096

Tessarion rugiu durante todo o trajeto, desde o fosso de Porto Real até o fosso de Pedra do Dragão, mesmo quando Rhaenys tentou acalmá-la durante todo o voo.

O dragão parecia tão agitado quanto sua cavaleira, refletindo seus sentimentos.

Rhaenys usou a maior velocidade que pôde para voar com Tessarion e não foi surpresa quando ela conseguiu chegar lá em menos de cinquenta minutos. Foi um longo tempo, considerando as circunstâncias, mas foi o suficiente para que ela chegasse a tempo e pudesse se aproximar de sua mãe.

A princesa não se preocupou em colocar Tessarion no fosso, pois seria uma caminhada ainda mais longa. Em vez disso, ela deixou o dragão perto da costa do mar e a chegada da fera azul não passou despercebida nem mesmo pelos mais jovens, que olharam pela janela mais próxima no momento em que o rugido alto foi solto ao vento. A herdeira do trono, que foi a primeira a perceber que sua filha desaparecida havia chegado ao castelo, estava com a testa franzida enquanto agarrava a barra do vestido e marchava em direção às escadas e ao portão.

Ela estava tão assustada e preocupada que sentia que desmaiaria a qualquer momento, ela não estava mais acreditando nas desculpas de Lucerys.

Mas antes que a mulher pudesse descer as escadas em direção aos portões do castelo, ela foi parada pelo filho do meio e pelo marido, ambos igualmente preocupados. Rhaenys, por sua vez, deixou Tessarion na areia e subiu correndo as escadas rochosas até a praia, pisando em seus próprios pés e quase caindo no caminho.

— Lucerys Velaryon, você me deve uma boa explicação. — disse Rhaenyra, com o rosto contorcido de preocupação e irritação, e o fato de a mãe dela chamá-lo pelo nome completo o assustou e o fez engolir a saliva com força.

Daemon ordenou que os guardas abrissem o portão, apenas para ouvir os arfos da princesa enquanto ela subia as escadas e corria em direção à entrada do castelo, decorada com duas cabeças de dragão. Os três permaneceram parados em frente à pequena escada que levava ao castelo enquanto esperavam que a princesa concluísse a subida e chegasse até eles.

A visão que tiveram, no entanto, não foi tão satisfatória e muito menos aliviadora.

Rhaenyra sentia o coração apertado no peito e seus lábios se entreabriram de surpresa ao ver o estado de sua filha. Além do cansaço, ela estava usando roupas sujas e de menino, seu cabelo estava solto como uma cachoeira e emaranhado como pelo de gato no verão, havia sangue seco na lateral de sua testa que manchava os platinados. A herdeira do trono quase desmaiou de choque, e suas pernas imediatamente a guiaram para verificar sua filha, que parecia ter saído de uma prisão de calabouço.

— Mas o que... o que é isso? — disse o Príncipe Daemon, estreitando os olhos na direção de Lucerys como se buscasse uma explicação, mas o próprio garoto não sabia o que dizer ao padrasto. — Rhaenys, qual é o significado disso?

Rhaenys respirou fundo enquanto tentava recuperar o fôlego, mas se sentiu um pouco sufocada pela forma como Rhaenyra a apalpava e procurava por mais ferimentos, preocupada como uma mãe deveria. Ela apoiou a mão nos braços da mãe e inspirou e expirou mais uma vez para se acalmar, enquanto Rhaenyra despejava pergunta após pergunta e a comoção chamava a atenção até mesmo de Jacaerys, que logo apareceu nos portões ao lado do irmão.

Ele não admitiria isso agora, mas sentiu uma fúria imediata percorrer seu corpo quando viu o estado vulnerável de sua irmã mais nova.

Depois de finalmente conseguir respirar e se acalmar, a princesa mais jovem olhou para a mãe e franziu os lábios em uma linha fina que já dizia que ela obviamente não trazia boas notícias.

— O que está acontecendo, minha querida? Foi o Aemond, foi o Aemond que fez isso com você? — ela perguntou com mais proteção e talvez até com raiva. Rhaenyra não suportaria a ideia de Aemond machucar sua filha depois de prometer que nunca a faria tal coisa.

Lucerys havia contado o paradeiro de Rhaenys apenas alguns minutos antes de Rhaenys chegar novamente a Pedra do Dragão.

Coincidentemente.

— Rhaenys? — chamou Daemon, aproximando-se das duas mulheres. — Você se importa de explicar por que fugiu de madrugada para visitar aquele homem de um olho só e só voltou no meio da tarde com hematomas? — perguntou o príncipe rebelde, agitado.

A princípio, ela não sabia a quem responder ou para quem olhar, mas, assim que conseguiu associar o que estava ao seu redor, foi em busca da pessoa mais adequada para aquele momento. Rhaenys alcançou sua mãe novamente e olhou para ela com um olhar triste, sem saber exatamente como lhe dar a notícia que tinha.

Mas ela também não tinha tempo, então teria que ser rápido.

Mesmo que fosse doloroso.

— Viserys está morto, mãe. — disse ela em um tom quase sussurrado, mas alto o suficiente para que os necessários ouvissem. — O vovô está morto.

O suspiro de surpresa que saiu dos lábios de Lucerys e Jacaerys atraiu a atenção de alguns servos que entravam sorrateiramente para ouvir a notícia em segredo. Os príncipes não sabiam como reagir ao que a princesa acabara de dizer e simplesmente congelaram no lugar enquanto seus olhos se arregalavam.

A herdeira não teve uma reação tão diferente a de seus filhos. Seus olhos se arregalaram enquanto ela tentava processar a notícia, ela sabia que as notícias não eram boas, mas Viserys?

Sua mão alcançou a da filha, segurando-a com folga. Sua mente estava cheia de pensamentos, e ela não tinha ideia do que perguntar primeiro.

Ela engoliu, lutando contra as lágrimas que estavam ameaçando cair. Rhaenyra havia rezado e esperado que não fosse verdade, mas no fundo sabia que não parecia bom.

Oh pelos Sete, ele a abandonou.

— Tem certeza, querida? Você viu isso acontecer? — Rhaenyra olhou para sua filha, seu coração parecia estar sendo arrancado dela. — Como?

— Eu ouvi a mãe, eu... — Rhaenys começou e suspirou, segurando as mãos da mãe para se apoiar. A princesa olhou para Daemon também, o príncipe tinha um semblante intenso no rosto. — Desculpe-me por ter voado no meio da noite com meu dragão para ver Aemond, mas... mãe, eu ouvi o conselho! O rei está morto, e eles querem Aegon no trono, não você.

Rhaenyra ofegou, era pior do que ela pensava, eles já estavam conspirando contra ela, contra seus filhos.

— Aemond lhe contou isso? Você fala de Aegon como se ele estivesse sentado no meu trono agora. — disse ela, sua voz ficando mais alta ao perceber que havia mais problemas do que apenas a morte do rei.

— Ele não está, mãe. Aegon não quer ser o rei. — disse a princesa e pensou em uma maneira de encurtar a história para que tivessem tempo. — Aemond e Alicent estão ganhando tempo para nós, de alguma forma consegui trazer ela para o nosso lado.

Rhaenyra respirou fundo e sentiu a raiva e a tristeza se dissiparem naquele momento.

Daemon apertou os dedos em volta do punho da espada e fez uma careta, tentando manter a paciência sob controle, embora soubesse quem era o culpado pela morte do rei. Ele se aproximou da enteada e olhou para o ferimento na cabeça dela por um tempo antes de suspirar e dizer entre dentes:

— Aquele vagabundo do Otto Hightower.... estava planejando isso há anos, e você não sabe se aquela vadia da Alicent está dizendo a verdade. — disse ele, segurando a espada com mais força.

— Eu não coloquei minha confiança nela, coloquei em Aemond. — afirmou a princesa, suspirando alto. — Eu não tenho tempo para explicar tudo, não agora.

— Uma decisão ainda mais imprudente. — sussurrou Jace ao fundo, ainda observando os adultos decidirem o que fariam a respeito da situação.

A herdeira do trono fez uma careta para os dois homens e depois olhou de volta para a filha, levando os dedos para examinar a origem do sangue seco que escorria pela lateral da testa de Rhaenys.

Ela teria a cabeça de quem ousou fazer isso com sua filha, não importando se fosse o lorde mais nobre ou a pessoa mais pobre do reino.

Rhaenyra estava tão confusa com as notícias que estava recebendo que mal se preocupou em perguntar como e porquê Alicent estava ao lado deles tão repentinamente, ou como tudo estava indo em Porto Real. Ela só queria que seus filhos ficassem a salvo e desejava punir todos aqueles que tramavam às suas costas para usurpar o que era seu por direito.

— Portanto, temos tempo e temos um aliado. Isso é bom. — sussurrou a nova Rainha dos Sete Reinos. — Precisamos ser rápidos, se eles estão atrasando a coroação, não há como ser suficiente, eles anunciarão seu reinado se continuarmos se atrasando.

Rhaenys olhou novamente para a mãe e respirou fundo enquanto levava a mão à capa da bolsa que carregava ao lado do corpo, desabotoando silenciosamente os botões e retirando a coroa de Viserys, a mesma que estaria na cabeça de Rhaenyra se tudo desse certo. Ela mostrou à mãe a coroa dourada com os sete reinos gravados, a coroa que ela roubou para atrasar a coroação.

— Sem a coroa, não há coroação. — disse ela com um pequeno sorriso orgulhoso.

A rainha ficou atônita, pois não esperava o raciocínio rápido e os movimentos inteligentes de sua filha. Os deuses estavam definitivamente trabalhando a seu favor, e Rhaenys acabara de adicionar outra arma para combater os Verdes.

Ou, nesse caso, apenas Otto Hightower.

A respiração de Rhaenyra foi roubada dela pela segunda vez naquele dia.

— Você o roubou? — a rainha perguntou, ela não estava brava nem parecia chocada, ela estava orgulhosa. — Você é mais esperta do que eu pensava, querida.

Rhaenys não sabia como responder ao elogio da mãe. Seu coração saltou de alegria no peito, sabendo que não havia falhado com ela até agora.

— Estou feliz por não tê-la decepcionado e prometo que continuarei lutando por você até o fim. — afirmou ela com a voz cheia de emoção, pois iria recuperar o trono para sua mãe ou morreria tentando.

Rhaenyra ficou satisfeita com a resposta da filha, mas sabia que não poderia se deleitar com o brilho da vitória por muito tempo. A Rainha precisava planejar seu próximo passo, então a mulher respirou fundo mais uma vez e deixou a coroa cair dentro da bolsa de Rhaenys novamente antes de continuar.

— Eu sei que eles provavelmente a trarão de volta, mas se isso atrasar a coroação em um dia sequer, é um dia a mais que temos. — disse ela, olhando para o marido, esperando que ela tivesse um plano a seguir.

— É claro que tenho um plano, meu amor. — Daemon respondeu com convicção. — Precisamos nos mexer, não podemos ceder ao medo da guerra ou ao medo de perder. Não me importo com o que vai acontecer comigo, mas não vou ficar parado vendo eles tirarem o que é seu, o que você recebeu. Não vou permitir que eles escapem impunes de uma traição, eles precisam pagar por isso.

As palavras de convicção do príncipe inspiraram Rhaenys, sabendo que ele faria qualquer coisa para protegê-los e à família.

Ela olhou para a mãe mais uma vez, tentando transmitir apoio, não queria que ela fizesse isso sozinha.

— Há algo que eu possa fazer, mãe? Não quero passar meu tempo apenas me escondendo, quero ajudá-la de todas as formas possíveis. — perguntou ela, disposta a fazer o que fosse preciso para garantir que tudo corresse a favor deles e que o reino soubesse a verdade.

Rhaenyra segurou as mãos da filha para confortá-la. Ela iria dizer que não, que só queria que ela ficasse segura e longe de toda essa confusão, mas sabia que a menina nunca aceitaria isso e sabia que não havia como protegê-la.

No entanto, nada a impedia de tentar.

A rainha não poderia estar mais orgulhosa de sua filha, mesmo agora, quando o mundo parecia se desfazer à sua frente, mesmo agora, sua filha arriscaria a morte e a guerra para ficar ao seu lado.

— Você já fez o suficiente, querida. — disse ela em voz baixa e reconfortante.

A princesa queria discordar, protestar e lutar contra o que a mãe estava dizendo, mas quando viu o olhar da mãe, teve que abaixar a cabeça e aceitar que talvez a rainha soubesse o que era melhor nessa situação.

Ou talvez Rhaenyra não quisesse arriscar a vida da filha no que poderia ser uma batalha perdida.

A princesa deu alguns passos para trás ao se aproximar de seus irmãos, olhando para Jacaerys de relance e depois sorrindo para Lucerys com gratidão estampada em sua expressão. Ela segurou a mão dele com força e fechou a mente enquanto observava a mãe e o padrasto discutindo em voz baixa sobre o que fariam a respeito disso, como lidariam com o poder em suas mãos.

Era como se a nova rainha malmente pudesse ter tempi para digerir a morte do pai.

Seus ouvidos captaram algumas palavras, mas nada tão concreto que a fizesse saber qual era o plano deles. Porém, à medida que os minutos passavam, ela ficava cada vez mais inquieta e nervosa por ficar apenas olhando. A princesa mordeu o lábio inferior em extrema ansiedade, apertando os dedos de Lucerys entre os seus constantemente, a ponto de deixar o garoto desconfortável com a pequena dor que sentia.

Finalmente, quando a princesa notou que eles estavam agindo, ela deu alguns passos à frente para se juntar a eles, mas parou imediatamente ao ver o olhar que os dois lhe lançaram. É claro que ela não tinha permissão para participar de nenhum plano que eles decidissem fazer.

O plano da rainha era simples, e o processo seria rápido e sangrento se fosse do jeito que ela queria.

Dois dragões voam rápido, mas duas pessoas em um dragão chegam ao seu destino muito mais rápido. Assim, Rhaenyra dividiria espaço no dragão com Daemon, em Caraxes, que era mais rápido que Syrax.

Eles voariam de Pedra do Dragão para Porto Real com a agilidade de Caraxes e chegariam rapidamente, entrariam por aqueles portões mesmo que fosse necessário aterrissar no jardim e invadir o local com fogo. Eles procurariam por tudo o que Rhaenys havia dito e, assim que Otto descobrisse sobre a chegada de Rhaenyra, ele não teria outra chance a não ser se render, pois não seria mais um segredo e a usurpação não seria mais uma coisa a se concluir.

Era vulnerabilidade.

No momento em que Daemon o visse, a lâmina cortaria sua cabeça em três pedaços, se necessário.

Rhaenys fez um pequeno bico em seus lábios quando foi impedida de ir e observou a mãe andar com as presas pelo longo caminho que levava ao fosso, logo atrás do castelo. Ela ainda estava petulante quanto ficar no castelo ao invés vez de ir a Porto Real para ajudar e ter o prazer de ver a cabeça de Otto ser cortada e seu corpo ser dado de comer a um dragão.

A princesa poderia ter ficado no castelo; ela sabia que Daemon e Rhaenyra cuidariam bem da mensagem.

Mas ela era teimosa e determinada em igual medida, uma combinação quase fatal.

No momento em que seus pais desapareceram entre as rochas para chegar a Caraxes no fosso, Rhaenys se esgueirou para ter certeza de que eles estavam longe. Quando teve a absoluta certeza, virou-se para as escadas da praia e calçou as luvas de couro mais uma vez, suspirando.

Assim que começou a descer, ouviu passos apressados e um assobio; antes que pudesse ver o que era, já havia sido puxada pelo braço.

Jacaerys e Lucerys.

— Onde você pensa que está indo? — disse Jacaerys, segurando o pulso da irmã para mantê-la imóvel. A princesa ficou olhando para o irmão por um tempo, era a primeira vez que ele falava com ela desde o incidente do jantar.

Ela suspirou suavemente e lentamente removeu o aperto de Jace de seu pulso, sorrindo tranquilizadora.

No fundo, os dois príncipes sabiam que a irmã não obedeceria à mãe nessa situação. Eles sabiam como ela era teimosa e como essa teimosia a colocava constantemente em armadilhas e perigos.

— Estou indo para Porto Real. Tenho a coroa e não vou deixar que tomem o trono de minha mãe. Vocês não sabem quantas fugas fiz durante a noite e a manhã para chegar aqui. — disse ela com um tom de voz baixo. — Eu preciso ajudar, Jacaerys.

O príncipe mais velho olhou para a irmã por alguns instantes, seus olhos castanhos parando no corte da testa dela. Às vezes ele se perguntava se Rhaenys era de fato uma bastarda como eles, embora nunca admitisse em voz alta que ele e seus três irmãos eram de fato bastardos. Ela era a única entre os quatro Velaryons que tinha cabelos platinados e olhos azuis como a mãe deles e, se não fosse pela única mecha castanha que ela tinha, ele diria que ela era filha de Laenor.

Elas foram legitimadas, de qualquer forma.

— Eu vou com você. — disse o príncipe ao segui-la, o que fez com que a irmã mais nova se virasse para olhá-lo com uma expressão incrédula.

Ela parou no meio do caminho e franziu a testa para o irmão, desaprovando completamente a decisão dele de ir com ela para Porto Real.

Já era uma má ideia Rhaenys se esconder, mas Jacaerys? Era muito pior.

— É claro que você não vai, Jace — disse ela, obviamente, soltando uma risada sem humor. — Você é o herdeiro agora, precisa estar vivo. Você tem uma esposa com um filho esperando por você, eu não quero que nada aconteça com você, não posso perder ninguém agora.

A princesa andou para trás novamente, alcançando o irmão e segurando suas mãos com um leve sorriso no rosto. Ela sentia falta disso, do jeito temperamental e impulsivo de Jace, da maneira como ele se preocupava com sua família e com a dinastia.

Adequado para um verdadeiro rei.

— Não quero que você morra. — disse ele em uma voz firme, apertando os dedos dela.

Rhaenys suspirou alto e mordeu o lábio, olhando para Lucerys, que estava logo atrás de seus dois irmãos mais velhos. Ela soltou as mãos de Jacaerys e suas pernas a levaram até o garoto de cabelos castanhos, segurando a mão dele em vez da de Jace.

— Lucerys vai comigo, não estarei sozinha. — disse ela, causando uma reação negativa de Lucerys.

— Eu vou!? — respondeu ele surpreso, sem saber se era uma boa ideia.

Mas o que ele não fazia por sua irmã.

Jacaerys achou a ideia ainda pior e suspirou alto em aborrecimento, olhando para o céu quando ouviu o rugido alto de Caraxes ao levantar voo, a grande fera vermelha era tão cativante. Sem dúvida, depois de seu próprio dragão, Caraxes era o seu favorito.

Rhaenys seguiu o olhar de Jace para o céu e comprimiu os lábios em uma linha fina de ansiedade, sabendo que estava desperdiçando os minutos com a conversa que estava tendo. Ela olhou para o irmão novamente e suas sobrancelhas se contraíram com uma expressão formada entre ternura e determinação, pronta para ir e levar Lucerys com ela.

— Tenho que ir, Jace — disse ela, mas não teve tempo de se despedir ou abraçá-lo. Ela só precisava ir para Porto Real.

Lucerys se agarrou a Rhaenys, ainda achando que era uma péssima ideia fazer essa viagem à capital quando a mãe deles deixou bem claro que não queria que eles se envolvessem em mais nada, mas ele iria com a irmã mesmo assim. Jacaerys, por sua vez, olhou para os passos apressados de Rhaenys e seu irmão enquanto desciam as escadas em direção à costa da praia, onde sua besta azul estava empoleirada e agitada.

Mas antes que ela chegasse aos últimos degraus, Jacaerys deu um passo à frente e alcançou a irmã mais uma vez, segurando seu braço novamente.

— Por favor, não morra antes que eu a perdoe. — disse ele com um meio sorriso torto, dizendo em tom de brincadeira, mas que havia uma verdade por trás disso, uma preocupação real. — Por favor.

Rhaenys suavizou o olhar por alguns segundos, deixando Lucerys correr e se aproximar cuidadosamente de Tessarion. Ela deu uma risada fraca com o comentário do irmão e pegou a palma da mão de Jace, encaixando a cicatriz dele com a própria cicatriz na palma da mão dela, a mesma onde eles fizeram a promessa de sangue.

— Prometo que não vou morrer antes de você me perdoar, Jace. — ela prometeu da forma mais sincera possível, sorrindo levemente para ele. — Eu tenho que ir, então não faça nada que eu não faria e fique em segurança, cuide de nossos irmãos caçulas e de sua esposa.

Uma gargalhada ecoou pela névoa da ilha, os dois nobres sorrindo gentilmente um para o outro depois que ela soltou a palma da mão dele e desceu correndo as escadas mais uma vez, encontrando Lucerys na areia da praia. Rhaenys passou as mãos sobre as escamas de Tessarion como forma de acalmá-la, pois a fera ainda estava tão agitada que parecia ser a mais feroz do reino... mas não era, estava um pouco longe disso.

Os mais ferozes, na opinião de Rhaenys, eram Caraxes e Vhagar.

Uma batalha entre os dois dragões seria sangrenta se um problema desse tipo acontecesse.

Ela usou as mãos para subir nas cordas da sela e escalar o grande corpo de Tessarion. Sempre que fazia isso, sentia a mesma cãibra no estômago ou um pouco mais abaixo. Ela a ignorou novamente, pois não tinha tempo para sentir dor quando algo tão importante estava em risco, com todos os minutos que eles passaram perdendo em Pedra do Dragão.

Depois de terminar a escalada, ela sussurrou palavras valirianas para acalmar a rainha azul, para que Lucerys pudesse subir no dragão sem o risco de ser devorado vivo e mastigado até seus ossos se quebrarem. O príncipe imaginou que a morte de ser mastigado por um dragão seria muito dolorosa, ou talvez tão rápida que ele nem sentiria a dor a tempo de morrer.

Quando ambos estavam acomodados no topo da sala, Rhaenys confirmou com o irmão que estava tudo bem e, ao receber a afirmação do príncipe, sorriu gentilmente e comandou Tessarion com as rédeas e o valiriano fluente.

O dragão azul subiu aos céus, voando com uma agilidade com a qual Lucerys não estava acostumado, pois ele era mais acostumado a voar com calma e apreciação, mas entendia que a situação exigia essa velocidade. Caraxes, Rhaenyra e Daemon não estavam muito longe, então quando a ex-herdeira ouviu um rugido distinto entre as brumas abaixo deles, ela soube instantaneamente que sua filha estava chegando.

Mas, no fundo, ela já imaginava que a garota não ficaria parada em Pedra do Dragão.

É claro que ela viria.

[...]

Na Fortaleza Vermelha, a confusão ainda não havia diminuído. A atmosfera pesada e sombria ainda percorria cada um dos corredores do castelo, preenchendo os corações aflitos e assustados de todos.

Aemond arregalou o olho bom pelo que ele acha que foi a vigésima vez em menos de cinco minutos devido ao comportamento de Aegon.

— Por que está chorando? — perguntou ele com desprezo, balançando a cabeça com irritação enquanto via seu irmão mais velho chorar como uma criança sem doces, era vergonhoso e torturante de se ver.

O Príncipe Aegon se deitou na cama, surpreendentemente ainda bêbado devido à quantidade de álcool que havia ingerido durante a noite de seu típico passeio. Ele enxugou algumas lágrimas do rosto, sem saber ao certo porquê estava chorando.

Ele murmurou baixinho e voltou a chorar mais, para irritação de Aemond e sua pouca paciência. O príncipe não suportava mais assistir a essa tortura e humilhação, era demais para ele.

Daeron não estava mais na sala, mas estava andando pelos corredores próximos para se certificar de que ninguém estava ameaçando a entrada da sala, enquanto Alicent usava sua própria inteligência para manter Otto em suas mãos. Ela ainda não sabia ao certo por que estava fazendo tudo isso, mas era apenas por seus filhos... então, quem sabe, Rhaenyra ficaria com pena dela e consideraria os anos de amizade que tiveram no passado.

— Eu não sei... — murmurou Aegon, virando-se na cama e sentando-se mais uma vez. — Eu acho que sou uma pessoa ruim, irmão. Eu não sou bom em nada, às vezes duvido que eu seja mesmo bom de cama também.

Aemond franziu as sobrancelhas com mais desdém, levantou-se da cadeira e se aproximou de seu irmão mais velho, observando as lágrimas que caíam como uma cachoeira de seus olhos. Ele não conseguia entender o que estava acontecendo, e aquele não era o momento ideal para Aegon ter uma crise existencial e chorar como uma criança.

— É mesmo? Está me perguntando ou afirmando? — disse ele com as sobrancelhas erguidas, ficando estressado com o choro constante do homem. — Pare de chorar! — gritou ele.

Mas não adiantava, o príncipe mais velho continuava chorando em sua própria bolha, como se tivesse esquecido que havia coisas mais importantes para se preocupar do que se ele era bom de cama ou não. A paciência de Aemond estava no limite, então, quando os sons do choro do mais velho continuaram, ele não se conteve quando sua mão agiu por conta própria e bateu na bochecha do irmão com a força de três homens.

Foi útil, por um momento. O príncipe Aegon ficou tão chocado quando sentiu o tapa de seu irmão que mal teve tempo de raciocinar e continuar chorando, então parou e olhou para Aemond com grandes olhos azuis escuros.

— Qual é o seu problema!? — reclamou o mais velho, passando a mão sobre a bochecha avermelhada com insatisfação no rosto. — Você é insano, eu não entendo como Rhaenys se apaixonou por você, você deve ter o melhor pau do-

— Pare de falar. — cortou Aemond, esbravejando com o irmão.

Enquanto os dois irmãos brigavam, não muito longe estava Alicent, melancólica, enquanto conversava com o pai sobre os planos que tinha em mente, convencendo-o. Ela tinha as mãos cruzadas diante de si, sentada perto da janela do quarto do pai, respirando pesadamente enquanto a conversa fluía normal e calmamente. Ela tinha as mãos cruzadas à sua frente, sentada perto da janela do quarto do pai, respirando pesadamente enquanto a conversa fluía normal e calmamente.

Apesar da hostilidade que estava no limite.

A conversa era uma mistura de tópicos, mas o principal era sempre o príncipe Aegon.

— Você trata isso como um jogo, uma bela competição. O prêmio? Um saco de prata. — disse a mão do rei, levantando-se da cadeira e andando lentamente pela sala. — Confiamos um no outro durante todos esses anos e agora pelo bem da família que ambos desejamos, apesar de nossas diferenças, nossos corações permanecem um só.

Alicent permaneceu em silêncio enquanto olhava para o pai, com uma expressão ainda mais cansada do que antes e a respiração começando a ficar mais pesada e mais alta. Ela pensou em quantas coisas poderia dizer a ele, mas nenhuma delas queria sair de sua garganta, estavam presas em sua própria mente.

Com um suspiro alto, ela voltou a falar.

— Nossos corações nunca foram um só, percebo isso agora. — disse ela em um tom ainda baixo, olhando para o pai com um sentimento tão desagradável. — Eu era apenas uma peça em seu tabuleiro, pai.

Otto ergueu as sobrancelhas e olhou para a filha, questionando por que ela estava indo contra algo que ele disse, algo que não era tão comum de acontecer entre eles. Ele deu alguns passos para perto da filha e parou ao lado da janela, apoiando os ombros na moldura e respirando fundo para continuar a conversa.

— Se isso é verdade, então eu a tornei rainha dos sete reinos, você desejaria outro destino? — ele perguntou seriamente.

Alicent olhou para o colo e riu para si mesma, agora percebendo que tudo o que Rhaenys lhe disse era verdade, ela só estava cega demais para perceber, presa demais nas linhas imaginárias que a moviam por seu próprio poder astuto.

Seus lábios se torceram em uma careta enquanto seu pai continuava a falar e falar, seu peito se apertava cada vez mais a cada bobagem dita. Seus dedos se apertaram um ao outro, puxando a carne ao redor das cutículas até que ela ficasse mais crua, com pequenas gotas de sangue saindo pelos buracos.

De fato, seu pai era muito ousado.

— Como eu poderia saber? Eu queria o que você me manipulou para querer... e agora é a hora de pagar a dívida, dívida aquela que você ficou muito feliz em pagar!

— Um sacrifício. Um sacrifício em nome da estabilidade do reino, Alicent. — corrigiu ele, saindo do lado da filha e se aproximando da lareira que queimava lentamente a madeira. — Nenhum rei subiu ao trono sem ter que sacrificar a vida de alguns em nome de muitos, embora eu entenda sua relutância!

— A relutância em matar não é uma fraqueza! — disse ela ao erguer a voz e se levantar da cadeira, mantendo as mãos cruzadas à sua frente e se aproximando do pai. Um grande silêncio se instalou entre pai e filha, ambos surpresos com o comportamento dela pela primeira vez. — Eu tenho Aegon, agora vamos proceder como eu desejo. Enviarei os termos para Rhaenyra em Dragonstone, termos verdadeiros que ela poderá aceitar sem sentir vergonha.

A mão do rei levantou as sobrancelhas mais uma vez, respirando fundo diante da petulância da filha em aceitar o plano ideal para colocar Aegon no trono, havia algo errado. Ele não entendia por que ela estava mudando o curso da conspiração agora, por que estava assumindo a liderança no assunto e, de certa forma, não deixando que chegasse a Aegon.

Ele percebeu que havia algo errado.

Aemond havia retornado da baixada das pulgas não apenas com Aegon, mas com os gêmeos, e eles foram enviados por caminhos diferentes. Cole não estava com ele e somente os deuses sabiam de seu paradeiro, seu neto estava sujo e tinha manchas de sangue nas mãos e no rosto quando chegou para lhe dizer que havia encontrado Aegon.

A coroa havia desaparecido, Daeron estava à espreita e Alicent estava mudando o caminho original.

Algo ou alguém havia mudado e revertido a situação.

— Se ela sobreviver, os aliados se reunirão atrás de seus estandartes, ansiosos por seu retorno. — disse ele.

— Então ela não deve voltar, meu marido gostaria que tivéssemos misericórdia de sua filha. — ela respondeu imediatamente, aproximando-se do pai.

Pouca luz entrava pela janela do quarto e criava uma atmosfera sombria entre eles, quase como se estivesse espelhando a tempestade que pintava suas almas de preto como carvão, escurecendo tudo o que lhes trazia alegria amarela.

— Seu marido, ou você, a melhor amiga de infância da filha dele? — ele perguntou.

Alicent fechou a boca e sentiu a garganta se fechar em pregos, rasgando a traqueia em mil pedaços para matar. Seus grandes olhos castanhos pareciam pesados, ela engoliu com força para não deixar a tristeza e as lágrimas tomarem conta de seus olhos brilhantes.

Bem, essa era a verdade. Ela queria a amizade de Rhaenyra novamente, ela foi a única pessoa que Alicent amou genuinamente e que lhe trouxe tanta felicidade, essa que acabou depois de seu casamento com Viserys. Alicent pretendia cuidar e proteger seus filhos, portanto, se fosse necessário se afastar para se tornar uma mãe de verdade e mudar o curso de seus relacionamentos, ela o faria.

Porque ninguém sabia o que a guerra traria. Seus filhos poderiam morrer de qualquer maneira enquanto lutavam.

Eles poderiam morrer com espadas, no céu, no oceano, em janelas ou com venenos. Seus corpos poderiam ser esmagados e os dragões mortos, a loucura poderia tomar conta da mente de qualquer um e criar aversão ao que um dia eles mais amaram.

— Meu filho será consagrado amanhã à noite, toda Porto Real deve testemunhar sua ascensão. Ele assumirá a autoridade, não haverá mais hesitação e ele usará a coroa de seu homônimo, o conquistador. — disse ela, respirando alto e com determinação, tentando se manter confiante e transmitir a ideia de que era exatamente isso que ela queria. — Ele carregará Blackfyre e sua espada, o povo se lembrará da antiga força da Casa Targaryen.

Otto olhou para a filha por longos minutos, parecendo analisar algo no comportamento dela que o estava deixando com uma pulga atrás da orelha.

— Você se parece tanto com a sua mãe quanto a algumas ações. — disse ele e se aproximou da ruiva, pousando uma mão em seu ombro. — Você está mentindo para mim.

A ruiva foi pega de surpresa quando seu pai a acusou tão livremente, e ela não sabia exatamente como reagir às acusações feitas sobre suas ações. Ela deu alguns passos para trás, o comentário de Otto sobre ela ser parecida com a mãe em alguns aspectos, por algum motivo, a fez se sentir instável e doente, frustrada.

— Mentindo sobre o quê? — ela perguntou em um mal-entendido. — Não estou mentindo sobre nada, pai.

— Ah, sim, você está. — disse Otto, aproximando-se de sua filha mais uma vez. — Você acha que sou tolo, Alicent? Sou muito mais velho do que você e tenho muito mais experiência nesse sentido, não sou idiota para você achar que poderia mentir e eu não perceberia!

Alicent respirou fundo e se afastou do pai novamente, sentindo-se um pouco mais nervosa agora que ele a estava acusando com mais força e sem piedade, seu coração bateu forte no peito quando foi pega. Ela tinha o péssimo hábito de piscar freneticamente e apertar os dedos para mudar o foco de atenção quando era pega em uma mentira, e seu pai sabia disso.

Foi por isso que ele segurou o braço e inclinou a cabeça para o lado, como um pai que pega a filha fazendo algo errado, com a diferença de que o caso deles era o contrário.

Ele cravou os dedos no braço da filha e a puxou até ficarem frente a frente, respirando alto e com raiva por suas narinas.

— Você trocou de lado, não foi? Ouvi dizer que Rhaenys estava perambulando pelos campos de pulgas. — disse ele entre dentes, encarando a filha com olhos arregalados. — O que você fez, Alicent?

A mulher olhou nos olhos do pai e viu duas opções a seguir; ou ela abaixava a cabeça e mudava de lado novamente para satisfazer o pai, ou levantava a cabeça e ia contra tudo o que o pai queria naquele momento.

E a Hightower sabia exatamente o que ela deveria fazer.

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