08.



Olá Leitores! Passando aqui só lembrar vocês de comentarem e votarem, ajuda muito na minha motivação, amo vocês, não desistam de In Between!

⚠️ATENÇÃO! ESTE CAPÍTULO APRESENTA MENÇÕES DE SU1C1D10! SE VOCÊ FOR SENSÍVEL NÃO RECOMENDO QUE LEIA! LEIA POR SUA PRÓPRIA CONTA E RISCO!⚠️

Caminhar de volta para o acampamento pareceu ser mais difícil do que ir em direção ao bunker.

Um misto de coisas fez que querer apenas me jogar no chão e dormir eternamente.

Por imprudência minha e de Bellamy, dormimos sentados, apoiados em uma árvore, expostos a chuva e sereno e totalmente vulneráveis a qualquer animal ou terrestre que passasse por lá.

Graças a Deus nada nos atacou.

Por conta disso e de estar carregando cobertores e vários rifles, eu estou com uma dor nas costas de matar.

Se eu não tinha problemas na coluna, agora eu tenho.

E Bellamy ao meu lado também não parece muito disposto.

Também anda olhando para o chão enquanto carrega rifles e cobertores.

Cansado, exausto e sem vontade de dar mais um passo.

Os ferimentos em seu rosto estavam menos piores, já que eu lavei o rosto dele na margem do rio hoje cedo, para tirar a terra e o sangue seco.

Mas depois de longas horas de caminhada cansativa, conseguimos chegar ao acampamento.

Pendo minha cabeça para o lado ao ver que o portão do acampamento estava aberto, também dava para escutar vozes raivosas e assustadas ecoando por detrás dos muros.

Eles gritavam sobre o terrestre, dizendo que ele havia fugido.

Então deu certo, Octávia conseguiu.

Contenho meu sorriso de satisfação, visto que Bellamy estava ao meu lado, furioso com a escapatório do nosso refém.

No meio da discussão, Bellamy ultrapassa o portão, com uma mão erguendo um rifle.

—Que venham os terrestres!—Agora os olhos de todos estão em nós.—Temos tido medo deles por tempo demais! Porque? Por causa de suas facas e lanças?! Eu não sei vocês, mas eu cansei de ter medo.

Isso me dá um deja vu, de quando chegamos aqui e ele tinha esse mesmo tipo de discurso, com uma conotação mais rebelde.

—Isso são armas, não são brinquedos.—Clarke diz se aproximando e eu reviro os olhos, esperando mais um de seus sermões de mãe.—Quando a Arca chegar, devem ter ciência de que serão devolvidas a guarda.

—Por enquanto, são nossas e vão nos manter seguras.—Eu respondo cruzando os braços, finalizando o assunto.

—Tem muito mais dessas onde encontramos, amanhã, começamos o treinamento e se os terrestres vierem, estaremos preparados!—Novamente Bellamy ergue o rifle no alto, fazendo todos os adolescentes se encherem de euforia e esperança.

Bellamy entrega os rifles e eu os cobertores para um grupo de adolescentes levar para dentro do módulo, enquanto Clarke ia logo atrás deles, direcionando e orientando.

—Você vai ficar?—Eu pergunto para ele, sorrindo, cheia de alegria no peito, que infelizmente não consegui conter.

Porque eu sentia que já sabia a resposta.

—Sua insistência e seu olhar de coitada me comoveram...—Ele finge desdém, sorrindo de leve, mostrando seus dentes brancos e eu desfiro um soco leve em seu ombro.—Não vou abandonar vocês, estamos nessa juntos.

Eu abro a boca para responder, mas sou interrompida quando algo me empurra do lado, me fazendo cambalear.

Mau me recupero e sinto algo meu empurrar do outro lado.

E eu me vejo num amontoado de braços enormes, me espremendo.

—Anche a me è mancato...—"Também senti saudades..." eu digo com dificuldade, me sentindo sem ar ao ser amassada pelos meus dois irmãos.

—Il mio vero desiderio era di darti un occhiata, ma dato che ero troppo preoccupato ti abbraccerò.—"Minha vontade verdadeira era te dar uma coça, mas como eu estava preocupado, to te abraçando." Ethan diz, esfregando a mão com força contra o meu coro cabeludo.

—Giusto.—"Justo." respondo sentindo meus pulmões serem espremidos.

Só consigo ver Bellamy rindo na minha frente e eu olho para ele como se eu dissesse: "socorro, me tira daqui."

—Donna, non farci più questo.—"Mulher, não faz mais isso com a gente."—Cardan diz, esfregando o nariz contra a minha bochecha.

—Eu não to conseguindo respirar.—Eu falo o óbvio, meus irmãos me apertam uma última vez antes de me soltarem.

Enquanto eu recobrava o ar para os meus pulmões, vejo os dois caminharem até Bellamy, agora o jeito que encaravam o amigo era carregado de preocupação e aflição.

—Jaha quer falar com você.—Cardan leva a mão ao ombro de Bellamy.

—'To sabendo...—Bellamy resmunga, apoiando as mãos nos quadris.

—Já pensei em todas as formas de como te ajudar cara! Não sei se consigo te salvar disso.—O loiro afirma preocupado, passando a mão pelo queixo e depois pelos cabelos.

—Nem precisa, sua irmã disse que tem um jeito.—No instante que Bellamy fala, eu sorrio, tinha uma pitada de orgulho e confiança.

Lanço uma piscadela para os três, confirmando que eu sabia o que eu estava fazendo.

Cardan revira os olhos com um sorrio e Ethan apenas ri olhando para baixo em resposta, aliviado com a situação.

—5 minutos, lá na barraca do rádio.—O loiro diz, deixando um leve tapinha no ombro de Bellamy e um peteleco na minha orelha.

Dentro da tenda, eu ajeito os fones de ouvido em minhas orelhas e o microfone nos meus lábios, esperando o rádio estabelecer a conexão.

Bellamy, sentado ao meu lado, estava visivelmente ansioso.

Sua respiração estava descompassada, tinha suor escorrendo pelo canto da têmpora, ele não parava de fitar a tela a nossa frente e também, seus lábios tremiam de leve.

Respiro fundo, procurando coragem.

E quando encontro, coloco minha mão por cima do punho fechado de Bellamy, mostrando que eu estava ali, eu iria ajudá-lo.

Ele fixa suas íris castanhas em mim, do mesmo jeito que fez quando estávamos sentados contra a árvore, ou quando eu poupei Atom do sofrimento.

Admiração, confiança.

Eu só comprimo os lábios em resposta.

Todos os olhares dele me causavam arrepios.

Era sempre uma sensação estranha, mas ao mesmo tempo, satisfatória.

Eu odeio não conseguir descrever.

—Senhor Blake.—Ajeito minha postura rapidamente ao ouvir a voz de Jaha no fone.—Faz um bom tempo que eu desejava falar com você.

—Não antes de você me escutar.—Eu desafio, cruzando os braços na altura do peito e encarando o mais velho na tela.

—Lembro de ter marcado uma reunião com Bellamy.—Jaha responde sério, dava para ver que o meu tom havia irritado ele um pouquinho.

—Que pena.—Eu nem me esforço em fingir desapontamento.

—Seja rápida, Walden.—Reviro os olhos pelo apelido sem graça, eu sabia que ele queria me atingir.

O apelido surgiu de uma brincadeira totalmente idiota de Clarke, que espalhou para todos da escola de Phoenix que a minha mãe era Waldenita.

E como a maioria das pessoas em Phoenix pensa que Walden está no sangue, oque é simplesmente a maior ignorância já cometida, eu fui chamada de Walden durante todo o meu período de estudo, já que afinal, eu nunca seria uma fenícia pura, sempre teria sujeira de Waldenita.

E esse apelido se espalhou até para o conselho, os únicos do conselho que não me chamavam com esse apelido tosco, era o casal Griffin.

Consigo sentir Bellamy me encarar confuso com o jeito que Jaha se denominou a mim, eu apenas dou de ombros e começo a argumentar.

—A Terra pode ser obviamente habitável... mas sem Bellamy, Clarke e meus irmãos, estaríamos mortos, Bellamy foi quem tomou a frente e ajudou a liderar isso aqui.—Eu pressiono os lábios e respiro fundo antes de continuar.—Ele é um dos nossos agora e assim como todos aqui, merece uma segunda chance.

—Admiro o seu gesto, mas você sabe que não é simples.—O homem responde cético, cruzando os braços e os apoiando na mesa.

—É sim e você sabe disso.—Eu não me contenho e exalto-me, gesticulando com as mãos com rapidez.—Se você condená-lo a morte, nunca saberá quem deu-no a ordem para matar você, e não vai demorar para arranjarem outra pessoa para mata-lo, com certeza com a mira melhor que a dele, afinal, ninguém erra duas vezes.—Termino sorrindo, cruzando os braços acima do peito novamente, pendendo a cabeça para o lado.

—Essa doeu.—Bellamy murmura, fingindo ofensa e eu o cutuco com o meu cotovelo.

—E aí terceira idade, oque nos diz?—Falo, sem medo da reação dele com o meu apelido de "gente mal educada".

E aqui a tensão se instala no ar.

O homem do outro lado da tela bufa em irritação, passa as mãos pelo cabelo curto e encara a mesa por longos instantes, como se estivesse tomando a decisão mais difícil de sua vida.

Jaha levanta a cabeça e começa a fitar Bellamy, depois de segundos torturantes decidindo qual seria o futuro dele, o mais velho pronuncia.

—Bellamy Blake, está perdoado pelos seus crimes.

Eu não consigo conter minha animação e euforia, sorrio eufórica, apertando ainda mais a mão de Bellamy.

Meu coração simplesmente bate muito mais rápido e eu consigo sentir alguns tiques de alegria tomarem o meu corpo.

—Agora me diga quem te deu a arma, Bellamy.—Jaha diz, indo direto ao assunto.

—Shunway, disse que me daria um lugar na nave se eu matasse o senhor.—Bellamy responde em prontidão, encarando a tela com mais firmeza.

Agora ele parecia o líder destemido de antes.

O olhos de Jaha se arregalam em surpresa, dava para perceber o quanto esse nome em específico era o último que esperava ouvir.

—Certo, obrigado.—O Chanceler desliga rapidamente, fazendo eu soltar o ar que nem sabia que estava em meus pulmões.

—Haha! Eu falei que ia dar certo!—Eu digo animada, dando soquinhos leves no ombro de Bellamy, com um sorriso de orelha a orelha.

Há um brilho diferente no olhar que ele direciona a mim, transforma o ar da tenda em um ambiente agradável e aconchegante, faz meu coração pular do peito.

—Juro que na hora que você chamou ele de "terceira idade" eu já estava decidindo que frase colocar no meu túmulo.—Ele diz descontraído, mas tinha um pingo de verdade ali e o sorriso dele nessa hora era impagável.

Eu já tinha reparado que Bellamy tinha um dos sorrisos mais bonitos que eu havia visto.

Não eram os dentes brancos e alinhados em si, era o jeito que a covinha no queixo e nas bochechas apareciam e a forma sútil que os seus olhos se fechavam involuntariamente.

—A "autoridade" dele me assusta assim como uma porta me assusta.—Eu digo revirando os olhos, com um pitada de humor e a resposta dele apenas eram mais risadas.

Nunca tive nenhum respeito por Jaha, muito menos medo, ele não era tudo oque diziam que era.

—Porque Walden?—Bellamy questiona com um sorrisinho, provavelmente porque pensava que o apelido era engraçado, ou que eu achava engraçado.

Mas uma tensão se instala na tenda, tudo volta a ser como era antes e um bolo se forma na minha garganta.

Eu odiava lembrar do meu tempo na escola, odiava lembrar dos jantares na casa do Chanceler e odiava muito mais lembrar da forma que olhavam para mim quando recitavam essa merda de apelido.

—Isso é história para outro dia.—Eu digo sorrindo.

Não sei se estou aqui a semanas, meses ou anos.

O silêncio ensurdece meus ouvidos da forma mais irônica.

Eu nunca gostei de tumulto ou barulhos.

Mas agora, o silêncio me apavora mais do que

o caos.

O metal frio contra a pele suada da minha mão só me faz ficar mais tensa.

Eu roubei esse revólver do guarda que trazia minha comida, foi tão leve, tão discreto, quase não aconteceu.

Mas eu fiz.

Agora, eu estava a um passo da minha paz...

Do fim das noites em claro, do fim dos choros agonizados, fim dos tremores, das crises de pânico, das alucinações, dos sonhos ruins.

Era só apertar o gatilho.

Enquanto eu levava a ponta do revólver até a minha testa, eu refletia:

E Ethan?

E Cardan?

E o meu pai?

Eles chorariam?

Ficaram decepcionados comigo?

Eles saberiam que eu estava morta?

Eles não sabem ainda.

Mas essa cela me matou.

A solidão veio de mansinho e com um beijo na testa, sugou cada chama da minha vida, o beijo da morte.

Meu coração não parou de bater.

Mas estou tão morta quanto aqueles que já foram flutuados.

Fluida, porém com raizes.

A morte não é bonita.

Pelo menos não a minha.

Como eles saberiam que eu estaria morta?

Eles não pisam aqui a meses.

Se bem que eles saberiam.

E eu começo a ouvir batidas na porta, um ritual que ele sempre fazia quando começava seu turno.

Ele quem?

Não faço ideia de quem seja.

Só sei que está aqui por alguma razão.

E nesse últimos meses eu só estou viva, porque eu faço perguntas e ele responde com batidas na porta.

Uma batida: Sim.

Duas batidas: Não.

Só isso.

Tão pouco, para uma menina que ama falar, que costumava gastar saliva no Asilo da Arca, com os idosos com pouca expectativa de vida.

Mas esse pouco bastava.

Porque me mantinha sã.

Porque desde que essas "conversas" aconteciam, minhas alucinações diminuíram drasticamente.

Eu sei que ele, ou ela, me ouvia, isso bastava.

Então minha mão solta a arma pesada, que faz um enorme ruído quando bate contra o chão frio de metal.

E eu começo a chorar.

É um choro preso, que trava a garganta e me faz perder o ar, me faz gritar de desespero, me faz encolher no chão gélido da cela, sem nenhum acalento ou conforto.

Eu nem percebo quando eu começo a gritar, quando começo a arranhar minhas próprias costas por baixo da blusa de tecido fino.

Nem percebo quando meus olhos, nariz e lábios ficam vermelhos e inchados, cheios de lágrimas e ranho, fluídos de tristeza, que vazam quando não dá mais para guarda-los.

Eu quero que pare.

Quero que o aperto no meu peito cesse.

Quero que meus pulmões abram de novo e voltem a fazer o trabalho designado.

Então eu escuto:

Batidas rápidas na porta.

E isso pode significar tantas coisas.

Como: "Você está bem? Porque está chorando?"

Ou: "Eu ainda estou aqui, não se esqueça."

Também um: "Você sabe que está parcialmente sozinha, não posso entrar aí, não importa o quanto você chore, esperneie, implore, grite ou faça birra, essa porta não vai se abrir."

Entre soluços eu proclamo:

—Eu achei que não viria hoje.— Depois disso, ouço uma leve risada nasal, como se isso nunca pudesse acontecer.

Por um momento, tudo fica em silêncio, por mais que desde que ele começou a vir aqui para seja lá oque ele queira fazer, o silêncio permaneceria, eu tinha esperança de que um dia, ele respondesse.

—Eu... roubei o revólver do guarda que me traz comida...— Silêncio, absoluto.

Solto uma risada nasal, limpando as lágrimas quentes e robustas que escorriam pela minha bochechas.

Talvez essas batidas na porta sejam mais uma das alucinações.

Um mecanismo de proteção da minha cabeça contra ela mesma.

É tão irônico que chega a ser cômico.

—Obrigada... eu não sei se você é real, ou, qual o seu objetivo aqui, ou quando vai embora...—Eu suspiro com os olhos fechados, recobrando as forças.

Então eu paro de falar, porque percebo, eu não queria falar.

Antes, quando eu percebia que ele estava aqui, eu falava até ficar com a boca seca, aproveitava das batidas da porta.

Eu me via na obrigação de usufruir desse presente tão desprezível.

Mas agora eu percebo.

Não tenho obrigação de falar, a não ser que eu queira.

E eu fico em paz.

 Porque eu não queria falar, queria ficar com a boca fechada, até que os lábios se fundissem, selando minhas palavras.

Eu me arrasto até o colchão, que ficava no chão de aço gélido, sem nenhum tipo de aquecimento.

Eu tinha apenas um pequeno edredom e um travesseiro pequeno, muito pouco comparado com a beliche que eu costumava dividir com a minha mãe quando eu não tinha nem uma década de vida.

E era tão bom.

Era tão bom quando, as vezes, ela deixava eu dormir na parte de cima, mas eu nunca passava a noite toda lá, tinha medo de altura.

Eu sempre descia dali e ia deitar no colo dela.

Não tinha colo para deitar aqui.

Mas eu me contento.

Eu deito minha cabeça no travesseiro, que estava levemente úmido e quente de lágrimas.

Tudo ainda estava quente, o prato de comida que o guarda trouxe estava ali, no chão, eu nem toquei na comida.

Eu como só antes de dormir, deixo o que eu não como na porta, para virem buscar o resto depois.

Eu fecho os olhos.

Respiro uma... duas vezes...

E na terceira vez;

Eu apago num sono pesado, tão forte, tão palpável.

E eu não tenho mais sonhos.

Isso é ruim.

Ainda me lembro quando eu descobri que a falta de sonhos é sintoma de depressão profunda.

[...]

Eu acordo em um pulo, suada e atordoada, totalmente sem ar, puxando e sentindo meus pulmões queimarem com a sensação.

Esses sonhos vinham sendo frequentes.

Tecnicamente, não era um sonho, era uma memória.

Eu sempre sonhava com ela.

Acho que a minha cabeça sempre volta para esse momento, tentando descobrir quem era a pessoa do outro lado da porta.

Eu nem ao menos sei se ele ou ela está vivo, se está na arca ou é um dos 100.

Meu maior desejo, é poder agradecer essa pessoa pelo o que ela fez por mim, me sinto em total dívida.

Também pelo fato de que esse ser ouviu todos os meus desabafos e deve me conhecer mais do que eu mesma.

Me assusta que pode ser qualquer pessoa.

Eu balanço a cabeça, afastando esses pensamentos.

Agora eu tenho preocupações maiores.

Um exemplo é a cor do meu sangue estar literalmente preta.

Isso vem rondando a minha cabeça, mas não tenho nem ideia de como mudar isso ou até falar com um dos meus irmãos.

Levanto da cama, calço meus tênis, prendo meus cabelos num coque desleixado e saio da tenda, com o arco e a minha bolsa de flechas.

A poucos metros da minha tenda, vejo Raven, ajeitando vários fios elétricos junto ao monitor, além do rádio agora estar conectado a um visor.

Em passos rápidos e largos eu me aproximo dela, curiosa com oque ela possivelmente estaria fazendo.

—Raven, tem algo de errado com o rádio?

Seu rosto se vira imediatamente, ela limpa o suor da testa com as costas da mão e nega.

—Hoje é Dia da Unidade e o Chanceler quer fazer um discurso para todo o acampamento mais tarde.—Ela explica e eu apenas assinto com a cabeça.

Hoje é o tão esperado e vangloriado, Dia da Unidade.

Para contextualizar, cada país tinha uma estação durante o apocalipse nuclear, que orbitavam a atmosfera da Terra, vivendo em completa e total independência.

Porém hoje, dia 1º de outubro, a 80 anos atrás, a estação Ymir, da Dinamarca, cruzou com a Théos, da Grécia.

Ao invés desse dia ser o estouro de uma guerra espacial, felizmente, foi o estopim para a união de todas as estações, visto que seria mais fácil conviver todos juntos em um grande conjunto.

Todas as estações se uniram em uma enorme nave flutuante no espaço, dividia socialmente por três estações oficiais:

Walden, a estação mais pobre, onde não tinha recursos extras e as pessoas sofriam muito mais com a falta de oxigênio e a fome, os moradores de Walden são conhecidos como Waldeanos, minha mãe e meus irmãos são nascidos de Walden.

Phoenix, a estação mais rica e cheia de recursos, climatização, roupas de sobra, conforto, comida a vontade, arte e repleta de pessoas privilegiadas e algumas muitas pessoas insensíveis, os moradores de lá são chamados de Fenícios, eu e meu pai somos considerados fenícios.

E Arkadia... bom, era a estação de trabalho e comércio, administração e diretoria da nave, tinha algumas pessoas morando lá, geralmente porque não conseguiam voltar para a devida estação a tempo de o dia terminar, era um pouco menos precária que Walden.

Hoje é o último dia da unidade que eles comemoram lá em cima e o primeiro dia da unidade que comemoramos aqui em baixo.

Minha honesta opinião sobre isso é: eu não dou a mínima.

É simplesmente para mim, o dia com o mesmo significado que um dia comum.

Não é como se a Arca fosse o paraíso no espaço porque um monte de homem barbudo decidiu juntar tudo e depois dividir entre ricos e pobres.

Sei que sou privilegiada, mas eu tenho um pouco de senso de moral e empatia para entender que era só balela.

Eu nunca tinha dado importância para esse dia, para mim, não passava de apenas um feriado.

—Precisa de ajuda?—Eu questiono cruzando os braços e inclinando a cabeça.

—Você sabe como funcionam ondas de rádio?—Raven indaga irônica e eu apenas ergo as sobrancelhas e respondo.

—Justo, divirta-se com os seus cabos e ondas de rádio!—Eu faço uma careta, bagunçando os cabelos de Raven enquanto caminhava para outra direção do acampamento, onde estavam os meus irmãos.

Enquanto Ethan alimentava o fogo da barraca de carne, Cardan com as mangas arregaçadas pendurava os pedaços crus por cima dos galhos, uma velha técnica para fazer carne defumada.

—Lasciami indovinare, preparativi per il Giorno dell'Unità?—"Deixa eu adivinhar, preparativos para o Dia da Unidade?" apoio as mãos nos quadris.

—50 punti per Hufflepuff!—"50 pontos para a Lufa-Lufa!" Cardan responde irônico, batendo as mãos sujas nas calças e afastando as mechas negras do rosto.

—E c'è qualcosa in cui posso essere d'aiuto?—"E tem algo que eu possa fazer?" pergunto, cruzando os braços acima do peito, encarando meu irmão.

—Non c'è molto da fare, Raven si sta occupando della parte tecnologica, noi due ci occupamo della cena e Bellamy sta monitorando il solito lavoro.—"Não tem muito oque fazer, Raven está cuidando da parte tecnológica, nós dois cuidando da janta e o Bellamy tá monitorando o trabalho de sempre" Cardan dá de ombros, encarando o acampamento ao nosso redor.

Bufo em frustração, eu não queria passar o dia inteiro sem fazer nada, de novo, assistindo as pessoas trabalhar e apenas tendo que ficar sentada, me sentindo um peso morto.

—Vado a caccia.—"Vou caçar." Eu aviso, pegando um amarrador de cabelo do bolso de Cardan.

—Torna prima del tramonto e prendi della frutta per me!—"Volta antes do anoitecer e pegue frutas para mim." Ethan invade a conversa, carregando vários tocos de madeira nos braços.

—Va bene.—"Tá bom." Eu assinto, deixando um beijo na bochecha de cada um antes de começar a atravessar o acampamento em direção ao portão.

Olho para os lados, me certificando que ninguém iria bancar um líder e me impedir de sair e então eu abro o portão e avanço em direção a floresta.

Tenho propriedade em dizer que hoje, a floresta está tranquila até demais.

Depois de apenas algumas horas de caça, eu consegui pegar dois coelhos, com muita dor no coração, mas consegui.

Eu juro que se alguém ousar jogar fora um pedaço dessa carne, eu enfio o coelho vivo na goela do infeliz.

Perto do lago, eu descanso as minhas pernas, ajeito os meus cabelos e abro a mochila, a procura de uma pequena lista de coisas.

•Algas e Sumagre (venenoso)

•Camomila e Alecrim selvagem

•Água

•Frutas

Os primeiros 4 itens da lista é pedido indireto de Monty, que vive reclamando aos ares que não há nada para fazer chá, então, se eu encontrar, vou levar uns bons punhados.

Enquanto eu enchia alguns cantis com água do rio, ouço um barulho, como vários zumbidos, há alguns metros de distância.

Ao guardar os cantis e olhar para cima, reparo numa colmeia, cheia de abelhas e respingando mel.

Pelos menos eu acredito que isso seja mel, baseada na minha pouca experiência com qualquer tipo de coisa terrestre.

Só sei que mel é doce, ajuda a cuidar da imunidade e fica ótimo no chá.

Eu nem acredito que eu estou cogitando fazer uma merda dessas, ainda mais sozinha.

Oque eu não faço para agradar alguém né?

Lembro de uma das poucas vezes que eu prestei atenção na aula de Pike, onde nessa exata aula, ele explicou que a fumaça afasta as abelhas.

Isso pode dar tão certo e pode dar tão errado.

Em alguns minutos, eu consigo acender uma fogueira perto da raiz da árvore, logo abaixo da colmeia, apenas com galhos secos e ninhos de passarinhos abandonados.

Vai demorar um tempo até que as abelhas saiam do ninho e migrem para outro lugar.

Então eu resolvo procurar os itens da minha "lista" e voltar um tempo depois para realmente extrair o mel.

Ah se o arrependimento matasse! Eu estaria no chão, dura e fria.

A coleta do mel foi um sucesso, a não ser pelas várias ferroadas que eu levei nos meus braços e o fato de eu quase ter caído de uma árvore de 6 metros.

Por sorte, tinha um cantil extra na bolsa e eu consegui extrair todo o mel e colocar a parte boa dentro do cantil, com favo e tudo.

Durante esse intervalo eu já havia coletado tudo, as frutas, o alecrim, a camomila, o sumagre e a alga.

Os coelhos já estavam limpos e pendurados em arame, prontos para serem assados assim que eu chegasse no acampamento.

Eu até cogito em voltar para o acampamento agora, mas simplesmente não consigo ignorar a sensação grudenta no meu corpo e o cheiro de sangue misturado com terra e suor.

E o riacho a minha frente parece que chama o meu nome.

Eu até penso no bicho que me atacou no primeiro dia, mas sinceramente, não é o mesmo rio,

então....

É, eu entro.

Não demoro a tirar as roupas de cima, ficando apenas de top e calcinha preta, soltando os meus cabelos que caiam e tocavam a minha cintura.

Eu só consigo me questionar o porque de eu não ter entrado antes.

Acho que até a minha alma vai estar mais limpa depois desse banho.

Nada explica a sensação de estar sozinha aqui, limpando a mente, processando oque aconteceu, apenas com o barulho da floresta.

O jeito que a água deixa minha pele até mais brilhante.

Preciso sair sozinha mais vezes.

Depois de alguns minutos dentro da água, eu não demoro a me vestir, juntar as minhas coisas e voltar para o acampamento.

Consigo sentir o cheiro do alecrim exalar pelas minhas mechas úmidas.

Posso dizer me sinto uma nova pessoa mesmo depois de apenas ter tomado um banho de rio?

Mesmo me sentindo uma nova pessoa, os deveres da antiga ainda me esperavam do outro lado do portão.

Ainda nem estava perto de anoitecer, eu não havia andado muito longe do acampamento.

—De volta a... casa?—Murmuro indecisa, abrindo o portão, me deparando com vários jovens ainda trabalhando.

Nenhum deles parece surpreso ao me ver, simplesmente olham para mim e continuam o trabalho.

Caminho em direção ao módulo, passo pelas lonas e me deparo com Raven, Ethan, Cardan, Clarke, Bellamy, Finn, Monty e Jasper reunidos, provavelmente para discutir sobre a noite da Unidade.

—Eu volto outra hora.—Eu digo levemente constrangida com os olhares familiares a mim, sentindo o meu cabelo ainda humildo respingar nas minhas roupas.

—Não precisa, já estávamos de saída.—Clarke diz e eu assinto, avançando um passo.

—Onde estava?—Jasper me pergunta e eu nem respondo verbalmente.

Eu entrego saco de frutas para Ethan, as ervas e o mel para Monty, os cantis de água eu coloco num balcão.

Também pego uma garrafa de Whiskey velho, que achei no bunker que Clarke encontrou com Finn uma vez e entrego para Jasper.

Eu também entrego os dois coelhos limpos na mão de Cardan.

No meu bolso também, tinha uma pedra de âmbar.

Eu a peguei simplesmente porque lembrei que a cor delas é igual a dos olhos de Bellamy.

E eu me conhecendo muito bem, sabia que quando algo tão besta me lembrava uma pessoa, significava que ela tinha um pitado de significado na minha vida.

Eu entrego na mão dele e o mesmo me encara confuso e eu apenas digo.

—Nem pergunta, outra hora eu te explico.

Eu não sou lá uma pessoa muito verbal.

Meus jeitos de dizer: "eu te amo" ou "eu lembrei de você" ou "eu me importo com você" é por meio de atos e objetos, meus irmãos já perceberam isso.

A voz de Jaha com certeza é uma das minha menos preferidas.

Ter que escutar esse idiota falar por mais de 5 minutos já me deixa com dor de cabeça.

O dia que ele calar a boca, até cachorros vão começar a falar.

—Maiale sporco.—"Porco imundo." Eu reclamo baixinho, de braços cruzados ao lado de Ethan.

—Guarda la bocca...—"Olha a boca" Ethan murmura sério, me cutucando com o cotovelo.

—Non ha mentito.—"Ela não mentiu." Cardan responde baixo, encarando o irmão loiro de cima a baixo.

E depois de mais alguns minutos de discurso totalmente monótono, mórbido e entediante, o qual nenhum dos adolescentes dava crédito, o monitor começa a falhar e a conexão cai.

—Graças a Deus!—Eu digo até alto demais e os olhares dos adolescentes recaem sobre mim, da até para ouvir algumas risadas.

Consigo ver Bellamy e Octávia rindo juntos e olhando para mim.

E eu não consigo evitar e rir junto, é muito mais cômico do que constrangedor.

A atenção dos adolescentes é rapidamente direcionada a Jasper, que agora gira a garrafa de Whiskey com uma mão, dando início ao que eu sei que vai ser uma bagunça.

Oque era para ser só uma comemoração ao Dia da Unidade com uma garrafa de Whiskey, na verdade virou uma festa ao redor da fogueira, cheia de adolescentes enchendo a cara e ignorando o fato de que os terrestres poderiam estar na espreita.

Até Ethan estava no meio da festança, bebendo do moonshine de Monty e comendo carne de veado, enquanto Cardan observava o irmão sentado em um toco de madeira, comendo frutinhas e bebericando Whiskey velho.

E eu, bom, eu estava na vigília, com o arco e flecha em mãos, vistoriando e vigiando a área ao redor do abrigo, a procura de algum movimento suspeito.

Olhando a calmaria da floresta, da até para falar que os terrestres também comemoraram o Dia da Unidade.

A noite se mantém tranquila até demais, se não fosse pela luz da lua e da fogueira do acampamento, tudo estaria um breu.

Eu juro que quero fazer parte de toda essa bagunça e euphoria.

Mas não consigo tirar da minha cabeça que da que poucos dias, meu pai vai estar aqui na Terra, vindo na primeira nave a ser lançada, a nave Exodus.

Eu sinceramente não estou pronta para encarar toda a minha vida quando ele chegar aqui.

Não estou pronta para reorganizar meu cérebro e meu coração para que eles parem de sentir repulsa do próprio pai.

Minha liberdade vai ir embora quando Marcus voltar?

O ciclo vai se repetir? ele vai me prender numa estação de novo?

Ele vai virar um homem melhor? Um pai amoroso? Realmente atencioso?

Tenho medo de mesmo conseguindo perdoa-lo algum dia, eu nunca mais possa ser eu mesma perto dele.

Tudo mudou desde a minha puberdade.

Antes, com ele, qualquer lugar era céu.

Agora, longe do caos, eu percebo o quanto eu precisava de um tempo sozinha.

Antes eu reclamava da solidão, agora eu a quero de volta.

Não eu não quero a solidão.

Eu quero a solitude saudável.

Aquela que eu tomo por escolha, não por que me falta pessoas ao meu lado.

Minha família sempre percebeu que depois de um tempo de contato social, eu precisava descansar e silenciar minha mente sozinha.

Meu pai não respeitava muito isso, achava que eu estava deprimida, melancólica.

Mas Ethan e Cardan sempre entendiam quando eu simplesmente não queria falar ou ficar perto de ninguém.

Eu me sentia esgotada, sem forças ou energia.

Como se eu tivesse uma crise de identidade tão profunda.

Ficar sozinha recarrega tudo em mim.

Longe de quem eu deveria fingir ser, longe da obrigação de ser forte e firme, longe da obrigação de esconder meu luto das últimas semanas.

Oh Wells, você não o quanto eu queria que você estivesse aqui também, conversando com o seu pai, babando em cima da Clarke e tentando mandar em mim, mesmo eu desobedecendo só de pirraça.

Charlotte, como eu queria fazer todos os penteados que eu aprendi a fazer nos seus cabelos lisos e loiros, como eu queria ensinar você a rezar para finalmente ter paz nos pesadelos que te assombravam toda a noite.

Atom, eu queria ter sido mais teimosa em tentar te manter vivo, mas eu me vi sem saída e só queria que parasse de sofrer...

Queria que estivesse aqui, fazendo Octávia ter borboletas no estômago e deixando Bellamy com a maior carranca existente.

Mãe, eu queria que você visse como a Terra que você mostrava nos livros para mim, é muito mais linda do que palavras em papel, você não sabe o quanto eu queria seu colo agora, mesmo ele as vezes me matando e me sugando, deixe-me morrer em seus braços...

Nona, sei que está viva lá em cima, cuidando daquela árvore com todo o carinho, sempre tentando fazer o filho abrir os olhos, mas eu queria que você estivesse aqui, para fazer o sinal da cruz e me botar para dormir, queria que você estivesse fazendo carinho nos meus cabelos e contando histórias bíblicas, que raramente, eu prestava atenção, porque eu dormia antes de você conseguir terminar.

Não por que eram chatas, mas por que o seu carinho era tão gostoso que me deixava leve e me permitia abandonar o peso da culpa que eu carregava.

Caroline! Meu Deus! Como eu sinto falta de trançar seus cabelos crespos e negros, como eu tenho saudade de recitar os meus poemas para você, como eu tenho saudade de fazer tortas e bolos com você sendo a minha jurada, provando a comida e sumindo na hora de lavar a louça, eu espero um dia ser sua babá de novo e se eu tiver uma filha, quero que seja incrível como você.

Por favor Caroline, esteja na nave Exodus e venha me ver o mais rápido possível, preciso do meu pequeno raio de sol.

Os meus sentidos parecem aflorar quando eu escuto passos pesados sobre as folhas secas no chão.

Eu rapidamente armo a flecha no arco, apontando para a origem do barulho, exatamente na minha retaguarda.

—Minha Nossa Senhora, assombração...—Eu suspiro nervosa, revirando os olhos ao ver que era apenas Bellamy.

Ele apenas ri de leve, caminhando até o meu lado, segurando um copo do que parecia ser o moonshine de Monty.

Eu prontamente abaixo o arco e guardo a flecha, ajeitando os ombros.

—Porque está aqui sozinha nesse breu?—Bellamy indaga, apoiando as costas no tronco largo da árvore, nossos ombros se tocam.

Eu arqueio as sobrancelhas, suspirando em cansaço.

—Alguém tem que vigiar a movimentação externa.

O mais alto só murmura em concordância, tomando um gole do líquido no copo, enquanto cruza os braços acima do peito.

Mesmo com uma floresta imensa ao nosso redor, não consigo evitar de me sentir sufocada pela atmosfera tensa dali, preenchida por um silêncio alto e nada confortável.

—Ainda quero saber o porquê da pedra.—Seu sorriso se ilumina, me fitando de cima a baixo.

Eu apenas reviro os olhos em uma resposta impaciente e constrangida, tudo que eu penso em dizer parece íntimo demais, algo que eu acredito que eu Bellamy não tenhamos espaço para discutir.

É claro que ele iria perguntar, afinal, quem dá uma pedra do nada para alguém? Só uma pessoa bem fora de si.

—É um cristal.—Corrijo, comprimindo os lábios e encarando ele com um sorriso constrangido.—O nome é âmbar.

Bellamy apenas inclina a cabeça para o lado, confuso com a minha resposta, me encarando com os mesmos olhos enormes e enigmáticos de sempre, esperando que eu continuasse a explicar o porque do presente tão estranho e inusitado.

Eu respiro fundo e preparo as palavras antes de assumir.

—A cor dela é parecida com a cor dos seus olhos, então eu resolvi trazer.—Falo tudo isso olhando para o chão, numa expressão aparentemente tranquila e indiferente, como se aquilo fosse comum, mesmo não sendo.

Os lábios do homem ao meu lado se abrem em supresa, parece que o que eu assumi, deixou ele em choque, como se surgisse um branco na cabeça dele.

—Não precisa guardar se não quiser, é bem ridículo guardar uma pedra na bolsa.—Eu tento descontrair o momento, dando de ombros e fingindo que não tinha importância.

E o silêncio constrangedor volta a reinar entre nós dois, formando um escudo de coisas não ditas e sentimentos inexplicáveis, características próprias de um relacionamento de confusão e alternância sentimental tão drástica.

Eu espero que seja a primeira e última vez que tenhamos que conversar sobre a pedra.

Eu espero que ele finja que nunca aconteceu.

—Obrigado.—Ele sussurra, me cutucando com o cotovelo, sorrindo de leve para mim, olhando diretamente para minha alma com aqueles olhos enormes e castanhos.

Era meio cômico o jeito que ele tinha que olhar para baixo para conseguir encarar meus olhos.

E depois de alguns segundos novamente sem saber o que dizer para quebrar a tensão, ele me estende o copo, que eu nego em prontidão.

—Vamos, você 'tá precisando de um desses, até o Cardan tá lá aproveitando e você está aqui.—Bellamy insinua, estendendo o copo mais uma vez para mim.

Sem pestanejar, eu cedo seu pedido e hesitante, eu pego o copo de sua mão e viro.

Consigo sentir a álcool queimar a minha garganta e impregnar nas minhas papilas gustativas, me fazendo querer vomitar logo de início.

Quando eu devolvo o copo para Bellamy, começo a tossir e por alguns segundos eu fico nesse estado humilhante digno de alguém virgem de álcool.

—Nunca... mais... me de... isso...—Eu digo rindo e tossindo ao mesmo tempo.

Bellamy batia de leve com a mão nas minhas costas, enquanto soltava uma daquelas gargalhadas gostosas de ouvir.

Quando eu finalmente paro de tossir e a minha garganta finalmente para de queimar, eu encaro Bellamy, levemente supresa com o fato de que os outros estavam bebendo aquilo como se fosse água.

—Vamos voltar, 'tá todo mundo curtindo lá.—Bellamy diz sugestivamente estendendo a mão em direção ao portão do acampamento.

Depois de um tempo eu me permiti relaxar um pouco com Jasper e Clarke, que bebiam e jogavam, brincando e falando coisas idiotas pelo estado de embriaguez leve.

E o clima na verdade estava mais do que agradável, eu havia bebido mais um copo, escutando Ethan contar aquelas piadas bem idiotas que todo mundo já tinha ouvido pelo menos uma vez vida.

Tudo ali colaborava para que a noite fosse perfeita, a luz da fogueira, o efeito leve do moonshine, a carne que estava sobrando, as frutas que estavam mais doces do que costumavam.

Me viro devagar para trás quando eu sinto uma mão encostar de leve na minha cintura, retornando ao menos um pouco para o estado de alerta de antes.

—Pega o arco e flecha, chama o Ethan e avisa o Cardan, 'to te esperando no portão.—O mais velho sussurra de leve e toma o copo de Whiskey das minhas mãos.—E pare de misturar bebida.

Eu só reviro os olhos, cedendo as palavras dele e caminhando em direção a minha tenda onde eu havia deixado minha arma.

Por grande sorte, Ethan já não estava mais metido no meio da multidão de adolescentes embriagados, na verdade, ele estava sentado num canto mais afastado, chorando com as mãos no rosto, sendo acudido por Cardan.

—Mi manca così tanto!—"Eu sinto tanta falta dela!"Ethan se encontrava em prantos, chorando provavelmente por Annabeth, uma das maiores mecânicas da Arca e a ex-namorada mais recente dele.

Ele não está em estado para sair desse acampamento.

Cardan vira o rosto para mim, me encarando como se dissesse: "Me tira daqui antes que eu atire ele pelos portões."

Eu apenas abaixo ao lado dos dois, deixando um carinho no ombro de Ethan e um beijo nos seus cabelos.

Me aproximo do ouvido de Cardan e aviso.

—Bellamy dice che ha qualcosa di importante da risolvere, ti ha chiesto di prendersi cura di qui fino al suo ritorno.—"Bellamy disse que tem algo importante para resolver, pediu para você tomar conta daqui até ele voltar."

Meu irmão só assente, com um braço ao redor dos ombros de Ethan, que agora vomitava toda a bebida da noite.

Já do outro lado do portão, encontro Bellamy, Raven e Jasper, todos armados com rifles, prontos para caminhar na floresta escura.

—Onde está Ethan?—Bellamy inclina a cabeça para o lado, ajeitando o rifle em suas mãos.

—Bebeu demais, agora tá chorando pela Annabeth, de novo.—Eu murmuro mal humorada, trocando o peso do corpo para outra perna.

Como os dois são obviamente muito próximos é claro que o Bellamy sabia quem era Annabeth e oque tinha acontecido entre os dois.

E ele também obviamente já tinha presenciado essas recaídas carentes do meu irmão.

De vez em quando, quando tudo ainda estava certo, eu conseguia ver os 4 andando pelos corredores, Bellamy, Ethan, Cardan e Annabeth, que nem um grupinho de faculdade esteriótipado.

Bellamy só ri nervoso em resposta, passando a mão pelos cabelos e me fitando.

—Posso saber porque me chamaram aqui?—Pergunto indo para a questão importante.

—Te explicamos enquanto estivermos andando, vamos.—Raven diz, agora caminha impaciente em direção a floresta densa.

E não demora muito para nós a acompanharmos, sempre olhando aos arredores e verificando a reta guarda.

—E aí?

—Finn marcou uma reunião com os terrestres.—Bellamy me explica, com os olhos fixos no ambiente ao nosso redor.—Eles exigiram que fossem sozinhos, mas Clarke chamou reforços e pediu armas.

—Não acho isso uma boa ideia.—Eu aponto, pegando uma flecha da bolsa e posicionando no arco.

—A reunião ou as armas?—Jasper questiona, com os olhos na lente de mira do rifle.

—A reunião, por mim eu iria armada até os dentes.—Eu respondo com indignação, como se a minha resposta fosse óbvia.—É burrice marcar uma reunião com gente louca para nos matar e não levar um canivete!

O silêncio da floresta contrastava com o barulhos das nossas vozes, gerando uma tensão enorme enquanto podia se ouvir também os passos sobre as folhas secas.

E quando chegamos no local, uma ponte, já estava quase amanhecendo, nós nos posicionamos por detrás das árvores, num ponto onde era possível ver tudo oque estava ocorrendo na tal, reunião.

A visão de Octávia, junto de Clarke na ponte chama a minha atenção e também a atenção de Bellamy, que está agachado ao meu lado, observando tudo com a lente de mira do rifle.

—Só pode ser brincadeira.—O mais alto murmura indignado com a visão.

Então, depois de alguns segundos, Octávia está correndo em direção a um homem alto e de pele escura, abraçando-o de uma forma íntima e afetuosa.

Era o mesmo terrestre o qual nós havíamos torturado para salvar Finn.

—Acho que descobrimos como ele escapou.—Raven murmura com uma pitada de humor ácido no timbre, também observando tudo pela lente do seu rifle.

Após longos minutos de espera incessante e entediante, a líder dos terrestres aparece, montada num cavalo, com roupas primitivas e cheia de rasgos e uma pintura de guerra contrastando com o seu rosto feminino, que carregava uma feição estóica e aterrorizante.

Mesmo depois de vários minutos, o diálogo entre Clarke e a líder se estende, isso faz minhas mãos suarem em contato com a madeira do arco, não era para demorar tanto assim.

Os olhos de todos miravam as duas, procurando por qualquer indício ou ameaça iminente.

Uma estranha movimentação nas árvores do outro lado da ponte captura meu foco, meus pulmões parecem se fechar quando eu vejo não um, mas vários terrestres, em cima das árvores, armados com arcos e flechas, prontos para atirar.

Não havia sido apenas nós que havíamos quebrado o acordo, os terrestres também estavam.

Jasper parece perceber a mesma coisa que eu, porque ele ergue o rifle em suas mãos, olhando assustado para as árvores.

—Porca puttana!—"Puta merda!" eu murmuro em impulso, mirando a flecha em um dos terrestres nas árvores

Mesmo não entendendo o meu xingamento, Bellamy e Raven percebem a minha ansiedade e logo Bellamy pergunta.

—Qual o problema?

—Terrestres nas árvores!—Jasper responde rapidamente.

—Oque?—Raven imediatamente segura o rifle, olhando pela lente em direção as árvores.—Vocês tem certeza?

—Onde? Não estou vendo nada!—Bellamy rebate impaciente, fazendo o mesmo que os três, revistando a área a nossa frente.

Meu corpo da um salto quando eu escuto Jasper gritar desesperado, tentando avisar os três que estavam lá em baixo de que não era seguro.

Eu vejo um dos terrestres atirar uma flecha em direção à Griffin, prontamente eu atiro, mirando num ponto onde a flecha terrestre iria passar e por um milagre, eu acerto a minha flecha na dele, impedindo de acertar minha amiga.

—Clarke! Corra!—Jasper grita uma última vez antes de nós começarmos a correr em direção ao caminho de volta, torcendo para que nenhum de nós seja atingindo por uma flecha.

A noite já havia chegado quando voltamos ao acampamento, cansados da caminhada esgotante e cansativa.

Além disso havia a tensão do momento mais tenso do dia, que gerou uma intriga nada tranquila entre o grupo.

—Tem algo a dizer?!—Bellamy indaga impaciente a Finn, encarando o mais baixo com desdém.

—Sim! Eu disse, nada de armas!—Finn rebate furioso, elevando o tom de voz, desafiando o homem a sua frente.

—E eu disse que não podíamos confiar neles! Eu estava certa!—Clarke não hesita em responder o garoto com um tom decidido e autoritário.

—Porque não me disse oque pretendia fazer?—Raven pergunta, era evidente o sentimento de decepção e fúria na sua voz.

—Eu tentei, mas você estava ocupada demais fazendo balas para a suas armas!—Finn continua a usar o tom de voz grosseiro, mesmo que estivesse falando com a sua namorada e o meu sangue ferve.

—Tá certa ela! Errado está você! Que quer brincar de pacifista, não temos tempo para suas aventuras!—Eu avanço uns passos em direção a ele, com o queixo erguido e o olhar cortante.—Ir para uma reunião com gente que você nem conhece sem levar um canivete é cúmulo da imprudência e da burrice!

—Eles vieram para matar você Finn!—Bellamy se põe ao meu lado, fazendo nossos ombros se rasparem de leve.

—Você não sabe disso! Valerie deu o primeiro tiro!—Collins aponta a mão em minha direção e eu não demoro para desferir um tapa em sua mão, fazendo os seus olhos se arregalarem em surpresa.

—Queria esperar levar uma flecha na cabeça?! Você devia me agradecer!—Minha voz é carregada de fúria e impulsividade, minhas palavras são cuspidas como veneno na cara do mais alto.

—Você estragou tudo!—Octavia pela primeira vez se pronuncia na conversa, posicionado ao lado de Finn, cuspindo as palavras na minha cara.

—Eu salvei vocês! Mas se fosse para me retribuirem dessa forma, eu devia ter deixado os dois para morrerem naquela merda daquela ponte!—Eu nem penso mais antes de falar, não adiantava, o caos já estava feito.

Octávia não me responde, apenas vira as costas e começa a caminhar em direção ao portão do acampamento, batendo os pés no chão igual uma criança birrenta.

—Bom, se não estávamos em guerra, agora estamos.—Finn apoia as mãos nos quadris, direcionando as palavras para mim com veneno em seu tom, Jasper parece se cansar, porque também dá as costas e vai embora.—Não era para confiar nos terrestres! Era para confiar em mim!—Finn agora fala para Clarke, que foi quem havia chamado Bellamy e os outros.

E o mesmo não demora para caminhar em direção ao acampamento também, sendo rapidamente seguido por Raven, deixando eu, Bellamy e Clarke sozinhos, plantados na porta do acampamento, carregados de culpa e tensão palpável pela discussão feia transcorrida.

—Melhor Dia da Unidade.—Bellamy murmura, cutucando meu braço com o cotovelo numa tentativa de aliviar o clima.

Eu apenas olho para ele desapontada, não pela piada em si, mas por tudo oque havia acontecido, pela culpa que eu carregava e pelas palavras que eu disse, Clarke ao meu lado nega com a cabeça, também tomada por decepção.

Meus olhos são levados a um pequeno pontinho brilhante no céu, que se movimentava rapidamente em direção a atmosfera, logo Clarke e Bellamy também já haviam percebido.

—A nave Exodus?—Bellamy continua ao meu lado, meus ombro não para de tocar o seu.—Parece que seu pai se apressou, princesa.

Os dois sorriam olhando para o céu, mas eu não consigo esboçar uma reação feliz, na verdade, a angústia no meu coração só aumenta, parece que as coisas nunca iriam melhorar, eu nem ao menos estava pronta para ver o meu pai.

Mas depois de alguns segundos assistindo aquilo em pura angustia, algo acontece, algo pior acontece.

Um explosão brilha a distância, fazendo meu ar se prender em meus pulmões.

A nave que meu pai estava a bordo explodiu na minha frente.

É como ser perfurada por mil agulhas, levar um soco no estômago ou ser esfaqueada no peito.

Não, é muito pior.

É pior porque todas as chances que eu tive para concertar e amá-lo novamente, eu fui orgulhosa e não o perdoei.

Ele provavelmente morreu pensando que eu o odiava.

Clarke ao meu lado não consegue conter o sofrimento e começa a chorar, lágrimas gordas e teimosas escorrem pelo seu rosto e eu não hesito em abraça-la de lado e deixar ela chorar no meu ombro.

E eu nem percebo quando a minha visão se suja com lágrimas, que descem muito mais dolorosas do que deveriam ser.

Eu não conseguia nem conter o meu choro, muito menos acudir a minha amiga, que realmente tinha um relacionamento com a mãe.

A mão de Bellamy aperta o meu ombro e eu só consigo virar meu rosto para ele e encara-lo como se eu estivesse quebrada.

E na verdade, eu realmente estava.

Um pedaço de mim sumiu.

Bellamy também estava chocado com oque acabara de ver e dava para perceber o quão sem reação ele ficou ao presenciar duas pessoas em colapso ao seu lado.

Mas ele parece ignorar isso, o choque e passa o braço pela minha cintura, me dando um gatilho para deixar as lágrimas descerem ainda mais.


E quando ele percebe que eu queria ser acolhida e abraçada, Bellamy abraça nós duas, como se fôssemos bonecas de porcelana quebradas.

8.0K Words! Não revisado!

iBeijinhos da V!

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