𝚘𝚗𝚎
As gotas finas de chuva corriam pela pequena janelinha do avião, enquanto um aviso da cabine de comando mandava todos os passageiros colocarem o cinto de segurança, pois a aeronave já iria pousar. Fechando o livro, As Crônicas de Nárnia, que tinha em mãos, você o colocou de volta na mochila e pegou seus fones de ouvido, tentando acalmar os nervos de estar de volta ao Japão, ao som de Way down We Go, de KALEO.
A música invadia seus tímpanos, enquanto você respirava fundo mais uma vez, sentindo a enorme pressão que o avião fazia quando chegava ao solo. Tentando se distrair da ansiedade que corria seu corpo, pelo simples fato de poder ver seu irmão mais novo novamente, você começou a bater suavemente as pontas de seus dedos na coxa, no mesmo ritmo da música, enquanto a cantarolava, baixinho.
Assim que o veículo parou completamente e o sinal de atar os cintos foi desligado, você esperou as pessoas ao seu lado saírem de seus assentos, e fez o mesmo logo em seguida. Pegando a pequena mala de mão, que estava no compartimento de cima, se apressou em sair de lá o mais rápido possível, pegar suas malas e, finalmente, voltar para casa.
Mesmo que tenha amado a experiência de passar um ano estudando nos Estados Unidos, nada seria comparável a sensação de estar de volta ao Japão, lugar que você sempre chamou de lar. Além disso, não conseguia nem descrever o tanto de saudade que estava sentindo do irmão, não conseguindo imaginar quanta merda ele deveria ter feito nesse último ano, sem você lá para cuidar dele.
Não demorou nem minutos para que você conseguisse um táxi, já que seu irmão fez questão de não atender às suas ligações, e já estava no caminho de casa. Olhando pela janela do veículo, você conseguia reconhecer todas as ruas, percebendo que quase nada havia mudado desde que você foi embora, para seu alívio.
Walking The Wire tocava no som do carro, a fazendo tirar os fones de ouvido e desfrutar da música da banda Imagine Dragons, enquanto pegava seu celular e tentava ligar novamente para seu irmão.
Depois de duas tentativas falhas, você desistiu e colocou o aparelho de volta na bolsa, agradecendo veementemente por você ter levado uma chave da casa consigo para os Estados Unidos, se não ficaria presa até seu irmão dar notícias.
Mesmo só tendo um ano de diferença, você e Takemichi tinham uma mentalidade completamente diferente. O, agora loiro, era completamente irresponsável e vivia se metendo em confusão. Você era mais certinha, sempre tendo estudado muito e se dedicado ao seu currículo acadêmico; ainda assim, vivia tirando o mais novo de confusão, sempre se metendo em brigas por causa dele.
— There's nights we had to just walk away — Você cantarolava a letra da música, ao mesmo tempo em que acompanhava a batida com uma das mãos, mesmo que baixinho — And there's tears we'll cry, but those tears will fade.
— Então a senhorita fala em inglês? — A voz suave do taxista quase a fez pular de susto. Estava tão imersa em seus próprios pensamentos, que até havia esquecido da presença dele ali.
— Falo sim — Respondeu, devolvendo o tom simpático — Eu estava fazendo faculdade fora.
— Que fantástico! — O senhor, já de idade, falou, animado, arrancando uma risada fraca de você — Para onde você foi?
— Estados Unidos.
Depois disso, vocês dois passaram o caminho inteiro falando sobre sua viagem. Aproveitando que estava na hora do pico do trânsito, tiveram bastante tempo para conversar. O taxista, Senhor Suzuki, era extremamente educado e estava super empolgado em saber mais sobre sua experiência, fazendo perguntas animadas e ouvindo atentamente a tudo o que você falava.
— Mas, falando sobre aqui — Você falou, enquanto olhava seu reflexo no retrovisor, tentando amenizar as olheiras no rosto cansado do voo — Alguma coisa de muito importante aconteceu durante ano passado?
— Nada demais, na verdade — O Senhor respondeu, dobrando em uma rua que você logo reconheceu como a sua — Acabaram as obras das pontes, perto do lado leste da cidade, e o governo tem feito mais movimento de ajuda aos sem teto.
— Isso é uma ótima notícia.
Assim que o carro parou, você tirou o sinto de segurança, só conseguindo se imaginar deitando em sua cama, depois de um voo de quase treze horas. O Senhor Suzuki também saiu do carro, alegando que a ajudaria com as malas, mesmo que você tivesse insistido que não precisava.
Depois de colocar sua bagagem no terraço da casa com uma coloração levemente esverdeada, você pagou ao homem, que agradeceu pela conversa e se virou para ir embora. Você pegou suas chaves na bolsa e ia entrando em casa, mas parou ao ver que o Senhor deu meia volta.
— Sim, esqueci de lhe falar — Ele acrescentou, com um semblante preocupado — Há um novo grupo de delinquentes nesse bairro, eles se chamam de Tokyo Manji Gang. Se os vir, é melhor chamar a polícia.
— Certo — Você disse, com um sorriso agradecido no rosto — Obrigada pelo aviso.
Rapidamente, o homem foi até o carro e saiu de lá, indo fazer o restante das corridas do dia. Depois de um suspiro pesado, você finalmente colocou a chave na tranca, abrindo a porta da frente, e, por fim, achando que teria um tempo de paz. Mas, assim que entrou na casa, se deparou com uma bagunça enorme.
Roupas sujas, caixas de comida, peças de quebra cabeça, latinhas de cerveja e copos usados. Tudo estava espalhado por toda a sala de estar, a fazendo franzir as sobrancelhas e grunhir alto. Mesmo assim, a primeira coisa que você fez foi ir até seu antigo quarto, para confirmar se o estrago não havia sido estendido até lá.
Para sua sorte, depois de abrir a porta, percebeu que o seu cômodo estava impecável, do mesmo jeito que você havia deixado quando saiu, mas ele claramente havia sido limpo, provavelmente pela sua mãe. Ao relembrar da mais velha, você acabou sorrindo agradecida.
Um dos motivos para você ter voltado dos Estados Unidos, foi o fato de que sua mãe teria que se mudar de Tokyo, para resolver alguns problemas familiares. Já que Takemichi estava no início da faculdade, a melhor escolha foi que ele continuasse a morar aqui, mas, como vocês duas conhecem bem ele, acharam mais válido a mais velha voltar para o Japão, para que seu irmão não precisasse morar sozinho.
Você fazia faculdade de música nos Estados Unidos, e já estava indo para o quinto período, mas não reclamou em pedir transferência e voltar para sua cidade natal.
Depois de colocar suas malas em seu quarto, você pegou logo seus fones e escolheu uma playlist em seu celular, ouvindo Homemade Dynamite, de Lorde, invadir seus tímpanos, finalmente lhe dando coragem para limpar a casa.
Sem enrolar, você pegou um saco de lixo e começou a recolher toda a bagunça descartável deixada pelo seu irmão mais novo. O fato de haverem diversas garrafas de bebidas e copos só a faziam ter certeza de que Takemichi estava se divertindo muito enquanto a mãe de vocês estava fora.
Rindo suavemente, você encheu o último saco e deu um nó no mesmo, indo até a cozinha para deixá-lo na área de serviço. Enquanto estava colocando o saco na lixeira de recicláveis, você ouviu o barulho da porta de trás sendo aberta de forma lenta.
De onde estava, você apenas inclinou a cabeça um pouco para o lado, já que a outra pessoa estava na cozinha, mesmo cômodo que você, separados apenas por uma parede fina. Sem conseguir ter um mínimo de visão, começou a se perguntar se não era seu irmão que havia acabado de chegar.
— Acho que ele não está em casa — A voz do invasor a fez ter certeza de que não era o seu irmão.
— Ainda bem — Outra voz completamente desconhecida por você — Seria um problema se Takemichy estivesse aqui.
Logo em seguida, você ouviu passos pesados se aproximando. O fato de sua casa estar sendo invadida no mesmo dia que você havia acabado de chegar lhe irritava muito, a fazendo se questionar o que seu irmão estava aprontando.
Quando o corpo estranho se aproximou o suficiente da única parede que separavam seus corpos, você saiu de trás dela, rapidamente pegando o braço do outro e o imobilizando para trás.
O garoto que você havia acabado de atacar foi claramente pego no susto, já que agora tentava se soltar das suas mãos. O que você não contava, era que ele fosse tão grande, mas isso explicava as pisadas pesadas. Ambos estavam no chão, com você por cima do corpo dele, que estava deitado com a barriga virada para o chão.
Você segurava os braços dele para trás, os deixando imóveis, ao mesmo tempo em que colocava força nas suas pernas, o impossibilitando de usar as dele para de levantar. Mas, mesmo que ele não conseguisse se mover, ainda havia outro intruso em questão.
— Nossa, ela realmente conseguiu te prender, Ken-chin — A voz infantil fez você franzir as sobrancelhas fortemente e se virar para o outro homem.
Na verdade, não era um homem, mas um garoto. Deveria ter mais ou menos a sua idade, perto dos dezenove. Ele tinha um cabelo loiro, que ia quase até o seu ombro, e tinha a parte da frente presa para trás. Seus olhos eram escuros, e exalavam diversão. Além disso, ele era claramente baixinho e estava com um sorriso divertido no rosto.
— Perdeu pra uma garota, Ken-chin — O mesmo garoto falou, de novo, a deixando ainda mais confusa.
Foi exatamente nesse momento de desordem que você perdeu o foco no corpo em baixo de você. Em um movimento rápido, você foi atirada para o chão e, sem tempo para reação, sentiu um corpo em cima de você, a prendendo. Mas, diferente de antes, suas costas estavam viradas para o chão, te fazendo ficar cara a cara com seu agressor. Ele segurava seus pulsos, que estavam lado a lado com sua cabeça, a fazendo notar como os braços dele eram fortes e definidos.
Somente agora, conseguiu analisá-lo. O tal de "Ken-chin" parecia ser mais velho, mas não tanto assim, provavelmente não passava dos vinte e dois. Ele tinha um cabelo grande, preso em uma trança fina, com as laterais da cabeça raspadas. No lado esquerdo de sua cabeça, havia uma tatuagem de dragão, que cobria um área relativamente extensa. Além disso, os olhos dele eram pretos e estupidamente penetrantes.
As orbes intensas dele te olhavam com atenção, analisando cada traço do seu rosto, a fazendo ficar levemente corada com a proximidade em que estavam agora. Seus rostos estavam tão próximos que suas respirações pesadas estavam se misturando, e seus corpos completamente colados, já que ele ainda estava a imobilizando.
Mesmo levemente assustada, você realmente não conseguiu deixar de notar como aquele homem era lindo e atraente. Ele tinha um ar perigoso e protetor ao mesmo tempo, como se fosse capaz de te destruir inteira, mas não faria isso.
O loiro olhava para você a todo o momento, a analisando por completo, e ficando atento a cada movimento seu, não te dando brecha para fugir. Com certeza, você era uma das, ou a, garotas mais bonitas que ele já viu em toda a vida. Além disso, ele não conseguia deixar de ficar fascinado com a facilidade que você teve em derruba-lo, mesmo ele sendo um dos melhores lutadores da cidade.
Seus olhares ainda não tinham se desviado um do outro, como se, além de se analisando, vocês estivessem se desafiando, como um jogo. Ambos até esqueceram a presença do outro loiro ali, cada um imerso em seus próprios pensamentos.
— Que porra tá acontecendo aqui!? — A voz estridente e gritante de Takemichi a fez tomar um leve susto e desviar o olhar do homem em cima de você — Sai de cima dela!
Mesmo gritando, você sentiu que seu irmão estava completamente receoso em falar nesse tom com o mais velho, não sabendo se era medo ou respeito. Ainda assim, o loiro fez o que ele pediu, soltando seus braços primeiro e se levantando em seguida.
Você respirou pesado, notando que tinha soltado o fôlego que nem sabia que estava segurando. Quando foi se apoiar no chão para se levantar, notou que havia uma mão estendida para você, e, ao olhar mais para cima, percebeu que era do tal de "Ken-chin". Ainda que levemente receosa, você a aceitou, se impressionado com a facilidade que ele lhe ajudou a levantar.
— Obrigada — Você falou, baixo, sem o encarar nos olhos, e voltou a atenção para o seu irmão — Onde você estava, seu imbecil!? — Falou mais alto, deixando a raiva consumir você — Te liguei a manhã inteira avisando que tinha chegado!
— Desculpa, eu acabei saindo e esqueci meu celular aqui — Takemichi respondeu, meio sem jeito e coçando a nuca, com um sorriso nervoso no rosto — Senti sua falta.
A última fala dele teve o poder de afastar toda a raiva que você estava sentindo até então. Depois de um leve suspiro, você esboçou um sorriso e foi até o irmão, o abraçando com força, deixando agora a saudade falar mais alto.
— Eu também senti sua falta — Você respondeu, depois de interromper o ato para olhar no rosto dele — Se meteu em briga de novo? — Perguntou, ao perceber os leves hematomas recentes.
— Sabe como é, maninha.
— Maninha!? — Os dois outros garotos, que você havia esquecido completamente da existência, perguntaram, de uma só vez, com as sobrancelhas levemente arqueadas.
— Ah, é verdade — Tekemichi continuava sem jeito, rindo nervosamente — Eu nunca contei a vocês sobre ela. Essa daqui é a [Nome], minha irmã mais velha.
— Muito prazer — O loiro mais baixo falou, com um sorriso inocente no rosto — Me chamo Mikey.
— O prazer é meu — Você respondeu, meio incerta, já que, por mais fofo que estivesse parecendo, esse Mikey fazia todos os seus sentidos alertarem para perigo — E você? — Perguntou para o outro homem, que ainda não havia dito nada — Não vai falar o seu nome?
— Draken.
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