𝗖𝗮𝗽𝗶́𝘁𝘂𝗹𝗼 𝟵
Yuuji vivia dizendo a ele que não passava mais tempo com a família, que vivia fora de casa ou aprisionado no próprio mundinho particular, talvez essa represália fosse o maior motivo por estar em um parque lotado num dia de sol, detestava com todas as suas forças lugares lotados, principalmente em dias de muito calor, porém, se queria melhorar sua relação com as pessoas a sua volta, teria de fazer por onde.
Por esse motivo exato, Megumi agora estava jogando basquete com garotos que mal conheciam, eram amigos de Yuuji, sim, mas nunca tiveram contato. Eram divertidos e muito barulhentos, mas ainda sim não pareciam más pessoas. Naoya fora o que mais o surpreendeu, sabia que ele era amigo de Aya, os dois estavam sempre juntos, imaginava o garoto um pouco mais esnobe ou talvez arrogante, mas na verdade, ele era apenas uma versão masculina e mais espalhafatosa da própria Aya.
Deveria parar de pensar nela, estava ficando esquisito já. Quando via algo que o fazia lembrar, mesmo que vagamente, dela, seu semblante mudava para algo mais sereno, mas durava pouco. Megumi pensou que ela adoraria estar ali, ela sempre deixou claro que adorava lugares cheios e movimentados.
Quando a viu na multidão sentiu vontade de ir até lá, mas ela estava com os amigos e Megumi não queria atrapalhar, então fingiu que não a notou, evitando olhar para ela, mas quando foi procurá-la novamente após o final da partida não a encontrou, reconheceu os amigos de longe mas nenhum sinal dela.
Talvez Aya teria ido embora, se ele pudesse, também já teria feito o mesmo, mas a garota não era igual a ele e realmente gostava daquele tipo de evento, a não ser que algo a tivesse deixado para baixo, fazendo-a se afastar da multidão e ir para o único lugar que ficaria vazio naquele momento. Poderia estar indo lá a toa, não a conhecia o suficiente para listar opções realmente condizentes com Aya, mas não custaria ir conferir e ver se estava errado.
Mesmo estando cansado e levemente ofegante por conta da partida assídua, Megumi não hesitou em ir até a área infantil do parque, um tiro no escuro é claro, mas ainda sim um tiro certeiro porque mesmo de longe, conseguiu vê-la no balanço enferrujado.
***
Aya estranhou a mão do garoto quando a segurou, pensando que ele iria soltá-la, mas sua pele calejada continuava entrelaçada a sua mesmo enquanto caminhavam pelos arredores sossegados do parque, as árvores compunham o ambiente fechado mas ainda sim fresco, seu balanço acalmava Aya, ou talvez fosse a presença do garoto que lhe trouxesse alívio.
— Estou sozinha porque sei que não sou bem-vinda em alguns lugares, não queria ser inconveniente e permanecer onde sei que não me encaixo.
Ayame sabia que não devia satisfação alguma ao garoto ou que tinha a obrigação de responder as perguntas dele, mas sentiu a necessidade de dizer a verdade. Costumava mentir para todos ao seu redor, sempre mantendo relações com base em meias verdade, sempre ocultando o que de fato sentia ou acontecia. Aya tinha medo de ficar sozinha, tanto medo que a mentira sempre fora seu refúgio, mas por algum motivo, não sentia necessidade de mentir para Megumi, talvez porque não tivesse medo dele ir embora, por sempre ter sido honesta com ele não possuía aquela necessidade extrema em fazê-lo ficar.
Megumi nunca a fez sentir vontade de ser ninguém além dela mesma, não havia sentido em mentir para a única pessoa que não a forçava a colocar uma máscara.
— Seus amigos sabem que estão com pessoas que te deixam assim? - ele estava bravo com os amigos dela, por não enxergarem algo tão explícito.
A única reação de Aya fora rir desacreditada — Não é culpa deles, e também não é como se fosse algo óbvio o tratamento indiferente que recebo. Só quem é tratado assim sabe como funciona, eu tento evitar me misturar muito para não surgir comentários maldosos, mas a indiferença ainda permanece junto com o desconforto. - Aya se desvencilhou da mão dele, disfarçando logo em seguida amarrando o cabelo — Sabe a sensação de estar rodeado de pessoas e ainda sim se sentir sozinho? Como se-
— Você não pertencesse de fato ao lugar onde está... - Megumi disse baixo e Aya o encarou de soslaio, vendo aquele tipo de dor que só quem passa, compreende — Eu entendo você.
Megumi sabia o que era não pertencer a nada e a ninguém, sabia tão profundamente o sentimento de solidão agudo que alastrava por seu peito toda vez que se afastaram dele por um boato ou por sua personalidade áspera.
Tinha sua família, é óbvio, não poderia amar ninguém como ama eles, mas cada um tinha sua própria vida, pertenciam a algum lugar, faziam parte de algo e ele... Bom era um complemento dentro de sua própria melancolia e agora sabia que Aya se sentia do mesmo jeito que ele.
— Nós dois somos odiados. Talvez por isso o destino nos fez amigos - Ela disse bem humorada, tentando espantar o clima triste.
Mas Megumi sabia que por mais que aquilo fosse verdade, apenas ele merecia aquele tratamento. Aya era tão gentil e alegre, nunca a vira ser grosseira ou falar mal de alguém por bel prazer, ela não merecia isso, essa indiferença estúpida de pessoas sem noção alguma... Pessoas como ele. Ele tratou Aya desse mesmo jeito, fora tão rude e indelicado com alguém que só quis deixá-lo mais alegre.
— Detesto te ver triste - Aya parou de andar encarando-o, sorrindo de leve ao ver a expressão abatida do garoto.
— Não ligue, eu já estou acostumada com isso, agora já não é mais um ato doloroso se afastar para evitar, é como se fosse autopreservação - Aya entrelaçou seu braço no dele - Eu só te contei porque não queria mentir para você.
— Não era para ser assim - voltaram a caminhar — É por isso que eu não gosto de ninguém, muitos, me incluindo, são odiosos. Não merecem você. Me desculpa por ter tratado você daquela maneira eu...
Ele não a merecia, era tão egoísta e ingrato, fizera tão mal a ela e agora os dois eram amigos, porque Aya sabia perdoar, sabia enxergar alguém que merecia tal afeto, era alguém que por mais que tivesse os próprios defeitos, tinha um coração bom.
— Você me superestima demais - ela riu apertando mais os braços dos dois — Ninguém merece ser tratado com desdém, Megumi. Gentileza não deveria ser uma característica rara das pessoas, mas como não são todos que acham isso, deveria ser pelo menos algo a ser trabalhado individualmente, assim como você. Você é alguém gentil, do seu jeito especial é claro, mas não deixa de ser. Pare de se menosprezar apenas por um erro, eu já te perdoei.
Estar com Aya fazia valer a pena ser gentil, dava vontade de ser o melhor de si mesmo apenas para poder vê-la sorrindo, sua gargalhada era melodia e sua tristeza era pior do que ouvir um desafino.
Queria ser o motivo dela sorrir, nunca mais ser o de chorar porque Aya tornava as coisas leves, seu sorriso aliviava qualquer pesar.
Por uma fração de segundos infinitamente grandes as orbes dos dois travaram uma na outra, a atração sendo tão forte e intensa que podia sentir seu próprio coração retumbante. Os olhos cor de mel dela o fazia querer arfar, davam-lhe prazer apenas por permitir que Megumi pudesse admirá-los.
— Achei você!
A quebra da troca de olhares fora tão rápida e súbita que Aya sentiu dor no pescoço após desviar o olhar com tanta intensidade, não sabia o que raios havia acabado de acontecer, só tinha noção de que seu coração batia muito, muito rápido.
Megumi fechou a cara no exato momento em que escutou a voz de Yuuji, o garoto de cabelos rosados dividiu os olhares entre os dois, decidindo para quem iria olhar primeiro.
— Oh, me desculpe se atrapalhei algo - Aya discordou levemente com a cabeça, sorrindo para Yuuji ao soltar discretamente o braço de Megumi.
— Que isso, relaxa. Yuuji, não é? - a garota o cumprimentou rapidamente, cortando logo a chance de Yuuji fazer qualquer comentários a mais.
— Isso mesmo, posso te chamar de Aya? - o garoto era tão alegre e espontâneo, parecia cheio de energia, era estranho como irmãos, mesmo que adotivos, serem tão diferentes um do outro.
— Claro que pode - Aya sorriu ainda mais abertamente quando Yuuji a retribuiu.
— E você aí, seu ridículo, traidor e horroroso - Yuuji franziu o cenho, trocando o olhar de Aya para Megumi em segundos — Como ousa me deixar na mão? Cara, sem você nós perdemos por dez pontos a mais, sabe o que é isso?!
Megumi revirou os olhos, cruzando os braços em frente ao peito desnudo, Aya havia esquecido desse fator, estava tão concentrada que sinceramente não deu muita atenção ao resto das tatuagens adornando o corpo do garoto.
— Já acabou o drama? - a voz gélida dele espantou Aya, há quanto tempo ele havia parado de ser tão frio e taciturno com ela? — Já estávamos voltando.
Ela não havia esperado que de uns tempos para cá Megumi andava sendo mais calmo do que indiferente com ela, mantinha o tom de voz mais nivelado mas não rude.
— Ora seu ingrato, perdemos por culpa sua, Naoya vai me importunar pelo resto do mês agora! - Yuuji colocou as duas mãos na cintura, parecia uma mãe dando bronca no filho — Mas não é culpa sua viu, Aya gatinha. Não é sua culpa esse safado branquelo sair por aí flertando com você.
Flertando? Eles não estavam flertando! Aya estava prestes a explicar esse fato mas Megumi foi mais rápido, mas não fez o que ela esperava, Megumi apenas pegou no braço dela arrastando levemente, sem machucar puxando-a para longe de Yuuji.
— Vai almoçar comigo - Megumi disse num tom mais baixo, para que o garoto raivoso que agora os seguia não escutasse — Não estou aberto a discussões.
— Mas...
— Quieta, Aya. Pare de ser tão teimosa.
Megumi virou-se com tudo ao sentir a mão de Yuuji pousar em seu ombro fazendo-o parar — Você vai buscar as bebidas, Aya você vem comigo! Estou te convidando para almoçar com a gente caso esse azedo não tenho feito isso.
Aya prendeu o riso diante do apelido, Megumi a fuzilou com o olhar. Aya apenas ergueu os braços em sinal de rendição.
— Você paga, Megumi!
— Tudo bem - Fushiguro aproveitou o momento em que Aya se distraiu olhando o próprio celular para sussurrar no ouvido do irmão — Não a deixe sozinha enquanto eu não estiver por perto, entendeu?
Yuuji pereceu confuso, franzindo o cenho olhando para a garota afastada — Ela é o que sua? Pensei que só estivessem no mesmo clube.
— Não interessa o que ela é minha, só... Por favor, Yuuji, faça ela rir, de o seu jeito, mas não a deixe triste.
Yuuji sorriu malicioso para o irmão, balançando as sobrancelhas ao concordar — Tudo bem, eu vou distrair sua gatinha, fica tranquilo.
O rosado foi até ela, deixando Megumi para trás passando o braço pelo ombro de Aya, levando-a para caminhar de volta para a área movimentada — Nunca tivemos oportunidade de conversa, mas me diz aí, o que acha da Jennifer Lawrence?
Fushiguro observou os dois irem embora, sumindo do campo de visão dele aos poucos. Sabia que Yuuji era alguém que nunca faria outra pessoa se sentir excluída, Nobara tinha aquele jeito robusto e exagerado dela mas tinha plena certeza que ambas se dariam muito bem.
Estava aliviado em deixar Aya nas mãos de seus irmãos, pelo menos agora teria certeza de que ela não seria deixado de lado enquanto estivesse nos cuidados dele.
Andou até chegar em um quiosque na parte oeste do parque, estava tão lotado e com tantas filas que pensou se realmente valia a pena pegar as bebidas, mas já que tinha ido até lá, deveria fazer valer a pena. Colocou a camiseta, finalmente seu corpo havia esfriado e começou a cogitar a possibilidade que quem o deixou quente não foi o jogo, e sim, Aya.
Odiava o tanto que o sorriso dela o deixava nervoso. Detestava o fato de que só precisava ver uma parte de seu pescoço para deixá-lo desconcertado. Ela era amiga dele e ele estava confundindo as coisas, não poderia deixar isso o afetar mais do que já estava afetando.
Aya era só a amiga gente boa e engraçada dele. Só isso e nada mais.
Ficaria repetindo isso até que seu subconsciente transformasse em verdade.
Mexia no celular distraído, rolando por seu feed vendo qualquer baboseira que aparecesse enquanto o tempo passava. Quando finalmente chegou sua vez, foi o mais breve o possível, pegando quatro sucos de laranja em garrafinhas, um para cada um de seus irmãos, um para ele e outro para Aya, pagou a moça do quiosque e deu-lhe um curto sorriso, tal ato que deixou a moça sem graça, rindo timidamente.
Megumi não sabia o porquê de deixar as pessoas desconfortáveis, ele até havia dado um sorriso dessa vez.
Voltava para a área das quadra novamente segurando uma pequena sacola, refazendo o caminho das árvores mais uma vez prezando pela paz e sossego, coisa que durou pouco já que uma voz conhecida e temida soou em seus ouvidos pouco tempo depois de ter entrado pelas árvores.
— Te vi saindo do quiosque, aquela moça queria o seu número - a garota disse com aquele tom cínico e vil que ele tanto odiava.
— Me lembro de ter dito que não queria mais ouvir sua voz ou ver a sua cara - Megumi queria esconder que estava nervoso pela presença dela, então cobriu sua voz pelo mais profundo desprezo.
— Você já foi mais simpático comigo - a garota deslizou a mãos pelos seus braços e Megumi, por reflexo, se afastou — Não posso mais encostar em você? Essa tarefa ficou para Aya? Não vi você em nenhum momento desviando dela...
Megumi franziu o cenho desacreditado, porra, ela era maluca e agora deu para ficar observando-o?
— Por que faz isso? - Megumi disse indignado - Você morreu para mim, por que não posso estar morto para você?
— Eu gosto de você e não quero desistir de nós.
— Não existe mais um nós, Aimi. Me esqueça de vez e vá viver sua própria vida.
Aimi semicerrou os olhos para o garoto, entortando de leve a cabeça encarando-o daquele jeito que sabia deixar Megumi com raiva ou com medo dependendo da situação.
— Vai se contentar com a bonitinha? Acha que ela vai te entender tanto quanto eu? - ela soltou um risada desacreditada — Na sua primeira crise ela vai embora, Megumi. Sabe que ninguém além de mim sabe resolver você.
Fushiguro comprimiu os lábios, com o receio caindo sobre seus ombros. Ele não queria Aya envolvida nisso, não queria ela vendo mais de seu pior lado e doía só de imaginar sua amiga tendo que lidar com ele daquela forma. Odiava Aimi por isso, detestava o quanto ela o conhecia e sabia onde mais doía.
— Ela só um rosto bonito e frágil, nunca vai entender o quão difícil você é, sabe que só vai machucá-la então por que continua? - Aimi cruzou os braços, sorrindo com aqueles dentes brancos — Quando foi que se tornou tão egoísta?
Aimi era maldosa e ardilosa, tão esperta feito uma víbora, sabia como segurar as cordas para controlar Megumi e em como suas palavras surtiam um efeito quase nefasto na mente dele.
— Pare, Aimi. - Megumi se afastou mais ainda quando ela tentou avançar — Não envolva ela em algo que não cabe a mais ninguém além de nós dois.
— Está preocupado com ela? - insanidade pairou sobre as orbes esverdeadas dela, Aimi podia estar sorrindo, mas Megumi a conhecia bem o suficiente para saber que ela estava fervendo de raiva — Aya não vale a pena, confie em mim, só vai te prejudicar.
— Cala a porra da boca maluca - não controlou as palavras dessa vez, estava tentado a ter medo da ex-namorada ou em mandá-la ir se fuder — Você nem a conhece, para de tentar enfiar as pessoas nisso.
— A conheço bem melhor do que você ou do que qualquer um dos amiguinhos dela - Aimi estalou a língua _ E por conhecê-la sei que não é boa o bastante para você, é só a porra de uma garota traumatizada que vive em função de agradar as pessoas que pisam nela. - a garota não controlava o próprio tom, finalmente havia perdido a paciência — Agora você se contenta com tão pouco? Ayame não passa de um caso perdido, todos já desistiram dela, ela já está abandonada de qualquer jeito, por que quer se afundar junto com uma estranha?
Chega. Era o suficiente.
Aimi podia falar qualquer merda dele, podia ser louca o quanto quisesse enquanto ofendia ou ameaçava ele, mas Aya não tinha absolutamente nada a ver com aquela história, só teve o azar de cruzar o caminho com a desgraçada de sua ex-namorada.
— Olhe para o espelho e repita as mesmas palavras e talvez aí sim elas façam sentido - Megumi se aproximou dela, o suficiente para milímetros serem considerados exagero, olhava para baixo para conseguir encará-la, fitando-o os olhos ferventes da garota — Não envolva outras pessoas nos seus surtos, ninguém tem culpa de você ser uma fodida da cabeça, e eu vou repetir uma única vez e eu espero que você me entenda. Nunca mais abra a porra da sua boca para falar dela, entendeu? Fui claro o suficiente agora? - sua voz era mortalmente fria e pausada, nunca havia ameaçado Aimi, sempre prezou por ignorá-la mas dessa vez ela passou de todos os limites aceitáveis.
Aimi engoliu em seco, mas não desviou seu olhar do dele, em nenhum momento ousando abaixar a cabeça perante a um olhar ameaçador.
Megumi suspirou se afastando, virando-se de costas prestes a deixá-la e ir embora tentar esquecer a merda que acabara de acontecer, mas Aimi não havia acabado.
Aquilo só seria o começo.
— Diga a Aya que a prima favorita dela mandou um abraço.
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