𝗖𝗮𝗽𝗶́𝘁𝘂𝗹𝗼 𝟭𝟱

N/A: O capítulo está com essa quantidade de visualizações e comentários pq eu reescrevi por cima do antigo capítulo!

Aya, tentando ser o mais otimista possível depois de uma longa noite de choradeira desenfreada, foi para escola enfrentar um dos maiores males da adolescência: lidar com outros adolescentes. Com um belo sorriso estampando o seu rosto e com o seu humor costumeiro cumprimentou todos a sua volta, conversando com quem quer que a parasse. Usava o uniforme juntamente a um cardigã off-white, estava esfriando mas não tanto ao ponto de necessitar de um casaco, seus cabelos estavam presos em um rabo de cavalo e o bendito colar ainda a acompanhava.

Não era novidade passar a noite afogada nas próprias mágoas e no dia seguinte ter que aparecer socialmente, então já era mestre na arte de esconder as olheiras e de fingir que não estava a um tris de desmoronar.

O primeiro horário foi tão tranquilo que mal sentiu o tempo passar, mesmo que tenha ficado inquieta com a falta de Megumi. Ele não costumava faltar, na verdade, Aya nunca tinha o visto perder aula. Era mais do que incomum a não presença dele na sala de aula.

Aya poderia estar sendo paranóica, costumava ser assim quando coisas familiares aconteciam, mas sua intuição gritava para que ligasse ou que ao menos perguntasse para ele se estava bem ou se estava doente ou com algum problema, mas não iria fazer isso, tinha medo de ultrapassar os limites com ele. Não sabia os níveis de intimidade com Megumi, talvez ele a achasse grudenta ou exagerada, a garota realmente tinha essa preocupação com todos os seus amigos, mas muito provável que Fushiguro não tivesse o mesmo nível de tolerância que eles.

Aya continuou a conversar com suas amigas, vendo Mahina e Nobara se entrosarem cada vez mais. O tempo foi passando e o dia também e nenhuma notícia de Megumi ou de seu paradeiro.

Até que não se aguentou, na sexta-feira era o segundo dia consecutivo que o amigo não dava notícias, mas seus irmãos não pareciam preocupados, o que de certa forma deveria confortá-la, entretanto, não conseguia se acalmar. Esperou pacientemente Mahina se afastar para perguntar para a ruiva:

— Perdão a intromissão mas o Megumi está doente ou algo do gênero? - Aya simplesmente perguntou, curiosa e com aquela aflição esquisita forçando sua garganta a secar.

— O que? - Nobara riu fraco — Não, ele está bem! Só tirou umas noites fora porque estava trabalhando nos próprios quadros. Provavelmente se cansou tanto que dormiu no apê do nosso amigo Choso. Ele costuma fazer isso nas férias, mas como ele anda pintando mais nos últimos tempos, acredito que esteja mais ocupado do que o normal.

Ela disse animada, parecia orgulhosa em suas palavras ao mencionar o trabalho do irmão, mas Aya, mesmo parecendo aliviada, ainda sentia a maldita pulga atrás da orelha.

— Que ótimo então! Pensei que como ele nunca perde aula, poderia estar de cama ou algo assim - Aya ajeitou a mochila nos ombros, parando no corredor antes de dar um beijinho de despedida na ruiva — Te vejo no sábado?

— Com certeza! - Nobara sorriu animada, seguindo seu caminho para o clube de jujitsu.

Aya estava inquieta, pensando em possibilidades infinitas que não condiziam com a realidade, cogitando situações não cabíveis com o que diziam a ela. Nunca se considerou alguém sensitiva, inclusive, naquele momento agradeceu por isso, pois estava com um sentimento amargo. Como se algo muito errado tivesse acontecido.

Mas por aquele momento, resolveu ignorar sua dor de cotovelo e resolver suas obrigações. Aya tinha que estudar algumas coisas e preparar alguns documentos para seu registro no trabalho voluntário, começaria na próxima segunda e não poderia estar mais ansiosa.

Adorava essas campanhas, sempre participava porque conhecer pessoas novas a deixava alegre e ajudar de alguma forma, mesmo que mínima, também a fazia sorrir. Aya amava trabalhar com crianças, sempre foram suas favoritas, por esse mesmo motivo sempre teve trabalhos voltados a elas, mas para variar um pouco, Aya foi designada ao hospital regional. Faria companhia para pacientes em observação constante ou para aqueles em seus processos de observação.

Mas ainda sim precisava organizar sua agenda com os compromissos do clube e com os encontros formais dentro da empresa aonde seu pai trabalhava. Aya participava todas as vezes, gostava de ver seu pai radiante por ver ela e seu irmão junto a ele.

Tinha a sala do clube do livro todinha para ela, não podia estar mais aliviada. A maioria havia ido ao último amistoso da temporada, mas como Aya estava muito ocupada para simplesmente deixar suas tarefas para trás e ir, resolveu aproveitar o silêncio e o vazio naquele ambiente.

Aya fez tudo o que podia, estudou bem mais do que o planejado e aproveitou seu tempo livre para colocar sua leitura atual em dia, Cordialmente Cruel tomava toda a sua atenção, as palavras entravam em sua mente e entrelaçavam-se a sua imaginação. Fazia um bom tempo que não achava um livro que a deixasse tão inerte de sua realidade.

Tudo estava tão silencioso que o mínimo movimento seu era amplificado, se até o som de seu cardigã encostando na almofada era alto, a batida na porta do lado de fora se tornou um estrondo para os ouvidos de Aya.

A garota largou o livro no sofá e se levantou rapidamente, caminhando até a porta abrindo-a encarando um grande nada. O barulho da respiração de alguém ao lado da entrada a fez sair para fora, dando de cara com Megumi ofegante e aparentemente debilitado.

— Meu Deus, o-o que aconteceu? - Aya colocou as duas mãos nos braços gelados do garoto.

Aya podia identificar um corte pequeno já cicatrizado no lábio, um arroxeado na bochecha bem abaixo dos olhos e olheiras marcadas. Seus olhos azuis eram um mar revolto, algo contido e extremamente volátil, mas quando suas orbes fixaram-se nas dela, a revolta se foi, expulsa por um vento aliciante e calmo.

Seus olhos foram amenizando ao ver Aya, como se apenas a presença dela fosse o bastante para tirar a angústia que contorcia suas feições, cada traço dela era uma onda morna em suas costas.

— Ei... - Aya franziu o cenho, pousando uma das mãos no rosto dele, acariciando o hematoma com o polegar — Vamos entrar.

O garoto parecia desnorteado, Aya o guiou para dentro, fechando a porta no caminho. Queria colocá-lo para sentar e talvez o acalmar, mas os braços do garoto rodearam-na em um abraço, apertado e suplicante, enterrando seu rosto na curvatura do pescoço dela. Aya deu um passo para trás, desequilibrando um pouco antes de retribuir aos poucos. Conseguia escutar os batimentos dele contra o seu peito.

Com um pouco de esforço a garota conseguiu levá-lo para o sofá, Aya não disse mas ela conseguia sentir a respiração dele desregulada e as mãos trêmulas sobre seu corpo, do jeito que estava Aya tinha medo dele começar a hiperventilar. Em uma tentativa de acalmar o garoto Aya o abraçou mais forte ainda fazendo-o apoiar a cabeça em seu ombro, acariciando suas costas com uma mão e a outra afagando os fios negros do garoto. Megumi a apertava tanto que seu diafragma ameaçava estourar, mas Aya não o soltou, se pudesse pegaria toda a dor do garoto e instalaria nela mesma.

Por um tempo eles ficaram nessa mesma posição com apenas a respiração dos dois soando pela sala vazia, Aya tinha medo de dizer alguma coisa e desencadear algo pior, se mantendo calada, deixando que ele entendesse a própria confusão antes de tentar falar. Não fazia a mínima ideia do que havia acontecido e nunca desejou tanto que sua intuição estivesse errada.

Sentiu o garoto afrouxando mais o abraço, a respiração ficando mais regulada e o tremor se esvaindo conforme os minutos torturantes iam passando, Aya se sentiu aliviada ao ver aquilo, mas por mais que estivesse se acalmando, Megumi não conseguiu conter às lágrimas, tão silenciosas que nem percebera quando começaram a escorrer pelas suas bochechas.

Ele estava assustado e cansado, passar por uma crise sempre o fazia se sentir mal, era como se estivesse na beira de um abismo pronto para ser empurrado, seu coração estava tão acelerado que sempre teve a sensação de estar em uma corda bamba, com o seu bombeamento prestes a explodir caso cortasse o fio errado, mas Aya não cortou o fio errado ou sequer o empurrou da corda, sua presença o fez se guiar pelo caminho certo e suas mãos enxugaram suas lágrimas.

O silêncio de Aya não era como um pesar desconfortável que arranhava seu timbre pelo ranger do calado, era como um silêncio palpável e respeitoso, que acariciava sua mente e transformava a tormenta em um mormaço pós-chuva.

Aos poucos foi tomando coragem para ir encarando-a, com o receio substituindo a clemência de minutos atrás.

Megumi não conseguia olhá-la nos olhos de fato, não tinha estabilidade o suficiente para se manter ali, só queria ir embora mas não queria ficar sozinho.
Um turbilhão de pensamentos fazia suas mãos tremerem, mas se assustou quando sentiu uma mão um pouco menor segurar delicadamente a sua, com sua pele quente assegurando a solidão gélida de Megumi.

A garota sorriu fraco, olhando para ele não com pena, mas com compreensão — Conseguiu se acalmar um pouco? - sua voz mansa o fez ter vontade de chorar de novo, mas não iria fazer aquilo na frente da garota a qual era apaixonado novamente.

— Me perdoa Aya, eu não queria que você visse isso. - sua voz estava mais rouca e baixa que o normal, o quer que tenha acontecido deixou o garoto mais abalado do que jamais visto por ela — Eu-

— Quieto. - não foi um repreensão, mas serviu como uma — Se quiser ir fique a vontade, não vou te impedir, mas se você está apenas fugindo saiba que não é necessário. Eu estou aqui, mesmo que seja apenas para te fazer companhia, não é bom ficar sozinho.

Mas aquela foi primeira vez que quando chegou no fim do abismo escuro e solitário havia alguém para abraçá-lo, que estivesse ali por ele e não por conta dele. O calor do corpo da garota, a respiração controlada dela, o cheiro, a presença de alguém ali com ele o fez se sentir simplesmente bem, ainda agoniado com a aflição ameaçando sufocá-lo, mas ainda sim bem.

A sensação de não estar sozinho era inigualável.

Se desfez do abraço, limpando as próprias lágrimas voltando a encará-la.

— Isso foi... - desceu o olhar para as próprias mãos, estava envergonhado demais para olhar para Aya durante muito tempo — Vergonhoso... Me desculpe. Eu não deveria ter... - Aya colocou as duas mãos no rosto de Megumi levantando a cabeça do mesmo.

Antes de sequer deixar o garoto terminar de falar, Aya o interrompeu.

— Chorar não é motivo de vergonha, não se cobre tanto. Você é um ser humano, tem reconhecer os seus limites e aceitar que nem sempre as coisas ocorrem como planejamos e que é completamente normal nos sentirmos fracos. - falava de um jeito tão sério que nem parecia ela mesma, ríspida e firme como nunca. Se Megumi estava fraquejando agora, Aya era quem iria o reerguer — Independente do motivo, você tem sim o direito de se sentir triste e isso nunca vai te fazer mais fraco.

Aya sorriu para ele, indo para mais perto até estar a milímetros de distância, deixando um beijo suave na bochecha do garoto.

Sempre evitou demonstrar qualquer um de seus sentimentos, escondeu suas crises durante muito tempo com medo de que tivessem pena ou simplesmente o rejeitasse, mas não, Aya o apoiou e ofereceu um ombro amigo, o conforto de saber que não estava sozinho.

— Obrigado - Aquela foi a primeira vez que Aya viu Megumi sorrir, verdadeiramente. Não mostrou os dentes como se estivesse pulando de alegria, mas ela conseguia sentir o peso que carregava, ela entendia, entendia que aquilo era alívio.

Tudo que ele precisava era de compreensão e um amigo, assim como ela.
Sentiu seu coração palpitar ao ver aquilo e em um ato inesperado Aya o abraçou novamente, estaria ali por ele, até passar.

Era reconfortante estar ali, com o tempo ambos se acostumando com a presença um do outro de uma maneira intima. Algo havia mudado ali.

Aya pôde escutar barulhos no corredor, vozes para ser específica, e não precisa saber muito sobre o garoto para entender que ele odiaria ser visto daquele jeito na escola.

— Vamos para minha casa.

[...]

— Aya, eu estou melhor, realmente não precisa...

— Cala a boca e tira a camiseta.

Megumi e Aya estavam nesse embate a quase dez minutos, foram para a casa dela e durante o caminho inteiro a garota percebeu o quão dolorido Fushiguro estava. Até que pegar no braço dele o fez soltar em gemido de dor agoniante o suficiente para Aya arregalar os olhos.

— Não fala desse jeito, está igual a uma maluca - ele disse encarando a figura desajeitada de Aya, que havia substituído o uniforme por uma camiseta estampada com a banda Paramore e o rabo de cavalo por um coque bagunçado, segurando uma caixa de remédios e o mesmo kit de primeiro socorros que ele usara nela semanas atrás. — Aya não precisa de tudo isso, eu estou bem.

— Levante o braço - ele ergueu uma sobrancelha em confusão — Se realmente estiver bem, erga o braço.

Megumi murmurou algo em negação, mas Aya o fuzilou tão profundamente que tinha certeza que ela enxergou seus órgãos.

Assim ele fez, tentou lentamente erguer o braço, mas seus músculos doíam tanto que foi humilhante fazer aquilo.

— Isso foi doloroso de se ver. - Aya disse e resmungou como resposta um xingamento baixo — Agora deixe-me ver o resto, vou tratar tudo isso.

Aya tinha muitas pomadas e curativos e Megumi já tinha feito o mesmo por ela de qualquer jeito, mas ver o garoto tirando a camiseta preta que usava, revelando o conjunto de tatuagens tão perto dela quase a fez se arrepender de ter insistido. Aya balançou a cabeça, espantando qualquer pensamento controverso, começando a usar toda a sua concentração nele.

Ela sentou-se ao lado dele, pedindo educadamente para o garoto virar-se de costas. Era um estrago, havia hematomas arroxeados mesclados com verde, alguns cortes mal cuidados e arranhões desregulados.

— O que aconteceu com você...? - Aya disse mais para si mesma do que para o garoto, aquilo foi surpreendente demais que acabou pensando alto.

— Os cortes foram por conta do vidro estilhaçado - Megumi disse calmo, agora não estava mais tenso — e os hematomas foram obra do meu pai - o tom irônico que ele utilizou fez o peito de Aya apertar, foi o próprio pai dele que fez isso...

— Vou cuidar de você, da mesma maneira que cuidou de mim. - Megumi pôde sentir a mão dela encostando em suas costas, a mão que semanas atrás ele havia enfaixado com tanto afinco.

Aya não disse mais nada, apenas passou água em um pedaço de algodão e limpou os cortes, após isso fez curativos simples com gazes e esparadrapo, percebeu que eram superficiais e que talvez não precisassem de cuidados médicos, depois abriu um pequeno potinho de pomada de ervas que seu pai trouxe de uma viagem do exterior e passou tomos os hematomas.

Megumi contraía os músculos de leve, mesmo não podendo ver seu rosto sabia que ele estava se contorcendo em dor. S

— Vire-se para mim - ela perdeu calmamente, voltando sua atenção a caixa de remédios — Você tomou uma surra e tanto, quer um analgésico?

— Sim, por favor - Megumi a observou caçar a cartela certa, analisou cada traço do rosto dela e percebeu o porquê de ter ido atrás de Yaa antes de qualquer pessoa.

Depois do incidente Megumi estava tão perdido, acabou indo parar no hospital, mas antes que ligassem para Satoru o garoto fugiu, foi para o estúdio vazio já que Choso estava fora da cidade naquela semana, dormiu lá remoendo absolutamente tudo o que aconteceu, sentia tanta dor mas só conseguia pensar no quão covarde e inútil ele era. Tsumiki ligou, mas não atendeu, seus irmãos também mas aceitaram as desculpas facilmente, sabiam o quanto Megumi prezava por suas pinturas então não protestaram por muito tempo.
Tudo estava errado, seu mundo era confuso e ele precisava urgentemente de algo que o trouxesse a realidade. Foi até a escola na intenção de procurar suas coisas dentro do armário, sabia que tinha algumas coisas de que precisava, mas caminhando por aquele corredor vazio, temendo ser visto por um conhecido, lembrou que no final do corredor havia algo que não era errado, que sempre tornava a trazer o eixo do mundo.
Sabia que o clube estaria vazio mas ao ver Aya pela pequena janela da porta quis correr, fugir porque dentre todas as pessoas no mundo ela era a única que ele não se perdoaria por vê-lo assim.
Não quis atrapalhá-la mas tudo se tornou tão intenso que acabou esbarrando na porta atraindo a atenção. Não queria que as coisas fossem desse jeito, que ela tivesse uma visão tão fragilizada dele. Na verdade, não quis muitas das coisas as quais foram dadas a ele, mas cá estava, praticamente nu na frente dela demonstrando todas as suas fraquezas.

— Sabe, pode falar comigo sobre qualquer coisa... Eu sei que pareço meio imatura por conta do meu jeito, mas eu ainda sou sua amiga e estou disposta a escutar o que quer que você esteja prendendo aí dentro.

Nunca apreciou a arte de se comunicar, de dizer o que afligia as partes mais sombrias de seu coração, de encarar o que corroía a fragilidade em sua carne. Sempre fora a própria rocha a qual as ondas quebravam-se, e nunca, nem uma vez se quer antes de hoje deixou-se rachar por qualquer tempestade.

Conhecimento de que falar o que estava preso era o melhor a se fazer, mas que ainda sim era doloroso fazer isso. Porém, era para Aya que iria falar, a garota mais gentil que conhecia iria escutar e não sabia o que esperar da reação dela.

Mas mesmo com medo e relutante, Megumi contou, parte por parte e todas as vezes que ele desviava o olhar ou seus lábios não conseguiam expressar a situação dolorosa, Aya segurava sua mão e mesmo calada o incentivava a continuar.

Aya sabia o quão difícil era se abrir, principalmente com alguém que não tinha tanta intimidade. Sabia exatamente o que ele estava sentindo, compartilhavam da mesma dor em situações diferentes, a compreensão era mútua.

Durante a conversa Aya não atrapalhou, guardou suas reações para si mesma, não queria desencorajar o ritmo dele. Megumi deveria estar guardando tudo aquilo por tanto tempo que só os deuses sabiam o peso que se desvencilhava dele.

Quando acabou a grande confissão, Megumi a encarou, pronta para as palavras clássicas de conforto barato, mas Aya séria, encarando-o firmemente, disse:

— Megumi não é culpa sua. - Ela se manteve ereta por mais que a vontade de abraçá-lo já fosse aparente — Nós não somos de ferro e não podemos evitar todas as situações, eu tenho certeza que a sua irmã não te culpa e te ama muito, você mesmo ultrapassou seus limites por causa dela, então é óbvio que ela te ama e você não é um irmão horrível.

Colocou a mão nas costas do garoto acariciando levemente o local onde pousou.

— Foi seu pai que invadiu a casa da sua irmã? Foi ele quem ameaçou vocês dois? - Ele a olhou e concordou com a cabeça - Pois bem, você está na sua razão de atacá-lo, não foi culpa sua, da mesma maneira que você enfrentou seu pai pra defender sua irmã, sua irmã entrou na frente para defender você, o único culpado é o seu pai que não sabe como tratar os próprios filhos, a culpa não é de nenhum de vocês dois, entendeu? Só Deus sabe o que eu faria caso alguém ousasse machucar o meu irmão.

Aya transmitia confiança e conforto, tão confortável que conseguiu se abrir para ela com um assunto que mal conseguia discutir com seus irmãos.

— Então quer dizer que violência é a solução? - depois de minutos essa foi a primeira frase que saiu da boca do garoto, o tom irônico e levemente brincalhão fez Aya rir em alívio.

— Se seu pai estiver envolvido, sim. Tem total passe para socar a cara dele!

O clima aos poucos foi amenizando, os dois tomando a animação e juntando forças para pelo menos arrancar um sorriso um do outro. As conversas aleatórias foram tomando um rumo melhor e o peso das palavras passadas foram tornando-se cada vez mais memórias, daquelas que ficam guardadas, que vigiem voltando à tona.

— Vou fazer algo para você comer. - Aya levantou-se, certa do que iria fazer. — Tenho absoluta certeza de que faz dois dias que você não vê comida decente.

— Tem certeza de que vai cozinhar? Não quer sair? - Megumi, com dificuldade a seguiu até a cozinha, sentando-se com bastante esforço na banqueta alta em frete à ilha.

— Está duvidando das minhas habilidades?

— Sim, estou. - admitiu sem rodeios — Da última vez transformou sua casa em churrasco e queimou a mão.

— Ah, aquilo ali foi um pequeno acidente! Não me dou bem fazendo doces - Aya voltou sua atenção para o armário, pegando as panelas e tigelas de inox que precisava — Se importa em não comer carne? É que eu sou vegetariana e como ultimamente só eu venho comendo em casa, não temos quase nada de origem animal aqui.

O garoto não viu problema algum e disse que ela poderia fazer o que ela quisesse contanto que tomasse cuidado com o fogo.

Os dois foram conversando sobre aleatoriedades do dia a dia e em meio a essas coisas Megumi levou um sermão sobre as mentiras que andava contando para seus irmãos, em como isso era sério e que se fosse ela no lugar deles, ficaria extremamente preocupada e chateada.

Mas mesmo com todos os sermões, Aya continuava o tratando da mesma forma, não com pena de sua situação e nem com censura, continuava sendo ela mesma, cozinhando de um jeito surpreendente habilidoso enquanto murmurava uma música que o garoto não fazia ideia.

Aya por um momento ficou tão concentrada na cozinha que mal falava e Megumi não poderia estar mais hipnotizado, percebeu que poderia passar horas vendo-a fazer algo que gosta, ela ficava ainda mais bonita quando estava séria.

Aya serviu para os dois um refogado de legumes com especiarias exóticas e apimentadas e Megumi literalmente murmurou de tão bom que estava.

— Isso aqui está divino - disse daquele seu jeito gélido demais, ainda não aprendeu como elogiar alguém sem parecer uma ofensa.

— É claro que está, fui eu quem fez! -  respondeu colocando outra garfada na boca, claramente já sabendo a maneira como ele elogiava.

Comeram em poucas palavras, o silêncio entre os dois ainda era uma benção inigualável. Megumi tentou lavar os pratos após o almoço, mesmo com Aya reclamando em seu ouvido sobre como ele não poderia fazer muito esforço.

Megumi feito uma muralha não se deixava abalar pelas repreensões de Aya, começando a se preparar para lavar os pratos até que as mãos delicadas dela pousaram nos dois lados de seu rosto, virando-o para ela.

— Tem como me escutar? - ela franziu o cenho tirando as mãos, mas Aya estava terrivelmente perto dele — Você precisa de repouso! Pare ser teimoso!

Megumi não disse absolutamente nada, apenas aproveitou a distância mínima entre os dois, porém, seu silêncio a fez amenizar a expressão e perceber o quão perto eles estavam um do outro.

Milímetros eram exagero para se referir ao espaço que separava eles.

As orbes brilhantes de Aya pareciam relutantes ao mesmo tempo que desejosas enquanto o mar revolto dos olhos de Megumi lutavam para se manterem concentrados em qualquer coisa a não ser nos lábios dela.

— Você está muito perto... - o coração de Aya dançava em seu peito e não conseguia ter controle da sua voz, só não tinha coragem o suficiente para deixá-la alta e vontade o bastante para se afastar.

— É mesmo? - seus fixaram-se nos dela, fendas impiedosas fitavam a imensidão âmbar de Aya — Então por que você não se afasta?

Podia jurar que a garota prendeu a respiração.

Perigosa e tentadora era aquela proximidade, Aya paralisou as mãos ao lado do corpo, com os dedos se contorcendo e Megumi fez questão de ajeitar a postura sem tirar o foco dela. Aya não tinha a mínima ideia do que estava fazendo quando olhou para cima, para ajeitar a visão e conseguir ficar de igual para igual. Ela perdeu a noção de tudo quando seu enfoque foi para o arco bem desenhado dos lábios dele, em dar atenção ao seu pensamento malicioso de como seria beijá-lo.

— Isso é erro... - ela sussurrou quando percebeu que ele estava aproximando seu rosto propositalmente ao dela.

— Diga, então.

A respiração de Aya ficou desregulada, havia menos de um mísero dedo de distância entre a boca um do outro.

— Diga que não quer e eu não me aproximo mais.

— Eu... - Aya mordeu imperceptível o interior de sua bochecha — Pensei que não me visse dessa forma.

Aquele maldito sorriso ladino de Megumi nasceu e a mão atrevida na cintura dela quase a fez desmoronar. Ele a puxou para perto, colocando ambos os corpos em um calor mútuo.

— Se soubesse a forma que eu a vejo ficaria surpresa com o quanto eu quero você.

Todos os neurônios de Aya entraram em erupção. Suas bochechas eram rosas e nunca quis tanto beijar alguém como queria neste exato momento ao mesmo tempo em que seu cérebro gritava para ela se afastar dele e dizer com todas as letras que eles eram amigos!

Amigos. Sim, só amigos, mas enquanto sua mente gritava repetidas vezes essa afirmação, Aya se via indo até ele, prestes a se deleitar naqueles lábios que por tudo que era mais sagrado jurava que não seria capaz de soltar.

— Aya, estou entrando! - a voz da ruiva fez os dois abrirem tanto os olhos que a alma dava para ser vista — Aí meu deus! Desculpa! E-eu já vou embora!

Aya nunca tinha empurrado alguém tão rapidamente quanto naquele momento.

E Megumi não sabia se enterrava a cabeça na pia ou se sorria porque Aya estava prestes a beijá-lo.

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