079

Ao acordar nessa manhã em particular, Rhaenys encontrou um corvo empoleirado do lado de fora da janela de seu quarto, apenas olhando para ela com seus olhos vazios e sem vida. Ela estremeceu ao pensar no que esse sinal de mau agouro poderia significar, era como se o corvo fosse um mensageiro de mau agouro.

Os pássaros estavam estranhamente quietos naquela manhã, como se o mundo estivesse prendendo a respiração na expectativa de um presságio.

Porém a princesa nunca de fato acreditou nesses ditados do povo comum, então sua atenção não foi capturado pelo bizarro corvo que usava seu bico para bater no vidro da janela dela nesta manhã.

Seus irmãos a esperavam no campo de treinamento, como era a rotina diária deles. Lucerys havia voltado da lua de mel a poucas horas atrás, estava sorrindo de forma radiante como nunca visto antes.

Energia drenada.

O sol não estava tão forte, era um dia nublado e com pouca luz solar para atrapalhar o desempenho dos príncipes e soldados que treinavam no agitado pátio. A princesa se acomodou ao lado de Jacaerys enquanto os dois observavam Lucerys treinar com sua espada em um dos bonecos de palha do lugar, e ao outro lado do campo se encontrava o príncipe Aemond testando suas habilidades com outro guarda do castelo.

Aemond era um excelente espadachim. Seu estilo era fluido e preciso, seus movimentos eram graciosos e suaves.

Enquanto os de Lucerys eram desajeitados, mas ele ainda estava em fase de aprendizado e Rhaenys se orgulhava da trajetória do irmão mais novo comparado ao único dos treinos dele a alguns anos atrás.

Cole andava por perto, seus olhos sempre focados nos bastardos e em Rhaenys, principalmente na princesa.

Como se ele estivesse buscando por qualquer tipo de deslize dela, como se estivesse buscando por alguma interação discreta entre Aemond e Rhaenys. Estava sendo vigiada como um corvo vigia a carcaça podre.

Isso chamou a atenção de Aemond, ele olhou para Criston com o rosto vazio. No entanto, isso não durou muito, pois Aemond logo voltou a se concentrar na luta. Seu rosto era uma máscara de determinação enquanto ele lutava contra o guarda que, obviamente, era muito mais velho do que ele.

— Firme seus joelhos, tenha mais força no punho. — Criston orietou de repente, sua voz firme preenchendo os ouvidos de Jacaerys e Rhaenys. O homem segurou o pulso do garoto e firmou a espada nela, de uma forma levemente bruta.

Rhaenys mudou sua atenção para Lucerys, cutucando o braço do irmão mais velho quando viram a repentina aproximação e orientação do escudeiro quanto ao treinamento do garoto, visto que desde que eram pequenos, Criston nunca deu atenção nenhuma para os treinos dos meninos de Rhaenyra.

— Por que ele está ajudando Lucerys? — sussurrou Jacaerys com uma sobrancelha levantada. Rhaenys apenas mexeu os ombros em forma de dizer que também não tinha a mínima idéia do porquê.

— Não, Lucerys, concentre-se. Não é isso. Seu pulso deve estar firme e reto, seus punhos fechados com força e firmeza. — Criston deu um tapa na perna do garoto enquanto segurava seu pulso. Ele soltou o braço e fez um gesto, como se estivesse ordenando que o garoto se concentrasse novamente. — Joelhos firmes, é isso que lhe falta. Seja forte como um dragão, não tão desajeitado como uma vaca.

Os dois Velaryons mais velhos franziram suas sobrancelhas de formas iguais, estranhando ainda mais o comportamento de Criston. Ele estava sendo passivo-agressivo e demonstrava um entusiamo súbito quanto ao posicionamento e treinamento de Lucerys, isso não agradava a princesa.

— Estou tentando. — disse Lucerys, segurando a espada com mais firmeza e acertando no ponto certo, mas logo no próximo golpe errando.

— Lucerys, o que eu lhe digo é a diferença entre a vida e a morte durante um duelo. — o tom áspero de Criston não mudou e ele segurou firmemente o pulso do garoto, com os dedos pressionando. — Agora entenda isso. Seja mais rápido, mais agressivo, mais forte.

Seus olhos estavam fixos no garoto, e Lucerys estava claramente começando a sentir dor, tanto pelo aperto duro quanto por sua incapacidade de seguir as instruções de Cole.

Criston deu outro tapa forte nas costas de Lucerys. O rapaz fez uma careta de dor.

— Pare de se lamentar, seu pequeno bastardo. — o Lorde Comandante da Guarda Real parecia ter prazer em ver o garoto sofrer.

Rhaenys caminhou com determinação na direção de Criston Cole, seu rosto vermelho de raiva pelas ações do homem adulto contra um adolescente de baixa fisionomia. Jacaerys tentou segurar a irmã mas não teve tempo, então tudo que fez foi seguir na mesma direção que ela e ver o desenrolar da situação.

A princesa empurrou o guarda pelo ombro, afastando-o do irmão caçula.

— Talvez você deva procurar alguém do seu tamanho, Criston. — disse ela, encarando o homem sem medo algum nas veias. — Apesar de que, lembro-me bem de Sor. Harwin Strong lhe humilhando nesse mesmo pátio, senhor laranja. — a princesa provocou.

Rhaenyra havia contado para Rhaenys a história de Criston, ela sabia bem da proposta ridícula que o escudeiro tinha feito para a herdeira do trono e como ele passou a odiá-la após a rejeição.

— Não me toque, princesa. — rosnou Criston ao mesmo tempo em que arrancava a espada do braço de Lucerys e se virou para olhar para Rhaenys. — E quanto ao seu bastardo? Por que ele não está sendo ensinado a segurar uma espada? Será que ele também quer ser um bastardo mole? — ele gesticulou atrás de si, apontando claramente para Jacaerys. Criston se virou de volta para Lucerys, apontando a espada para ele novamente. — Vamos lá.

Jacaerys, sempre com um temperamento forte, cerrou os punhos com força e imediatamente franziu a testa. Ele deu um passo à frente como se estivesse pronto para atacar o homem, mas Rhaenys o conteve... por enquanto.

— O rei foi muito claro quando disse que qualquer um que chamasse meus irmãos de bastardos teria a língua cortada, e isso vale para você também. — avisou a princesa, ela mesma também cerrando os punhos.

Aemond observava a confusão de longe, mas não pretendia desfazer nada no momento, não queria se envolver em algo assim quando poderia gastar melhor seu tempo com os seus treinamentos. Então, após alguns segundos olhando a situação, ele se virou e continuou a treinar com a espada e o escudo.

Criston se virou bruscamente, olhando para Rhaenys e para o garoto, que havia se aproximado e queria bater nele agora. O Lorde Comandante da Guarda Real permaneceu calmo, mas havia uma clara raiva na maneira como ele olhava para os dois.

— Eu só digo a verdade, princesa. — o escudeirou olhou de volta para Lucerys. — Vá em frente, vamos. — ele apontou para o peito do Velaryon e se virou, esperando que ele o atacasse.

Rhaenys franziu as sobrancelhas dela mais uma vez e soltou um resmungo de raiva, caminhando para perto de Cole mais uma vez e apontando para o peito dele da mesma forma que o homem havia feito para o irmão dela.

— Isso não é um treino justo, você tem quase 40 anos e Lucerys tem 15. Ele não vai treinar com você e sugiro que pelo seu bem, você se afaste e pare de caluniá-los agora mesmo. — ela avisou, sua raiva aumentando a cada palavra que o homem dizia.

— Estou apenas treinando o futuro de Driftmark. — disse o homem com um encolher de ombros. — Lucerys tem quinze anos e já é casado, é quando um menino se torna um homem. Você não deve interferir nesse assunto, princesa...

Criston foi interrompido por um súbito soco em seu rosto, dado por Jacaerys. O garoto ficou furioso com o fato de o homem ter ousado insultar sua mãe e seus irmãos.

Ele não conseguiu se conter e deixou que toda a sua raiva se derramasse em um único golpe.

Criston não respondeu ao ataque, mas parecia furioso, com o rosto inchado, como se tivesse acabado de levar um tapa.

Rhaenys poderia ter interferido ou repreendido o irmão, mas ela não o fez. A princesa apenas deu uma risadinha baixa e bateu palmas com o irmão mais velho, sorrindo levemente pela braveza que o príncipe teve em bater em um homem quase 30 anos mais velho que ele.

— Seus insultos irão chegar ao ouvido de minha mãe, Sor. Crispin. — disse o príncipe, e depois de uma longa pausa ele retomou a fala. — Criston. — ele se corrigiu.

Por um momento, um silêncio tenso encheu o ar, quebrado apenas pela respiração de Jacaerys, que continuava rápida, e pela respiração de Criston, que saía por suas narinas dilatadas.

Criston permaneceu em seu silêncio, com o rosto começando a arroxear e, por um instante, parecia que ele estava prestes a reagir, mas não o fez. Ele tinha inteligência suficiente para entender que era melhor ficar em silêncio, pelo menos por enquanto.

— Você quer um treinamento justo? Muito bem, venha cá. — disse o escudeiro, pegando o pulso da princesa e puxando-a para o outro lado do pátio de treinamento. Jacaerys e Lucerys seguiram logo atrás, protestando contra o homem que tocava a irmã deles.

A princesa fez birra, tentando puxar o pulso do aperto do escudeiro enquanto ele a puxava contra a vontade dela.

— Príncipe Aemond, venha aqui. — Cole chamou e posicionou a princesa no meio do círculo. — Segundo filho contra segunda filha, isso me parece mais do que justo.

Aemond virou-se quando seu nome foi chamado, e quando ele percebeu a forma como Rhaenys se encontrava, ele teve que usar todo o seu auto controle para não enforcar Cole nesse exato círculo por estar tocando e machucando a princesa. Mas ele não podia, não podia arriscar o segredo deles ser revelado e sabia apenas pelo olhar da sobrinha que ela também não desejava isso.

Jacaerys protestou mais uma vez, retirando as mãos sujas do escudeiro de perto da irmã.

— Rhaenys não participará de nenhum treinamento. Ainda é injusto porque Aemond tem muito mais habilidade e muito mais força que a princesa, Cole. — ele disse como um fato óbvio, seu estresse aumentando tanto quanto o a irmã, e de Aemond.

Ceustin encarou o príncipe por um momento, mas depois balançou a cabeça.

— Se a princesa é muito frágil, então diga a ela para ficar longe da espada e do escudo e pegar uma agulha.

Isso pareceu deixar Jacaerys ainda mais furioso, e ele protestou novamente.

Rhaenys ficou olhando para Jacaerys e Aemond, com o coração batendo forte e rápido. Ela nunca quis entrar em uma luta, muito menos contra Aemond, por quem seu coração batia mais rápido do que o normal.

O olhar de Aemond era duro para o cavaleiro, e Jacaerys podia sentir seu desejo de bater em Cole novamente surgir de repente. Ele parecia uma fera perigosa, pronta para atacar sua presa.

— Deixe-me lutar contra Aemond, ao invés de Rhaenys lutar. — disse o príncipe Jacaerys, tentando proteger a irmã.

Cole zombou e olhou para o príncipe, mas a sugestão do garoto lhe pareceu válida.

— Tudo bem, se você quer tanto. — ele fez um gesto para que Aemond se aproximasse. — Aqui, você quer lutar com ele? Então lute contra ele, se quiser. Aemond vai lhe dar um belo chute, mas se você aguentar como um homem... então veremos.

Jacaerys sorriu. Ele sabia muito bem que Aemond o derrotaria, assim como sabia muito bem que não poderia deixar que sua raiva o tornasse imprudente.

Mas esse era o preço que ele tinha que pagar para proteger Rhaenys.

Faria qualquer coisa por ela.

Aemond deu um passo à frente, com uma expressão estoica, mas claramente irritado por ter sido convocado para lutar contra um bastardo. Ele era muito mais alto que o príncipe e muito mais habilidoso com a espada.

Jacaerys parecia furioso com o Lorde Comandante da Guarda Real por zombar dele tão abertamente, mas aceitou o desafio.

Com um olhar determinado e firme, o príncipe avançou com determinação contra Aemond, preparando-se para lutar.

Aemond também aceitou o desafio e avançou para o centro do círculo. O príncipe era menor do que Aemond e não tinha as mesmas habilidades com a espada, mas ainda sim sabia bem como usar uma. A luta parecia completamente desigual desde o início, mas Jacaerys estava determinado a vencê-la.

Aemond se aproximou de seu oponente e fez o primeiro movimento, mirando um golpe na perna do príncipe.

Jacaerys tinha a agilidade necessária para se esquivar do golpe de Aemond e contra-atacar imediatamente, mas o filho do dragão parecia muito mais rápido e determinado a vencer. Seu segundo golpe veio em seu corpo, no ombro, e Jacaerys não teve escolha a não ser receber o golpe.

O príncipe já estava perdendo, mas, no verdadeiro estilo Targaryen, ele não desistiu tão facilmente e continuou lutando.

Cole estava observando a luta, mas seu olhar estava focado apenas em Jacaerys, que estava recebendo muitos golpes do príncipe Aemond. O homem se sentia frustada que, mesmo com a derrota iminente, o garoto ainda estava lutando apesar de ter recebido tantos golpes.

Os dois garotos se atacaram simultaneamente, Aemond com um golpe no pescoço e Jacaerys com um golpe no ombro. O golpe de Aemond foi mais preciso e não foi desviado pelo príncipe, o golpe doeu porém não o suficiente para fazer ele desistir.

Com um aperto forte, Rhaenys segurou a mão de Lucerys, seu coração disparado no peito enquanto a preocupação por seu irmão a consumia. Simultaneamente, a princesa desviou o olhar para o escudeiro, dominada por um desejo imenso de retaliar contra suas palavras ofensivas, lançando uma flecha ou pedra em sua direção, cobrando um preço pela humilhação pública que os meninos haviam suportado.

A princesa contaria isso a Rhaenyra mais tarde; as calúnias do homem não ficariam impunes, independentemente de Cole ser ou não o escudeiro pessoal da rainha.

Seu olhar estava concentrado, atento demais a cada mínimo movimento dos dois príncipes e a cada novo ataque, seus joelhos tremiam de ansiedade.

Naquele momento, tudo parecia estar acontecendo em uma velocidade extremamente alta.

Os dois garotos atacaram ao mesmo tempo, desferindo dois golpes um no outro sem pausas. O golpe de Aemond parecia mais preciso e o rapaz acertou Jacaerys no ombro esquerdo.

O Velaryon tentou revidar o golpe, mas não teve tempo.

Aemond continuou atacando com brutalidade, atingindo o garoto novamente no rosto, e o Jace não se esquivou dos golpes. Parecia que tudo estava prestes a acabar, mas o príncipe, apesar de ter sido muito atingido, não se rendeu.

Rhaenys então decidiu que já era o bastante e, quando encontrou a brecha necessária, teve que interromper o "treinamento".

— Já chega, Jace. — disse a princesa, segurando o antebraço do irmão para que ele parasse e tomasse consciência de suas ações, movidas pela raiva. — Já é o bastante por hoje, por favor.

Parecia que a sessão de treinamento estava prestes a terminar, mas a batalha ainda estava indecisa. Aemond ainda tinha mais energia do que seu oponente e o havia atingido com bastante eficácia.

O príncipe olhou para a sobrinha com a expressão mais terna e, embora estivesse cansado, ainda tinha consciência de suas ações e emoções. Seu coração batia forte no peito, mas ele sabia que não era pelo cansaço, mas sim pelo fato da princesa estar por perto, sua presença perfumada e seu rosto enfeitado pela preocupação com o irmão.

Aemond apenas esperava que ela não ficasse furiosa com ele mais tarde.

Jacaerys parecia exausto, mas não desviou o olhar de seu oponente até que Rhaenys puxasse o manga de sua roupa mais uma vez, e ele finalmente teve sua atenção trocada.

Cole manteve suas mãos cruzadas para trás enquanto observava a cena por inteiro, seu ponto de visão sempre parando na princesa antes de todos. Rhaenys era exatamente igual a mãe quando mais jovem, e isso deixava o homem ainda mais furioso e receoso do que normalmente já era.

Quando Rhaenys conseguiu afastar Jacaerys, o Príncipe Velaryon se libertou das mãos de sua irmã e caminhou até um canto do campo de treinamento, onde as curvas do vento eram maiores e ele conseguia refrescar melhor o calor que sentia em seu corpo. Seus ferimentos eram superficiais e não deixariam vestígios depois de curados, exceto um pequeno hematoma perto do pescoço.

Aemond torceu o cabo da espada entre os dedos e enfiou a espada no cinto, puxando o cabelo platinado que o atrapalhava para atrás do ombro. Seu olho bom seguiu os passos da sobrinha e sua pupila dilatou quase imediatamente com a mera presença da garota.

Sua paixão por ela o afetava profundamente, e o príncipe não sabia se deveria continuar a amá-la em público ou se deveria manter esse sentimento escondido pelo resto da vida.

Até que alguém conseguisse preencher essa lacuna.

— Eu não gosto da forma como ele olha para você. — disse Lucerys, cruzando os braços e olhando a irmã com uma preocupação evidente. — Eu deveria ter tirado os dois olhos dele para não ter que ver a forma como ele olha para você agora. — comentou o príncipe, baixo mas o suficiente para que o príncipe Aemond conseguisse ouvir pois estavam perto.

Depois de ouvir suas palavras, Rhaenys se virou ligeiramente e olhou para seu irmão. Seus olhos se arregalaram de surpresa por ter ouvido tais palavras vindas da boca de seu irmão mais novo, que era tão dócil, e se sentia tão culpada por Aemond ter perdido um olho durante a infância deles.

Aemond ficou tenso quando o assunto de seu olho e o incidente foram levantados pelo próprio autor da ação. Seu olhar era forte o suficiente para queimar qualquer um, principalmente Lucerys.

— Tenha cuidado com o que fala, príncipe. — ele disse mais uma vez, elevando a voz o suficiente para que pudesse ser considerado uma ameaça. — Fale do meu olho novamente e eu pegarei o seu. Então você também poderá usar um tapa-olho, Lucerys. — o príncipe sibilou com os dentes cerrados, seu tom sombrio e pesado de raiva.

Os olhos de Lucerys se arregalaram quando a situação se agravou, e ele se arrependeu de ter falado sobre o olho de Aemond. Sentiu-se envergonhado e culpado por ter provocado a raiva do tio indiretamente.

Ele ficou em silêncio por um momento, pensando consigo mesmo.

Rhaenys, atônita ao ver a reação de Lucerys, não conseguiu responder.

Essa súbita e violenta explosão de Aemond não foi apenas inesperada, mas também assustadora.

No entanto, quando Aemond ameaçou tirar o outro olho dele também, Rhaenys sentiu a raiva crescer dentro dela. Apesar de entender que as palavras do príncipe vinham de uma profunda mágoa e insegurança, ela sentiu que a ameaça dele também foi um passo longe demais.

Rhaenys estava prestes a se aproximar e defender seu irmão mais novo quando Lucerys subitamente quebrou o contato visual com Aemond e deu as costas ao irmão mais velho, olhando para baixo.

No entanto, esse temor era justificado, pois Aemond se levantou rapidamente e, de repente, ficou perto do sobrinho. Ele se inclinou com uma expressão intensa, fazendo com que Lucerys congelasse e ficasse ainda mais tenso.

— Aemond. — Rhaenys disse calmamente, com a voz afiada e firme. — Lucerys estava apenas falando. Ele não queria irritá-lo dessa forma, não o ameace assim.

Aemond ficou em silêncio, com a mandíbula cerrada, antes de finalmente falar.

— Há muita coisa em jogo para brincar com meu olho, Rhaenys.

A princesa se manteve em silêncio e soltou um alto suspiro, encarando Aemond de cima a baixo com uma expressão não tão contente. Não importava o quão próxima ela fosse de Aemond, os irmãos e a família sempre seriam a prioridade suprema. Rhaenys não podia discordar disso, embora não gostasse de como a resposta do tio havia se tornado violenta.

— Eu sei, Aemond. — continuou ela, mantendo a compostura, mas com a voz carregada de raiva. — Mas não é assim que você deve reagir, você deve saber que Lucerys não queria zombar de você. Indico que acalme-se, Aemond.

A carranca de Aemond se aprofundou com a menção da palavra calma, seus punhos se apertando com força e ele respondeu em um tom baixo.

— Não consigo ficar calmo. Não quando isso é a única coisa que as pessoas veem quando olham para mim. Eu odeio isso, tudo o que elas veem de mim é a aberração com um olho só e estou cansado disso. — o príncipe disse, mas logo escondeu sua vulnerabilidade diante do assunto. — Talvez eu deva tomar o olho de Lucerys para mim, como um presente.

— Aemond. — exclamou Rhaenys, irritada ao ouvir o sobrinho fazer tal ameaça. A ideia de Aemond ferir seu irmão a aterrorizava.

Aemond tinha sido uma criança quieta e raivosa e, embora parecesse ter crescido desde então, parecia que ela estava errada em pensar assim.

O príncipe desceu a mão para a adaga que carregava junto da espada, apertando com firmeza entre os dedos. A mesma arma usada para arrancar o olho do príncipe, a mesma arma que custou toda a sua vida e reputação, sua insegurança.

O temperamento dos Targaryen é conhecido por ser feroz e implacável. Embora suas emoções e raiva possam ser domadas, basta uma leve provocação para desencadear seu temperamento ardente. Eles podem ser extremamente cruéis e vingativos quando são provocados, o sangue do dragão corre profundamente na linhagem dos Targaryen.

— Lucerys nunca será um grande lutador, você sabe. — ele murmurou, para ninguém em particular, mas alto o suficiente para que os dois ouvissem.

— Não faça isso. — ela exclamou novamente, com eu inquietação em sua voz ao notar que Aemond estava segurando sua adaga. Ele se meteria em problemas se reagisse com violência dessa forma, e ela não poderia permitir isso. — Aemond, guarde sua adaga. — a princesa continuou, com a voz ainda afiada, mas com uma ponta de preocupação dessa vez.

Jacaerys percebeu a mudança da atmosfera, e a mudança no tom de voz da irmã. O garoto virou-se para trás para olhar a comoção, e toda a raiva dele que já havia decrescido, parecia ter amplificado mais uma vez. O príncipe passou por Cole até chegar ao lado da princesa, a própria mão dele também descendo para a adaga que sempre carregava no cinto do quadril como um costume.

Aemond era alto e ágil, e seu temperamento também não era um dos melhores. Seus passos foram largos quando ele se aproximou do Velaryon menor com a adaga levemente levantada no punho, seu olho bom arregalado com toda a sua perturbação tomando conta de suas ações. O príncipe não se importava com mais nada, além de assustar o Velaryon que ele tanto odiava.

Nem mesmo seu amor por Rhaenys foi capaz de deixar ele consciente.

A interferência de Jacaerys só piorou a situação, e Rhaenys suspirou profundamente. O príncipe e o irmão dela estavam claramente nervosos, e ambos tinham uma arma mortal. Essa situação estava ficando fora de controle muito rapidamente, no entanto, a princesa não se surpreendeu com o fato de Aemond não ter conseguido se controlar dessa vez; ele sempre atacava à menor provocação.

Principalmente se vinda de um dos Velaryons, ou Strongs.

Aemond praticamente se jogou na frente de Lucerys, usando ainda mais a sua altura para intimidar o príncipe. A adaga estava levantada, e ele parecia muito disposta a arrancar um dos olhos do garoto; olho por olho.

Como a mãe dele havia desejado a anos atrás.

Rhaenys se interpôs entre o irmão e tio, com um suspiro surpresa e talvez assustada. A ideia de que algum de seus irmãos se machucasse não era algo com que ela pudesse conviver, jamais.

Jacaerys também interveio, mas parou no mesmo instante quando viu a irmã entre a adaga e Lucerys. Ele se perguntou se Rhaenys também percebeu a gravidade da situação ou se ela só interveio porque já estava por perto e foi poe impulso.

Aemond parou seu pulso no mesmo instante que ele notou a presença da princesa entre a adaga e o Velaryon. Sua mão segurou firme no cabo, e a ponta da lâmina da adaga se manteve perto da bochecha da princesa.

Mais uns centímetros para frente, e ela a machucaria.

— Se pretende tomar um dos olhos do meu irmão, você terá que pegar o meu primeiro. — a princesa sussurrou, sua voz carregava um grande misto de emoções e era difícil entender qual estava no comando. — Tenho certeza que sua mãe terá preferência na cor azul, ao invés do castanho.

— Meu príncipe, abaixe a adaga. — disse o escudeiro, finalmente tomando consciência do quão ruim a situação poderia acabar. Um pequeno circulo de sussurros se formar ao redor dos príncipes e da princesa, mas ninguém ousou parar a confusão com medo da situação se escalar ainda mais cruelmente.

Rhaenys manteve seus olhos azuis fixados no azul de Aemond, a mão dele apertava a adaga com tanta força que a mão tremia de raiva. O príncipe estava dividido entre continuar com o movimento da adaga, ou abaixar para não machucar a tão amada princesa.

Devagar, ele aproximou a adaga mais alguns centímetros do rosto dela. A lâmina chegou a tocar no rosado de sua bochecha, mas não a ponto de cortá-la, não ainda.

Rhaenys sentiu os batimentos cardíacos aumentarem quando Aemond continuou a se aproximar dela com a lâmina afiada. Seus olhos se arregalaram quando ela percebeu que as ações do tio, induzidas pela raiva, poderiam lhe causar muitos danos. Ele manteve a lâmina da adaga perto da pele dela, a apenas alguns centímetros de cortar sua carne.

A princesa tentou desesperadamente manter a calma, ciente do perigo potencial da situação. Seu coração começou a bater ainda mais rápido quando a lâmina tocou sua pele rosada, e sua respiração ficou mais curta e rápida de medo.

O olho singular de Aemond estava fixo nos de Rhaenys, enquanto sua testa estava franzida de frustração e sua boca tremia ao olhar para ela. Seu aperto na lâmina não afrouxou, mas começou a vacilar levemente.

A mão de Aemond finalmente afrouxou um pouco; a adaga parou de se aproximar da bochecha dela quando a borda da lâmina parou de pressionar sua pele. A expressão dele não mudou, mas o aperto ficou mais frouxo e a palma da mão começou a se voltar mais para baixo. O príncipe começou a remover lentamente o punhal do rosto dela enquanto a tensão da situação continuava a aumentar.

As respirações anteriormente suspensas agora eram liberadas lentamente. Lucerys estava agarrando o tecido do vestido da irmã com toda a sua força, porque estava com medo, com medo de ser a razão por alguém se machucar por culpa dele mais uma vez.

Seu olhar permaneceu nela enquanto ela se mantinha firme entre os dois, e foi então que ele percebeu o quanto ela era uma princesa corajosa. Mas antes que ele pudesse dizer qualquer coisa, o príncipe removeu a adaga do rosto dela e seu punho se afrouxou completamente quando o confronto foi desfeito.

O príncipe Aemond soltou um alto murmúrio, seu coração parecia querer explodir do peito, quebrar as costelas e rasgar a pele. Ele permaneceu em completo silêncio por severos minutos, encarando apenas a princesa e o irmão dela.

Jacaerys devagar e cautelosamente se aproximou da irmã, segurando no braço dela enquanto ambos se mantinham na frente do mais novo.

Talvez se Rhaenys tivesse confiado e prestado mais atenção, ela teria notado que o corvo bicando em sua janela mais cedo era, de fato, um sinal de mau presságio.

Apesar da tensão persistente, seus olhos se encontraram enquanto o ar entre eles ainda parecia crepitar com a emoção da situação. Muito pouco tempo depois, o príncipe guardou a adaga no mesmo lugar de antes e virou-se, caminhando na direção da saída do pátio.

Lucerys sentiu uma pontada no coração quando percebeu a situação. Aemond não hesitaria em machucar Rhaenys, não antes.

Agora ele havia hesitado, porque ele estava apaixonado por Rhaenys. Lucerys notou.

— Ele poderia ter lhe machucado, Rhaenys. — disse Jace, seu olhar era tão preocupado quanto o de Lucerys.

Rhaenys soltou um suspiro, seguindo com os olhos na direção em que o príncipe se retirava.

— Estou confortável e acostumada com a violência da nossa família, Jace. — ela explicou em um quase sussurro, tentando manter a compostura apesar da dor mental que estava sentindo. — Aemond não é corajoso o suficiente como clama ser.

Ela sabia que estava brincando com fogo quando aceitou a trégua oferecida, então não poderia culpá-lo quando se queimasse.

Teria que lidar com suas próprias consequências.

Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top