos ainda tremiam e ele murmurava coisas que eu não conseguia entender.

— O que aconteceu Seth? — pergunto, me aproximando.

Ele levanta os olhos até mim e consigo vê-los marejados. Estava chorando. Suspiro e me agacho, preocupado com o que poderia ter acontecido, Seth surtou e saiu correndo assim que chegou na sala e agora aparece chorando e tremendo no meio da floresta? Alguma coisa não estava bem.

— Você nos bloqueou! — exclama Leah surgindo por de trás das árvores. — Ficou falando droga por vinte segundos seguidos quando nos sentiu na sua mente, o que está escondendo?

— Eu sinto muito — ele murmura.

— O que você fez? — pergunto, minha voz saindo mais dura do que eu esperava.

Seth funga, mais lágrimas escorrendo por seus olhos.

— Merliah... — ele murmura.

Ah não.

— Você não fez isso! — grito, me colocando de pé.

— Eu não posso controlar — ele grita de volta.

Sempre quis manter minhas irmãs o mais longe possível de toda essa confusão. É por esse motivo que elas não vinham aqui, eu tentava evitar qualquer conexão delas com nosso mundo mas não achei que trazer Merliah fosse um problema, afinal, ela já sabia sobre tudo. Ela estava me irritando tagarelando coisas irritantes sobre a Bella quando me transformei.

Ela só tinha treze. Depois disso papai e eu resolvemos manda-la para morar com Rachel e o marido, queríamos que ela tivesse uma vida feliz e sem nenhuma interferência do sobrenatural e ela teve. Namorava a quatro anos com James que era um cara incrível, se formaria na faculdade no ano que vem e tinha uma carreira brilhante como engenheira pela frente então ela vem ver nosso pai e essa merda acontece. Isso não é justo.

Minhas mãos tremem de raiva. Raiva por não poder dar a ela o que eu queria que ela tivesse.

— Você. Não. Fez. Isso — praguejo, cerrando meus dentes.

— Me desculpa tá legal?

— Mas que merda! — berro, socando a árvore ao meu lado. A madeira estala e se parte, caindo para dentro do lago.

Sinto a mão de Leah no meu ombro enquanto ela me encara, me censurando por ser tão duro mas merda, eu estava puto.

— Jake vamos nos acalmar, o que tem a Merliah?

— Ele teve um imprinting por ela — respondo e Seth geme ao ouvir a palavra.

A expressão de Leah fica indecifrável enquanto ela dá dois passos para trás, como se um baque tivesse a empurrado.

— Ah... — é tudo que ela diz, pressionando os lábios.

Respiro profundamente e me sento no chão ao lado de Seth, minhas mãos finalmente parando aos poucos de tremer.

— Que merda — murmuro.

— Merda? — indaga Seth aumentando o tom de voz e olhando pra mim com seus olhos marejados e desesperados. — Como acha que eu me sinto? Eu estou esperando esse momento há anos e então acontece com uma garota que tem namorado? Quando olhei pra ela foi como... se eu tivesse um filho e arrancassem o bebê de mim. Está doendo pra porra e isso não é justo.

Isso me deixou triste. Eu não podia nem imaginar como ele se sentia, ninguém aqui podia. Até hoje nenhum de nossos lobos teve um imprinting por alguém comprometido.

— Eu devia ter ido pra Nova York... — me lamento.

Leah revira os olhos.

— E aí o quê? Provavelmente aconteceria em outro momento, eles estão ligados Jacob. Não há o que fazer.

— Não queria minhas irmãs envolvidas nisso, já é uma merda Lia saber sobre os vampiros.

— Seth, pare de chorar! — Leah berra colocando a mão na têmpora. Conhecendo como a conheço eu podia apostar que ela estava tentando pensar numa solução.

O único problema é que não tinha solução.

— Eu não consigo! — ele berra de volta, a voz parecendo sufocada. — A sensação é angustiante, droga, como vocês sobreviveram a isso?

Encaro Leah e ela me encara de volta, isso não devia ser assim. Quando olhei pra Nessie a primeira vez eu senti que tudo na vida fazia sentido, que não importava o que fosse acontecer eu estaria com ela. Sempre e para sempre. Não é angustiante, é reconfortante.

— Tem alguma coisa errada Jacob — ela murmura.

Assinto com a cabeça.

— Não estou gostando disso.

Seth funga e nos encara.

— O que foi?

— Não deveria te dar agonia Seth, deveria ser bom.

Ele dá uma risada sem humor.

— Bom? Estou ligado a alguém que ama outro. Pra sempre! Você mesmo disse que quando sofre um imprinting nem ao menos consegue pensar em outra pessoa. Meu destino é correr como um cachorrinho atrás dela e servir de babá para seus filhos com o James?

E o que eu deveria fazer? Dizer para minha irmã largar o namorado de quatro anos? Dizer a Seth para se contentar com uma amizade? Eu não podia fazer nenhum dos dois.

Quando um imprinting acontece você não vê mais as outras pessoas, é como a luz que ilumina tudo em volta. Longe do alvo de seu imprinting você só vê o escuro... é sem graça.

— Faz sentido — Leah diz.

Pigarreio e me ponho de pé.

— Vamos resolver isso Seth.

Ele funga de novo e seca as lágrimas que insistiam em escorrer de seus olhos.

— Eu estava esperando o amor da minha vida, cara. Que merda.

E ganhou Merliah Black, a pessoa mais irritante e tagarela do mundo. Pelo menos nisso eles combinavam.

— Levante-se e acabe de se vestir, vou te deixar em casa e depois buscar a Merliah.

Seth se levanta e pega minha jaqueta, se enrolando nela como pôde.

— Não vai falar nada pra ela né?

Eu e Leah o encaramos.

— Claro que vou, não vou deixar você em agonia pelo resto do verão — respondo.

— Jac... — ele começa mas Leah da um tapa em sua nuca.

— Cala a boca Seth e faz o que ele está mandando.

Foi um custo para fazer o Seth parar de reclamar, custo tão grande que nem ao menos consegui voltar para a festa da minha namorada. Liguei pra ela, que entendeu completamente o que estava acontecendo e garantiu que seu avô Charlie deixaria meu pai em casa em segurança. Eu estava chateado por não ter conseguido passar um tempo com ela hoje, tinha planejado tanta coisa e tudo foi arruinado.

Merliah me ligou dezessete vezes e eu a ignorei em todas. Toda vez que ela ligava as mãos de Seth voltavam a tremer, era muito estranho. Deixei que Leah e Alex fossem pro quarto e fiz companhia pra Seth até acabar dormindo.

Quando acordei já era hora do almoço e Seth não estava mais por perto, Sue me disse que ele havia saído com a câmera e que provavelmente iria demorar. Tentei ligar pra ele mas ele deixou o celular no quarto, perfeito.

Almoço com Sue e Leah enquanto Alex assistia televisão. Era impressionante como ela largou qualquer outro compromisso no mundo para passar praticamente vinte e quatro horas numa reserva cheia de lobos e pessoas que não gostavam nem um pouco dela. Nós lobos entendemos a situação do imprinting e aceitamos numa boa a presença dela aqui agora os outros moradores eram insuportáveis, tanto com ela quanto com Renesmee.

As vezes queria arrancar a cabeça de todos que ficavam olhando torto.

Claro, eles não tinham certeza mas ouviam as lendas. As mesmas lendas que contavam para nós desde quando éramos apenas crianças.

Fui andando para casa em passos lentos, preocupado com o rumo que toda essa situação poderia tomar. Minha irmã não era conhecida por ser a pessoa mais meiga do mundo e Seth era sensível demais, olhando por fora não consigo nem imagina-los como almas gêmeas.

Assim que abro a porta da sala Merliah olha pra mim, a franja do cabelo amassada por conta do contato com o ombro de James. Eles estavam agarrados no sofá assistindo um jogo de beisebol.

— Precisamos conversar — eu e ela dissemos ao mesmo tempo.

Lia assente e beija o rosto de James antes de levantar do sofá, seguimos pro lado de fora. Sua expressão estava estranha, parecia triste e confusa.

— O que lembra sobre o imprinting? — pergunto assim que demos alguns passos de distância da casa.

Seus olhos ficam mais atentos enquanto ela pensa por alguns segundos.

— Amor à primeira vista?

Acho graça.

— Mais ou menos isso. Está mais para um amor genuíno e inevitável, o lobo não tem controle e não pode escolher não sentir isso, mas não necessariamente ele se envolve amorosamente com a pessoa.

Lia faz careta.

— Você conhece alguém que não se envolveu amorosamente?

Foi a minha vez de pensar e admito que foi bem difícil achar uma resposta.

— Hmmm, Quil? — sugiro.

Minha irmã dá risada tirando a franjinha dos olhos.

— Claro, a Claire tem dez anos Jake!

Suspiro, sem saber o que dizer em seguida.

— Só preciso que entenda o que é o imprinting.

— Eu entendo Jacob, já conversamos sobre isso. Sempre deixei claro que acho toda essa história de imprinting algo muito bonito, as tradições de nossa tribo são mágicas e ser lobo é um dom. Você sabe que creio nisso mais que tudo só não entendo o que isso tem a ver com o Seth.

— Seth teve um imprinting — explico.

Estranhamente Merliah para de andar e sorri, dando um pulinho empolgado enquanto levava as mãos ao peito. Parecia feliz, empolgada com a novidade.

— Ah meu Deus que maravilha! — ela exclama. — Quem é a sortuda?

Tudo bem, não tinha mais como evitar isso.

— A sortuda é você Lia.

Pareceu ter passado uma eternidade enquanto esperei minha irmã esboçar uma reação. Seu rosto parecia uma pintura, completamente imóvel, mas então depois de alguns segundos sua sobrancelha de mexe formando uma careta de explícita confusão.

— Isso só pode ser piada — murmura, cruzando os braços na defensiva.

Eu bem queria que fosse.

— Não é.

— Por isso aquela cara ontem?

— Exatamente.

Lia suspira, parecia não confiar completamente no que eu havia dito.

— Jacob, jure pra mim em nome da nossa mãe que isso não é uma brincadeira.

— Não é uma brincadeira Lia, — eu juro — eu não brincaria com isso.

E então ela dá de ombros, fazendo o caminho de volta para casa em passos mais rápidos do que antes.

— Mas eu tenho namorado, oras!

— Sam também tinha namorada — a lembro.

Ela me fuzila com o olhar e ergo as mãos pra cima em rendição. Nada pior do que me verem apanhando para uma garota magrela de um e setenta.

— Mas ele fez uma escolha e em que mundo você acha que minha escolha seria Seth e não James? — ela praticamente grita. — Ele é quem eu amo, quem me deu apoio por todos esses anos.

— Você não precisa ficar com o Seth.

Minha irmã mais nova bufa, ignorando completamente o que eu havia acabado de falar e continuando a andar de volta para nossa casa.

— Não quero iludi-lo Jacob, você precisa conversar com ele.

— Não é tão simples assim — insisto, encarando suas costas enquanto ela fugia de mim.

— Claro que é, ele está magicamente apaixonado por mim mas eu não estou magicamente apaixonada por ele e nem irei ficar. Acabou. Fim de história.

— Não seja infantil — rebato.

Ela se vira para trás, cruzando os braços.

— Falou o lobo mau.

Era só o que me faltava.

— Merliah Serena Black, você está sendo ridícula!

— Ridícula é toda essa história. Eu não posso fazer nada pelo Seth, diga a ele que lamento.

Suspiro e a observo se afastar, não tinha mais energia para discutir com ela, só queria ter tido tempo de avisa-la que em breve ela realmente teria motivos para se lamentar.



Espero que tenham gostado :)
Música: A Drop in the Ocean - Ron Pope.

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